Acórdão nº 560/09.0YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelSEBASTIÃO PÓVOAS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA REVISTA DO AUTOR E CONCEDIDA REVISTA DA RÉ Sumário : 1. Salvo situações de excepção, o Supremo Tribunal de Justiça só conhece matéria de direito, “ex vi” do artigo 26.º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro.

  1. Em consequência, o Tribunal de revista limita-se a aplicar aos factos definitivamente fixados pelo tribunal recorrido o regime jurídico adequado (artigo 729.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).

  2. As situações de excepção acenadas consistem no erro de apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, praticado pela Relação, se ocorrer violação expressa de norma que exija certa espécie de prova para a existência de um facto, ou estabeleça força probatória de algum meio de prova, tal como resulta dos artigos 722.º, n.º 2 e 729.º, n.º 2 do diploma adjectivo.

  3. Isto é, não obstante, e no âmbito da sindicância do direito pode verificar do cumprimento das normas processuais que regem o julgamento da matéria de facto, designadamente se as respostas à base instrutória foram correctas – não na sua essência, ou conteúdo, por tal competir, como se disse, exclusivamente às instâncias – mas na sua forma.

  4. Ou seja, pode verificar se a resposta foi clara, inteligível e explícita, em termos de poder contar com o facto que inequivocamente dela resultou; pode aquilatar da sua coerência com o elenco do mais respondido, mas sem que contenda com a convicção do julgador; pode, finalmente, julgar da suficiência da explanação dos elementos que condicionaram aquela convicção.

  5. No tocante ao âmbito, a resposta pode surgir simples – com mera afirmação ou negação ao perguntado – restritiva ou explicativa – aqui clarificando o sentido da “verdade judiciária”. Mas não pode ser exuberante, isto é, transcender o perguntado por conter elementos que iriam, por alteração total, descaracterizar o quesito, equivalendo portanto a uma nova formulação, quiçá não extraível dos factos articulados.

  6. O dano biológico traduz-se na diminuição somático-psiquica do indivíduo, com natural repercussão na vida de quem o sofre.

  7. O dano biológico tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial tal como compensado a título de dano moral. A situação terá de ser apreciada casuisticamente, verificando se a lesão originou, no futuro, durante o período activo do lesado ou da sua vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, numa afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade.

  8. E não parece oferecer grandes dúvidas que a mera necessidade de um maior dispêndio de esforço e de energia, mais traduz um sofrimento psico-somático do que, propriamente, um dano patrimonial sendo certo que o exercício de qualquer actividade profissional se vai tornando mais penoso com o desgaste natural da vitalidade (paciência, atenção, perspectivas de carreira, desencantos…) e da saúde, tudo implicando um crescente dispêndio de esforço e energia.

  9. E esses condicionalismos naturais podem é ser agravados, ou potenciados, por uma maior fragilidade adquirida a nível somático ou em sede psíquica.

  10. Ora, tal agravamento, desde que não se repercuta directa – ou indirectamente – no estatuto remuneratório profissional ou na carreira em si mesma e não se traduza necessariamente numa perda patrimonial futura ou na frustração de um lucro, traduzir-se-á num dano moral.

  11. Estas indemnizações tendem a proporcionar um certo grau de satisfação de vida em ordem a, tanto quanto possível, atenuar os sofrimentos de ordem moral e física sofridos em resultado do acidente e que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito – artigo 496.º, n.º 1 do Código Civil – sendo de fixação equitativa – n.º 3 do mesmo artigo 496.º. Subjazem-lhes sempre, contudo, um juízo de censura ético-juridica, com certa componente sancionatória.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA intentou acção, com processo ordinário, contra “G... – C... de S..., SpA” pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de 111.399,65 euros, acrescida de juros desde a primeira chamada ao processo, a título de ressarcimento por danos sofridos em acidente de viação.

Na 1ª Instância a acção foi julgada parcialmente procedente e a Ré condenado a pagar ao Autor a quantia de 27.399,65 euros, com juros desde a citação (22 de Fevereiro de 2007) sobre 1.399,65 euros e juros vincendos sobre os restantes 26.000,00 euros, desde a notificação da sentença.

Apelaram o Autor e a Ré.

A Relação do Porto julgou totalmente improcedente a apelação da Ré mas parcialmente procedente a apelação do Autor fixando a indemnização pelo dano biológico em 15.000,00 euros, a indemnização pelo dano patrimonial pela perda de um ano escolar em 2,000.00 euros e em 26.000,00 euros a indemnização por danos não patrimoniais.

Inconformados pedem ambos revista.

A Ré concluiu assim as suas alegações: - Na resposta dada ao quesito 2º da base instrutória o tribunal a quo não se limitou, como era seu dever, a responder ao perguntado, considerando o quesito como provado ou não provado, antes extravasando claramente os seus poderes, conhecendo de factos que não poderia conhecer, pois que em momento algum foram alegados pelas partes e dando assim uma resposta que exorbitou da pergunta formulada naquele quesito.

- Nem mesmo se afirme, como o fez o tribunal recorrido, que a resposta dada àquele quesito constitui uma factualidade apenas explicativa das circunstâncias concretas relativas à ocorrência da lesão, pois que, a afirmação do mesmo constitui negação do que ali foi perguntado.

- Seguir a mesma linha de raciocínio do tribunal recorrido significaria que, em qualquer caso de responsabilidade civil por acidente de viação, bastaria alegar a ocorrência do embate, não sendo necessário precisar a forma como o mesmo ocorreu, pois que todos os factos relacionados seriam meramente explicativos daquele.

- Tendo os factos em causa resultado da instrução e discussão da causa o autor poderia, e deveria mesmo, ter manifestado interesse em se aproveitar dos mesmos, sendo que, não o tendo feito em tempo oportuno, não poderá o tribunal substituir-se ao mesmo carreando-os para os autos - Não são factos instrumentais nem explicativos mas antes factos essenciais à causa aqueles que importam a negação dos factos perguntados em quesito da base instrutória.

- O tribunal recorrido violou, pois, os artºs 264º, 653º/2, 659º/2 e 664º do CPC, devendo a resposta ao quesito 2º da base instrutória ser dada como não escrita.

- O valor de € 15.000.00 fixado pelo tribunal recorrido para efeitos de indemnização do dano biológico revela-se claramente excessivo, maxime se tivermos em conta, por um lado, o valor que seria devido de acordo com as tabelas matemáticas normalmente utilizadas para cálculo de indemnização por danos patrimoniais futuros e, por outro, o Anexo IV da Portaria 37/2008, referido pelo próprio tribunal a quo.

- O tribunal recorrido ao decidir como decidiu violou, pois, o previsto no artº 566º/2 do CC, devendo a sua decisão ser alterada nos termos supra, reduzindo-se o montante arbitrado a titulo de dano biológico para valores entre € 1.070,00 e € 1.245.00 - Nos € 31.000,00 atribuídos pelo Tribunal da Relação a título de dano não patrimonial o dano estético foi duplamente avaliado, tendo sido tomado em consideração também para fixação não só dos € 6000,00 como também dos € 25.000.00, conforme se retira da fundamentação ali utilizada.

- O valor atribuído a título de danos não patrimoniais revela-se, também ele, e em confronto por indemnização á atribuídas por este tribunal em situações semelhantes (cfr. Ac.s de 10.05.2007 e de 23.04.2009. in www.dgsi.pt), claramente excessivo, devendo ser reduzido para valor não superior a € 10.000.00.

Embora por forma imperfeita, o Autor conclui a sua alegação nos termos que assim se sintetizam: - Levando em conta uma taxa de juros da ordem dos 3%, atenta a realidade económica actual, considera o Recorrente como ajustada uma indemnização de 30.000,00€ pela incapacidade de que ficou a padecer e, a título de danos patrimoniais e, nessa medida deve ser alterado o douto acórdão...

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