Acórdão nº 2296/17.0T8LRA.C2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAMÕES
Data da Resolução09 de Abril de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 2296/17.0T8LRA.C2.S1[1] * Acordam no Supremo Tribunal de Justiça – 1.ª Secção[2]: I. Relatório AA intentou acção declarativa, com processo comum, contra Banco BB, S.A.

, pedindo que se: a) declare que a aquisição do produto financeiro traduzido na compra de obrigação CC, ao réu, DD (actual BB S.A….), (…), adquirida na agência de ..., foi levada a efeito no pressuposto de que o produto financeiro em causa se mostrava a coberto da garantia de reembolso do capital a 100% (cem por cento); b) declare que é da responsabilidade do BANCO BB S.A. (…) o reembolso do capital reportado à aquisição por parte da autora da obrigação CC, no valor de € 50.000,00 (…); c) - condene o réu (…) a proceder ao imediato reembolso do capital de €50.000,00, acrescidos dos juros vencidos desde 11 de Outubro de 2014 sobre a obrigação CC, à taxa legal, até integral reembolso do capital, condenando ainda o réu (…) a pagar à autora quantia indemnizatória a fixar em liquidação de sentença, mas nunca inferior a €10.000,00 (…), por danos morais sofridos pela autora com o comportamento imputável ao réu BANCO BB S.A., traduzido na informação falsa prestada pela gerente de conta do Balcão de ... e que conduziu à presente situação.

No entendimento de que o contrato é nulo: d) Julgar-se nulo o contrato de intermediação financeira celebrado entre autora e réu que deu origem à ordem de subscrição de 11.10.2004 de obrigação CC no valor de € 50 000 (…). E, e) Em consequência, condenar-se o réu BANCO BB SA., a restituir à autora o valor de €50 000 (…) acrescido de juros, à taxa legal, desde 11.10.2014 e até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese: Em Setembro de 2004, a autora dirigiu-se ao Balcão do DD, agência de ..., com vista a proceder a um depósito a prazo, no montante de €50.000,00 (cinquenta mil euros).

Aí chegada, foi recebida “pelo gerente do DD, ...”, que, ao inteirar-se das intenções daquela, logo lhe propôs que, ao invés de fazer o depósito a prazo a que se propunha, adquirisse um produto financeiro que tinha as mesmas garantias e segurança de um depósito a prazo, mas que lhe daria um maior rendimento.

“Para tal efeito e porque o valor de aquisição do referido produto tinha como limite mínimo de aplicação, €50.000,00 (…), a autora poderia adquirir uma obrigação CC, naquele preciso valor, e assim obteria o referido produto, que lhe traria um melhor rendimento e que tinha o reembolso do capital garantido pelo DD.” Perante o que lhe estava a ser proposto (maior rendimento na aplicação do seu dinheiro) e dadas as garantias que lhe estavam a ser dadas (segurança do produto como se fosse um depósito a prazo), a autora anuiu a tal proposta e aceitou adquirir tal produto.

O referido gerente disse, ainda, à aqui autora que tal aplicação seria feita pelo prazo de dez anos, mas que poderia, eventualmente, proceder ao seu resgate antecipado ao fim de cinco anos.

Até ao dia 10 de Outubro de 2014, sempre foram pagos à autora os juros do capital investido na aplicação financeira, pagamentos esses que lhe foram feitos pelo DD até 10 de Outubro de 2012 e pelo BB a partir dessa data.

A autora, em Outubro de 2009, mais precisamente cinco anos decorridos após as aplicações financeiras, confiante naquilo que o referido gerente de conta do DD lhe havia afirmado e garantido, deslocou-se ao DD (nessa data já nacionalizado e da responsabilidade do Estado, que o detinha a 100%) com vista a proceder ao resgate do capital investido, tendo sido informada que só ao fim de 10 anos poderia proceder a tal resgate, ou seja, só no fim do prazo contratual e não antes como lhe havia sido garantido.

Começaram nessa data a gerar-se na autora angústias e receios.

Vencido o prazo de dez anos contratualmente estabelecido, foi a aqui autora informada de que a aplicação financeira em causa não tem cobertura de garantia de capital, que é uma subscrição de obrigações da EE, S.A., e que, uma vez que a referida sociedade se mostra insolvente, tal resgate não lhe será concedido, podendo e devendo reclamar o montante a que se julga com direito no processo de insolvência.

Mais invocou o facto de não ter sido reduzido a escrito o “acordo entre as partes qualificável como de intermediação financeira”, para concluir pela nulidade formal desse convénio, por ausência de forma escrita.

Em sede de danos não patrimoniais, alegou ter passado noites sem dormir, dias sem conseguir gerir os seus negócios e ter gerado destabilização no seio do seu agregado familiar, sendo que ainda hoje “sofre de depressão e de angústia”.

Contestou a ré, por impugnação motivada, alegando, em resumo, o seguinte: Nada ter vendido à autora, mas antes a seu falecido marido, FF, sendo que a obrigação veio a ser transferida para uma conta titulada pela autora, por instruções desta e de GG.

Não foi, assim, desenvolvida qualquer actividade de intermediação financeira, por parte do Banco, perante a autora, na colocação daquele produto.

À data, dificilmente haveria um produto tão seguro como a subscrição daquelas obrigações (pelos fundamentos que desenvolveu).

A ré cumpriu, perante o seu cliente, todos os seus deveres de informação.

Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar e fixado o objecto do litígio. Realizado o julgamento, foi proferida sentença a julgar improcedente a acção, absolvendo a ré de todos os pedidos.

Inconformada, a autora interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 28/11/2018, julgou a apelação parcialmente procedente, revogou, também parcialmente, a sentença recorrida e condenou o réu BB – ..., SA, a pagar à autora a quantia de € 50.000 (cinquenta mil euros), acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contados desde o dia 27 de Outubro de 2014 até efectivo e integral pagamento, bem como a pagar-lhe a quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), por dano não patrimonial, mantendo o demais decidido.

Inconformado, desta feita o banco réu interpôs recurso de revista e apresentou a respectiva alegação com as seguintes conclusões: “I. O Autor peticionou na sua Petição Inicial a condenação no Banco Réu no pagamento de indemnização pelos danos não patrimoniais.

II. A sentença de primeira instância absolveu o Banco deste pedido!!! III. O Autor recorreu da decisão não tendo abordado a matéria dos danos não patrimoniais, conformando-se assim com mesma.

IV. O Acórdão Recorrido, sem que houvesse qualquer pedido expresso nesse sentido, condenou o banco Réu no pagamento de indemnização por danos não patrimoniais, situação que configura uma clara nulidade nos termos do artigo 615, nº 1, alínea d) e e) do Código de Processo Civil.

V. Dispõe o artigo 412º, nº 2 do CPC que “Também não carecem de alegação os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções; quando o tribunal se socorra destes factos, deve fazer juntar ao processo documento que os comprove”.

I. Na apreciação da alteração à matéria de facto o Acórdão recorrido disserta sobre aquele que seria a forma habitual de actuação dos funcionários no banco Réu, socorrendo-se de “conhecimento que vamos retirando dos julgamentos de situações idênticas a esta” não fazendo qualquer referência concreta ao processo ou processos me que tal se verificou, tratando por igual processos e situações necessariamente diferentes.

II. A ideia que dá é que se decide por arrastão, massificando-se as decisões sem que a situação em concreto seja analisada nas suas circunstâncias próprias.

III. Esta ideia, pré-pré-concebida, influi de forma directa na alteração que foi efectuada à matéria de facto em desrespeito pelo estatuído no referido artigo 412º, nº 2.

IV. Se é verdade que a informação tem que ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita (art. 7º CdVM), não é menos verdade que o cumprimento desse dever de transmissão da informação não se compadece com qualquer conceptologia idílica e de delimitação difusa quanto ao seu inadimplemento, sendo que o CdVM estabelece objectiva e precisamente qual a informação que tem de ser prestada quanto a cada um dos contratos de intermediação financeira e até – em alguns casos –, quanto aos instrumentos financeiros objecto dessa intermediação.

VI. A menção do artº 312 nº 1 al. e) do CdVM aos “riscos especiais envolvidos nas operações a realizar” refere-se claramente ao negócio de intermediação, ao dito negócio de cobertura, sob pena de redundância da al. d) da mesma disposição – essa sim referente aos instrumentos financeiros envolvidos nos serviços de intermediação.

VII. A alusão que a lei faz quanto ao risco de perda da totalidade do investimento está afirmada em função das características do investimento. Aliás como também o denota a necessidade de informação acerca da volatilidade do preço do instrumento financeiro, igualmente prescrita na alínea b) deste preceito e com a qual este risco de perda está umbilicalmente ligado. Trata-se, portanto, de um risco que tem que ser endógeno e próprio do mecanismo do instrumento financeiro e não motivado por qualquer factor extrínseco ao mesmo.

VIII. Ora, o investimento efectuado foi feito em Obrigações, não sujeitas a qualquer volatilidade, sendo o respectivo retorno do investimento certo no final do prazo, por reembolso do capital investido ao valor nominal do título (de “capital garantido”), acrescido da respectiva rentabilidade. Logo, não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso! IX. Todo e qualquer investimento em todo e qualquer instrumento financeiro acarreta a possibilidade inerente de perda de total de capital… basta verificar-se, com neste caso, um incumprimento! Aliás, qualquer contrato, seja qual for a sua natureza, apenas um de dois destinos: o cumprimento ou incumprimento.

X. O risco de incumprimento não constitui qualquer risco especial da operação! XI. A ser alguma coisa, o risco de incumprimento de uma obrigação de compra é um RISCO GERAL de...

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