Acórdão nº 2340/16.8T8LRA.C2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelILÍDIO SACARRÃO MARTINS
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO AA, BB, CC e DD intentaram acção contra Banco EE, S.A., pedindo: a) a condenação do réu a pagar aos autores o capital e juros vencidos e garantidos que, à data da entrada da petição inicial, perfaziam a quantia de € 57.000,00, bem com os juros vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Subsidiariamente: b) a declaração de nulidade de qualquer eventual contrato de adesão que a ré invoque para ter aplicado os € 50.000,00 que os autores lhe entregaram e que aquela aplicou em obrigações subordinadas FF; c) a declaração de ineficácia em relação aos autores da aplicação que a ré tenha feito daquele montante; d) a condenação da ré a restituir aos autores € 57.000,00 que ainda não receberam dos montantes que lhe entregaram e de juros vencidos à taxa contratada, acrescida de juros legais vincendos, desde a data da citação até efectivo e integral cumprimento.

E sempre: e) - a condenação da ré a pagar aos autores a quantia de € 3.000,00 a título de danos não patrimoniais.

Em síntese, alegaram que foram clientes da ré (então GG), com uma conta de depósitos à ordem. Em Outubro de 2004, um funcionário daquele disse ao 2º autor que dispunha de uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido pelo GG e com rentabilidade assegurada.

O funcionário da ré sabia que o 2º autor não possuía qualificação ou formação técnica que lhe permitisse, à data, conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente e que, por isso, tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro.

O seu dinheiro (€ 50.000,00) viria a ser colocado em obrigações FF, sem que os autores soubessem, em concreto, o que era, desconhecendo inclusivamente que a HH era uma empresa.

De todo o modo, sempre foi dito ao 2º autor que o capital era garantido pelo Banco réu, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respectivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias.

Os autores sempre estiveram convencidos que o dinheiro tinha sido aplicado numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo; caso tivessem percebido que poderiam estar a dar ordem de compra de obrigações FF, produto de risco e que o capital não era garantido pelo GG, não consentiriam nem autorizariam.

A partir de Novembro de 2015, a ré deixou de pagar juros e, agora, atribui a responsabilidade pelo pagamento à HH, entidade que os autores nem sabiam existir.

Nunca qualquer contrato lhes foi lido nem explicado, nem entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas HH, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos autores, nem nunca conheceram qualquer título demonstrativo de que possuíam obrigações HH, não lhes tendo sido entregue documento correspondente.

Foi omitido o processo informativo, quanto à liquidez do capital, vencimento de retribuição, prazos de reembolso, que os autores nunca aceitariam se conhecessem os seus reais termos.

O prazo de maturidade ocorreu em Novembro de 2014 e o capital investido não foi restituído aos autores.

A ré colocou os autores num permanente estado de preocupação e ansiedade, com o receio de não reaverem o seu dinheiro, computando o respectivo dano não patrimonial em €3.000,00.

O réu contestou, dizendo, em substância, que os autores tinham conhecimentos e experiência suficientes para um tal tipo de investimento, sabendo da respectiva natureza, riscos e rentabilidade. As Obrigações FF foram emitidas, como o próprio nome indica, pela HH, SGPS, S.A., sociedade titular de 100% do capital social do Banco réu.

Qualquer obrigação é tendencialmente um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente; no caso concreto, o facto de a entidade emitente ser “mãe” do Banco, sendo este necessariamente, um garante da solvibilidade daquela, por ser o principal activo do seu património, do que concluiu que “dificilmente haveria um produto financeiro tão seguro com a subscrição daquelas obrigações” e que o risco de um depósito a prazo seria, então, semelhante a uma tal subscrição por o risco da HH ser indexado ao risco do próprio Banco.

O incumprimento foi determinado por circunstâncias completamente imprevisíveis e anormais.

Foi explicado aos autores que se tratava da sociedade-mãe do Banco, pelo que se tratava de um produto seguro e foram apresentadas as respectivas condições.

Nunca a ré disse aos autores que o Banco garantiria fosse o que fosse quanto ao cumprimento ou incumprimento das obrigações da HH.

Os autores responderam às excepções alegadas na contestação, terminando como na petição inicial.

Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu o réu dos pedidos.

Os autores recorreram e a Relação de Coimbra, por acórdão de 09.10.2018, julgou o recurso parcialmente procedente, revogou parcialmente a decisão recorrida e, mantendo o demais decidido, condenou o réu Banco EE, SA, a pagar aos autores a quantia de € 50.000 (cinquenta mil euros), acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde Novembro de 2014 até efectivo e integral pagamento.

O réu interpôs recurso de revista, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1ª -O douto acórdão da Relação de Lisboa violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D e 327º do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE e 364º, 483º e ss., 563º, 628º e 798º e ss do CC . 2ª - A forma como a decisão recorrida valoriza e interpreta o depoimento da testemunha II, contrariando o entendimento e a livre apreciação da 1ª instância, quando não teve contacto directa com a mesma e com o seu testemunho, ultrapassa em muito aquilo que o legislador pretendia da Relação na reapreciação da matéria de facto.

  1. - A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao réu e o seu comportamento verificado tem que ver com o facto do tribunal considerar que, a circunstância do funcionário do Banco réu ter assegurado ao autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação financeira era uma produto sem risco e com capital garantido, não transmitindo a característica da subordinação, configura a prestação de uma informação falsa.

  2. - Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

  3. - De facto, o uso de uma tal expressão apenas se pode ter como referência à mecânica de funcionamento do investimento, que é feito por um determinado prazo, findo o qual o capital é reembolsado na totalidade, acrescido da rentabilidade.

  4. - É utópico pretender ver nesta singela referência qualquer espécie de garantia absoluta de investimento. Até porque essa garantia não existe! 7ª - O investimento efectuado era um investimento seguro e não um investimento em qualquer “produto de risco”.

  5. -Temos para nós por evidente que, à data da subscrição das Obrigações, o intermediário financeiro não tinha obrigação legal de informar o investidor sobre os riscos do instrumento financeiro subscrito (Obrigações) e que, mesmo actualmente (depois de entrar em vigor o DL 357-A/2007 de 31/10), o intermediário financeiro não está obrigado a informar o investidor acerca dos efeitos do risco de insolvência dos emitentes ou do mero risco de não retorno do capital investido na data de maturidade do investimento, ou sequer de analisar a robustez financeira do emitente, ou da posição dos credores em caso de insolvência da entidade emitente.

  6. - Ainda relativamente à característica da subordinação, a explicação da regra da subordinação que, à data, em face das relações entre o Banco e entidade emitente seria certamente irrelevante para a decisão de subscrição, por ninguém supor um cenário de incapacidade financeira do banco ou da sua sociedade-mãe.

  7. - Em lado algum se vislumbra se os mesmos clientes, e especialmente, em concreto, o autor, agiriam de forma distinta acaso tivesse convicção diferente, em particular se conhecessem a característica da subordinação.

  8. - O que está em causa nos presentes autos, até tendo em conta a respectiva causa de pedir, é o dano do incumprimento do dever de reembolso das obrigações pela emitente, não tendo qualquer relevância a natureza subordinada das obrigações. Diga-se aliás, que não ficou de forma alguma demonstrado que, se as obrigações não fossem subordinadas, o autor teria recebido o seu capital.

  9. - Da mesma forma, repetimos, o que levou o autor a subscrever o produto foi a sua aparente segurança e o facto de seu emitido pela dona do banco. Nestas circunstâncias, saber a sua posição numa possível situação de insolvência da entidade emitente não mudaria ou teria qualquer influência na decisão de aplicar ou não o seu dinheiro no produto.

  10. - O que o CdVM exige é que seja prestada a informação, o que foi feito.

  11. - Cumprido o dever de informação, e porque o diálogo e processo negocial é dinâmico, não estava o funcionário do Banco réu impedido de – em boa fé – acrescentar ao seu argumentário o seu juízo pessoal sobre a segurança do produto.

  12. - A recomendação do funcionário do Banco réu e juízo de valor acerca da segurança do produto não constitui qualquer violação do dever de informação que impendia sobre o intermediário financeiro, em 2006, no que toca ao esclarecimento quanto ao risco da subscrição do produto “Obrigações”.

  13. - Quer o artº 314º do CdVM, quer os artigos 798º e 799º do C.C. estabelecem unicamente presunções de culpa dos devedores, como aliás decorre do próprio texto legal dos referidos preceitos.

  14. - Fica por isso, e nos termos do artº 342º do CC, a cargo dos credores/autores alegar e provar a ilicitude que serve de esteio à pretensão que trazem a juízo! 18ª - Mesmo que se defendesse (juntamente com alguma doutrina) a existência de uma presunção de ilicitude, sempre...

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