Acórdão nº 161/06.5GCSAT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Outubro de 2009

Data21 Outubro 2009
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório No processo comum singular nº 161/06.5GCSAT do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Viseu a arguida M..., devidamente identificada nos autos, foi submetida a julgamento acusada da autoria de um crime de dano p. e p. pelo artigo 212º, nº 1 do Código Penal.

    A ofendida A... deduziu pedido de indemnização contra a arguida no montante de 2.100 € (1.500 € por danos não patrimoniais, 600 € por danos patrimoniais) e juros de mora desde a notificação até integral pagamento.

    Realizado o julgamento, por sentença de 23 de Outubro de 2008, foi decidido condenar a arguida M...: 1. Como autora de um crime de dano p. e p. pelo artigo 212º, nº 1 do Código Penal na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de seis euros, no montante de 720 euros; 2. A pagar a A... a quantia de 500 euros e juros de mora a contar da sentença.

    Inconformada com essa decisão, dela recorreu a arguida M...

    , condensando a respectiva motivação nas seguintes conclusões: A) A condenação da arguida assentou na circunstância de se ter dado como provado que a mesma retirou de uma propriedade uma rede de vedação com uma extensão de 18 metros, sete esteios onde ela se encontrava apoiada, uma porta de acesso a essa propriedade e as couves que se encontravam plantadas no terreno em causa, pertença da ofendida A…; B) Apesar de se ter dado como provado que esta conduta causou à ofendida danos que se cifram em € 500, não foram apurados os valores dos bens danificados nem identificada a forma de apuramento dos danos; C) Tendo em conta que a circunstância das coisas danificadas deverem ter algum valor para que se mostre preenchido o elemento do tipo objectivo do ilícito por que a arguida foi condenada, o que não resulta provado na douta sentença recorrida, inexiste matéria de facto suficiente para suportar essa sua condenação; D) Por isso, ao condenar a arguida pela prática do crime de dano sem que se tivesse apurado qual o valor dos bens danificados ou os prejuízos que individualmente e em concreto lhe foram causados, o que constitui um elemento do tipo objectivo deste crime, inexiste matéria de facto suficiente para condenar a arguida, o que constitui fundamento para o presente recurso nos termos do art. 410° n° 2 al. a) do CPP; E) Por outro lado, apesar de se ter concluído que a totalidade dos danos se cifram em € 500, o certo é que não são identificados em relação a cada um dos bens considerados danificados, nem o respectivo valor, nem os danos que lhes foram individualmente infligidos; F) Assim como não se identifica minimamente a forma como foram apurados estes danos, no seu conjunto, ficando assim sem se saber se por exemplo as couves que a arguida arrancou têm algum valor que permita atribuir carácter lesivo à sua conduta em termos de alcançar o limiar da dignidade penal; G) Por isso, a Douta Sentença recorrida não se encontra fundamentada de facto, nos termos exigidos no art. 374° n° 2 do CPP o que a torna nula nos termos do art. 379° n° 1 al. a) do mesmo CPP o que constitui também fundamento do presente recurso de acordo com o previsto no art. 410° n° 3 ainda do CPP, tendo em conta que da mesma decisão recorrida não consta a base de apuramento dos prejuízos que se considerou terem sido infligidos à ofendida; H) De resto, ainda que se entenda que assim não sucede, sempre a douta sentença recorrida deverá ser revogada por na determinação em concreto do montante da multa aplicada à arguida, não terem sido seguidos os critérios para este efeito previstos no art. 71° do Código Penal, que por isso foi violado; I) A pena de multa aplicada à arguida fixada em 1/3 do seu limite máximo, afigura-se, manifestamente exagerada, atendendo à possibilidade de ocorrência de factos diversos, mais gravosos, não só em termos de culpa do agente, como da existência de antecedentes criminais, intensidade do dolo, condições pessoais e situação económica do agente bem como da gravidade das consequências da conduta criminosa; J)Não funcionando nenhuma das circunstâncias previstas no art. 71° n° 2 do Código Penal contra a arguida, não se afigura correcta a determinação concreta da pena de multa, a qual se deveria por isso ter fixado próximo dos seus limites mínimos; K) Assim como se afigura exagerado por manifestamente desadequado à realidade sócio-económica da arguida, o montante diário da pena, fixado em € 6 (seis); L) E isto porque, o montante da pena de multa aplicada à arguida equivale a quase 3 remunerações mensais que ela aufere, as quais, como ficou provado, correspondem a pouco mais de metade de um salário mínimo nacional que já de si, como é pacificamente reconhecido, não cumpre as mais das vezes o seu objectivo de garantir uma existência condigna dos seus beneficiários.

    M) Daí que, no caso da arguida, tendo-se sempre presente as despesas inevitáveis e inerentes à satisfação das necessidades básicas de qualquer ser humano, que não podem deixar de ter-se por assentes, as quais muito facilmente consomem a sua remuneração mensal, é manifesto que o montante total da pena de multa a que foi condenada a pagar, coloca em risco a satisfação das suas necessidades básicas, constituindo por isso um sacrifício desmesurado e desproporcionado em relação à conduta por cuja prática foi condenada; N) Mostra-se assim por isso desrespeitado o critério a este propósito fixado nos arts. 47º n° 2 e 71° do Código Penal, por não ter sido atribuído o devido relevo à situação económica da arguida (ai. d) do n° 2 do art. 71°) bem como ainda à não gravidade das consequências da actuação que lhe foi imputada (al. a) do n° 2 do art. 710), preceitos estes que assim foram violados pela douta sentença recorrida; O) Por isso, deve a pena aplicada ser substituída por outra que se fixe próximo dos seus limites mínimos, quer na sua determinação quer na fixação da respectiva quantia, a qual, ainda assim, constituirá um sacrifício real e considerável para a arguida, em face da sua situação sócio-económica que se encontra provada nos presentes autos.

    Termos em que deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e anulando-se o julgamento realizado, Ou caso assim se não entenda, fixando-se a pena de multa a aplicar à Recorrente próximo dos seus valores mínimos legalmente previstos.

    Com o que se fará, como sempre, JUSTIÇA.

    O Ministério Público respondeu ao recurso interposto, concluindo que exceptuada a parte em que se dá como provado que os danos causados à ofendida se cifraram em 500 euros (cuja invalidade, por total falta de fundamentação, se admite seja declarada - sem que, no entanto, afecte a parte restante da sentença, nos termos do disposto no art. 122 do CPP-, caso não venha a ser suprida pelo tribunal como é permitido pelo art. 379, n°2 do mesmo diploma legal) deve manter-se a douta sentença recorrida.

    Foi o recurso objecto de despacho de admissão.

    Antes de ordenar a remessa dos autos a este Tribunal da Relação, a Mmª Juiz a quo, ao abrigo do disposto no artigo 374º, nº 2 do Código de Processo Penal, proferiu despacho de reparação da decisão recorrida no que concerne à falta de fundamentação do valor atribuído aos danos, nulidade invocada pela recorrente.

    Remetidos os autos a esta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seguinte parecer: 1. - Vício da decisão a) Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada A al. a) do n° 2 do art° 410° do C.P.P, refere-se à insuficiência que decorre da omissão de pronuncia, pelo Tribunal, sobre factos alegados pela acusação ou defesa ou resultantes da decisão da causa que sejam relevantes para a decisão, isto é, decorre da circunstância de o tribunal na factualidade vertida na decisão em recurso quando se verifica que faltam elementos que, tendo resultado da discussão podendo e devendo ser indagados, são necessários para se poder formular um juízo seguro de condenação, e em que termos, ou de absolvição.

    A recorrente refere nas "conclusões" da Motivação apresentada, que se verifica insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, porque considera que o tribunal não indagou como podia e devia qual o montante dos danos causados à ofendida.

    A recorrente confunde o vício de insuficiência da matéria de facto provada para a decisão com insuficiência de prova, que no seu entender, ocorreu, para dar como provada a matéria de facto.

    Tomando em consideração a matéria de facto dada como provada e as razões explicitadas na fundamentação que levaram o tribunal "a quo " a considerá-la como verificada entendemos que tal vício, não decorre do texto da decisão recorrida.

    Pelo que nenhuma razão assiste à recorrente quando pretende apenas que a prova produzida fosse valorada de forma diferente II. Falta de fundamentação da decisão - nulidade suprida Após ter sido prolatada a douta decisão de que se recorre nos autos, veio a ser proferido a fls 291 dos autos um despacho de suprimento de nulidade, em que se pretende ao abrigo do disposto nos art°s 379° n°2 do C.P.P. e 414° n°4 do mesmo diploma legal, agora reparar a nulidade referentes à decisão proferida quanto à omissão de pronuncia sobre a forma como o tribunal elaborou a sua convicção para poder concluir que o dano causado à ofendida é no valor de €500.

    Dispõe o art° 379° n°2 do C.P.P.: "As nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso, sendo lícito ao tribunal supri-las, aplicando-se com as necessárias adaptações o disposto no art° 414°n°4 do C.P.P. " Por sua vez o art° 414° n°4 do C.P.P., preceitua: " Se o recurso não for interposto de decisão que conheça, afinal, do objecto do processo, o tribunal pode, antes de ordenar a remessa do processo ao tribunal superior, sustentar ou reparar aquela decisão " Ora, o que se verifica no caso vertente é que o recurso interposto é de uma decisão que conhece a final do objecto do processo.

    Porém, depreende-se da redacção actual do art° 379° n°2 do C.P.P., com a entrada em vigor da Lei 48/2007, que se deu ao tribunal de recurso a possibilidade de vir a suprir as nulidades invocadas em...

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