Acórdão nº 323/05.2TBTBU.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelURBANO DIAS
Data da Resolução02 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I – O direito conferido ao comprador pela garantia edilícia é um direito fundado directamente no contrato, o que tem como natural consequência que não pode, de forma alguma, ser um direito fundado no erro, o que acarreta que os quadros da teoria do erro e os princípios específicos do regime de anulação por erro não podem ter aplicação aos problemas da venda de coisas defeituosas.

II – Só respondendo quando haja culpa da sua parte (artigo 798º), é ao vendedor que compete provar a falta de culpa sua: não se podendo aplicar, nestes casos de impossibilidade originária, os princípios relativos ao não cumprimento, a regra mantém-se, dado que é ele (vendedor) que está obrigado, pelo contrato, a entregar ao comprador a coisa isenta de defeitos. E, nessa medida, a isenção que a lei confere ao vendedor de reparar a coisa, por atenção à desculpabilidade do seu erro (compartilhado com o comprador) e à limpidez da sua conduta, surge também como uma espécie de contradireito, como uma excepção destinada a paralisar o direito que em princípio compete ao comprador.

III – A par desta garantia legal (de cumprimento), a lei permite que a parte vendedora se comprometa, no próprio programa contratual, com o bom funcionamento da coisa, durante um determinado período.

A consagração desta garantia de bom funcionamento dada pelo vendedor ao comprador no programa contratual concreto é algo que surge como reforço da posição do comprador, como um quid plus que se junta à tutela legal, consagrada no artigo 913º e seguintes.

Na verificação desta hipótese, o vendedor assegura, por certo período de tempo, um determinado resultado, a manutenção em bom estado ou o bom funcionamento da coisa.

IV – Este facto tem reflexos no campo probatório: ao comprador basta fazer a prova do mau funcionamento da coisa no período de duração da garantia, sem necessidade de identificar ou individualizar a causa concreta impeditiva do resultado prometido e assegurado nem de provar a sua existência no momento da entrega; ao vendedor que queira ilibar-se da responsabilidade é que cabe a prova de que a causa concreta do mau funcionamento é posterior à entrega da coisa, ilidindo assim a presunção da anterioridade ou contemporaneidade do defeito que caracteriza a garantia convencional, imputável ao comprador, a terceiro ou devida a causa fortuita Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

AA intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Tábua, acção ordinária contra BB e marido, CC, pedindo a anulação do contrato de compra e venda do veículo de matrícula 00-00-00, que celebrou com a R., e a condenação dos RR. na restituição do preço pago, no montante de 13.000 €, e, ainda, no pagamento de 8.373,76 €, como forma de indemnização dos danos patrimoniais sofridos.

Em síntese, alegou ter comprado à R. o supramencionado veículo, em 24 de Janeiro de 2004, com a garantia de bom funcionamento, pelo prazo de um ano, no que respeita ao motor, e que, no dia 15 de Setembro do mesmo ano, no decurso de uma viagem, este deixou de funcionar, tendo-se, então, constatado que o tubo que levava o óleo tinha partido, o que lhe provocou grave avaria, cuja reparação importou na quantia peticionada.

Mais invocou que a dita avaria se deveu a defeito existente, à data da venda, o qual era do conhecimento da R./vendedora e que, mesmo assim, lho ocultou.

Os RR. contestaram, arguindo a excepção de caducidade, louvando-se, para tanto, no disposto no artigo 921º, nº 2, do Código Civil, argumentando, por um lado, que, na referida viagem, o veículo avariou, o que motivou ter acendido a luz do mostrador, mas que tal facto não lhes foi comunicado e, por outro lado, que o veículo, no momento da venda, estava sem defeito e, tanto assim, que andou milhares de quilómetros, após a sua concretização.

Seguiram-se os articulados da réplica e tréplica.

No saneador, à míngua de elementos factuais para decidir do mérito da excepção arguida, foi o seu conhecimento relegado para final.

Após selecção dos factos, provados e a provar, o processo seguiu a sua tramitação normal até julgamento e, findo este, foi proferida sentença, pelo Juiz de Círculo de Coimbra, a julgar a acção improcedente, em consequência da verificação dos pressupostos da, oportunamente, arguida excepção de caducidade, o que determinou a absolvição dos RR. do pedido formulado pelo A..

Este, inconformado com tal decisão, apelou para o Tribunal da Relação de Coimbra, imputando-lhe, além do mais, a nulidade por omissão de pronúncia relativamente ao pedido indemnizatório formulado.

A Relação, mediante tal invocação, ordenou a baixa imediata dos autos à 1ª instância, com vista a permitir que o Juiz de Círculo se pudesse pronunciar sobre tal ponto omisso, olvidando, por completo, o preceituado no artigo 715º do Código de Processo Civil.

Este, reconhecendo o lapso, de imediato, o sanou (o que poderia ter acontecido imediatamente antes de o processo subir à Relação, nos termos do preceituado no artigo 668º, nº 4, daquele diploma adjectivo), conhecendo, então, do mérito do segundo pedido formulado e, por via disso, acabou por julgar a acção parcialmente procedente, condenando os RR. no pagamento da indemnização devida pela reparação do tubo chupador do óleo, a liquidar posteriormente.

Continuando inconformado, o A. apelou, de novo, para o Tribunal da Relação de Coimbra que, em resultado da alteração da matéria de facto, a seu tempo impugnada, julgou a apelação procedente, condenando, assim, os RR. no pagamento da peticionada quantia de 8.373,76 €.

Foi a vez de os RR. mostrarem o seu desagrado com o decidido e pedirem revista do acórdão prolatado, o que fizeram com a apresentação atempada da respectiva minuta, fechada, como é devido, com conclusões e que são as seguintes: - Os recorrentes não se conformam com o acórdão pois que consideram que a garantia não poderá abranger quaisquer danos, para além da quebra do tubo...

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