Acórdão nº 102/07.2GAAFE.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelMOREIRA RAMOS
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: PROVIDO.

Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO - LIVRO 414 - FLS 142.

Área Temática: .

Sumário: I - A não documentação das declarações prestadas oralmente na audiência assim como a imperceptibilidade, total ou parcial, da gravação constituem nulidade que pode ser suscitada em sede de recurso.

II - Constituiria um exagerado ónus para os sujeitos processuais exigir-lhes, antes da fase de recurso, o cuidado de ver se a prova foi correctamente gravada.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Proc. nº 102/07.2 GAAFE.P1 Tribunal da Relação do Porto (2ª Secção Criminal – 4ª Secção Judicial) Origem: Tribunal Judicial de Alfândega da Fé.

(Secção Únic

  1. Espécie: recurso penal.

    Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório: No processo supra identificado, por sentença datada de 22/04/09, foi decidido: – condenar o arguido B………., pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artº. 143º, nº.1, do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 5,00, o que perfaz a quantia global de € 600,00 (seiscentos) euros; – condenar a arguida C………., pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artº. 143º, nº1, do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00, o que perfaz a quantia global de € 400,00 (quatrocentos) euros; – absolver o arguido B………. da prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo art. 143º, nº 1, do Código Penal; – condenar o arguido B………. a pagar ao requerente D………. a quantia de € 600,00 (seiscentos euros) a título de danos morais.

    – condenar o arguido B………. a pagar ao requerente D………. a quantia de € 460,00 (quatrocentos e sessenta euros) a título de danos patrimoniais; – condenar a arguida C………. a pagar ao assistente a quantia de € 600,00 (seiscentos euros) a título de danos morais.

    – condenar a arguida C………. a pagar ao assistente a quantia de € 105,00 (cento e cinco euros) a título de danos patrimoniais.

    Inconformada com a sobredita decisão, veio a arguida C………. interpor recurso da mesma, nos termos constantes de fls. 334 a 352 (via electrónica, com originais a fls. 362 a 371) dos autos, aqui tidos como especificados.

    Na motivação apresentada formulou as seguintes conclusões: 1ª – vem o presente recurso interposto da sentença proferida nos autos que condenou a recorrente pela prática do crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo art. 143º do C.P., por se entender que, tanto do ponto de vista de apreciação da matéria de facto, como do ponto de vista da aplicação do direito, se impõe a revogação da decisão e a absolvição da arguida; 2ª – no que à matéria de facto concerne deu o Tribunal como incorrectamente provada a matéria vertida sob alíneas e) e l) dos factos provados, das quais deverá ser retirada a menção, directa ou indirecta, a várias pedras, devendo referir-se apenas uma pedra, como se extrai dos depoimentos valorados pelo tribunal das testemunhas E………. – depoimento gravado do minuto 11:53:53 ao minuto 12:53:36 e F………. – depoimento gravado do minuto 16:46:47 ao minuto 17:03:54, através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal de 1ª instância e como resulta da acta da audiência de discussão e julgamento do dia 03.03.2009; 3ª – ao dar como provada sob as alíneas e) e l) dos factos provados, a existência a várias pedras e referindo na sua motivação que as testemunhas mencionadas na alínea que antecede se referiram a uma pedra enferma a douta sentença recorrida de contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, nos termos do disposto no art. 410º, nº 2, alínea b) do C.P.P.; 4ª – devendo revogar-se a decisão proferida e eliminar dos factos provados, designadamente das citadas alíneas e) e l) a referência, directa ou indirecta, a várias pedras; 5ª – da prova produzida em sede de audiência, designadamente os depoimentos mencionados sob alínea B), bem como do relatório pericial junto aos autos, do qual resulta a ocorrência da lesão em data muito anterior à dos autos, ou seja, a 20.08.2007, verifica-se a inexistência de qualquer ilícito imputável à recorrente, devendo eliminar-se as alíneas g), i) e l) dos factos provados, dando-se tal matéria por não provada e, consequentemente, absolver-se a arguida; 6ª – não poderá para a matéria constante da alínea que antecede ter-se por valorado o depoimento da testemunha G………., pelo facto de este não se encontrar documentado pelo sistema de gravação digital disponível no Tribunal a quo determinando-se a sua nulidade; 7ª – a sentença proferida violou o disposto no art. 32º, nº2, da C.R.P., não aplicando o Princípio In Dúbio Pró Reo que deveria sustentar a absolvição da arguida, quer porque de facto não foi produzida prova relativa à prática de qualquer crime, quer porque a prova produzida foi manifestamente insuficiente e contraditória entre si mesma para, apelando às regras e experiência comum, demonstrar, sem margem para dúvida, que a aqui recorrente praticou o tipo de crime pelo qual vem condenada, impondo-se a sua revogação e absolvendo-se a arguida; 8ª – sem prescindir, impõe-se a revogação da sentença proferida pela verificação da ocorrência de causa de exclusão da ilicitude: legítima defesa, prevista nos arts. 31º e 32º do C.P. e como decorre da matéria vertida sob alíneas d) e e) dos factos provados, claudicando de igual modo o pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente, por exclusão da ilicitude da conduta da recorrente; Sem prescindir 9ª – mesmo que se entenda que a arguida não agiu em legítima defesa, as circunstâncias em que a mesma actuou, designadamente ter actuado na sequência da agressão ao seu marido por parte do aqui recorrido – cfr. ponto 3.2. da sentença – impõem que seja proferida decisão de dispensa de pena, por ter a arguida unicamente exercido retorsão sobre o recorrido, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 74º e 143º, nº 3, b) do C.P., e como alegado sob ponto 3. das presentes alegações revogando-se, em conformidade, a decisão recorrida; 10ª – sem prejuízo das alíneas que antecedem, deverá ser revogada a decisão proferida, impondo-se a atenuação especial da pena aplicada à aqui recorrida, por força do disposto nos arts. 72º e 73º, nº1, do C.P.; 11ª – mais deverá ser alterada a fixação concreta da pena da recorrente que, tão só, actuou na sequência das agressões perpetradas contra seu marido, por forma a que a pena aplicada reflicta o diminuto juízo de censurabilidade e ilicitude da sua conduta, reduzindo-a ao mínimo legal de dez dias e revogando-se em conformidade a sentença em crise; 12ª – a douta sentença de que se recorre violou o disposto nos arts. 31º, 32º, 74º, 143º, nº 3, b), 71º, 72º e 73º, todos do C.P., bem como, o disposto nos arts. 410º, nº 2, do C.P.P.

    Concluiu no sentido da revogação da sentença proferida, com a sua inerente absolvição.

    O Ministério Público respondeu nos termos constantes de fls. 377 a 392 dos autos, aqui tidos como renovados, concluindo que a sentença recorrida não merece qualquer censura, não se verificando qualquer dos vícios enunciados no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, devendo, por isso, improceder o recurso interposto pela arguida.

    Por seu turno, o assistente B……… veio responder nos termos constantes de fls. 399 a 403 dos autos (com fax a fls. 394 a 398), aqui tidos como renovados, concluindo pelo não provimento do recurso e consequente confirmação da sentença recorrida.

    Apesar de tardiamente junto aos autos o respectivo “print”, o recurso foi regularmente admitido (cfr. fls. 426 e 427 dos autos).

    Nesta instância, o Ex.mo. Procurador-Geral Adjunto apôs um visto nos autos (cfr. fls. 408 dos autos).

    Após exame preliminar, colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir, nada obstando a tal.

    II – Fundamentação: a – a decisão recorrida: No que ora importa destacar, a sentença recorrida é do teor seguinte: Factos provados

  2. No dia 27 de Agosto de 2007, por voltas das 18h30, D………., C………. e B………. cruzaram-se num caminho sito no ………., freguesia de ………., desta comarca.

  3. Aí, o arguido B………. munido de um pau que não foi possível examinar ou apreender, desfere uma paulada nas costas do ofendido D………. .

  4. Nesse momento o arguido começa a correr em direcção à aldeia de ………. sendo seguido, de perto pelo ofendido e pela arguida, que o tentavam alcançar.

  5. Seguidamente, o ofendido, quando já se encontrava perto do arguido B………, escorrega, caindo no solo, momento em que este, novamente com a ajuda do pau que empunhava, desferiu várias pancadas no corpo de D………. .

  6. Nessa mesma altura, a arguida C………. arremessou várias pedras ao ofendido B………. .

  7. Na sequência desses factos, D………. teve de receber tratamento no Centro de Saúde de ………., apresentando: - no crânio: ferido corto contusa com 5cm de comprimento, na região parietal direita, suturada com seis pontos de seda; ferida corto contusa com 15 milímetros de comprimento, na região retroauricular esquerda; - no tórax: escoriação, com hematoma de cor vinosa, com 15 centímetros de comprimento por dez centímetros de largura, na região dorsal; hematoma de cor vinosa, com 7 centímetros de diâmetro; na região posterior do hemitorax esquerdo; hematoma de cor vinosa com dez centímetros de comprimento por quatro centímetros de largura na região lateral do hemitorax esquerdo; - no membro superior direito: escoriação com 15 milímetros de diâmetro, na região lateral externa do antebraço direito; - no membro superior esquerdo: escoriação com três centímetros de comprimento por um centímetro de largura, na região lateral externa do antebraço esquerdo que lhe causaram directa e necessariamente, 10 dias de doença com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional (10 dias).

  8. Em consequência da conduta da arguida C………. o ofendido B………. teve de receber tratamento no Centro de...

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