Acórdão nº 425/06.8PTPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelJORGE GONÇALVES
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC PENAL.

Decisão: NEGADO PROVIMENTO.

Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO - LIVRO 604 - FLS 208.

Área Temática: .

Sumário: I - A condenação pela prática de um crime no decurso do período de suspensão da execução da pena só implica a revogação da suspensão se a prática desse crime infirmar definitivamente o juízo de prognose favorável que esteve na base da suspensão.

II - A revogação da suspensão deverá ser excluída, em princípio, se na nova condenação tiver sido renovado esse juízo de prognose favorável, com o decretamento da suspensão da pena da nova condenação.

III - A escolha de uma pena de multa na nova condenação é, igualmente, um elemento que contra-indica a solução da revogação da suspensão.

Reclamações: Decisão Texto Integral: RECURSO N.º 425/06.8PTPRT.P1 Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto – ..º Juízo Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Porto: I – Relatório 1. No processo sumário n.º425/06.8PTPRT, do ..º Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto, B………., melhor identificado nos autos, foi condenado pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de sete meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de dois anos, tendo a sentença condenatória transitado em julgado em 11/05/2006.

  1. Por despacho de 22 de Maio de 2009, o tribunal a quo, indeferindo o que havia sido promovido pelo Ministério Público, decidiu não revogar a suspensão da execução da pena de prisão. Mais decidiu declarar extinta a pena, invocando, para o efeito, o preceituado nos artigos 57.º, n.º1, do Código Penal, e 475.ºdo Código de Processo Penal.

  2. Inconformado, recorreu o Ministério Público desse despacho, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): 1.ª- O arguido B………. foi nestes autos condenado por douta sentença de 17/04/2006, transitada em julgado em 11/05/2006, pela prática, em 13/04/2006, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3°, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3/01, na pena de 7 (sete) meses de prisão, inicialmente suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, mas depois reduzido para 1 ano na sequência da entrada em vigor da Lei n.º 59/07, de 04/09, conforme resulta de fls. 17-21 e do despacho de fls. 123-124.

    1. - Após esta condenação, o mesmo foi condenado no âmbito do processo sumário n.º …/06.0PEGDM, do ..º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Gondomar, por sentença de 07/07/2006, transitada em julgado em 24/07/2006, pela prática, em 05/07/2006, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3.º, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3/01, na pena de 150 dias de multa à taxa diária de 3€.

    2. - O arguido sofreu ainda outra condenação da Justiça Austríaca (Innsbruck) em Setembro de 2006, numa pena de 24 meses de prisão efectiva pela prática de "agressões físicas", tendo estado preso na Áustria entre 16/07/2006 e Janeiro de 2008 em cumprimento dessa pena, regressando a Portugal em finais de Janeiro de 2008 - cfr. fls. 92-93.

    3. - Verifica-se, portanto, que o arguido foi condenado duas vezes, por decisões transitadas em julgado, em Portugal e na Áustria, pela prática de crimes cometidos no decurso do período de 1 ano de suspensão da execução da pena de 7 meses de prisão em que foi condenado nestes autos.

    4. - Neste caso, entende o Ministério Público, estão preenchidos os pressupostos legais para a aplicação do disposto no art. 56.º, n.º1-b) do C. Penal, porque ficaram definitivamente comprometidas as finalidades da suspensão.

    5. - Em nosso entender, o facto de o arguido ter cometido um novo crime de condução sem habilitação legal logo a seguir ao trânsito em julgado desta condenação - que determinou a suspensão da execução da pena de 7 (sete) meses de prisão que lhe foi aplicada (ainda antes de terem decorrido dois meses sobre esse trânsito em julgado) - demonstra, inequivocamente, que o mesmo não interiorizou a pena que lhe foi aplicada, revelando a sua prática a frustração total das finalidades desta suspensão, designadamente as respeitantes à sua ressocialização (prevenção especial).

    6. - A suspensão da execução decretada visava assegurar que o arguido fosse sensível ao desvalor da sua conduta e à indispensabilidade de evitar comportamentos análogos - a suspensão da pena foi especificamente dirigida a evitar que o arguido cometesse outros crimes, designadamente no exercício da condução estradal.

    7. - Ora, o facto de o arguido ter praticado esse novo crime idêntico, associado ao facto de, logo a seguir, ter cometido um outro crime, ainda que de natureza diversa, mas cuja gravidade determinou a sua condenação numa pena de 24 meses de prisão efectiva, revela que o mesmo foi absolutamente insensível à pena que lhe foi aplicada nestes autos e que as finalidades desta suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.

    8. - No douto despacho de fls. 132-134 o Mm.º Juiz a quo fundamenta a sua decisão de não revogação desta suspensão da execução da pena de forma inadequada e insuficiente, consubstanciando tal decisão uma violação do disposto no art. 56.º, n.º1-b), do C. Penal.

    9. - Com efeito, a fundamentação desta decisão não realiza uma correcta apreciação e ponderação das questões essenciais neste caso e que se enquadram na problemática dos fins das penas.

    10. - Não é possível salvaguardar e alcançar a prevenção geral positiva, num caso como este - em que as necessidades de prevenção geral são muito fortes (devido à elevadíssima frequência da prática de crimes de condução sem habilitação legal na nossa sociedade) -, afastando a revogação da suspensão da execução da pena e decretando a extinção da pena do arguido, apesar de o mesmo ter praticado outro crime idêntico e ainda um outro diverso, pelo qual cumpriu uma pena de 24 meses de prisão, durante o período da aludida suspensão.

    11. - Não é possível garantir a eficácia das normas que protegem os valores jurídico-penalmente erigidos pela nossa sociedade se os tribunais forem complacentes com a reiterada prática de crimes da mesma natureza durante o período de suspensão da execução das respectivas penas de prisão.

    12. - Não se vislumbra qual é a excepcionalidade que este caso comporta e que permitiu concluir ao M.mº Juiz a quo que "a título excepcional" não deverá ser revogada a suspensão da execução da pena de prisão.

    13. - A prática de um novo crime de condução sem habilitação legal (idêntico) cerca de um mês e três semanas depois do trânsito em julgado da condenação em pena de 7 meses de prisão suspensa na sua execução demonstra que não se cumpriram as expectativas que motivaram a concessão daquela suspensão.

    14. - O facto de o arguido também ter cometido e ter sido condenado, entretanto (ainda não decorridos seis meses sobre aquele trânsito em julgado), pela prática de um crime de diversa natureza, tendo estado preso em cumprimento da respectiva pena de 24 meses de prisão, durante quase todo o período em que decorreu o prazo de um ano desta suspensão da execução da pena, prejudica seriamente um juízo de prognose positivo quanto à prática de novos crimes em relação a ele.

    15. - O facto de já terem decorrido três anos sobre a data do trânsito em julgado da condenação do arguido nestes autos, tendo o mesmo estado a cumprir uma pena de 24 meses de prisão efectiva durante esse período, não deve ser valorado a favor dele e justificar a não revogação da suspensão em causa.

    16. - Neste caso não foi possível alcançar as finalidades da suspensão da execução da pena, por meio dela.

    17. - A revogação da suspensão da execução desta pena impõe-se nos termos do disposto no art. 56.º, n.º1-b), do C. Penal, e ainda porque, de outro modo, se verificaria uma incompreensível impunidade deste arguido, com repercussões muito graves ao nível das fortíssimas necessidades de prevenção especial e de prevenção geral que se fazem sentir neste caso.

    18. - A actual redacção do C. Penal, introduzida pela Lei n.º59/2007, de 04/09, configura um regime penal, em geral, mais favorável aos arguidos, por contraposição com o regime vigente antes da entrada em vigor dessa lei.

    19. - Nos termos do art. 37l.º-A do CPP, a requerimento do condenado, pode ser reaberta a audiência de julgamento exclusivamente para a aplicação retroactiva da lei penal mais favorável.

    20. -Se depois do trânsito em julgado da condenação, mas antes de ter cessado a execução da pena, como sucede neste caso, o arguido reclama - ainda que implicitamente - a reabertura da audiência de julgamento para, em concreto, lhe ser aplicado este novo regime legal (que considera ser-lhe mais favorável), o afastamento desse novo regime não poderá ser decidido por simples despacho judicial, implicando a reabertura da audiência e a prolação de nova sentença que se pronuncie sobre essa questão.

    21. - Ao decidir, por mero despacho judicial, rejeitar a aplicação do disposto no art. 44.º do C. Penal, in casu, por considerar que a nova lei penal não é, em concreto, mais favorável ao arguido, e, em consequência, rejeitar a reabertura da audiência para aplicação retroactiva da lei penal nova que o arguido reclama implicitamente, o M.mº Juiz a quo interpretou e aplicou a nova lei penal e processual penal de modo manifestamente desfavorável ao arguido, em flagrante violação do disposto nos citados art.s 2.º, n.º4 e 44.º do C. Penal (na redacção da Lei n.º59/2007, de 04/09), e do preceituado nos art.s 5.º, n.º1 e 371.ºA, do CPP (na redacção introduzida pela Lei n.º 48/2007 de 29/08).

    22. - É manifestamente mais favorável ao arguido ser condenado numa pena de sete meses de prisão em regime de permanência na habitação (ainda que a mesma possa vir a ser revogada e determinado o seu cumprimento efectivo em meio prisional), do que ser condenado numa pena de 7 meses de prisão a cumprir em estabelecimento prisional (ainda que a mesma possa ser suspensa na sua execução e posteriormente revogada tal...

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