Acórdão nº 5986/00.2TXLSB-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 01 de Março de 2010

Data01 Março 2010

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: PROVIDO Sumário: 1 - Nos termos do disposto no art. 61.º n.º2 do C. Penal, o condenado pode ser colocado em liberdade condicional quando se encontrar cumprida metade da pena e no mínimo seis meses, se for fundadamente de esperar que em liberdade conduzirá a sua vida sem crimes e de modo socialmente responsável, e se a libertação se revelar compatível com a defesa da ordem e paz social.

2 - O objectivo da liberdade condicional é a efectiva reinserção social; para o sucesso de tal objectivo importa considerar as circunstâncias do caso (onde se inclui a valoração do crime cometido, a sua natureza e as realidades normativas que serviram para a determinação concreta da pena de acordo com os critérios do artigo 71.º, n.º 1 e n.º 2, do Código Penal), a vida anterior do recluso (que se relaciona, nomeadamente, com a existência ou não de antecedentes criminais), a sua personalidade e a evolução desta durante a execução da pena de prisão, perceptível através de padrões comportamentais temporalmente persistentes que indiciem um adequado processo de preparação para a vida em meio livre e que, não se esgotando numa boa conduta prisional, também se revelam na mesma.

3 - A regra do artigo 61.º, n.º 5, do Código Penal não impede a colocação em liberdade condicional, desde que verificados os respectivos pressupostos, nas situações em que, como ocorre nos presentes autos, há um remanescente de pena de prisão superior a cinco anos; antes explicita que, findo o prazo máximo de liberdade condicional (cinco anos) e não se verificando a existência de motivo relevante para a sua revogação, ocorre a extinção do remanescente da pena, nos termos e com as implicações que resultam dos artigos 64.º, n.º 1 e 57.º, n.º 1, do Código Penal.

4 - A extinção do excedente da pena não opera no caso de revogação da liberdade condicional, conforme decorre o disposto no artigo 64.º, n.º 2, do citado diploma.

5 - Sendo este o regime legal estipulado e verificando-se os pressupostos da liberdade condicional, não cabe afastar a sua aplicação a pretexto de se operar desta forma o perdão parcial da pena.

Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 2.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I) Relatório 1.

No Tribunal de Execução de Penas de Évora corre termos o Processo n.º ---/00.2TXLSB (Processo Gracioso de Concessão de Liberdade Condicional), no qual, por decisão proferida em 14 de Agosto de 2009 (cópia certificada a fls. 69 e seguintes), foi decidido não conceder a liberdade condicional ao recluso A., melhor identificado nos autos, por se considerar – no essencial – que, no caso, não se mostravam preenchidos os requisitos previstos no artigo 61.º, n.º 2, alíneas a) e b), do Código Penal.

  1. O arguido, não se conformando com a decisão, veio interpor recurso, terminando a respectiva motivação com as seguintes conclusões:

    A) O Arguido através da sua mandatária, requereu cópia do parecer emitido pelos Serviços Prisionais e pelo Ministério Público, conforme permite o artigo 89.º do Código de Processo Penal.

    B) No entanto, o Juiz a quo determinou a emissão de certidão, com o seu consequente levantamento na secretaria, com custos para o Arguido, pondo em causa o direito de defesa que lhe assiste.

    C) A decisão recorrida contém um erro de escrita que pode ter condicionado todo o seu raciocínio, ao determinar que os 2/3 da pena seriam cumpridos no dia 30.11.2010, quando segundo a liquidação será mais cedo, em 30.01.2010.

    D) O fundamento para a não concessão da liberdade condicional foi a de que: “a pena que resta cumprir ao arguido é largamente superior a cinco anos, e, por outro lado, a impossibilidade legal de o período de liberdade condicional ser superior a cinco anos, caso lhe fosse concedida agora liberdade condicional tal equivaleria a um perdão do remanescente da pena”.

    E) O Ministério Público emitiu parecer favorável à concessão da liberdade condicional do Recorrente, pelos fundamentos que aqui se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.

    F) Os Serviços Prisionais também emitiram parecer favorável, até porque o Recorrente sempre teve um excelente comportamento prisional; G) Estão preenchidos todos os requisitos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 61.º do Código Penal.

    H) O Recorrente deu o seu consentimento expresso e deseja beneficiar da liberdade condicional.

    I) É verdade que a anterior redacção do n.º 5 do artigo 61.º do Código Penal previa que em qualquer das modalidades previstas de liberdade condicional, a duração desta tinha que ser igual ao tempo que faltava cumprir, mas nunca superior a 5 anos.

    J) Mas Lei nº 59/2007 de 4 de Setembro, veio alterar essa redacção, passando da mesma a constar que a liberdade condicional deverá ter a duração até ao máximo de 5 anos, considerando-se extinto o excedente da pena.

    K) Por ser este o regime mais favorável ao Recorrente, deve-lhe o mesmo ser aplicado, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Código Penal.

    L) De resto, conforme se pode verificar através dos registos informáticos, tem sido concedida a liberdade condicional a outros detidos a quem foi aplicada pena de prisão igual ou superior à do Recorrente, quando ainda tinham por cumprir mais de 5 anos.

    M) A discrepância de entendimentos põe em causa a justeza da decisão e viola o princípio da igualdade.

    N) A decisão recorrida violou, nomeadamente, o disposto nos: Artigos 2.º e 61.º do Código Penal; Artigos 13.º da Constituição da República Portuguesa.

    Entende que, nesta conformidade, a decisão proferida deve ser revogada, proferindo-se, em sua substituição, despacho que conceda a liberdade condicional ao recorrente, com as necessárias consequências legais.

  2. Respondeu o Ministério Público, concluindo nos seguintes termos: 1.º – Além da gravidade do crime e da pena serem elevados, aspectos aduzidos, para tirar tal conclusão, nenhuns outros factos concretos foram aduzidos que funcionem como indicadores de que a concessão da liberdade condicional possa vir a afectar a paz e tranquilidade públicas.

    1. – A este respeito, retirando força às ilações tiradas na douta sentença, refere o relatório da DGRS que é “indivíduo primário que não regista contactos anteriores com o sistema de justiça, revela arrependimento pelo crime que considera um erro irreparável, revela um percurso de vida linear, com comportamento ajustado em meio prisional, gozando de medidas de flexibilização da pena com êxito desde Dezembro de 2003, com pernoita fora de muros, tem desenvolvido actividade laboral com regularidade, dispõe de enquadramento familiar e perspectivas laborais”.

    2. – Refere ainda aquele relatório que “ao nível do impacto do crime no meio, são desconhecidos quaisquer indicadores negativos que aventem uma eventual perturbação da paz social, no caso de retorno à liberdade, o que é comprovado com a inexistência de ocorrência de problemas, durante as licenças precárias de que tem vindo a beneficiar”.

    3. – Os aspectos ponderados para afastar a concessão de liberdade condicional são de todo alheios à evolução do recluso no sentido da reinserção social e contradizem todo o quadro favorável que resulta demonstrado nos factos analisados e descritos nos relatórios dos técnicos que acompanham há onze anos a execução da pena em causa.

    4. – A natureza do crime e a pena aplicada, embora devam ser aspectos a ponderar, nos termos do artigo 61.º, n.º 2...

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