Acórdão nº 109/19 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Fevereiro de 2019

Data19 Fevereiro 2019
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 109/2019

Processo n.º 983-A/18

1.ª Secção

Relatora: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. Nos autos principais, foi apresentado por A. (o ora Requerente) um requerimento de abertura de instrução.

Nos autos, encontrava-se cópia do edital n.º 1031/2013, publicado no Diário da República, II Série, de 14/11/2013, pelo qual o Presidente do Conselho de Deontologia de Lisboa da Ordem dos Advogados fez saber que, por acórdão do Conselho de Deontologia de Lisboa, reunido em plenário em 24/01/2012, confirmado parcialmente por acórdão do Conselho Superior de 12/10/2012, transitado em julgado, foi aplicada ao ora Requerente a pena disciplinar de 5 anos de suspensão do exercício da advocacia, e que o arguido ficaria inibido do exercício profissional pelo prazo de quatro anos a partir de 22/10/2013, dia seguinte ao da data em que se devia ter por notificado da decisão administrativa, ali se clarificando que o mesmo advogado “esteve e estará, em consequência dos presentes autos e da pendência das diferentes providências cautelares instauradas, inibido do exercício da advocacia nos períodos de 09/07/2010 a 08/08/2010; de 19/10/2010 a 01/11/2010; 08/02/2011 a 21/12/2011 e de 22/10/2013 a 21/10/2017” (cfr. edital a fls.69)

Perante o teor do referido edital, o requerimento de abertura de instrução foi rejeitado, por despacho de 15/02/2017, proferido no Tribunal da Relação de Lisboa pelo senhor juiz desembargador Fernando Estrela, por o requerente não se encontrar representado por advogado e por não ter a qualidade de assistente (em momento anterior do processo, o ora Requerente havia pedido a sua constituição como assistente, a qual não foi admitida). Ali se considerou, designadamente, que o requerente se encontrava impedido do exercício da advocacia no momento em que requereu a sua constituição como assistente.

1.1. Notificado do mencionado despacho (de 15/02/2017), o Requerente suscitou um incidente de recusa do senhor juiz desembargador Fernando Estrela. Tal pretensão foi objeto de acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 04/07/2018, no qual se decidiu não tomar conhecimento do requerimento de recusa, por ilegitimidade do requerente, em virtude de não ter a qualidade de assistente no processo.

Na sequência desta decisão, o Requerente apresentou um requerimento, arguindo “irregularidades”, pendência do requerimento de constituição como assistente, omissão de atos processuais e falsidade de atos/documentos. Tal requerimento foi objeto de um despacho, proferido pelo senhor juiz conselheiro relator, datado de 31/07/2018, no sentido do não conhecimento do respetivo objeto, por se ter esgotado o poder jurisdicional relativamente ao incidente de recusa.

O Requerente apresentou, então, novo requerimento, no qual, inter alia, arguiu a nulidade do acórdão de 04/07/2018 e dele interpôs recurso para o Tribunal Constitucional.

1.1.1. No STJ, foi proferido acórdão, datado de 10/10/2018, indeferindo a requerimento de arguição de nulidade do acórdão de 04/07/2018. Notificado de tal decisão, o Requerente dela interpôs (novo) recurso para o Tribunal Constitucional (fls. 128/129).

O recurso foi admitido no STJ, com efeito suspensivo.

1.2. No Tribunal Constitucional, foi o processo distribuído à senhora Juíza Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros, cabendo-lhe o número 983/2018.

Pela senhora Juíza Conselheira relatora, foi proferido despacho liminar, datado de 21/11/2018, com o seguinte teor (fls. 137):

“[…]

Considerando que a decisão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de outubro de 2018, e ora recorrida, invocou a suspensão do exercício da profissão de advogado relativamente ao recorrente, tal como publicitada no Edital n.º 1031/2013, (DR, 2.ª Série, n.º 221, de 14 de novembro de 2013), e tendo em conta que, por força do disposto no artigo 83.º, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), é obrigatória a constituição de advogado, notifique o recorrente para, no prazo de 20 dias, constituir mandatário, nos termos do artigo 40.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 69.º da LTC, com a advertência de que, na sua inércia, terá lugar a cominação prevista no artigo 41.º do mesmo Código de Processo Civil.

[…]”.

1.3. Notificado de tal despacho, o Requerente deduziu um incidente de suspeição – que deu origem ao presente incidente –, invocando o seguinte (fls. 2/4) e juntando três documentos, que indicou no ponto IV.-4. do requerimento (fls. 5/9):

“[…]

[T]endo tido conhecimento de que o seu recurso de 22/10/2018 foi distribuído à Ex.ma Juíza Conselheira Dr.ª Maria de Fátima Mata-Mouros, contra ela deduz suspeição, ao abrigo do disposto no artigo 120.º, n.º 1, proémio, e alínea. g), de Código de Processo Civil (CPC), por ocorrer motivo, sério e grave. adequado a gerar desconfiança sabre a sua imparcialidade, designadamente inimizade grave da Recusada para com o Recorrente.

I – Autuação do presente requerimento

Por força do disposto no artigo 122.º, n.º 1, do CPC, o presente requerimento tem de ser autuado e concluso à Ex.ma Recusada apenas para Responder.

II – Questão prévia da competência para julgamento do presente incidente

Por força do disposto nos artigos 29.º, n.ºs 1 e 3, e 69.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), aplicaram ao presente requerimento o disposto no amigo 124.º do CPC. Mas a sua norma não permite a observância do disposto nos artigos 115.º, 116.º, 119.º e 120.º do mesmo código pelo Presidente do Tribunal Constitucional, no julgamento da suspeição deduzida contra qualquer dos Ex.mos Juízes do mesmo Tribunal.

Essa exclusão normativa ao escrutínio da imparcialidade infringe o estatuído nos artigos 203.º e 222.º, n.º 5, da Constituição. Pelo que, e por força do disposto no artigo 204.º da Constituição, aquela norma do artigo 124.º do CPC não pode ser aplicada em julgamento de incidente de suspeição.

Por força do disposto no artigo 10.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil, a norma aplicável é a do artigo 45.º, n.º 1, alínea. b), do Código de Processo Penal (CPP), com as necessárias adaptações.

III – Direito à imparcialidade estatuída no artigo 222.º, n.º 5, da Constituição

A imparcialidade garantida no artigo 222.º, n.º 5, da Constituição, encontra-se também consignada no seu artigo 203.º e no artigo 29.º, n.º 1, da LTC.

A imparcialidade exigida aos juízes no exercício da função jurisdicional do Estado constitui elemento essencial do Estado de Direito Democrático consignada no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), e o direito a ela tem a natureza dos consignadas nos seus amigos 16.º, n.º 2, 17.º e 18.º.

Pelo que, o exercício desse direito não pode ser restringida por preceito da lei ordinária, como resulta do n.º 3 daquele artigo 18.º, por inexistir preceito constitucional que preveja tal restrição.

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