Acórdão nº 119/04.9GCALQ.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelARMINDO MONTEIRO
Data da Resolução10 de Dezembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: ORDENADO O REENVIO DO PROCESSO Doutrina: A Parte Especial do Código Penal, da autoria do Exm.º Cons.º Lopes Rocha, Jornadas de Direito Criminal, CEJ, I, pág. 350 Legislação Nacional: CÓDIGO DE PROCESSO PENAL: ARTIGOS 97º Nº 4, 165º Nº 1, 340º, 374º, 410º Nº 2 A), 426º, 434º, 471º E 472º Sumário : I - A junção legal de documentos obedece ao previsto no art. 165.º, n.º 1, do CPP, e segundo este normativo deve ter lugar no decurso do inquérito ou da instrução e, não sendo possível, até ao encerramento da audiência.

II - Com a junção da motivação, o documento perde, em princípio, utilidade ante este STJ, pois a matéria de facto já se mostra fixada, só não sendo assim se, excepcionalmente, se demonstrar que o documento não pode ter sido incorporado nos autos até àquele momento e tiver indiscutível virtualidade para influenciar a decisão da causa, por o princípio da investigação, resultante da estrutura acusatória do processo, e da descoberta da verdade dos factos, se dever sobrepor ao da auto-responsabilidade dos sujeitos processuais, nos termos do art. 340.º, do CPP, observando-se sempre o devido contraditório.

III - O documento junto – relatório de perícia médico-forense psiquiátrica, onde se conclui poder a arguida ser declarada inimputável – é de clara obtenção superveniente, após o encerramento da audiência e o seu teor comporta uma natureza que reforça a sua imprescindível e justificada admissão de junção aos autos, em obediência até a uma linha de coerência processual, sedimentada num objectivo material, mal se compreendendo a sua inocuidade nos autos e a sua relevância noutro processo, dando-se o caso inaceitável, mesmo chocante, de alguém poder vir a ser julgado inimputável num processo e noutro sujeito a uma pena próxima do limite máximo consentido no nosso ordenamento jurídico.

IV - O procedimento de determinação da medida concreta da pena concretiza uma autêntica aplicação de direito; e um pouco por toda a parte se revela a tendência para o alargamento dos limites em que a questão da determinação da pena é passível de revista, função cabida historicamente ao STJ. É passível de revista “a correcção de procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela ou, pelo contrário, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis”.

V - A impertinência da junção do relatório de exame médico às faculdades mentais da arguida na fase de recurso é meramente aparente, na medida em que insinuando-se a inimputabilidade da arguida, ou seja, a sua ausência de culpa na sua relação com os factos provados, a incapacidade de pena, ao fim e ao cabo o seu teor incorpora matéria de direito, ao inteiro alcance da revista pedida a este STJ, nos termos do art. 434.º, do CPP.

VI - Em caso de cúmulo jurídico de infracções decisiva é a indagação do conjunto dos factos, não se mostrando imperiosa a fundamentação alongada com exigência no art. 374.º, n.º 2, do CPP, mas nem por isso a decisão deve deixar de evidenciar ante o seu destinatário e o tribunal superior os factos que servem de base à fundamentação.

VII - Não valem enunciados genéricos, como a simples referência à tipologia da condenação, fórmulas tabelares, ou seja, remissões para os factos comprovados e os crimes certificados, a lei, juízos conclusivos, premissas imprecisas, pois vigora no nosso direito o dever de fundamentar as decisões judiciais, mais extenso em dadas situações, de que é paradigmática a sentença, menos exigente noutras, mas ainda assim de conteúdo minimamente objectivado, permissivo da possibilidade de se atingir o raciocínio lógico-dedutivo, o processo cognitivo do julgador, por forma a controlar-se o decidido e a afirmar-se que não procede de simples capricho, à margem do irrazoável – arts. 97.º, n.º 4, e 374.º, n.º 2, do CPP – e que importa prevenir.

VIII - Seria um trabalho inútil e exaustivo exigir a menção dos factos de cada uma das sentenças pertinentes a cada pena, de reportar ao cúmulo, mas será sempre desejável que se proceda a uma explicitação por súmula dos factos das condenações, que servirão de guia, de referencial, ao decidido, em satisfação das exigências de prevenção geral, e bem assim os que se provem na audiência em ordem a caracterizar a personalidade, modo de vida e inserção do agente na sociedade.

IX - E daí que, mesmo na perspectiva da declaração de imputabilidade diminuída ou afirmação da sua plena capacidade, o exame às faculdades mentais repercute utilidade na definição da personalidade, enquanto substrato da capacidade de conformação ou desconformação em maior ou menor grau ao direito, suposta pela ordem jurídico-penal para o homem médio.

X - Padecendo a decisão recorrida de défice de enunciação de factos, não habilitando este STJ, pelo próprio texto do acórdão, sem recurso a elementos estranhos, a conhecer, ainda que de forma sintética, os factos praticados, modo de execução e seus efeitos, há lugar a reenvio do processo para novo julgamento (arts. 471.º e 472.º, do CPP), nos termos dos arts. 410.º, n.º 2, al. a), e 426.º, do CPP).

Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça : Em processo comum com intervenção do tribunal colectivo sob o n.º 119/04.9GCALQ, do 1º Juízo, do Tribunal Judicial de Alenquer, foi AA, condenada em cúmulo jurídico na pena única de 20 (vinte) anos de prisão e de 195 (cento e noventa e cinco) dias de multa, à razão diária de 4,00€ (quatro euros), pena essa que englobou as impostas: 1. Por acórdão proferido nos presentes autos em 03/06/2008 e transitada em julgado em 23/06/2008, pela prática, entre 23 e 27 de Agosto de 2004, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, n.º 1 e 204º, n.º 1, alínea f), do C. Penal, de 1 ano e 6 meses de prisão (cfr. fls. 158-169); 2. Por sentença proferida no processo comum singular n.º 240/04.3GEPNF, do 4º Juízo do Tribunal Judicial de Penafiel em 07/12/2005 e transitada em julgado em 20/03/2006, pela prática, em 21 de Setembro de 2004, de um crime de e, furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, n.º 1 e 204º, n.º 2, alínea e), do C. Penal, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos (cfr. fls. 131-141 do apenso); 3. Por sentença proferida no processo comum singular n.º 248/04.9GAFLG do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Felgueiras em 15/06/2005 e transitada em julgado em 02/05/2006, pela prática, em 16 de Março de 2004, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, n.º 1 e 204º, n.º 2, alínea e), do C. Penal, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos (cfr. fls. 39-47 do apenso); 4. Por acórdão proferido no processo comum colectivo n.º 522/04.4GBPRD do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Paredes em 31/05/2006 e transitado em julgado em 16/06/2006, pela prática, em 21 de Julho de 2004, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.ºs 203º, n.º 1 e 204º, n.º 2, alínea e), do C. Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos (cfr. fls. 26-38 do apenso); 5. Por sentença proferida no processo comum singular n.º 793/03.3GAFLG do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Felgueiras em 01/04/2005 e transitada em julgado em 05/07/2006, pela prática, em 19 de Agosto de 2003, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos...

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