Acórdão nº 355/16.5GESTB.E1-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Maio de 2019
Magistrado Responsável | JÚLIO PEREIRA |
Data da Resolução | 23 de Maio de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no supremo Tribunal de Justiça I - Relatório 1.1 - Por requerimento de 16 de janeiro de 2019 veio AA, invocando o disposto no n.º 2 do art.º 437.º do Código de Processo Penal, interpor recurso extraordinário de fixação de jurisprudência do acórdão de 4 de dezembro do Tribunal da Relação de Évora, transitado em julgado no dia 20 de dezembro de 2018, invocando oposição sobre a mesma questão de direito com o decidido no acórdão de 17 de abril de 2018, proferido no processo n.º 515/17.1PHSNT.L1-5.ª secção, do Tribunal da Relação de Lisboa, também transitado em julgado.
1.2 - Na sequência de questão prévia suscitada pelo Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, foi o recorrente notificado, ao abrigo do disposto no art.º 417.º, n.º 3 do CPP para apresentar conclusões do recurso em conformidade com o disposto no art.º 412.º, n.ºs 1 e 2 do CPP, tendo este então resumido as razões do pedido nos termos seguintes: “(…) 1 – Radicando o objeto da jurisprudência em análise na qualificação (ou não) como injúrias das expressões “palhaço”, “palhaçada”, “cambada de palhaços”, “isto é uma palhaçada” e, considerando como considerou o Venerando Tribunal da Relação de Évora que tal se trata de matéria controversa e considerada como de “fronteira” entre a mera grosseria e o crime, impõe-se a esse douto Tribunal estabelecer jurisprudência sobre a matéria.
2 – Tendo o Tribunal da Relação de Évora julgado em sede de recurso que aquelas expressões consubstanciam elemento objetivo de crime de injuria agravada, prevista e punida pelos Artºs 181º e 184º do Cód. Penal, com a referencia ao Artº 132º nº 2 da alínea c) do mesmo diploma.
3 – Considerou aquele douto acórdão são idóneas para atingir o número da dignidade pessoal do ofendido.
4 – Por outro lado, entre os variadíssimos acórdãos que têm aquelas expressões como uma mera expressão de linguagem grosseira, incapaz de pôr em causa o carater, o bom nome ou a reputação do visado, o qual se mostra em clara oposição, como determina o nº 2 do Artº 438º do Cód. Proc. Penal, identificamos o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no Proc, 515/17.1PHSNTL1, 5ª Secção, de 17/4/2018 em que foi Relatora a Juiz Desembargadora Drª ..., no qual se sustenta posição contrária ao decidido pela Relação de Évora nestes autos.
5 – Em síntese, naquele acórdão sustenta-se que as expressões: “vocês são uns palhaços”, “não valeis nada”, “ide-vos foder” dirigidas pela arguida a agentes da PSP que a tinham acabado de chamar a atenção sobre um seu comportamento, inculcam a ideia de que a arguida criticou um comportamento mas não expressamente as pessoas dos ofendidos.
6 – Diz ainda aquele Venerando Tribunal “Mesmo que se possa considerar que se trata de uma crítica diretamente dirigida à atuação dos ofendidos é patente que ela se situa na área do seu comportamento estritamente profissional e não atinge o núcleo da dignidade pessoal dos ofendidos.
No contexto em que foram proferidas as expressões não têm outro significado que não seja a mera verbalização de linguagem grosseira, ordinária, sendo absolutamente incapazes de pôr em causa o carater, bom nome ou reputação dos visados.
7 – “Mutatis Mutandis” temos o caso em apreço.
Na verdade o arguido mediante o circunstancialismo de estar um veiculo de combate aos fogos a funcionar junto à sua casa cerca das 1,30 horas da madrugada e observando um conjunto de Bombeiros fardados a rigor com uso de capacete e luvas, correndo abaixo e acima na calçada, vivendo ele numa quita e questionando o que se passava, ser respondido que andavam a resgatar um gato, é demasiado surreal pelo que se tem por justificadas as expressões proferidas, também elas dirigidas, no contexto, à situação, ao comportamento dos bombeiros que correndo e à mão pretendiam apanhar um gato.
8 – No contexto, como se disse as expressões não têm outro significado que não seja a mera qualificação, admite-se como grosseira perante uma situação, mas sendo as palavras proferidas incapazes de atingir a dignidade pessoal do ofendido, não tendo, por isso a conduta do arguido idoneidade para ser penalmente sancionada.
9 – Termos em que se peticiona junto de V. Exª no sentido de, mediante a oposição de julgados sobre a mesma questão, e na esteira no já decidido por esse Egrégio Tribunal no Proc. 168/12.TRPRT.S1, com data de 1/2/2015 que as expressões “palhaço”, “palhaçada”, “cambada de palhaços” foi usada para caracterizar uma situação (o uso de veiculo de combate a incêndios), com sinalização luminosa giratória de emergência, e de bombeiros fardados de capacete e luvas, a correr pela rua para resgatar um gato quando era 1,30h da madrugada e em época de fogos).
10 – A utilização daqueles vocábulos dirigidos à situação, naquele contexto, não tem alcance ofensivo à dignidade pessoal do visado, pelo que tais expressões não são suscetiveis de integrar ilícito penal, e nesse sentido deverão V. Exª fixar jurisprudência nos termos do Artº 437 do Cód. Proc. Civil subscrevendo a posição daquele outro Acórdão que está em Oposição ao subscrito nestes autos, e consequentemente ser alterada a decisão proferida nestes autos, absolvendo-se o arguido da prática do crime de injúria agravada de que foi condenado.
DECIDINDO DESTA FORMA FARÃO V. EXªS EGRÉGIOS JUIZES CONSELHEIROS INTEIRA E SÃ JUSTIÇA (…)”.
1.3 - O Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto...
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