Acórdão nº 0992/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Dezembro de 2009

Data09 Dezembro 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório O ESTADO PORTUGUÊS vem recorrer da sentença do TAC de Lisboa, de 12.3.09, que julgou procedente a acção interposta por A…, com melhor identificação nos autos, e o condenou no pagamento da quantia de 31.361,38 Euros, acrescida de juros de mora.

Para tanto alegou concluindo como segue: 1- O Decreto-Lei n.° 274-A/88, de 3 de Agosto, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Lei n°s 43/90, de 8 de Janeiro, e 60/91, de 30 de Janeiro incluía, no seu Anexo 1, 2.1 (caça menor - espécies sedentárias), o sisão (otis Tetrax) como espécie cinegética.

2- Mas o Decreto-Lei 75/91, de 14 de Fevereiro, em cumprimento do disposto na directiva comunitária (Directiva n° 79/409/CEE do Conselho de 8 de Abril, relativa à conservação das aves selvagens, adaptado à adesão de Portugal pela Directiva n° 86112/CEE do Conselho, de 8 de Abril), operou uma modificação do estatuto de espécie cinegética até então atribuído ao sisão.

3- Como se pode ler no respectivo preâmbulo, tal diploma transpõe directiva comunitária que tem como objectivo a protecção, a gestão e o controlo dessas espécies e a regulamentação da sua exploração, no tocante às espécies não cinegéticas, procurando assim viabilizar a estratégia nacional de conservação.

4- Existindo uma incompatibilidade entre as novas disposições do Decreto-Lei 75/91, de 14 de Fevereiro e as regras precedentes (o Decreto-Lei n.° 274-A/88, de 3 de Agosto), tem de considerar-se operada a revogação tácita.

5- Isto é, com o Decreto-Lei n.° 75/91, de 14 de Fevereiro, que incluiu o sisão em lista anexa a este DL, como ave sujeita a determinadas medidas de protecção e conservação, deverá considerar-se tacitamente revogado o Decreto-Lei n.° 274-A/88, de 3 de Agosto, na parte em que incluía o sisão no seu Anexo 1, como espécie cinegética.

6- A não autorização de correcção de espécies não cinegéticas - como é o caso presente - não fazia impender sobre o Estado qualquer obrigação de indemnizar os eventuais prejuízos provocados por tais espécies.

7- Partindo a douta sentença da equivocada premissa de que, sendo o sisão uma espécie cinegética inscrita na lista l anexa ao Decreto-Lei n° 274-A/88, de 3 de Agosto, entendeu erradamente que o peticionado deveria ser analisado ao abrigo dos artigos 90 e 93 deste Decreto-Lei.

8- Pois, com a publicação e entrada em vigor do Decreto-Lei n° 75/91 de 14.2, tendo o sisão deixado de ser considerado espécie cinegética, não tem aplicação ao caso o disposto nos citados arts. 90 e 93, n° 3, em que a douta sentença fundamenta a indemnização fixada.

9- Até porque, sendo o sisão uma espécie protegida desde 1991, como decorre da transposição da Directiva 79/409/CEE, não podia ser autorizado o seu abate, pois os actos de caça passaram a ser proibidos, mostrando-se inviável o abate de qualquer espécime, pelo que não poderá ter-se por abrangida pelo n.° 3 do artigo 93º, na redacção dada pelo Decreto-Lei n° 60/91, de 30 de Janeiro, que não é aplicável ao caso presente.

10- Ficando submetida apenas às disposições do artigo 4° do Decreto- Lei n° 75/91 de 14 de Fevereiro, sendo certo que as circunstâncias do caso concreto não configuravam uma situação excepcional para efeitos do n.° 1 deste artigo 4.° do referido DL, designadamente, porque se entendia existir alternativa satisfatória: o espantamento.

11- A sentença ora colocada em crise - tendo fundamentado a condenação no pagamento de indemnização apenas no DL. n° 274-A/88 - que não é aplicável, pelas razões já expostas - não se encontra devidamente fundamentada, pois o Tribunal não deu como provados factos que preenchessem os requisitos da responsabilidade civil do Estado.

12- É que a presente acção se destina, assim, à efectivação de responsabilidade civil extracontratual do Estado, pelo que, ao invés do subentendido pela douta sentença, a questão a decidir nos presentes autos, terá, então, de colocar-se no âmbito da problemática da responsabilidade civil extracontratual do Estado, por facto ilícito.

13- A nível legal, esta responsabilidade civil extracontratual do Estado encontra-se regulada pelo Decreto-Lei n° 48051 de 21 de Novembro de 1967, e conforme jurisprudência pacífica, assenta nos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, ou seja, é necessária a verificação cumulativa dos pressupostos de que depende a obrigação de indemnizar (cf. artigo 483.° n° 1 do Código Civil): o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

14- Assim, e contrariamente ao suposto na douta sentença - dependendo a procedência do pedido da verificação cumulativa dos mencionados pressupostos desta responsabilidade, verificamos que, “in casu” não estão preenchidos todos esses pressupostos de modo a que, na sentença, ao R. possa ser imposta a obrigação de indemnizar o Autor.

15- Face à factualidade provada, da mesma não resultam minimamente, factos ilícitos, culpa relevante, nem prejuízos de especial gravidade, e muito menos, nexo de causalidade, pelo que excluída está qualquer responsabilidade civil do Estado.

16- Da forma como a acção se encontra configurada, o pressuposto da ilicitude, decorreria da pretensa não autorização das acções de correcção (abate dos sisões), mas o A. nem sequer afirma estar na presença de actos ilegais, desde logo se mostrando inverificada a ilicitude.

17- No caso das espécies não cinegéticas - como é o caso dos sisões dos autos - embora a lei preveja a possibilidade de autorização de medidas de correcção, não impõe que tal autorização seja automaticamente concedida, não estabelecendo, aliás, qualquer obrigação de indemnizar pelos prejuízos causados pelas referidas espécies, se tais medidas de correcção não forem autorizadas (cfr. art° 91 do Dec-Lei 274-A/88, de 3 de Agosto, na redacção introduzida pelo Dec-Lei n° 60/91, de 30 de Janeiro e art° 4.° n° 1 do Dec-Lei n° 75/91, de 14 de Fevereiro).

18- Sendo de concluir pela inexistência de facto ilícito que de suporte a pretensão do A., tanto bastando para que sobre o R. Estado não recaiu qualquer obrigação de indemnizar, devendo a presente acção ser julgada necessariamente improcedente.

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