Acórdão nº 1130/17.5T9VIS-A.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelMANUEL AUGUSTO DE MATOS
Data da Resolução28 de Novembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO 1.

O Ministério Público deduziu acusação, em processo abreviado, contra os arguidos AA e BB, imputando ao primeiro a autoria de um crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, e ao segundo a prática de um crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal e de um crime de ameaça p. e p. no artigo 153.º, n.º 1, do mesmo Código.

O assistente CC deduziu ainda acusação particular contra o arguido BB, imputando-lhe a prática de um crime de injúrias p. e p. pelo artigo 181.º do Código Penal.

2.

A Ex.ma Juíza do Juízo Local Criminal de Viseu – Juiz ..., da Comarca de ..., proferindo o despacho a que alude o artigo 311.º do Código de Processo Penal, doravante CPP – saneamento do processo –, entendeu que: «[…] os factos que vêm descritos na acusação pública, relativamente ao imputado crime de ameaças que é imputado ao arguido BB, consubstanciam antes a prática pelo mesmo de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal […] Nesta medida importa proceder à alteração da qualificação jurídica nos termos supra mencionados.

Com a referida alteração da qualificação jurídica, e atentas as molduras penais abstractas em questão relativamente aos crimes imputados ao arguido BB, a competência para o julgamento pertence ao tribunal colectivo, não sendo admissível o julgamento sob a forma de processo abreviado, sendo certo que não foi feito uso do disposto no artigo 391.º-A, n.º 2, do CPP.

[…] Nos termos e com os fundamentos expostos, decide-se: 1. Proceder à alteração da qualificação jurídica quanto ao crime de ameaças imputado ao arguido BB […]; 2. Julgar o tribunal singular incompetente para a realização do julgamento dos presentes autos, atentas as molduras penais abstractas em questão relativamente aos crimes imputados ao arguido BB, não sendo admissível o julgamento sob a forma de processo abreviado, sendo certo que não foi feito uso do disposto no artigo 391.º-A, n.º 2, do CPP.

Notifique e oportunamente remeta os presentes autos ao Juízo Central Criminal da Comarca de Viseu».

3.

Este despacho foi proferido em 2 de Novembro de 2017, tendo sido notificado ao Ministério Público por termo nos autos em 8 de Novembro de 2017 e por via postal expedida na mesma data aos sujeitos processuais.

Não foi interposto recurso de tal decisão.

4.

No Juízo Central Criminal da Comarca de Viseu – Juiz 3, por despacho de 20 de Dezembro de 2017, foi entendido que a decisão proferida no Juízo Local Criminal, supra referenciada, «contraria frontalmente a jurisprudência obrigatória fixada pelo Ac. do S.T.J. n.º 11/2013 (D.R. I-A, de 19-07-2013) [destacado no original], segundo a qual “A alteração, em audiência de discussão e julgamento, da qualificação jurídica dos factos constantes da acusação, ou da pronúncia, não pode ocorrer sem que haja produção de prova, de harmonia com o disposto no artigo 358.º n.

os 1 e 3 do CPP» ". E é indiscutível que os fundamentos deste acórdão uniformizador de jurisprudência não se limitam à própria audiência de julgamento, sendo aplicáveis directamente, e também por maioria de razão, à fase de saneamento (art. 311.º, n.º 1, do CPP), como claramente resulta da sua leitura. Não é, assim, lícito ao juiz de julgamento, ao dar cumprimento ao disposto no art. 311.º do C.P.P., alterar a qualificação jurídica dos factos […][1].

5.

Os arguidos AA e BB, arguidos nos autos à margem identificados, não se conformando com o douto despacho proferido, por contrariar jurisprudência obrigatória fixada, vêm do mesmo apresentar recurso extraordinário, nos termos do disposto no art. 446.° do Código de Processo Penal (CPP), apresentando a motivação e conclusões que se transcrevem: «A) DOS TERMOS DO RECURSO O presente recurso vem interposto de despacho que decidiu: "l. Proceder à alteração da qualificação jurídica quanto ao crime de ameaça imputado ao arguido BB na acusação pública, nos termos supra expostos, o qual se encontra previsto e punido pelos artigos 153°, n° 1, e 155°, n° 1, alínea a) do Código Penal”.

Ora, não pode o recorrente conformar-se com os termos desta decisão, porquanto á mesma contraria o douto Acórdão proferido pelo STJ n.º 11/2013 https://dre.pt/pesquisa/Vsearch/498123/details/maximized.

Deste modo, deve o presente recurso proceder totalmente e, a final, ser aplicada a jurisprudência fixada.

B) DA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA No Acórdão proferido pelo STJ n.°11/2013, publicado a 19.07.2013 -https://dre.pt/pesquisa/-/search/498123/detáils/maximized - foi fixada jurisprudência no seguinte sentido: "Acordam em fixar a seguinte jurisprudência: «A alteração, em audiência de discussão e julgamento, da qualificação jurídica dos factos constantes da acusação, ou da pronúncia, não pode ocorrer sem que haja produção de prova, de harmonia com o disposto no artigo 358.º n.os 1 e 3 do CPP» " C) DO DESPACHO PROFERIDO A 02.11.2017, foi proferido despacho com a referência 80916901 que decidiu proceder a uma alteração da qualificação jurídica do crime.

Esta alteração foi feita sem que tenha havido qualquer produção de prova, que nem tampouco se iniciou.

Assim, tal despacho contraria nitidamente a jurisprudência fixada pelo STJ no Acórdão n.º 11/2013, publicado a 19.07.2013.

Pelo que, deve ser o douto despacho proferido revogado e substituído por outro que respeita a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

D) DAS CONCLUSÕES 1.

O presente recurso vem interposto de despacho que decidiu: "1. Proceder à alteração da qualificação jurídica quanto ao crime de ameaça imputado ao arguido BB na acusação pública, nos termos supra expostos, o qual se encontra previsto e punido pelos artigos 153°, n° 1, e 155°, n° 1, alínea a) do Código Penal”.

  1. Tal despacho foi proferido a 02.11.2017.

  2. Sendo que, esta alteração foi feita sem que tenha havido qualquer produção de prova, que nem tampouco se iniciou, 4.

    Ora, tal despacho contraria nitidamente a jurisprudência fixada no Acórdão proferido pelo STJ n.° 11/2013, publicado a 19.07.2013 -https://dre.pt/pesquisa/-/search/498123/details/maximized 5.

    Pelo que, deve ser o douto despacho proferido revogado e substituído por outro que respeita a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

    Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, ser revogada a douta decisão recorrida e substituída por outra em conformidade».

    6.

    O...

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