Acórdão nº 74/14.7GEPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelMARTINS SIM
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO Nos autos de processo comum, com intervenção do tribunal singular, com o n.º acima foram pronunciados os arguidos: JS e TJ ids. a fls.197, pela prática em co-autoria material, e na forma consumada, de um crime de introdução em lugar vedado ao público, previsto e punido no art. 191º do C.Penal.

Por decisão de 26 de Outubro de 2016, os arguidos foram absolvidos do crime pelo qual foram pronunciados, bem como do pedido de indemnização civil formulado.

Inconformados a assistente e o Ministério Público recorreram, tendo a primeira apresentado as seguintes conclusões: «1.O presente recurso vem interposto da sentença proferida em 19 de Outubro de 2016 que absolveu os Arguidos JS e TJ pela prática, em co-autoria e na forma consumada, de um crime de introdução em lugar vedado ao público, previsto e punido pelo artigo 191.º, do Código Penal, doravante designada por decisão recorrida.

2. A decisão recorrida absolveu os Arguidos JS e TJ pela prática, em co-autoria e na forma consumada, de um crime de introdução em lugar vedado ao público, previsto e punido pelo artigo 191.º, do Código Penal.

3. A decisão recorrida incorre no vício de manifesta contradição entre a matéria de facto e a matéria de Direito, de onde resulta uma contradição insanável entre os pressupostos e a fundamentação da decisão; 4. A decisão recorrida limita-se a não provar a existência de consciência da ilicitude, concluindo, em contradição, pela existência de um erro (certeza quanto à inexistência de consciência da ilicitude) não censurável; 5. De acordo com a douta argumentação da decisão recorrida, os Arguidos teriam agido em erro de valoração, pois estariam convencidos de que, apesar de não terem autorização da Assistente, teriam o direito legal, “constitucional” ou convencionalmente previsto a entrar e manter-se nas suas instalações para realizar actividade sindical; 6. Tudo porque estaríamos perante um caso de aplicação do princípio da subsidiariedade do direito penal, ou seja o direito laboral e sindical e seus valores sobrepõe-se ao direito penal e à sua tutela como foi o caso; 7. A que se aliava tudo revisto a insignificância penal do bem tutelado; 8. Ainda que se admitisse, o que não é o caso, a selecção da matéria de facto foi manifestamente insuficiente, face à prova efetivamente produzida, para construção da fundamentação de um erro não censurável sobre a ilicitude do facto e a uma insignificância penal; 9. Ainda que se aceitasse como suficiente e não contraditória a matéria de facto dado como provada, sempre se deveria concluir no sentido inverso ao decidido no que respeita à censurabilidade do erro, já que o comportamento dos Arguidos é e foi indiciador de uma posição de força perante tudo e todos, nomeadamente agentes de autoridade e força publica ou por outro lado a uma clara atitude provocatória perante a Assistente como que querendo dizer que tudo fazemos e tudo podemos fazer a coberto da interpretação da lei sindical ou que fazemos e não, como se conclui na decisão recorrida, de uma consciência e confiança na licitude do agir; 10. Ora a solução encontrada e espelhada na decisão recorrida é que não se consegue descortinar nem compreender, face ao estado de direito em que vivemos e com que nos regemos; 11. Na verdade não existem direitos de uns de Primeira e / ou direitos de outros de Segunda ou com um menor valor; 12.O direito e a sua aplicação é igual para todos independentemente de quem em cada momento se arroga de o fazer valer, como é o caso nos presentes autos; 13. Não podemos desvalorizar ou justificar as atitudes e decisões que cada um entende ter e praticar em determinado momento.

14. Não podemos tolerar que num estado de direito cada um de nós em determinado momento se permita a coberto de uma determinada atividade sindical interpretar a lei como melhor lhe convêm com recurso exclusivamente à sua leitura e interesse e não de qualquer tribunal e dessa forma violem a propriedade alheia, como foi o caso; 15. Tudo para afirmar na decisão recorrida que os Arguidos actuaram com conhecimento de que é ilícito manter-se em locais não destinados ao público, contra a vontade dos seus proprietários, mas que contudo, não conheciam que a sua conduta era proibida e punida por lei, pelo que se conclui que a sua actuação configura um erro sobre a ilicitude”, ora o tribunal incorre em manifesta contradição, admitindo simultaneamente que os Arguidos tinham e não tinham consciência do ilícito; 16. Termos em que deverá ser alterada a fundamentação constante da decisão recorrida, sendo a mesma substituída por outra que faça jus à matéria de facto dada como provada; 17. A decisão recorrida padece ainda de insuficiência da matéria de facto dada como provada para a boa decisão da causa e de erro notório na valoração da prova produzida e apreciação dos factos; 18. Tratando-se o erro de uma certeza errónea e tendo sido dado como provado que os Arguidos sabiam quais eram os procedimentos da Assistente e, consequentemente, o entendimento que a Assistente fazia das disposições legais aplicáveis ao caso, o que subsistiu nos Arguidos à data da prática dos factos não foi uma certeza errónea, mas, quanto muito, uma dúvida no que respeita ao âmbito e limites da atividade sindical de dirigentes sindicais não trabalhadores; 19. Resulta ainda da prova produzida em julgamento que os Arguidos não estavam em erro sobre as disposições legais aplicáveis, nem ocorreu qualquer falta de consciência de ilicitude ante o crime previsto no artigo 191.º do Código Penal; 20. Havendo antes e apenas uma discordância dos mesmos Arguidos face à lei aplicável, por entenderem que a lei deveria permitir-lhes o acesso incondicionado às instalações de qualquer empresa empregadora no ramo da respetiva atividade sindical, como era o caso da ora Recorrente; 21. Fazendo-se uma correcta e atenta análise e valoração da prova produzida em julgamento, deverá ser dado como provado o seguinte facto novo ponto 12 com o seguinte teor; “Os Arguidos agiram livre e com a perfeita consciência de que a sua conduta era proibida e punida por lei penal”.

22. Pois, foi dado como provado que “ 4. Os Arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, com a intenção concretizada de permanecer no corredor, junto à porta de serviço, existente no interior do referido estabelecimento, local vedado que sabiam não ser de livre acesso; 23. Bem como “ 5. Sabiam não ter autorização para permanecer nas referidas instalações após as 13h,30”; 24. Sendo, subsequentemente, alterada a decisão recorrida por uma que condene os Arguidos pela prática do crime de introdução em lugar vedado ao público nos termos do disposto no artigo 191.º do Código Penal; 25. A tudo acresce o facto de os Arguidos se terem revelado insensíveis às explicações que lhes foram dadas pelo representante da Assistente e pelos Agentes de Autoridade que estiveram a acompanhar a ocupação, cerca de duas horas; 26. A decisão recorrida incorre ainda num erro de princípio e fundamental ao esquecer ou confundir o estatuto e respetivos direitos e deveres da figura e estatuto do Delegado Sindical face à figura e estatuto do Dirigente Sindical. Ora no caso os Arguidos eram Dirigentes Sindicais, não tendo com a empresa qualquer relação laboral, facto pelo qual não o direito de fazer e usar a seu belo prazer as zonas que estão exclusivamente alocadas aos trabalhadores da empresa; 27. Face às várias e manifestas contradições presentes na fundamentação que nalguns casos não se encontra qualquer suporte legal ou outro, sendo meramente uma interpretação casuística do ocorrido, tudo ao arrepio do disposto no n.º 2 do artigo 374.º do Código de Processo Penal, deve a decisão recorrida ser revista, pronunciando-se o Tribunal ad aquem em sentido compatível com a matéria de facto provada, ou seja, dando como assente que os Arguidos actuaram com perfeita consciência da ilicitude da sua conduta; 28. O “erro” dos Arguidos é simples e não se encontra previsto em nenhum preceito legal, os Arguidos discordam da opção legal existente e recusaram-se a cumprir a lei fora das condições constitucionalmente toleráveis para a resistência à ordem de autoridade ou tutela privada de interesse legal.

29. Atendendo à nova factualidade provada, deve ser alterada a decisão recorrida por uma que condene os Arguidos pela prática do crime de introdução em lugar vedado ao público nos termos do disposto no artigo 191.º do Código Penal, podendo, quanto muito e no limite, ser aplicado aos Arguidos o disposto no n.º 2 do artigo 17.º do Código Penal; 30. Ainda que assim não se entenda, o que por mera cautela de patrocínio se admite, partindo apenas e estritamente da matéria que foi dada como provada na sentença recorrida subsiste em qualquer caso uma incorreta subsunção do Direito à matéria de facto, uma vez que nada na matéria de facto permite dar como provada essa leitura; 31. Não se alcança na decisão recorrida onde se obtiveram factos que permitam caraterizar o ocorrido como “insignificância penal”, ou mesmo a aplicação de “ cláusula de inadequação social”, ou que a recusa por parte dos Arguidos em abandonar as instalações da assistente, nas circunstâncias em que ocorreu, não lesou um bem Jurídico merecedor de tutela penal.

32. Pois, neste caso, os agentes tinham pleno conhecimento de todos os factos e circunstâncias que lhes permitiriam – caso não assumissem uma perspetiva censurável – ter formado corretamente a consciência da ilicitude; 33. Termos em que deverá ser alterada a decisão recorrida por uma que condene os Arguidos pela prática do crime de introdução em lugar vedado ao público nos termos do disposto no artigo 191.º do Código Penal, podendo, quanto muito e no limite, ser aplicado aos Arguidos o disposto no n.º 2 do artigo 17.º do Código Penal.

Nestes termos e nos mais de direito, que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser concedido integral provimento ao presente...

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