Acórdão nº 64/08.9GAPNC.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTIGOS 105º,120º, 121º,326º,6,363º CPP, 153º CPC Sumário: 1. A documentação deficiente das declarações prestadas oralmente constitui hoje uma nulidade sanável – artigo 363º do CPP, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 48/2007 de 29 de Agosto –, ficando prejudicada a jurisprudência fixada no acórdão do STJ n.º 5/2002, que entendia existir irregularidade neste caso e cuja não inconstitucionalidade foi confirmada pelo acórdão do TC n.º 208/2003.

  1. No domínio do CPP vigente a omissão ou deficiência da documentação das declarações orais na audiência (gravação) constitui nulidade, sanável, sujeita ao regime de arguição e de sanação dos art.º 105º n.º 1, 120º, n.º1 e 121º do CPP.

  2. O termo inicial do prazo de 10 dias do art.º 153º do CPC ocorre no dia em que os suportes técnicos com o registo das gravações ficam à disposição dos sujeitos processuais, visto que só nesta data poderão os interessados tomar conhecimento da omissão ou deficiência da gravação do registo da prova, estando a partir desta data habilitados a arguir o respectivo vício.

  3. Esta nulidade sana-se se não for tempestivamente arguida, contando-se o prazo de dez dias (artº 105º, n.º 1 do CPP) a partir da audiência, acrescido do tempo que mediou entre a entrega do suporte técnico pelo sujeito processual interessado ao funcionário e a entrega da cópia do suporte técnico ao sujeito processual que a tenha requerido.

  4. Pode ainda ser arguida em sede de recurso se os 10 dias em causa ainda se contiverem dentro do prazo normal de recurso, contado a partir dos momentos temporais do artigo 411º/1 do CPP .

    Decisão Texto Integral: I - RELATÓRIO 1.

    No processo comum singular n.º 64/08.9GAPNC do Tribunal Judicial da Comarca de Penamacor, o arguido J...

    , devidamente identificado nos autos, foi condenado, por sentença de 15 de Julho de 2009, pela prática de um crime de dano p. e p. pelo artigo 212º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 140 (cento e quarenta) dias de multa à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos).

    Foi ainda julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização cível e, em consequência, foi condenado o arguido/demandado a pagar a A... a quantia de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, considerando-se o pedido cível improcedente quanto ao demais.

    2.

    Inconformado, o arguido recorreu da sentença condenatória, concluindo (transcrição): «1. A gravação da prova produzida em audiência de discussão e julgamento efectuada pelo sistema digital que se encontra em uso no tribunal a quo, encontra-se prejudicada por uma estação de rádio local que impede a audição do que se encontra gravado.

  5. Pretende o arguido recorrer de Facto e de Direito, vendo-se impedido pela deficiência da gravação da prova.

  6. Pretende o Arguido recorrer da douta sentença proferida pela Mmª Juíza do Tribunal Judicial de Penamacor que o condenou, pela prática, de um crime de Dano, p. e p. pelo art° 212° do Código Penal, na pena de 140 dias de multa, à razão diária de 5,50 euros e no pagamento ao demandante A... da importância de 1500,00 euros (mil e quinhentos euros a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais.

  7. Dispõe o artigo 364° n° 1, do C.P.P., que “a documentação das declarações prestadas oralmente na audiência é efectuada, em regra, através de gravação… ou de outros meios técnicos idóneos a assegurar a reprodução integral daquelas…”.

  8. Dispondo o art.° 363° do mesmo diploma legal, que “as declarações prestadas oralmente na audiência são sempre documentadas na acta, sob pena de nulidade”.

  9. Constituindo irregularidade, devendo ser arguida pelo interessado.

  10. Violou o Tribunal a quo os supracitados preceitos.

    Por todo o exposto deve, pois, proceder-se à renovação da prova, enviando o processo para novo julgamento.

    Por tudo o que foi exposto e pelo que mais for doutamente suprido, deve ser dado provimento ao recurso com o que se fará a costumada JUSTIÇA».

    3.

    O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, opinando que a sentença recorrida deve ser mantida na íntegra.

    Conclui desta forma o MP: «1. O recurso interposto pelo arguido J... não deve ser admitido, por ter sido interposto fora de tempo (art.°s 411º, n.° 1, al. b), e 414°, n.° 2, do Código de Processo Penal).

  11. Na actual redacção do Código de Processo Penal, a não gravação e/ou a gravação deficiente da prova produzida em julgamento constitui uma nulidade sanável, sujeita ao regime dos art.°s 105°, n.° 1, 120°, n.° 1, e 121°, do Código de Processo Penal.

  12. O termo inicial do prazo de 10 dias para arguir tal nulidade “ocorre no dia em que os suportes técnicos com o registo das gravações ficam à disposição dos sujeitos processuais, visto que só nesta data poderão os interessados tomar conhecimento da omissão ou deficiência da gravação do registo da prova, estando a partir desta data habilitados a arguir o respectivo vício”.

  13. Consta dos autos, a fls. 221, que em 27 de Agosto de 2009 foi entregue à Ilustre Defensora Oficiosa do arguido um CD contendo a gravação da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, sendo que dos mesmos não consta, ao invés, que o arguido tenha vindo perante o tribunal recorrido arguir tal nulidade, no prazo de dez dias de que dispunha para o efeito.

  14. Donde, tal nulidade, a existir, encontra-se sanada.

    Nestes termos, deve negar-se provimento ao recurso interposto pelo arguido (…)».

    4. O assistente A... respondeu a este recurso, defendendo a manutenção da douta decisão recorrida.

  15. Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, a fls. 247 a 250, sendo de parecer «que, a não ser rejeitado o recurso por extemporaneidade do prazo, por não merecer a sentença qualquer censura, deverá improceder o recurso do arguido, mantendo-se aquela».

    5.

    Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, cumpre proferir decisão sumária, na medida em que se entende que deverá ser rejeitado o recurso interposto (artigos 417º, n.º 6, alínea b) e 420º, n.º 1, alínea b) do CPP), cabendo, assim, especificar sumariamente os fundamentos da nossa decisão (artigo 420º, n.º 2 do CPP).

    II – FUNDAMENTAÇÃO 1. As conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o objecto do recurso.

    A única questão suscitada no recurso prende-se com a alegada “irregularidade” da gravação do julgamento de 1ª instância.

    Porém, há que decidir a questão prévia e cuja procedência obsta ao conhecimento do objecto do recurso - tempestividade ou não do recurso intentado.

  16. A sentença recorrida foi datada de 15 de Julho de 2009, tendo sido depositada nesse mesmo dia (cfr. fls 219).

    Em 25 de Agosto de 2008 (ou seja, estando já esgotados 16 dias do seu prazo de 20 dias para o recurso), veio a ilustre defensora oficiosa do arguido requerer ao tribunal recorrido cópia da gravação do julgamento (que decorreu em duas sessões), juntando para o efeito um CD.

    Tal CD foi-lhe depois entregue no dia 27/8/2009.

    Acaba por recorrer em 14 de Setembro de 2009.

    E nesse recurso invoca a irregularidade da gravação deficiente do julgamento pelo facto da mesma estar prejudicada por uma estação de rádio local que impede a audição do que se encontra gravado.

    Nesse recurso, o arguido é claro e delimita bem o âmbito do seu recurso.

    A sua expressa lógica é esta: «Discorda o arguido da sua condenação por entender que a douta sentença enferma dos vícios constantes das alíneas a) e c) do n° 2 do art° 410° do C.P.P., insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova, vícios que resultam do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum determinando o reenvio do processo para novo julgamento nos termos do...

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