Acórdão nº 54/99.0IDFAR-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelCARLOS BERGUETE COELHO
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorTribunal da Relação de Évora

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: NÃO PROVIDO Sumário: 1- A suspensão da execução da pena é hoje, pacificamente, reconhecida como uma verdadeira e autónoma pena.

  1. Com o trânsito em julgado da sentença condenatória não começa a correr o prazo da prescrição da pena principal, mas sim o prazo de prescrição da pena de substituição, aplicando-se-lhe in totum o regime da suspensão e interrupção da prescrição contido nos art. 125.º e 126.º do Código Penal, por via do qual também a prescrição da pena de substituição se interrompe com a sua própria execução.

    3 - Para efeitos da definição do início da contagem do prazo de prescrição da pena principal substituída por pena suspensa ou outra pena de substituição, há-de entender-se que a decisão que aplicou a pena (cf. art. 122.º n.º2 C.Penal) é a decisão judicial que determine a execução da pena principal, na sequência da revogação da pena de substituição aplicada (pois a eventual revogação de pena de substituição não ocorre ope legis em caso algum) e não a sentença condenatória.

    4 - Só naquela altura pode produzir-se o efeito que, em regra, se encontra associado à aplicação da pena com trânsito em julgado, ou seja, a susceptibilidade de ser executada, efeito esse que se encontra pressuposto no n.º 2 do art. 122.º do Código Penal, justificando assim a interpretação seguida, permitida pelo sentido ainda possível das palavras, para a locução “decisão que aplicou a pena”.

    Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora * 1. RELATÓRIO Nos autos de processo comum, perante tribunal singular, com o nº…/99.0IDFAR, do …º Juízo do Tribunal Judicial de Albufeira, o arguido, entre outros, E.

    foi condenado por sentença transitada em julgado em 19.02.2002, além do mais, como autor material de um crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, p. e p. pelo art.24º, nºs.1 e 2, do Dec. Lei nº.20-A/90, de 15.01, por referência ao art.30º, nº.2, do Código Penal (CP), na pena de 14 (catorze) meses de prisão, suspensa na execução pelo período de 3 (três) anos e sob condição de proceder, no mesmo prazo, ao pagamento do valor em dívida ao Estado, documentando, de seis em seis meses, os cumprimentos parciais da obrigação, sendo que esse valor foi fixado em Esc.9.418.823$00.

    A suspensão da execução da pena foi revogada por despacho proferido em 12.03.2009, constante de fls.157/161, no qual ainda se determinou a emissão de mandados de detenção e condução do arguido a estabelecimento prisional para cumprimento da pena de prisão aplicada.

    O arguido veio, então, em 08.05.2009, requerer que se declarasse a prescrição da pena, o que foi indeferido por despacho de 19.05.2009.

    Inconformado com este despacho, o arguido interpôs recurso, formulando as conclusões: 1 - O arguido recorrente, discorda do despacho que entendeu que a pena que lhe foi aplicada não se encontra prescrita.

    2 - Entende o recorrente que no caso dos autos se verificou a prescrição da pena.

    3 - De facto, a sentença transitou em julgado em 19 de Fevereiro de 2002, tendo o arguido sido condenado na pena de 15 meses de prisão.

    4 - Esta pena ficou suspensa pelo prazo de três anos na condição de o arguido naquele prazo proceder ao pagamento da quantia de 9.418.823$00.

    5 - É certo que o arguido fez alguns pagamentos, e é certo que o arguido pediu a reabertura da audiência para que se procedesse à sua notificação nos termos do disposto no art.105º, nº 4 da alínea b) do R.G.I.T.

    6 - O arguido, derivado a doença grave que o afecta, do foro cardíaco, teve que deixar de trabalhar e por esse motivo não conseguiu cumprir o pagamento.

    7 - Tribunal revogou a suspensão da pena sem sequer saber, ou procurar saber que razão levava o arguido a cumprir ou a não poder cumprir, como se entende que deveria.

    8 - Tendo a pena transitado em 19 de Fevereiro de 2002, estaria suspensa até 19 de Fevereiro de 2005.

    9 - Aplicando os 4 anos de prescrição da pena previsto no art.122º do C. Penal, a pena prescreve em 19 de Fevereiro de 2009, pelo que quando foi proferido o despacho datado de 12 de Março de 2009, já a pena se encontrava prescrita, a qual se invoca para todos os efeitos legais, e mais estava quando foi notificada ao arguido em 22 de Abril de 2009.

    10 - O requerimento do arguido pedindo a reabertura da audiência, salvo o devido respeito, não suspendeu a prescrição, nem teve essa virtualidade, porque a nosso ver, não se enquadra na alínea e) do nº 1 do art.125º do C. Penal.

    11 - Discorda-se com o entendimento de que entre o momento da prolação da sentença condenatória e o da revogação da suspensão da pena o prazo prescricional se mantém suspenso.

    12 - O que está verdadeiramente em causa, no período de tempo que decorre entre o fim da suspensão da pena e o do despacho de revogação é o mero despacho e não qualquer impedimento legal.

    13 - Ora, a partir de 19 de Fevereiro de 2005, nada impedia que fosse proferido o despacho de revogação.

    14 - Se o despacho não foi dado, tal facto não pode prejudicar o arguido, nem os direitos que legalmente lhe estão assegurados no que se refere a limitação da sua liberdade.

    15 - Salvo o devido respeito, no caso concreto, considerar que o facto de não ter sido proferido o despacho durante cerca de 4 anos suspende o prazo de prescrição, comprime desproporcionadamente os direitos do arguido e a necessidade de em tempo útil obter uma decisão célere.

    16 - A opção pelo entendimento constante do despacho, salvo o devido respeito, torna o início do cumprimento da pena de duração indefinida ou de duração ilimitada.

    17 - Aliás e salvo o devido respeito, tal entendimento é inconstitucional por violação do art.20° nº 5, 27º, 30º nº 1 e 32º nº 2 da C.R.P., o qual se invoca para todos os efeitos legais, e a interpretação que é dada ao art.125° nº 1, alínea a) do C. Penal é inconstitucional, não só por violação das normas invocadas, como pela violação do princípio da igualdade da proporcionalidade e da justiça.

    18 - O entendimento deverá pois ser o que o recorrente apresentou e em consequência deve considerar-se prescrita a pena.

    19 - Fez-se incorrecta aplicação dos artºs.122 nº 1 alínea e), 125 nº 1 alínea a) do C.P. e arts 20 nº 5 , 27, 30 nº 1, 32 no 2 da C.R.P.

    Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida com o que se fará a costumada, JUSTIÇA! O Ministério Público apresentou resposta, concluindo: - A pena de prisão aplicada ao arguido não se encontra prescrita, por força do disposto nos artºs 122 nºs 1 al. d) e 2 e 125 nºs 1 al. a) e 2, ambos do C. Penal; - A revogação da suspensão da execução da pena prisão não opera ope legis, pelo que só a partir do trânsito em julgado do despacho que determina a revogação da suspensão da pena de prisão cessa a causa de suspensão do decurso do prazo prescricional da pena.

    Em face do exposto, deverá ser negado provimento ao recurso, confirmando-se o douto despacho recorrido.

    O recurso foi admitido por despacho certificado de fls.174.

    Neste Tribunal da Relação, o Digno Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, no essencial, aderindo à resposta à motivação.

    Cumprido o nº.2 do art.417º do Código de Processo Penal (CPP), o arguido nada disse.

    Colhidos os vistos legais e tendo os autos, na sequência do despacho de fls.214, ido à conferência, cumpre apreciar e decidir.

  2. FUNDAMENTAÇÃO O objecto do recurso, definido pelas conclusões que o recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art.412º, nº.1, do CPP e acórdão do Plenário da Secção Criminal do STJ nº.7/95, de 19.10, in D.R. I-A Série nº.298/95, de 28.12.1995), reside em apreciar se a pena que lhe foi aplicada, segundo a sua perspectiva, se encontra prescrita por já ter decorrido o respectivo prazo, referido no art.122º do CP, não se tendo verificado causa de suspensão aludida no art.125º, nº.1, alínea a), do mesmo Código e considerando que a interpretação feita pelo despacho recorrido foi incorrecta e viola esses preceitos legais e, ainda, os arts.20°, nº.5, 27º, 30º, nº.1, e 32º, nº.2, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

    Segundo o requerimento apresentado pelo ora recorrente: Independentemente da bondade dos fundamentos do despacho de revogação da suspensão da pena de prisão, afigura-se-nos que, salvo o devido respeito, e melhor opinião, a pena aplicada ao arguido está prescrita.

    Com feito, Nos termos do n° 2 do art 122 nº 1 alínea d) do Código Penal, a pena de 14 meses de prisão aplicada ao arguido, prescreve ao fim de 4 (quatro) anos.

    E, Nos termos do nº 2 do já acima referido normativo legal, o prazo de prescrição começa a correr no dia em que transitar a decisão que tiver aplicado a pena.

    A sentença transitou em 14 de Dezembro de 2001, pelo que em 14 de Dezembro de 2005, prescreveu.

    Entende-se que não existem causas de suspensão.

    Contudo ainda que se entenda que a suspensão da execução da pena era causa de suspensão da prescrição, teríamos que a prescrição estaria suspensa entre 14 de Dezembro de 2001 e 14 de Dezembro de 2004 iniciando-se aqui o prazo de prescrição.

    E iniciando-se o prazo de prescrição nessa data, a prescrição da pena ocorreu em 14 de Dezembro de 2008.

    Sendo assim, como se nos afigura que é, quando foi proferido o despacho de revogação a 12 de Março de 2009, e notificado ao arguido em 22/04/2009, a pena já se encontrava prescrita, prescrição que se invoca para todos os efeitos legais.

    Pelo exposto, vem requerer a Vª Ex.ª que pelos fundamentos invocados, declare prescrita a pena aplicada ao arguido.

    Veio, depois, reiterando a sua posição, ainda esclarecer: O signatário, por consulta no processo verificou que nele existe uma cota que indica a data de trânsito em 19/02/2002. Pese embora a data da notificação do acórdão ser a 14/12/2001, mantêm-se os mesmos fundamentos de facto e direito que levam à prescrição da pena.

    Com efeito, se se entender neste caso que a suspensão da pena tem o efeito de suspender o prazo de prescrição, a pena terá prescrito...

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