Acórdão nº 115/09.0PAPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelCALV
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório: 1.

No processo supra identificado, foi julgado o arguido, FZ solteiro, desempregado, filho de JJ. e OL nascido a 25/…..1983, natural de … residente na …., Pombal.

Imputando-lhe a prática, com base nos factos descritos a fls. 1 e v°, 2 v° e 3, os quais aqui se dão por reproduzidos, para todos os efeitos legais, em concurso real e efectivo e em autoria material um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo artº 347° e um crime de injúrias agravadas, previsto e punido pelos art°s 181° e 184°, todos do Cód. Penal.

*** Realizado o julgamento, o tribunal recorrido decidiu: 1. Condenar o arguido FZ com autor material de um crime de injúria agravada, p. e p. pelos art°s 181° e 184°do CP, na pena de 3 meses de prisão.

  1. Condenar o mesmo arguido com autor material de um crime de resistência e coacção sob funcionário, p. e p. pelo artº 347°, n°1 do CP, na pena de 18 meses de prisão.

  2. Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares supra aplicadas, de acordo com os critérios fixados na lei, condena-se o arguido na pena única de 20 meses de prisão.

  3. Condenar o mesmo arguido em 3 UCs de taxa de justiça, acrescida de 1% a favor das vítimas e nas custas do processo, fixando-se a procuradoria em 1/3.

    *** 2.

    Inconformado, o arguido interpôs o presente recurso, formulando nas respectivas motivações as seguintes (transcritas) conclusões: “O douto acórdão exarado, salvo o devido respeito, determinou de forma desajustada as medidas concretas das penas correspondentes aos crimes, marcando-as por uma nota de severidade que as tornou excessivas (violando o disposto nos artigos 40°, 70° e 71 o do Código Penal, A pena concretamente aplicada aos crimes de injúrias agravada e de resistência e coacção sob funcionário - pena única de 20(vinte) meses de prisão efectiva -- é excessiva e ultrapassa em larga medida a culpa do arguido.

    De igual modo, o ilustre Tribunal a quo violou, inequivocamente, o ínsito no artigo 70° do Código Penal, no qual, o legislador manifesta notória preferência pela aplicação de penas não privativas a liberdade.

    E o artigo 40°, nº 1 do Código Penal que assinala também à pena uma feição humanitária, no sentido de não deixar ao abandono, de ressocializar o agente.

    Pelo que, no caso, a aplicação da pena de multa, seria a única opção possível - por ser a que verdadeiramente realiza as intenções político-criminais mais profundas do ordenamento jurídico-penal vigente - e realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, ou seja, a protecção dos bens jurídicos e a reintegração.

    Pelo que errou na tarefa de escolha da pena.

    Do todo ressalta que: O douto Tribunal não ponderou de forma criteriosa quer a culpa, quer as exigências de reprovação e de prevenção (geral, ligada à defesa da sociedade e à contenção da criminalidade e especial positiva, ligada à reinserção social do agente) – art.º 40°, n.º 1 e 2- bem como as demais exigências do art. 71°, todos, do Código Penal, na determinação concreta das penas fixadas ao recorrente.

    Ao ter imputado ao recorrente um grau de culpa tão elevado só atendeu ao passado criminal do agente, não ponderando circunstancialismos passíveis de a atenuar (o facto de o arguido estar a inserir-se na comunidade, frequentando um curso de formação profissional e tendo uma filha) e que são susceptíveis de a mitigar e, nessa lógica, não ponderou devidamente o grau de ilicitude dos factos - que aferindo-se quer pelos meios utilizados (linguagem que faz parte do seu meio ambiente e passado social) quer pelas consequências do crime - será de gravidade mediana. Não ponderou as circunstâncias que não fazendo parte do tipo depuseram contra ou a favor do arguido.

    Pelo que não pôs em prática nenhuma das atenuantes gerais em detrimento da reinserção - cuja existência preferiu ignorar - podendo e devendo ter optado por penas parcelares mais baixas e, até, por outro tipo de penas (em violação do art. 70° do Código Penal).

    Como consequência, da condenação em penas parcelares tão excessivas, aplicou uma pena única, em cúmulo jurídico, também excessiva - vinte meses de prisão.

    Parecendo que o encadeamento dos crimes, passado criminal do arguido por crimes distintos, à excepção de um, e a personalidade evidenciada pelo mesmo não são suficientes para a afirmação de mais do que simples pluriocasionalidade.

    O douto Tribunal a quo, nesta sede, e atento o alegado supra, não teve em conta o fim da prevenção especial das penas, porque as penas quando excessivas deixam de realizar os seus fins (pelo que violou o disposto nos artigos 40° e 71º do Código Penal).

    Requer-se a fixação da pena unitária num ponto próximo do limiar inferior da moldura do concurso de molde a não prejudicar de forma irremediável a sua reinserção social.

    Conclui-se que o douto acórdão deverá ser revogado e/ou modificado no que respeita, à escolha, às medidas parcelares das penas aplicadas e à pena única, uma vez que são excessivas e desajustadas.

    Devem V/Ex.ªs Ex.mos Juízes conhecer dos vícios invocados ex vi 426, n.º 1 do Código de Processo Penal, procedendo ao reexame da matéria de direito.

    E, em consequência, diminuir consideravelmente a pena concretamente aplicada ao arguido, possibilitando-lhe tratamento mais consentâneo com a sua dignidade humana.

    Nestes termos, na procedência da argumentação supra expendida, deve ser dado provimento ao presente recurso, tudo com as necessárias consequências legais, devendo, nomeadamente, ser reconhecida a errónea determinação da medida da pena em concreto perpetrada pelo douto tribunal "a quo", Assim, Vossas Excelências, no mais douto e sapiente critério e suprindo as lacunas do patrocínio, decidirão, como sempre, de INTEIRA REPARAÇÃO E JUSTIÇA”*** 3, O Magistrado do Ministério Público veio oferecer a sua resposta, de fls. 88/97, onde sustenta que a sentença recorrida não merece reparos, devendo manter-se inalterada, apresentando as seguintes (transcritas) conclusões: “1. Razões de prevenção - geral e especial - impõem, no que respeita à conduta ilícita em questão, a preferência pela moldura abstracta da pena de prisão.

  4. Considerando os factos apurados, a culpa (dolo directo) do arguido e referidas exigências de prevenção geral e especial, compreende-se que estamos perante um caso que justifica a fixação das penas concretas em valor acima do mínimo legal.

  5. Afigurando-se-nos justa, adequada e proporcional a pena de 20 meses de prisão, aplicada ao arguido, tanto no que respeita à sua natureza, bem como quanto ao seu quantum.

    Porém, Vossas Excelências farão, como sempre Justiça!” *** 4. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, no douto parecer que emitiu, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

    Notificado, nos termos e para os efeitos consignados no artº 417.º, n.º 2, do C. P. Penal, o arguido nada disse.

    Foram colhidos os vistos legais.

    Procedeu-se à conferência, com observância do formalismo legal, cumprindo, agora, apreciar e decidir.

    *** II. Fundamentação.

  6. Delimitação dos poderes cognitivos do tribunal ad quem e objecto do recurso: É hoje entendimento pacífico que as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso.

    Por isso, temos, como Questões a decidir: Apreciar se face aos factos dados como provados, se a pena de prisão aplicada ao arguido deve ser substituída por outra ou não; se deve ser alterada ou não, ou finalmente, se deve ser suspensa., *2.

    Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos (por transcrição): “1. No dia …/…..09, pelas 7.30h, quando se encontrava de serviço, P… agente da PSP nesta cidade, deslocou-se ao estabelecimento denominado "Pastelaria…" nesta cidade, onde já se encontrava o arguido.

  7. No interior de tal estabelecimento, o arguido, dirigindo-se ao mencionado agente policial disse: "Ó bófia tu também vens aqui", ao que o destinatário não respondeu.

  8. No entanto, enquanto o mesmo se encontrava junto ao balcão, o arguido que estava um pouco mais atrás junto da sua companheira TG, numa mesa do estabelecimento, voltou a dirigir-se ao mencionado agente dizendo, entre outras expressões de carácter exacto não apurado "...tu só és autoridade quando estás com mais colegas, sozinho não vales nada, de mano para mano desfaço-te todo, meto-te o cacetete pelo cu acima, se estivesses na rua sozinho, eu e os meus amigos ciganos fazíamos-te a folha...".

  9. Face a tal comportamento, enfim, o agente da PSP identificado, dirigiu-se a ele e deu-lhe voz de detenção, solicitando-lhe de seguida a sua identificação, tendo o arguido respondido que, de momento não a tinha consigo.

  10. Nessa altura, o agente da PSP MN, que se encontrava no exterior da esquadra da PSP, nas imediações do local onde se passavam os factos supra descritos, apercebendo-se de que algo se passava entrou no estabelecimento para apoiar o seu colega.

  11. Nessa mesma altura, o arguido recusou acompanhar os referidos agentes à esquadra, apesar de já lhe ter sido dada voz de detenção, começando a levantar os braços, esbracejando, visando libertar-se da detenção e abandonar o local.

  12. Por isso, os dois mencionados agentes da PSP, usando a força física, agarraram-no pelos braços e arrastaram-no para o exterior e até à esquadra.

  13. Durante esse percurso, em momento exacto não apurado, o arguido olhando para o agente MN, proferiu as seguintes expressões: " quando te encontrar na rua sozinho, faço-te a folha, corto-te o pescoço, não vales nada de mano para mano".

  14. Já na Esquadra, quando estava a ser elaborado o expediente relacionado com a detenção, o Chefe da PSP L. dirigiu-se ao arguido e questionou-o sobre a sua residência, ao que o mesmo respondeu que não tinha nada que a dizer, que estava no seu documento de...

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