Acórdão nº 64/08.9GAPNC.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução09 de Dezembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - RELATÓRIO 1.

No processo comum singular n.º 64/08.9GAPNC do Tribunal Judicial da Comarca de Penamacor, o arguido J...

, devidamente identificado nos autos, foi condenado, por sentença de 15 de Julho de 2009, pela prática de um crime de dano p. e p. pelo artigo 212º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 140 (cento e quarenta) dias de multa à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos).

Foi ainda julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização cível e, em consequência, foi condenado o arguido/demandado a pagar a A... a quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, considerando-se o pedido cível improcedente quanto ao demais.

2.

Inconformado, o arguido recorreu da sentença condenatória, concluindo (transcrição): «1. A gravação da prova produzida em audiência de discussão e julgamento efectuada pelo sistema digital que se encontra em uso no tribunal a quo, encontra-se prejudicada por uma estação de rádio local que impede a audição do que se encontra gravado.

  1. Pretende o arguido recorrer de Facto e de Direito, vendo-se impedido pela deficiência da gravação da prova.

  2. Pretende o Arguido recorrer da douta sentença proferida pela Mmª Juíza do Tribunal Judicial de Penamacor que o condenou, pela prática, de um crime de Dano, p. e p. pelo art° 212° do Código Penal, na pena de 140 dias de multa, à razão diária de 5,50 euros e no pagamento ao demandante A... da importância de 1500,00 euros (mil e quinhentos euros a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais.

  3. Dispõe o artigo 364° n° 1, do C.P.P., que “a documentação das declarações prestadas oralmente na audiência é efectuada, em regra, através de gravação… ou de outros meios técnicos idóneos a assegurar a reprodução integral daquelas…”.

  4. Dispondo o art.° 363° do mesmo diploma legal, que “as declarações prestadas oralmente na audiência são sempre documentadas na acta, sob pena de nulidade”.

  5. Constituindo irregularidade, devendo ser arguida pelo interessado.

  6. Violou o Tribunal a quo os supracitados preceitos.

    Por todo o exposto deve, pois, proceder-se à renovação da prova, enviando o processo para novo julgamento.

    Por tudo o que foi exposto e pelo que mais for doutamente suprido, deve ser dado provimento ao recurso com o que se fará a costumada JUSTIÇA».

    3.

    O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, opinando que a sentença recorrida deve ser mantida na íntegra.

    Conclui desta forma o MP: «1. O recurso interposto pelo arguido J... não deve ser admitido, por ter sido interposto fora de tempo (art.°s 411º, n.° 1, al. b), e 414°, n.° 2, do Código de Processo Penal).

  7. Na actual redacção do Código de Processo Penal, a não gravação e/ou a gravação deficiente da prova produzida em julgamento constitui uma nulidade sanável, sujeita ao regime dos art.°s 105°, n.° 1, 120°, n.° 1, e 121°, do Código de Processo Penal.

  8. O termo inicial do prazo de 10 dias para arguir tal nulidade “ocorre no dia em que os suportes técnicos com o registo das gravações ficam à disposição dos sujeitos processuais, visto que só nesta data poderão os interessados tomar conhecimento da omissão ou deficiência da gravação do registo da prova, estando a partir desta data habilitados a arguir o respectivo vício”.

  9. Consta dos autos, a fls. 221, que em 27 de Agosto de 2009 foi entregue à Ilustre Defensora Oficiosa do arguido um CD contendo a gravação da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, sendo que dos mesmos não consta, ao invés, que o arguido tenha vindo perante o tribunal recorrido arguir tal nulidade, no prazo de dez dias de que dispunha para o efeito.

  10. Donde, tal nulidade, a existir, encontra-se sanada.

    Nestes termos, deve negar-se provimento ao recurso interposto pelo arguido (…)».

    4. O assistente A... respondeu a este recurso, defendendo a manutenção da douta decisão recorrida.

  11. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, a fls. 247 a 250, sendo de parecer «que, a não ser rejeitado o recurso por extemporaneidade do prazo, por não merecer a sentença qualquer censura, deverá improceder o recurso do arguido, mantendo-se aquela».

    5.

    Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, cumpre proferir decisão sumária, na medida em que se entende que deverá ser rejeitado o recurso interposto (artigos 417º, n.º 6, alínea b) e 420º, n.º 1, alínea b) do CPP), cabendo, assim, especificar sumariamente os fundamentos da nossa decisão (artigo 420º, n.º 2 do CPP).

    II – FUNDAMENTAÇÃO 1. As conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o objecto do recurso.

    A única questão suscitada no recurso prende-se com a alegada “irregularidade” da gravação do julgamento de 1ª instância.

    Porém, há que decidir a questão prévia e cuja procedência obsta ao conhecimento do objecto do recurso - tempestividade ou não do recurso intentado.

  12. A sentença recorrida foi datada de 15 de Julho de 2009, tendo sido depositada nesse mesmo dia (cfr. fls 219).

    Em 25 de Agosto de 2008 (ou seja, estando já esgotados 16 dias do seu prazo de 20 dias para o recurso), veio a ilustre defensora oficiosa do arguido requerer ao tribunal recorrido cópia da gravação do julgamento (que decorreu em duas sessões), juntando para o efeito um CD.

    Tal CD foi-lhe depois entregue no dia 27/8/2009.

    Acaba por recorrer em 14 de Setembro de 2009.

    E nesse recurso invoca a irregularidade da gravação deficiente do julgamento pelo facto da mesma estar prejudicada por uma estação de rádio local que impede a audição do que se encontra gravado.

    Nesse recurso, o arguido é claro e delimita bem o âmbito do seu recurso.

    A sua expressa lógica é esta: «Discorda o arguido da sua condenação por entender que a douta sentença enferma dos vícios constantes das alíneas a) e c) do n° 2 do art° 410° do C.P.P., insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova, vícios que resultam do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum determinando o reenvio do processo para novo julgamento nos termos do disposto no art° 426° no 1 do CPP.

    Conclui que pretendendo recorrer de facto e de direito, «vê-se, por tal motivo, impedido de apresentar o seu Recurso».

  13. Como se vê, a recorrente pretende invocar os vícios oficiosos do artigo 410º do CPP, assim impugnado a matéria de facto dada como provada.

    Não pretende assim reapreciar a matéria dada como provada, nos termos do artigo 4412º, n.º 3 do CPP.

    Sabemo-lo bem - o Tribunal da Relação deve conhecer da questão de facto pela seguinte ordem: - primeiro da impugnação alargada, se tiver sido suscitada (O QUE NÃO É O NOSSO CASO) - e, depois e se for o caso, dos vícios do n.º 2 do art. 410.º do C.P.Penal.

    Não há que confundir estas duas formas de impugnação da matéria factual – por um lado, a invocação dos vícios previstos no artigo 410º, n.º 2, alíneas a). b) e c), e por outro, os requisitos da impugnação – mais ampla - da matéria de facto a que se refere o artigo 412º, n.º 3, alíneas a), b) e c), todos do CPP.

  14. Estabelece o art. 410.º, n.º 2 do CPP que, mesmo nos casos em que a lei restringe a cognição do tribunal, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; b) A contradição...

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