Acórdão nº 605/04.0PBLRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Janeiro de 2010

Data07 Janeiro 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISÃO DE SENTENÇA Decisão: NEGADA A REVISÃO Sumário : I - “Descobrir”, por referência à al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP, é, no sentido pretendido pelo legislador, naturalmente condicionado pela ideia de que o sacrifício do caso julgado só será autorizado em situações limite de inequívoca e extraordinária injustiça, em sede, mais propriamente de “julgado novo” − em vez de “revisão de julgado”, como sugestivamente já observara Luís Osório, in Comentário ao Código de Processo Penal, Vol. VI, pág. 402 −, aceder o julgador a algo que de todo lhe não fora dado a conhecer nem lhe houvera sido possível representar, na antecedente audiência de julgamento, podendo fazê-lo, embora, ou a tanto podendo conduzir um simples impulso comunicacional do aí condenado.

II - Tendo o recorrente, alegadamente, na ocasião dessa audiência, pleno conhecimento das aqui invocadas ameaças e (ou) represálias, que referiu, claramente, ter decidido, então, silenciar, com essa atitude comprometeu seriamente, a aqui deduzida pretensão, frustrando, como é evidente, o pressuposto da “descoberta”.

III - A tanto acrescendo, efectiva falta de justificação − imprescindível, como é líquido, considerado o elemento sistemático de interpretação do art. 453.º, n.º 2, do CPP (“… a não ser justificando …”) − do requerimento formulado em vista da revisão do julgado, deve ser considerada infundada a pretensão do recorrente.

Decisão Texto Integral: AA, morador em local desconhecido (não preso, ainda, nem à ordem destes autos, nem de qualquer outro ), nascido em 16/03/1982, submetido a julgamento, a partir de 21/05/2007, com outros arguidos, no Círculo Judicial de Leiria; - tendo sido condenado, nesse domínio, pela prática, entre 23/11/2003 e 19/02/ 2005, consoante Ac. de 12/07/2007, de diversos crimes de burla (cinco), de falsificação de documento (um), de abuso de confiança (três), de furto (um) e de condução sem carta (catorze), na pena única de 4 (quatro) anos e 10 (dez) meses de prisão; - tanto assim por haver sido punido: como autor material de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos artigos 217.º n.º 1 e 218.º n.º 2, alínea a) e n.º 3 do CP, na pena de 1 (um) ano de prisão; como autor material de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos artigos 217.º n.º 1 e 218.º n.º 2, alínea a), do CP, na pena de 2 (dois) anos de prisão; como autor material de crime de burla qualificada, previsto e punível pelos artigos 217.º n.º 1 e 218.º n.º 2, alínea b) do CP, na pena de 2 (dois) anos de prisão; como autor material de um crime de falsificação de documento, previsto e punível pelos artigos 256.º n.º 1, alínea a), e n.º 3 do CP, na pena de 9 (nove) meses de prisão; como autor material de um crime de abuso de confiança, previsto e punível pelos artigos 205.º n.º 1 do CP, na pena de 9 (nove) meses de prisão; como autor material de um crime de abuso de confiança, previsto e punível pelos artigos 205.º n.º 1 do CP, na pena de 9 (nove) meses de prisão; como autor material de um crime de abuso de confiança, agravado, previsto e punível pelos artigos 205.º n.º 1 e n.º 4, alínea b), do CP, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; como autor material de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos artigos 217.º n.º 1 e 218.º n.º 2, alínea b) do CP, na pena de 2 (dois) anos de prisão; como autor material de um crime de furto, previsto e punível pelos artigo 203.º do CP, na pena de 9 (nove) meses de prisão; como autor material de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos artigos 217.º n.º 1 e 218.º, n.º 2, alínea b) do CP, na pena de 2 (dois) meses de prisão; como autor material de catorze crimes de condução sem carta, previstos e punidos pelas disposições conjugadas do artigo n.º 3, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro e artigos 121.º n.º 1, 122.º n.º 1 e 123.º todos do Código da Estrada, na pena de 3 (três) meses de prisão, relativamente a cada um deles; - condenação essa que veio a ser integralmente confirmada, na Relação de Coimbra, consoante seu Ac. de 03/04/2008, transitado em julgado; - vem interpor, de início pelo próprio punho, recurso extraordinário de revisão de sentença, nos termos, segundo refere, “…do artigo 449.º n.º 1, alíneas c) e d) do CPP…”, sob o pretexto de somente ter comparecido na penúltima sessão do julgamento, não tendo prestado declarações, contra sua vontade, dado que “…foi ameaçado por algumas testemunhas de acusação (mormente a testemunha V... mas também F...M... e um tal H...) e “”a-conselhado”” por outros arguidos a não falar…”, os quais lhe terão dito que “…se ele falasse (…) nunca mais via a luz do dia e à sua família nunca se saberia o que poderia acontecer…”; que “… se ele abrisse o bico se arrependeria…”; que (…) “era um homem morto…”; mais referindo que o ameaçaram “…de morte, com uma pá e um ferro, se ele falasse o contrário daquilo que constava no processo, depois, em julgamento…”; -precisando, logo após, que “…nunca (o arguido) cometeu os crimes de que foi acusado e condenado….”; e que só “…actualmente e apesar das perseguições a que é sujeito, o arguido ganhou coragem para falar tudo o que sabe em julgamento…”; sendo que “…a testemunha V... aparece em todos os processos, sempre como testemunha de acusação em todos os processos em que o mesmo é arguido, monta todo o processo, convence e alicia outras pessoas para testemunharem contra o arguido…”, citando, a este propósito, o processo n.º 538/04.OCGLRA, do 3.º J. Criminal de Leiria, relativamente ao qual diz ter sido “…desmontada toda a acusação e verificado que a testemunha do processo tinha mentido em sede de inquérito e apresentara queixa crime quando não tinha havido crime algum, mas sim um negócio legal e legítimo celebrado entre eles…”; - requerendo, depois, a sua própria audição “…em sede de julgamento, àcerca de toda a matéria constante da acusação…”; - formulando, então, as seguintes conclusões: «1 – O arguido não cometeu os crimes pelos quais foi condenado.

2 – Deverá o arguido ser ouvido acerca de toda a matéria constante da acusação, através do deferimento de revisão do processo.

3 – Consequentemente deverá o arguido ser absolvido.

4 – Deverá o arguido prestar declarações acerca da matéria constante deste requerimento.

5 – Deverão ser ouvidas as testemunhas indicadas neste requerimento e que receberam as ameaças contra o arguido por parte das testemunhas de acusação.» * Adiante (cfr.fls.199/200), já assistido pelo seu constituído Advogado, regulariza o seu requerimento, reafirmando as transpostas conclusões, dizendo fazê-lo “…nos termos do artigo 449.º n.º 1, alíneas c) e d) do CPP…”, sem deixar de relevar, no antecedente articulado, por referência às duas aludidas sentenças, que nelas “…estão em causa, essencialmente, os mesmos factos…” e que, por isso, “…existem 2 sentenças inconciliáveis, o que se insere na previsão do artigo 449.º n.º 1, alínea c) do CPP…”, dessa forma insistindo, agora, pela sua audição bem como pela das testemunhas J... V..., F...M... e H....

* Responde o Ministério Público, logo na 1.ª instância, propugnando a improcedência do recurso “…porque a certidão da decisão que foi junta aos autos extraída do processo NUIPC 538/04.OGCLRA não se refere a quaisquer factos que alegadamente terão inviabilizado uma defesa livre e consistente no âmbito do presente processo”.

Nesse sentido, consigna, entre o mais, este interessante trecho: «Ora, como resulta da certidão da sentença que o arguido juntou com requerimento de interposição do recurso, extraída do processo NUIPC358/04.OGCLRA, o que foi apreciado nesse processo foi factualidade susceptível de integrar a prática do crimes de receptação, falsificação de documentos e burla, alegadamente praticada pelo próprio recorrente AA e não pelas indicadas pessoas que o teriam ameaçado, ou seja, J... V..., F...M... e H.... Note-se que o tribunal no NUIPC 358/04.OGCLRA absolveu o arguido não porque tivesse concluído que ele não cometeu os factos pelos quais havia sido acusado mas com base no princípio in dubio pro reo.

De resto, analisando o processo, afigura-se-nos, que a circunstância do arguido ter optado pelo silêncio na fase de julgamento não se terá ficado a dever ao facto de andar receoso pelos males que poderiam advir a si e aos seus, caso optasse por prestar declarações em conformidade com a verdade (ou contra ela), mas antes em execução da uma planeada estratégia de defesa que ao tempo lhe pareceu poder sortir melhores resultados. Só nesta perspectiva é inteligível que, proferida a sentença, ele venha logo dela recorrer inclusive no que contende com a matéria de facto (cfr. motivação do recurso de fls. 1452, apresentada em 30/07/2007) e que só depois de ter conhecimento do sentido da decisão do Tribunal da Relação de Coimbra (proferida em 02 de Abril de 2008), o arguido, em 04 de Maio de 2009, venha alegar que (se) havia sido constrangido a não falar durante o julgamento.

Por fim repare-se que no julgamento do processo NUIPC 538/04.OGCLRA, findo o qual foi proferida a sentença, datada de 28 de Dezembro de 2008, com que o requerente instruíu o presente recurso de revisão, o arguido prestou declarações (sobre matéria atinente a factos pessoais e que, por isso, ele teria necessariamente de conhecer) às quais o tribunal se referiu da seguinte forma: “(…) É certo que o relato do arguido tem elementos inconsistentes e de credibilidade duvidosa. Não se confirma o alegado preço de três mil euros (não explicando o arguido como, poucos dias depois de o ter em seu poder, aceitou a troca de um veículo com esse valor por mil e cem euros) ficando também por demonstrar o alegado pagamento de parte do preço a A...C...” ___ cfr.fls.17v.» * * * Informando sobre o mérito do recurso, diz o Ex.mo juiz não se lhe afigurar procedente a deduzida pretensão, tendo indeferido, pois, “…as diligências de prova requeridas…”, observando, em essência, para além da circunstância de o arguido ” …não se encontra(r)...

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