Acórdão nº 910/08.7TAVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010
Magistrado Responsável | JORGE JACOB |
Data da Resolução | 01 de Março de 2010 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTIGOS 283º, 286º, 287º, 303º E 30º DO CPP Sumário: 1. São os elementos subjectivos do crime, com referência ao momento intelectual (conhecimento do carácter ilícito da conduta) e ao momento volitivo (vontade de realização do tipo objectivo de ilícito), que permitem estabelecer o tipo subjectivo de ilícito imputável ao agente através do enquadramento da respectiva conduta como dolosa ou negligente e dentro destas categorias, nas vertentes do dolo directo, necessário ou eventual e da negligência simples ou grosseira.
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Num crime doloso da acusação ou da pronúncia há-de constar necessariamente, pela sua relevância para a possibilidade de imputação do crime ao agente, que o arguido agiu livre (afastamento das causas de exclusão da culpa - o arguido pôde determinar a sua acção), deliberada (elemento volitivo ou emocional do dolo - o agente quis o facto criminoso) e conscientemente (imputabilidade – o arguido é imputável), bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei (elemento intelectual do dolo, traduzido no conhecimento dos elementos objectivos do tipo).
Decisão Texto Integral: I – RELATÓRIO: Nestes autos provenientes do Tribunal Judicial de Viseu, na fase de inquérito, a assistente C... deduziu acusação particular contra P... imputando-lhe a autoria de um crime de injúria e de um crime de denúncia caluniosa, p. e p., respectivamente, pelos arts. 181º e 365º, ambos do Código Penal.
O M.P. determinou o arquivamento dos autos no que concerne ao crime de denúncia caluniosa considerando não se indiciarem factos que preencham os respectivos elementos objectivos e subjectivos e acompanhou a acusação particular quanto ao crime de injúria.
A assistente não se conformou com o despacho de arquivamento e requereu a abertura de instrução, em requerimento com o seguinte teor: (…) C..., assistente nos autos supra referenciados, vem, nos termos do artigo 287°, n° 1, al. b) do Cód. Processo Penal, requerer a abertura da Instrução, o que faz pelas seguintes razões: 1. Foi proferido despacho de arquivamento, pelo douto Representante do Ministério Público, relativamente ao crime de denúncia caluniosa, p. e p. pelo art. 365º do Código Penal c relativamente ao qual a Assistente havia exercido oportunamente o competente direito de queixa.
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A Exmª Senhora Procuradora-Adjunta fundamenta, na essência, tal arquivamento no facto de o arguido, ao efectuar a comunicação à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Viseu, se ter limitado a cumprir urna exigência decorrente da lei (“um dever”), já que reputara de "estranha” a ausência injustificada da menor às aulas, atento o facto da menor não apresentar em meio escolar “comportamentos que fossem motivo de preocupação suplementar” e de não existir no processo da aluna documento justificativo para aquelas faltas.
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Seria, assim, “legítima a participação”, além de não se verificar o preenchido o tipo subjectivo do crime de denúncia caluniosa, na medida em que o arguido não actuara com a consciência da inveracidade da imputação nem com a intenção de que se instaurasse procedimento contra a Assistente.
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Ora, salvo melhor opinião, nem o comportamento do Arguido foi tão anódino, nem a sua intenção foi tão cândida quanto o que resulta do douro despacho de arquivamento.
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Assim se procurará demonstrar no decurso desta instrução.
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Desde logo, cumpre ter presente que, aquando da entrada da filha da Assistente, para o estabelecimento de ensino “Colégio ….” já o arguido ali exercia funções.
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Tal aconteceu no ano lectivo 2005/2006 c, logo nessa altura, foi entregue naquele estabelecimento de ensino o seu processo escolar, de onde constava a documentação médica que justificava estar a D… abrangida pelo DL 319/91, de 23 de Agosto, diploma que estabelece o regime educativo especial aplicável aos alunos com necessidades educativas especiais.
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De facto, a D..., em 27 de Maio de 2000, foi vítima de um acidente de viação, em consequência do qual ficou politraumatizada e com traumatismo craneo-encefálico grave. Devido a esses ferimentos foi submetida a várias intervenções cirúrgicas e acabou por ser transferida do Hospital de Viseu para o Serviço de Neurocirurgia dos Hospitais da Universidade de Coimbra em 6 de Junho de 2000, ainda em estado de coma. Durante o internamento foi recuperando os sentidos, tendo, depois, passado pelo hospital de Viseu e pelo Centro de Reabilitação do Alcoitão. Não obstante, ficou com sequelas gravíssimas, com áreas cerebrais comprometidas, que lhe acarretam dificuldades cognitivas, linguísticas e, em especial, flutuações a nível de aprendizagem e comportamento, motivo por que tem de tornar grande quantidade de medicamentos.
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Estes factos - embora, concede-se, não com a minúcia do antecedente relato - eram do inteiro conhecimento do Arguido, por força até das funções de Director Pedagógico por ele desempenhadas naquela Escola.
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Tanto assim é que, aquando da entrada da D... para o Colégio …, no ano lectivo 2005/2006, os auxiliares de acção educativa foram instruídos no sentido de a vigiarem durante os intervalos e, ao longo de todos esse ano, houve um acompanhamento permanente por parte de uma tarefeira.
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Essa situação clínica da D... era ainda sobejamente conhecida do Arguido por outros factores; a mãe da D..., ora Assistente, também é docente e o historial de sofrimento subsequente ao acidente de viação que vitimou a D... foi conhecido por toda a comunidade de docentes de Viseu; por outro lado, o irmão mais velho da D..., E..., frequentava o Colégio havia já 4 anos e relatava a todos os problemas que vivenciava com sua irmã, com quem o relacionamento em casa se tornava extraordinariamente difícil.
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Em Janeiro de 2006, a D... foi internada pelo pedopsiquiatra que a acompanhava no Serviço de Pediatria do Hospital de São Teotónio e teve alta 9 dias depois. Durante este período, foi visitada quer pelo Arguido, quer pelo seu Director...
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