Acórdão nº 694/09.1JDLSB.B de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução25 de Novembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: HABEAS CORPUS Decisão: INDEFERIDO A PROVIDÊNCIA Sumário : I - A providência de habeas corpus tem a natureza de remédio excepcional para proteger a liberdade individual, revestindo carácter extraordinário e urgente, «medida expedita» com a finalidade de rapidamente pôr termo a situações de ilegal privação de liberdade, decorrentes de ilegalidade de detenção ou de prisão, taxativamente enunciadas na lei: em caso de detenção ilegal, nos casos previstos nas quatro alíneas do n.º 1 do art. 220.º e quanto ao habeas corpus em virtude de prisão ilegal, nas situações extremas de abuso de poder ou erro grosseiro, patente, grave, na aplicação do direito, descritas nas três als. do n.º 2 do art. 222.º do CPP.

II - No caso concreto, o peticionante fundamenta a providência em prisão ilegal nos termos do art. 222.º, n.º 2, al. c), do CPP, por ter expirado o prazo de prisão preventiva a que se encontra sujeito, sem que tenha sido deduzida acusação; sucede, porém, que antes de se perfazer o sexto mês, a requerimento do MP, foi declarada a especial complexidade do processo, o que tem por consequência imediata que o prazo de 6 meses se dilata para o dobro, para 1 ano.

III -Certo é, porém, que na tramitação tendente à declaração de especial complexidade, se verificaram duas omissões sucessivas: uma primeira consubstanciada na falta de audição do arguido para se pronunciar sobre a pretensão do MP, dado que embora tenha sido ordenada a notificação dos arguidos para se pronunciarem sobre a pretensão do MP, a secção de processos limitou-se a enviar uma carta ao anterior advogado do arguido, desprezando o substabelecimento junto atempadamente e sem proceder à notificação pessoal do arguido; e uma segunda, após a prolação do despacho incidente sobre a extensão para mais da medida de prisão preventiva, o qual não foi notificado nem ao arguido, nem ao seu advogado, antes se tendo repetido a notificação para o anterior advogado.

IV -A dupla omissão verificada será susceptível de consubstanciar apenas uma irregularidade, nos termos do art. 118.º, n.ºs. 1 e 2, do CPP, já que a nulidade não se encontra expressamente cominada na norma que estabelece as nulidades insanáveis (art. 119.º), nem no elenco das nulidades dependentes de arguição (art. 120.º) e não se encontra como tal qualificada no art. 215.º, n.º 4, nem no art. 61.º do CPP.

V - As omissões em causa, a terem-se como consubstanciadoras de irregularidade nunca serão fundamento de habeas corpus; o arguido terá de arguir a irregularidade na sede própria. A providência de habeas corpus não é o meio próprio para sindicar as decisões sobre medidas de coacção privativas de liberdade.

VI -Enquanto não for invocada e processualmente qualificada a consequência da dupla omissão, maxime a da prévia audição do requerente, que eventualmente afecte a decisão sobre a especial complexidade, esta produz todos os efeitos que decorrem da especial complexidade, nomeadamente quanto ao prazo de prisão preventiva; existindo, sendo processualmente eficaz neste momento, por força do princípio da actualidade, e sendo de retirar os efeitos que tiver, a decisão que declarou a especial complexidade do processo tem como consequência que o prazo de duração da prisão preventiva até à acusação é o fixado no art. 215.º, n.ºs 1, al. a), e 3, do CPP, motivo pelo qual não se verifica a ilegalidade da prisão, o que inviabiliza a providência.

Decisão Texto Integral: O cidadão AA, arguido no processo de inquérito com o n.º em epígrafe, da 8.ª secção do DIAP, em 20 p. p., apresentou petição de habeas corpus subscrita por Advogado, invocando a alínea c) do n.º 2 do artigo 222º do Código de Processo Penal, alinhando os seguintes argumentos: 1 - Em 13 de Maio de 2009, foi o requerente, juntamente com outros três suspeitos, detido pelas autoridades policiais, tendo sido presente ao juiz de instrução criminal, para primeiro interrogatório.

2 - No dia 14 de Maio, foi lhe decretado a prisão preventiva à ordem destes autos, situação em que, desde então, se encontra.

3 - Atenta a gravidade, em termos de limitação, da liberdade pessoal sem condenação judicial ou culpa formada, da medida de coação "prisão preventiva", consagra a al. a) do n° 1 do art. 215° do C. P. Penal, que: "1. A prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido:

  1. Quatro meses sem que tenha sido deduzida acusação; O n° 2 deste preceito legal eleva esse prazo para seis meses, "... quando se proceder por crime punível com pena de prisão de máximo superior a 8 anos, ou por crime: b) De furto de veículos ou de falsificação de documentos a eles respeitantes ou de elementos identificadores de veículos; 4 - Como decorre do douto despacho que decretou a prisão preventiva, o requerente encontra-se indiciado pelos seguintes crimes: - 1 crime de falsificação de documento na forma continuada, p. e p. pelo art. 256º, n.ºs 1 e 3 do C. Penal; - 1 crime de burla qualificada na forma tentada, p. e p. pelos arts. 217°, 218°, n° l, 22º e 23º do C.Penal; - 1 crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203° e 204°, n° 2 alínea a) do C. Penal.

    5 - Assim, atendendo, para além do mais, que o arguido se encontra indiciado por crimes previstos na alínea b), nº 2 do art. 215° do C. P. Penal, o prazo máximo de prisão preventiva sem dedução de acusação é elevado para seis meses.

    6 - Ora, como supra se referiu o arguido foi detido em 13 de Maio de 2009, pelo que o prazo máximo de duração da prisão preventiva terminava em 13 de Novembro de 2009.

    7 - Assim, por se ter excedido o prazo de prisão preventiva previsto no n° 2, alínea a) n° 1 do art. 215º do C. P. Penal, a prisão do arguido é ilegal, devendo o mesmo ser restituído à liberdade.

    8 - Por mero dever de patrocínio, é de referir que, se considerar-se que o caso sub judice integra a situação prevista nos n.ºs 3 e 4 do art. 215° do C. P. Penal, o prazo de 6 meses seria elevado para 1 ano, 9 - tanto o arguido, como o subscritor desta peça (o substabelecimento foi junto aos autos em 11 de Setembro de 2009), jamais foram notificados de qualquer despacho nesse sentido, e 10 - muito menos foram ouvidos para se pronunciar sobre tal decisão.

    11 - Deste modo, o requerente nunca teve oportunidade ou lhe foi dado em momento algum, qualquer conhecimento que tivesse sido declarada a excepcional complexidade do processo.

    12- O requerente está há quase 6 meses e 6 dias consecutivos em prisão preventiva, pelo que a sua libertação é imperativa e urgente, nos termos do n° 1 do art. 217º do CP. Penal.

    No provimento da providência, pede que a mesma seja admitida e, em consequência disso, ser declarada a ilegalidade da prisão, ordenando-se a imediata libertação do requerente.

    O Exmo. Juiz de Instrução Criminal exarou a informação a que alude o artigo 223º, nº 1, do Código de Processo Penal, consignando: “Na sequência do primeiro interrogatório judicial de arguido detido, efectuado em 14/05/2009 foi aplicada ao...

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