Acórdão nº 83/09.8GCACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução21 de Outubro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - RELATÓRIO 1.

No processo sumário n.º 83/09.8GCACB.C1 do 1º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Alcobaça, o arguido M...

, devidamente identificado nos autos, foi condenado, como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 69º, n.º 1, alínea a) e 292.º, n.º1, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão, a cumprir em dias livres, em 36 períodos de 36 horas e ao fim-de-semana., bem como na (pena acessória) de proibição de veículos motorizados pelo período de 12 (doze) meses.

2.

Inconformado, o arguido recorreu da sentença condenatória, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): · A pena de prisão efectiva aplicada ao arguido mostra-se desproporcionada e deve ser suspensa na sua execução.

· A pena aplicada apresenta um forte carácter punitivo, revelando maior aptidão para satisfação de um fim imediato de punição do que para a prevenção.

· O cumprimento efectivo de uma pena de prisão, ao invés de contribuir para a reintegração do arguido, terá graves efeitos dessocializantes.

· O recorrente tem actualmente uma situação laboral estável, responsabilidades sociais e compromissos empresariais, que dificilmente poderá voltar a ter se cumprir prisão efectiva, ainda que a cumprir em dias livres.

· As finalidades da punição, no caso concreto, serão melhor alcançadas mediante a aplicação, ao recorrente, de pena de substituição não privativa da liberdade, do que através do cumprimento de prisão efectiva; · A censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

· A suspensão da execução da pena de prisão revela-se eficaz na prossecução das exigências de prevenção geral e especial.

· Em alternativa deverá a pena aplicada ser substituída por trabalho em favor da comunidade, nos termos do artigo 58.° do CP, uma vez que esta forma de cumprimento realizará de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Acaba por pedir, a final, que a pena de prisão efectiva aplicada ao arguido na sentença condenatória seja suspensa na sua execução ou, em alternativa, seja substituída por trabalho em favor da comunidade, nos termos do artigo 58.° do CP.

3.

O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, opinando que a sentença recorrida deve ser mantida na íntegra na medida em que a pena de prisão aplicada foi justa e adequada, não devendo, assim, ser substituída por outra ou suspensa na sua execução.

Como questão prévia, e a final, defendeu que o recurso deveria ser rejeitado uma vez que suscita questões de direito sem invocar as normas jurídicas violadas, apesar de no corpo da sua resposta já defender, previamente, um convite ao aperfeiçoamento das conclusões.

4.

Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, a fls. 71 a 74, no sentido de que o recurso não merece provimento, aderindo à fundamentação do MP de 1ª instância.

5.

Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º3, do mesmo diploma.

II – FUNDAMENTAÇÃO 1.

Conforme jurisprudência constante e amplamente pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 119º, n.º 1, 123º, n.º 2, 410º, n.º 2, alíneas a), b) e c) do CPP, Acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/1995, publicado em 28/12/1995 e, entre muitos, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242 e de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).

Assim, balizados pelos termos das conclusões formuladas em sede de recurso, as questões a decidir consistem em saber: - se a pena de prisão aplicada deve ser substituída pela pena de prestação de trabalho a favor da comunidade.

- se a pena de prisão aplicada ao arguido deve ser suspensa na sua execução.

2.

DA SENTENÇA RECORRIDA 2.1.

O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos: 1. No dia 24/02/2009, cerca das 03H53, M... conduzia o veículo ligeiro de passageiros, matrícula …, pela Av. Padre Inácio Antunes – Benedita, área desta Comarca de Alcobaça, com uma T.A.S. de 1,70 g/litro.

2. O arguido sabia que se encontrava sob o efeito do álcool e mesmo assim quis conduzir o referido veículo nas condições descritas.

  1. Agiu. Agiu livre, voluntária e conscientemente, conhecendo a reprovabilidade da sua conduta.

  2. O arguido é empresário e aufere €700 mensais; 5. Vive em casa própria com a mulher que aufere €700 mensais.

  3. Tem dois filhos de 12 e 18 anos.

  4. Tem três veículos automóveis.

  5. Tem o 5º ano de escolaridade; 9. Foi condenado no processo n.º 228/05.7GTSTR do 1.º Juízo do Tribunal da Comarca de Caldas da Rainha por sentença de 8/5/2006 pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, por factos datados de 28/8/2005, na pena de 63 dias de multa à taxa diária de €5 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos durante o período de 3 meses e 15 dias, ambas extintas pelo cumprimento; 10. Foi condenado no processo n.º 242/08.0GCACB do 3.º Juízo do Tribunal da Comarca de Alcobaça por sentença de 30/6/2008 pela prática de dois crimes de condução em estado de embriaguez, e um crime de desobediência qualificada por factos datados de 20/6/2008, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de €5 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos durante o período de 6 meses e 15 dias; 11. Foi condenado no processo n.º 426/08.1GCACB do 3.º Juízo do Tribunal da Comarca de Alcobaça por sentença de 30/6/2008 (cf. dispositivo deste acórdão) pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, e um crime de violação de proibições por factos datados respectivamente de 25/10/2008 e 27/10/2008 na pena de 5 meses e 15 dias de prisão suspensa por um ano e na pena acessória de proibição de conduzir veículos durante o período de 8 meses.

2.2. Inexistindo factos não provados, o tribunal recorrido fundamentou a sua convicção nos seguintes termos (transcrição): «A convicção do tribunal baseou-se, quanto a todos os factos provados na confissão integral e sem reserva do arguido.

Quanto às condições económicas e sociais do arguido o tribunal valorou as declarações do mesmo, que se revelaram credíveis.

No que respeita aos antecedentes criminais do arguido o tribunal valorou o teor do CRC junto aos autos».

3.

APRECIAÇÃO DE DIREITO 3.1. Não se verificando qualquer dos vícios enunciados no artigo 410.º, n.º2, do Código de Processo Penal, consideram-se assentes os factos supra descritos, sendo certo que não foi, de todo em todo, impugnada a matéria de facto.

3.2. QUESTÃO PRÉVIA Antes de mais, interessa constatar que as conclusões do recurso do arguido estão incompletamente formuladas, na medida em que olvidam, de todo em todo, as normas jurídicas tidas por violadas e as normas que deveriam ter sido antes aplicadas, de acordo com o comando legal do artigo 412º, n.º 2 do CPP, assente que este recurso apenas versa sobre matéria de direito.

O artigo 417º, n.º 3 do CPP (na versão revista de 2007, levada a cabo pela Lei n.º 48/2007 de 29/8) permite o convite ao aperfeiçoamento da respectiva peça processual se a motivação do recurso não contiver conclusões ou destas não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos n.ºs 2 a 5 desse mesmo normativo (não havendo, assim, qualquer necessidade de invocar arestos do Tribunal Constitucional pois agora é a lei processual penal que permite este convite ao aperfeiçoamento).

Analisada a peça do recurso, constato que a indicação das normas tidas por violadas e das normas que se pretendem que sejam aplicadas constam do corpo da motivação de forma assaz suficiente para se compreender o móbil do recorrente – não deveremos, assim, ser demasiado formalistas ao ponto de atrasar a tramitação de um processo quando existem conclusões e se consegue das mesmas deduzir, mesmo que parcialmente, note-se, as indicações previstas no n.º 2 do citado artigo 412º.

A este propósito, convém lembrar que as “conclusões aperfeiçoadas” têm de se manter no âmbito da motivação apresentada, não se tratando de uma reformulação do recurso ou da apresentação de um novo recurso - por outras palavras: o convite ao aperfeiçoamento, estabelecido nos n.º 3 e 4 do artigo 417.º, do C.P.P., pode ter lugar quando a motivação não contiver conclusões ou destas não for possível deduzir total ou parcialmente as indicações previstas nos nºs. 2 a 5 do artº 412º do mesmo código, mas sempre sem modificar o âmbito do recurso.

Pelo que se o corpo da motivação não contém as especificações exigidas por lei, já não estaremos perante uma situação de insuficiência das conclusões, mas sim de insuficiência do recurso, insusceptível de aperfeiçoamento.

Entendemos, nesta sede, e neste campo, ter alguma flexibilidade, pois, no rigor, muitos recursos contêm deficiências, não sendo, pois, necessário suscitar o aperfeiçoamento das conclusões.

É o que não faremos in casu, opinando que do conjunto da peça processual se retira, com rigor, o sentido normativo do recurso e a enumeração, quer das normas legais que foram violadas, quer das normas que deveriam ter...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT