Acórdão nº 484/06.3PAMRG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Março de 2010

Data03 Março 2010
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. RELATÓRIO.

    No processo Comum singular n.º …./06.3PAMRG.

    o arguido R., foi pronunciado para julgamento com intervenção do Tribunal Singular por factos susceptíveis de integrarem, em autoria material, um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido à data dos factos pelos artigos 143.º e 146º, por referência à al. j) do nº 2 do artº 132º, todos do Código Penal e actualmente pelo artº 145º, nº 1 al. e) e 2, por referência à al. j) do nº 2 do artº 132º, ambos do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro.

    No mesmo processo, o Hospital de Santo André, EPE, deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido no montante de 65,50 € e respectivos juros e a assistente apresentou pedido de indemnização civil contra o demandado, pedindo que este seja condenado a pagar-lhe, por danos não patrimoniais o montante de 60.000 €, e danos não patrimoniais a quantia de 32.011.27€ e ainda que o demandado seja condenado a pagar os juros vincendos sobre as referidas quantias desde a citação até integral pagamento, à taxa legal, bem como que o mesmo seja condenado em custas e procuradoria condigna e ainda a pagar à demandante todos os danos patrimoniais e não patrimoniais, que ainda não se verificaram, a liquidar em execução de sentença.

    Realizado o julgamento, o arguido, R foi condenado como autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido à data dos factos pelos artigos 143.º e 146º, por referência à al. j) do nº 2 do artº 132º, todos do Código Penal e actualmente pelo artº 145º, nº 1 al. e) e 2, por referência à al. l) do nº 2 do artº 132º, ambos do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei nº 59/2007, de 4 de Setembro, na pena de 200 (duzentos) dias de multa à razão diária de 7 € (sete euros) o que perfaz o montante global de 1.400 € (mil e quatrocentos euros) e a que correspondem subsidiariamente 133 (cento e trinta e três) dias de prisão.

    Foi ainda condenado a pagar ao Hospital de Santo André a quantia de 65,50 € (sessenta e cinco euros e cinquenta cêntimos) e respectivos juros e a pagar à assistente/demandante SA a quantia de 797,30 € (setecentos e noventa e sete euros e trinta cêntimos) e respectivos juros.

    Finalmente foi condenado em 3 UC de taxa de justiça e nas restantes custas do processo, fixando-se no mínimo a procuradoria (arts. 74º, 82º, 85º, n.º 1, al. a), 89º, 95º do CCJ e 513º, 514º do CPP), no pagamento da quantia correspondente a 1% da taxa de justiça, a reverter para o Cofre Geral dos Tribunais, nos termos e para os efeitos do art. 13º, nº 3 do D.L. nº 423/91, de 30/10 (alterado pela Lei 10/96 de 23.3, Lei 136/99 de 28.8, DL 62/2004 de 22.3. e Lei 31/2006 de 21.7)e D.R. nº 4/93, de 22/02 (alterado por D. Reg. 1/99 de 15.2) e ainda o arguido e demandantes condenados na Custas do pedido cível na proporção do respectivo decaimento.

    Não se conformando com a decisão, o arguido veio interpor recurso da mesma para este Tribunal, concluindo na sua motivação nos seguintes termos: 1. Nos presentes autos nada justifica a condenação do arguido pelos factos por que vinha acusado.

    1. Desde logo porque se baseou, apenas, a douta sentença para a condenação do arguido pela prática do crime de ofensa à integridade fisica qualificada por que vinha acusado, nas declarações prestadas em sede de audiência de julgamento pela assistente e no Relatório de Exame Médico-Legal 3. Refere a douta sentença do Tribunal a quo, “nenhuma das testemunhas ouvidas em julgamento assistiu aos factos. Resta, assim, ao Tribunal a versão trazida por um lado, pelo arguido, e por outro lado, pela assistente. Com efeito, o arguido começou por negar a totalidade dos factos que lhe vinham imputados, para posteriormente admitir que tinha retirado a pasta à assistente, e continuar a negar a prática de qualquer agressão, o que levou a que o Tribunal não desse credibilidade ao seu depoimento.

    2. Mais se refere na douta sentença que “Quanto à versão trazida a julgamento pela assistente, logrou convencer o Tribunal sobre a forma como ocorreram os factos e como a mesma foi agredida.” 5. Ora, salvo o devido respeito, jamais poderia o Tribunal a quo fazer consignar que o “arguido começou por negar a totalidade dos factos que lhe vinham imputados, para posteriormente admitir que tinha retirado a pasta à assistente, e continuar a negar a prática de qualquer agressão, o que levou a que o Tribunal não desse credibilidade ao seu depoimento.

    3. Pois o que se pode ouvir nas declarações do arguido, quando questionado pela Meritíssima juiz do Tribunal a quo se queria prestar declarações sobre os factos por que vinha acusado, foi que “tudo o que está no inicio do processo é verdade” e continuou esclarecendo “peguei na pasta (com os documentos da assistente) desorientado e saí porta fora. Eia veio atrás de mim, não sei se a meio da escada, não posso precisar, ela puxou para um lado e eu puxei para o outro, eu desequilibrei-me, caí de costas, tive um traumatismo aqui na minha cabeça (...) e eu senti que a senhora também tinha caído que eu ouvia a chamar por alguém mas não sei onde é que eia ficou, talvez um piso acima, não faço ideia. Eu sei que desci 4 ou 5 degraus de marcha atrás depois desequilibrei-me e bati com a cabeça, que ainda aqui tenho a marca na cabeça, aí talvez a 1 metro de altura já no piso O, bati no rés-do-chão. E eia também caiu só que eu não consegui levantar-me pá ir ... pronto não sei onde é que ela caiu que eu não consegui, eu tava postado no chão (...) Foi assim, foi assim que ocorreu. “ E concluiu referindo “nunca agredi ninguém, com a idade que tenho nunca levei bofetada de ninguém nem nunca dei nem nunca levei. O que aconteceu foi unicamente aquilo que eu estou a dizer. Ela puxou a pasta para um lado eu puxei para outro, caiu um para cada lado. Eu caí para a parte de baixo, ela caiu para a parte de cima.” 7. Ou seja, não conseguimos descortinar onde é que a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo ouviu o arguido iniciar o seu depoimento negando a totalidade dos factos por que vinha acusado.

    4. Muito pelo contrário o que realmente se pode ouvir da boca do arguido foi que, efectivamente, confirmava o início da descrição dos factos por que vinha pronunciado e prosseguiu contando o que se passou na realidade e concluiu sim o arguido que nunca agrediu ninguém nem nunca foi agredido.

    5. Ou seja, o arguido ao longo das suas declarações descreveu sempre o que se passou de forma coerente e, em nosso entendimento, nunca entrou em qualquer contradição. Tendo inclusive confessado que retirou de cima da secretária a pasta com os documentos da assistente mas isso em nada releva porque não vinha acusado por qualquer crime de furto ou roubo.

    10 O que de todo o arguido não confessou por não ser verdade é que alguma vez tivesse agredido a assistente, pois as lesões resultantes no corpo desta e descritas no relatório de exame médico-legal de fis 12 e 13 e 31 a 33 tiveram origem, tão só e apenas, na queda nas escadas, não havendo qualquer dolo da sua parte na produção de tais lesões.

    11 O rol de lesões, constatadas na assistente, é perfeitamente consentâneo com a descrição feita pelo arguido ao Tribunal de como se passaram os factos naquele dia, nomeadamente, aquando da disputa pela posse da pasta e após o desequilíbrio a assistente cai para trás.

    12 Se o arguido alguma vez tivesse pontapeado, dado murros e cotoveladas em várias partes do corpo da assistente por forma a que esta o soltasse (tal como vem dado como provado na douta sentença) não teriam tais agressões que deixar marcas e ser estas descritas no relatório de exame médico-legal? 13 Como é que é concebível que o arguido tivesse pontapeado a assistente quando, supostamente, tentava fugir com a pasta do escritório e ela o agarrava por trás, sem deixar marcas? 14 Como pode a douta sentença dar como provado que o arguido deu murros e cotoveladas em várias partes do corpo da assistente por forma a que esta o soltasse se no relatório de exame médico-legal só são descritas algumas equimoses e escoriações na perna, braço, antebraço e mão? 15 Não se afigura nada crivel que tais agressões tenham ocorrido.

    16 Pois a assistente, de acordo com a sua versão, terá sido espancada na parte superior do corpo e deitava bastante sangue pelo nariz e nem uma equimose sequer conseguiu ser vislumbrada pelo senhor perito na cara ou no peito! E nem sequer no relatório médico elaborado no serviço de urgência do Hospital Santo André, onde foi assistida poucas horas ou minutos depois, foi feita qualquer referência a tais lesões! 17 A douta sentença do Tribunal a quo faz ainda consignar no domínio dos factos provados que “lá/unto às escadas que se situam à porta do escritório da assistente no primeiro andar, o arguido volta-se para esta última e empurra-a provocando-lhe a queda pelas escadas, mas agarrando-se a assistente ao arguido, o que levou a que o mesmo caísse em cima dela “. Ora, salvo o devido respeito, deve ter havido um lapso neste segmento dos factos assentes pois a própria assistente declarou que no patamar existente entre o primeiro e o segundo lanço de escadas é que se atirou ao arguido quando este ia a passar por si e ele acabou por vir a cair-lhe em cima no rés-do-chão 18 Mais referindo que foi como que em voo desde este patamar das escadas até ao fim do primeiro lanço de escadas no sentido ascendente. Perdoe-se-nos a imagem mas, sempre salvo o devido respeito, parece que a assistente anda a ver muitos filmes! Pois como é que é possível ela atirar-se ao arguido, vão como que em voo até ao rés-do-chão e por ironia do destino ainda acaba por levar com o arguido a cair em cima de si.

    19 O depoimento da assistente, salvo o devido respeito, não merece nenhuma credibilidade pois está repleto de contrariedades e declarações sem qualquer nexo, a versão dos factos apresentada pela assistente não se afigura verosímil nem consentânea com a prova documental junta aos autos nem com as regras da experiência.

    20 O Tribunal a quo...

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