Acórdão nº 1563/16.4T8AMT.P1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA OLINDA GARCIA
Data da Resolução29 de Janeiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO 1.

    AA, Ldª requereu, em 16.12.2016, Processo Especial de Revitalização Em 5.09.2017 foi proferida sentença que homologou o plano de revitalização da devedora/requerente AA, Lda.

    O credor BB, SA, não se conformou com tal decisão e interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, por entender ser nula a cláusula constante do Ponto 5, n. 4, do Plano de Recuperação, segundo a qual “Durante o prazo de execução do Plano, desde que não se verifique a ocorrência de algum incumprimento, os credores obrigam-se a não acionar os avalistas ou fiadores de qualquer uma das dívidas inseridas no Plano de Revitalização”. Tal cláusula violaria o art.217.º, n.º 4, do CIRE.

    2. O Tribunal da Relação do Porto entendeu que o objeto do recurso (delimitado pelos recorrentes nas conclusões das suas alegações) se consubstanciava numa única questão: saber se o ponto 4 da cláusula 5.ª do Plano de Recuperação enfermava de nulidade.

    Concluiu este tribunal que aquela cláusula, por contrariar norma imperativa, enfermava de nulidade, embora não contagiando a globalidade do negócio, face ao disposto no artigo 292.º do Código Civil. Acordou-se do seguinte modo: “I. Em declarar nulo o ponto 4, da cláusula 5.ª, do Plano de Recuperação, reduzindo-se o acordo aprovado em conformidade com a eliminação do referido ponto; II. Em revogar a sentença recorrida, apenas na parte em que homologa o referido ponto 4, da cláusula 5.ª; III. Em manter a decisão de homologação quanto ao Plano de Recuperação reduzido nos termos referidos em I”.

    1. Inconformado com tal decisão, a devedora/recorrida – AA – interpôs recurso para o STJ, tendo esse recurso sido qualificado como Revista Excecional. Nas alegações deste recurso, formulou a recorrente as seguintes conclusões: «1- A interpretação extensiva de uma qualquer norma jurídica tem, de acordo com o método jurídico, de se suster em argumentos que a suportem (v.g., a pari, a fortiori, a contrario, a coherentia, etcaetera); 2 - Não há qualquer elemento de teor histórico, teológico, sistemático ou literal que fundamente uma interpretação extensiva do art.217.º/4 do CIRE; 3 - Do mais, essa interpretação extensiva, analisada à lupa, reside numa série de falácias e argumentos de cariz prático duvidosos; 4 - O âmbito do perímetro normativo do art.217.º/4 do CIRE cinge-se, tão-só, à existência ou montante dos direitos de crédito — não incorporando no seu âmbito, por conseguinte, qualquer outro aspecto relativo ao seu conteúdo (v.g., prazo de exigibilidade); 5 - Tal entendimento alicerça-se em três razões: a) Teor literal da norma; b) Necessidade de protecção da posição dos garantes — já de si severamente afectada pelas alterações legislativas que ocorreram —, que eventuais interpretações extensivas (abusivas) atingem de forma intolerável (com a especial gravidade de prejudicar uma situação jurídica já por si extremamente débil); c) Absoluta ausência dos cânones da lógica e técnica jurídica que alicercem a interpretação extensiva; 6 - Uma cláusula inserida num PER que fixe uma moratória sujeita a uma condição resolutiva (consubstanciada no cumprimento daquele) para o accionamento do avalista garante da dívida não viola o teor do art. 217.º/4 do CIRE; 7 - In casu, não viola o dito comando normativo a cláusula com o seguinte teor: «Durante o prazo de execução do Plano, desde que não se verifique a ocorrência de algum incumprimento, os credores obrigam-se a não accionar os avalistas ou fiadores de qualquer uma das dívidas inseridas no Plano de Revitalização»; 8 - Consequentemente, a dita cláusula não faz activar a nulidade prevista no art. 294.º do Código Civil; 9 - O Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento versam sobre a mesma questão jurídica, encontrando-se em manifesta contradição quanto à interpretação e aplicação da mesma norma jurídica.

      10.º- O Acórdão recorrido, ao decidir como decidiu, violou o art. 217.º/4 do CIRE, por errada interpretação e aplicação, bem como o art. 294.º do Código Civil.

      Termos em que, e nos demais de Direito com o douto suprimento de Vossas Exas., deve: a)Ser o presente recurso recebido e julgado procedente; b) Consequentemente, ser o Acórdão recorrido revogado e, consequentemente, manter na íntegra a sentença homologatória do PER...

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