Acórdão nº 2159/10.0TBFAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução23 de Outubro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes na 2 Secção do Tribunal da Relação de Guimarães 1.Relatório. E.., residente em Fafe, intentou acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra o Banco .., S.A., pedindo que : a) fosse declarada e reconhecida a existência de união de facto entre si e o falecido S.., com início em 22 de Junho de 2006 até à data do seu falecimento, ocorrido em 17 de Dezembro de 2009 ; b) fosse o réu condenado a reconhecer tal união de facto ; c) como consequência do referido reconhecimento, fosse o Réu seja condenado a pagar-lhe uma pensão de sobrevivência por aplicação do regime geral ou de regime especial de segurança social do Réu, com início na data da morte do falecido S...

Para tanto, alegou em síntese que : - No dia 17 de Dezembro de 2009 faleceu S.., indivíduo com quem , a partir de 22 de Junho de 2006 e até a data da sua morte, viveu em comunhão de cama, mesa e habitação em condições análogas às dos cônjuges, sendo que, aquando do falecimento do S.., era ele funcionário do Réu , exercendo as funções de director adjunto; - Ora, porque viveu em união de facto com o falecido desde 22 de Junho de 2006 até à data do seu falecimento ocorrido em 17 de Dezembro de 2009, durante mais de dois anos, portanto, por aplicação da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, assiste à autora o direito à protecção social por aplicação do regime geral ou de regime especial de segurança social e, consequentemente, assiste-lhe o direito de beneficiai de uma pensão de sobrevivência, a ser-lhe concedido pela Ré, o que impetra.

1.1. - A ré contestou a acção , pugnando pela sua improcedência – no essencial por a pretensão deduzida pela autora carecer de fundamento legal pertinente – e, seguindo-se depois a Réplica e a Tréplica, prosseguiram os autos a sua tramitação normal ( com dispensa da audiência preliminar, despacho saneador e seleccionaram-se dos factos assentes e controvertidos ), vindo finalmente a realizar-se a audiência de discussão e julgamento dentro do formalismo legal, tendo no seu final sido proferida decisão sobre a matéria de facto controvertida, sem qualquer reclamação.

1.2.- Por fim, seguiu a prolação da sentença, sendo do seguinte teor o respectivo comando/segmento decisório : “ IV DECISÃO Em face do exposto, o Tribunal, julgando a acção não provada e improcedente, absolve o Réu Banco.., S.A. dos pedidos formulados pela Autora E...

Custas a cargo da Autora.

Registe e notifique.” 1.3.- Inconformada com tal sentença, da mesma apelou então a autora E.., apresentando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões: 1-Em 17 de Dezembro de 2009 faleceu S.., com última residência habitual na Praceta.., concelho de Fafe, no estado de divorciado de S...

2-A recorrente casou-se com o inditoso S.. em Maio de 1976, casamento que foi dissolvido por divórcio, decretado em 05 de Dezembro de 2002.

3-O S.. era funcionário da Instituição Bancária..

4-Em 22 de Junho de 2006, data do casamento do filho do casal N.., o falecido S.., reconciliando-se com a ora recorrente, regressou a casa de morada de família onde permaneceu até à sua morte em comunhão de cama, mesa e habitação em condições análogas às dos cônjuges.

5-Deu-se como provado na acção a existência de uma união de facto entre o falecido S.. e a ora recorrente.

6-Na acção que propôs contra o recorrido, a recorrente formulava os seguintes pedidos: a)Declarada e reconhecida a existência de união de facto entre a A. e o falecido S.., com início em 22 de Junho de 2006 e até à data do seu falecimento, ocorrido em 17 de Dezembro de 2009, há mais de dois anos, portanto.

  1. Condenada a Ré a reconhecer tal união de facto.

  2. Como consequência desse reconhecimento, deve a Ré ser condenada a pagar à A. uma pensão mensal de sobrevivência por aplicação do regime geral ou de regime especial se segurança social da Ré, com início à data da morte do falecido S..; d) Condenada, por último, a Ré em custas, condigna procuradoria e demais encargos legais; 7- Como razão de direito que servia de base à acção, invocou a recorrente o disposto no nº 1 do artigo 6º da Lei nº 7/2001 de 11 de Maio com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 23/2010 de 30 de Agosto.

    8- Não se questionando que os trabalhadores bancários gozam de um regime próprio de segurança social, corporizado nos instrumentos de regulamentação colectiva aplicável ao sector, regime privativo de segurança social.

    9- Não se pondo em causa também que o ACT aplicável não previa a concessão da pensão de sobrevivência nos casos de união de facto.

    10- Porem, a Lei 23/2010 de 30 de Agosto introduz alterações prevendo no seu artigo 6º que o membro sobrevivo da união facto beneficie dos direitos de protecção social na eventualidade da morte do beneficiário, por aplicação do regime geral ou de regimes especiais de segurança social.

    11- Lei que foi publicada na sequência da Lei nº 7/2001 de 11 de Maio, dando-lhe uma nova redacção.

    12- O instituto da união de facto, já previsto no artigo 2020º do Código Civil, tem sofrido alterações várias no sentido de conceder às pessoas que vivam ou viveram nessa situação direitos iguais ou semelhantes àqueles de que gozam os ligados entre si pelo casamento e a publicação daquela Lei é um grande passo nesse sentido.

    13- Acrescentou-se agora ao regime geral, também os regimes especiais de segurança social: as pessoas que vivem ou viveram em união de facto tem direito a protecção social em caso de morte do beneficiário, quer no regime geral de Segurança Social quer em qualquer regime especial, como o decorrente de ACTs celebrados no sector bancário.

    14- É certo que o inditoso S.. faleceu antes da entrada em vigor da Lei nº 23/2010.

    15- A jurisprudência do STJ tem-se dividido a propósito da aplicação, no tempo, daquela Lei.

    16- Na douta sentença de que ora se recorre é citada numerosa jurisprudência no sentido da aplicação imediata a casos ocorridos após a morte do beneficiário, indo, assim, ao encontro do pretendido pela recorrente, o que conduziria à procedência da acção.

    17- Inesperadamente, porem, a Mª Juiz a quo vem dizer, ver pag. 16, que o direito previsto no artigo 3º, nº 1, al. e) da Lei nº 7/2001, quer na redacção original, quer na posteriormente introduzida pela Lei nº 23/2010, reporta-se à protecção social na eventualidade de morte do beneficiário, por aplicação do regime geral ou de regimes especiais de segurança social e desse diploma.

    18-Para concluir, erradamente no entender da recorrente, que “o regime geral da segurança social não é aplicável e o regime especial não prevê tal direito”.

    19- Não adiantando a que regimes especiais se aplica, saindo frustrada a letra e o espírito daquela Lei por não ter campo de aplicação, o que não se aceita.

    20- As normas ordinárias que se referem aos direitos sociais dos cidadãos, como a pensão de sobrevivência, são normas de interesse e ordem públicas, sendo direito indisponível, Acórdão do S.T.J. de 03.05.07 e citado no artigo 11º da contestação.

    21- Ora, o ACT ou diplomas legais relativas ao regime de Segurança Social, nomeadamente quanto à concessão da pensão de sobrevivência, não podem contrariar, restringir ou ignorar as disposições de carácter imperativo.

    22- Pelo que, mesmo admitindo que o ACT aplicável não prevê a concessão da pensão de sobrevivência, nos casos de união de facto.

    23- Nem, por isso, poderia o recorrido eximir-se ao cumprimento do disposto no nº1 do artigo 6º da Lei nº 7/2001 de 11 de Maio, com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 23/2010 de 30 de Agosto.

    24- Parecendo à recorrente indiscutível que também no regime especial de segurança social – como o privativo do sector bancário decorrente do ACT publicado no BTE, nº 3 de 22.01 – as pessoas que vivem em união de facto tem direito a protecção na eventualidade da morte do beneficiário.

    25- A douta sentença de que ora se recorre, violou, alem do mais, o disposto no nº 1 do artigo 6º da Lei nº 7/2001 de 11 de Maio com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº 23/2010 que dispõe que o membro sobrevivo da união de facto beneficia dos direitos previstos na alínea e) do artigo 3º do mesmo Diploma, por aplicação do regime geral ou de regimes especiais da segurança social, sendo nula a sentença por violação do disposto nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 668º do Código Processo Civil.

    Pelo exposto e pelo que doutamente será suprido por Vª Exª, deverá revogar-se a sentença recorrida, julgando-se a acção procedente por provada.

    1.4.- Já o apelado, contra-alegando, impetra a manutenção da sentença recorrida, considerando-a “acertada”, concluindo para tanto que : - O direito previsto no artigo 3º, n.º 1, al. e) da Lei 7/2001 de 11 de Maio, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 23/2010 de 30 de Agosto, reporta-se à protecção social na eventualidade de morte do beneficiário, por aplicação do regime geral ou de regimes especiais de segurança social e desse mesmo diploma legal.

    - É certo que, de harmonia com o disposto no artigo 6º n.º 1 da Lei n.º 23/2010 de 30 de Agosto, o membro sobrevivo de união de facto beneficia nomeadamente do direito de protecção social na eventualidade de morte do beneficiário, por aplicação do Regime Geral de Segurança Social ou por aplicação de regimes especiais.

    - No entanto, Conforme douta fundamentação aduzida em sede de Sentença, não é aplicável ao presente caso o Regime Geral da Segurança Social, sendo que o regime especial aplicável (Acordo Colectivo de Trabalho acima melhor identificado) não prevê a concessão de uma pensão mensal de sobrevivência para o caso de uniões de facto.

    - E assim, conforme bem se refere na douta Sentença, se à Autora cabe algum direito a receber alguma pensão de sobrevivência, a obrigação que compõe tal sinalagma não é titulada pela Ré, mas porventura pelo Estado, absolvendo-se assim a Ré do peticionado.

    - Não merece qualquer censura a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo.

    - Nesse sentido, requer-se a V.Exas, Venerandos Desembargadores, seja negado provimento ao recurso interposto, confirmando-se a douta...

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