Acórdão nº 11/06.2TBLSD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Fevereiro de 2010
Magistrado Responsável | ÁLVARO RODRIGUES |
Data da Resolução | 25 de Fevereiro de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I- Importa sempre ter presente que quando se trata de formular juízos equitativos, há sempre uma margem de subjectivismo, apesar da preocupação de observância do princípio da igualdade e da uniformização de critérios.
II- Mas tal não se confunde com a entrega a critérios de puro subjectivismo do julgador.
III- A indemnização por danos não patrimoniais, não se destinando à reconstituição específica da situação anterior à lesão, mas apenas a uma compensação, que a dogmática alemã denomina de Genugtuung (satisfação), isto é, a prestação de uma determinada quantia pecuniária visando a atenuação de um mal consumado «sabendo-se que a composição pecuniária pode servir para a satisfação das mais variadas necessidades, desde as mais grosseiras e elementares às de mais elevada espiritualidade, tudo dependendo, nesse aspecto, da utilização que dela se faça», como ensinou o saudoso Mestre de Coimbra, Prof. Antunes Varela ( Das Obrigações em Geral, vol. I, 10ª edição, Almedina, 2003, pg. 604), tal composição pecuniária é arbitrada não apenas em função do coeficiente de desvalorização do sinistrado, mas também dos outros factores referidos no artº 496º, nº 3 do Código Civil.
IV- Finalmente, não deve olvidar-se que a incapacidade permanente geral ou genérica (que é parcial, não se confundindo com a incapacidade permanente absoluta, que é total), na medida em que exprime um prejuízo anátomo-funcional, constitui um dano não patrimonial indemnizável de per se, isto é, independentemente da sua repercussão na capacidade de ganho ou de trabalho do lesado, como é uniformemente entendido pela nossa Jurisprudência [por todos, o Acórdão deste Supremo Tribunal de 23-10-2008, Relator, o Exmº Conselheiro Serra Baptista, onde se sentenciou que «a incapacidade permanente é de per se, um dano patrimonial indemnizável, pela incapacidade em que o lesado se encontra na sua situação física, quanto à sua resistência e capacidade de esforços» ( Pº 08B2318, disponível em www.dgsi.pt )].
Decisão Texto Integral: Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, destinada a exigir a responsabilidade civil emergente de acidente de viação, contra a Companhia de Seguros BB, SA (que incorporou, por fusão, a A...I...A..., Companhia de Seguros, SA), ambos com os sinais dos autos, pedindo a condenação desta a pagar-lhe, a título de indemnização, a quantia de € 160.525,01 (cento e sessenta mil quinhentos e vinte e cinco euros e um cêntimo), acrescida de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação e até efectivo e integral pagamento.
Alegou, para tal e em síntese, que, no dia 11/10/2003, foi vítima de um acidente que ocorreu na EN 106, no lugar de Cruz Nova, em Lustosa, Lousada, quando seguia como passageiro no motociclo de matrícula ..-..-.., que este acidente ficou a dever-se a condução ilícita e culposa da condutora do veículo automóvel de matrícula ..-..-.., segurado na Ré, que desrespeitou um sinal de STOP e a regra da prioridade no acesso à via por onde circulava o OH e foi embater neste motociclo, e que do mesmo lhe advieram diversos danos patrimoniais e não patrimoniais que descreve e quer ver ressarcidos.
A Ré, devidamente citada, contestou a acção, impugnando a essencialidade da materialidade fáctica alegada pelo autor, e concluiu que a acção deveria ser julgada em função da prova que viesse a ser produzida em audiência de julgamento.
O Autor replicou, mantendo a posição constante da petição inicial e concluiu que a culpa pelo acidente pertenceu essencialmente à condutora do LM seguro na Ré BB, SA.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, que obedeceu ao legal formalismo, seguiu-se a prolação de sentença - fls. 255 a 273 - que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Ré seguradora a pagar ao autor a quantia de € 70.146,77 (setenta mil cento e quarenta e seis euros e setenta e sete cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento.
Inconformados, o Autor e a Ré interpuseram recurso de Apelação da mesma para o Tribunal da Relação do Porto que, julgando o recurso do Autor parcialmente procedente, alterou a quantia devida a título de indemnização pela perda parcial da capacidade de ganho do Autor, fixando a mesma em € 40 000,00 e mantendo o mais decidido na sentença recorrida, improcedendo, consequentemente, a Apelação da Ré.
Novamente inconformados, os mesmos vieram interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, rematando as suas alegações, com as seguintes: CONCLUSÕES Da alegação do recurso do Autor 1a - tendo em conta a matéria dada por provada, o montante global de € 75 000,00 de indemnização fixado na sentença de que se recorre (€ 40 000 pelos danos patrimoniais - danos futuros - e de € 35 000 como compensação pelos respectivos danos não patrimoniais) está manifestamente desvalorizado; 2a - desde logo, a indemnização fixada no Acórdão de € 40 000 pelos danos patrimoniais (danos futuros) não permite compensar o recorrente, lesado, dos danos em virtude da perda aquisitiva ou de trabalho, nomeadamente, por não ter tido em devida conta alguns aspectos concretos deste caso, como a idade jovem do recorrente quando sofreu o acidente (18 anos); a taxa de IPP de 20%, devendo aqui admitir-se que a actividade profissional deste ficou lesada em medida superior àquela percentagem, na medida em que as lesões sofridas têm incidência concreta na locomoção - note-se que o autor era operário têxtil (ramolador) e ficou com lesões físicas permanentes no antebraço direito e perna esquerda; 3a - além do mais, o douto Acórdão não teve em devida conta que o recorrente ficou a sofrer de um prejuízo anátomo - funcional que prejudica a sua actividade em geral: com efeito, foi dado como provado que à data do acidente, o autor era dinâmico, alegre e trabalhador; que não tinha problemas de saúde nem qualquer deficiência motora ou estética, praticava vários desportos, entre os quais futebol, ocupando parte dos seus tempos livres com passeios de bicicleta; e que, em consequência do acidente deixou de praticar as actividades que praticava anteriormente, como sejam jogar futebol, passeios de bicicleta, sentindo dificuldades na condução de veículos, o que lhe provoca tristeza e inibição; sendo ainda que, na sequência do acidente o autor ficou com nove cicatrizes visíveis, uma na cabeça, uma na anca, três no braço direito e quatro na perna esquerda; 4° - ora, estes factos, consequência directa do acidente em causa, limitam novas opções laborais e restringe o incremento da actividade específica já desenvolvida, implicando previsivelmente também, pela diminuição da sua auto - suficiência, um acréscimo de despesas.
5° - de igual modo, continua o recorrente a entender que o montante fixado de € 35 000 como compensação pelos respectivos danos não patrimoniais está desvalorizado, não é justo nem equilibrado, por não ter tido em devida conta as gravíssimas consequências que daquele acidente resultaram para o recorrente. Reafirmam-se aqui os seguintes factos: em consequência do embate, o recorrente foi projectado para o chão, ficando imobilizado na via pública e perdeu os sentidos; sofreu fractura exposta dos ossos da perna esquerda , dos ossos do antebraço direito, feridas na face, tornozelo direito e cotovelo esquerdo; desde o acidente e até Fevereiro de 2004, apenas se deslocava em cadeira de rodas; foi submetido a quatro intervenções cirúrgicas; não tinha problemas de saúde nem qualquer deficiência motora ou estética, praticava vários desportos, entre os quais futebol, ocupando parte dos seus tempos livres com passeios de bicicleta; em consequência das lesões sobrevindas, sofreu dores, bem assim com as intervenções cirúrgicas, nos períodos de internamento e com os tratamentos; com o acidente o autor sofreu abalo psíquico, chegando a recear perder a vida ou, pelo menos, algum membro do corpo como o braço direito ou a perna esquerda, nos períodos de internamento e porque se visse privado das suas actividades e da companhia de familiares e dos amigos, sentiu-se triste; e, em consequência do acidente deixou de praticar as actividades que praticava anteriormente, como sejam jogar futebol, passeios de bicicleta, sentindo dificuldades na condução de veículos, o que lhe provoca tristeza e inibição; as cirurgias a que o autor foi submetido foram efectuadas com anestesia geral e determinaram perdas de sangue, dolorosos tratamentos intensivos e incómodos; em consequência do acidente e sequelas, ficou com nove cicatrizes visíveis, uma na cabeça, uma na anca, três no braço direito e quatro na perna esquerda; esteve sujeito aos seguintes períodos de incapacidade: entre 11/10/2003 e 30/11/04 - incapacidade temporária absoluta; entre 01/12/2004 e 13/01/2005 - incapacidade temporária parcial de 50%; entre 14/01/2005 e 19/04/2005 - incapacidade temporária parcial de 20%; 6° - Pelo exposto, resulta assim que, ao decidir do modo como o fez, entende o recorrente que, salvo o devido respeito por diferente opinião, o Tribunal da Relação não aplicou, ponderada e concretamente, os normativos consagrados nos...
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