Acórdão nº 68/14.2TAAVV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução23 de Outubro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Penal, do Tribunal da Relação de Guimarães: 1 - RELATÓRIO Nestes autos de processo comum, por despacho proferido em 19/04/2016 ao abrigo do artigo 311.º do Código de Processo Penal (cfr. fls. 327 a 330), relativamente à acusação deduzida pelo assistente R. N.

e que foi acompanhada pelo Ministério Público: - Foi declarado extinto o procedimento criminal contra o arguido H. P.

, com fundamento em que o assistente não apresentou queixa contra o mesmo; - Foi rejeitada a acusação contra os arguidos M. L.

e F. P.

, com fundamento em que na queixa apresentada não foram alegados quaisquer factos eventualmente subsumíveis ao(s) crime(s) particular(es) imputados na acusação particular deduzida contra os mesmos arguidos, sendo, em consequência declarado extinto o procedimento criminal.

Ainda, tendo em conta o disposto n artigo 71.º do CPP, não se admitiu o pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente/demandante contra os arguidos/demandados H. P.

, M. L.

e F. P.

.

Inconformado com o assim decidido, o assistente interpôs recurso do despacho, apresentando a motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões: A) O Tribunal a quo inverteu por completo o preceituado nos artigos 115.º e 117.º do Código Penal, deles tendo feito uma interpretação errónea, no mais eclipsando totalmente o disposto no artigo 114.º daquele Código, fazendo tábua rasa da regra da extensão dos efeitos da queixa no caso de comparticipação criminal; B) Tendo a acusação particular definido o objecto do processo (pois não houve fase instrutória), dúvidas não restam que todos os arguidos a quem a acusação se dirigiu se encontram numa relação de comparticipação; C) Mais a mais, os indícios suficientes dessa comparticipação encontram-se totalmente espelhados na excelsa investigação levada a cabo pelos Órgãos de Policia Criminal, mui douta e diligentemente supervisionada e orientada pela Exma. Sr.ª Procuradora-Adjunta do DIAP de Arcos de Valdevez; D) Contrariamente ao propugnado no ponto 1) do despacho recorrido, a omissão de acusação dirigida ao arguido H. P. despoletaria, isso sim, a imediata extinção do procedimento criminal, por força do disposto no artigo 115.º, n.º 3, aplicável ex vi do artigo 117.º do CP, uma vez que a abstenção de acusar um dos comparticipantes aproveita os demais, encerrando assim aquele despacho uma contradição nos próprios termos; E) O apuramento de um novo sujeito comparticipante é o corolário natural do desenvolvimento da investigação criminal, sendo o mesmo identificado como arguido após prévia constituição como tal, e cuja posição processual é dada a conhecer ao assistente no despacho que encerra o inquérito, aí podendo este inteirar-se dos indícios que sobre aquele recaem (uma vez que o MP informa quais são esses indícios), para efeito de dedução da competente acusação particular; F) Sob o prisma de qualquer perspectivação quanto ao tempo em que o aqui recorrente tomou conhecimento dos factos, e independentemente da figura do crime continuado que só pode aceitar-se no enquadramento dos mesmos, tendo o aqui recorrente indicado na narração da factualidade incriminatória o início dos eventos a partir do dia 11 de Outubro de 2013, temos que, atento o dia em que a queixa foi apresentada na Secretaria do Tribunal, não pode nunca a mesma deixar de ser considerada tempestiva; G) Quanto à rejeição de acusação operada no ponto 2) do despacho recorrido, os respectivos fundamentos desvelam um exacerbado formalismo no concernente ao quantum hermenêutico mínimo que deverá constar da queixa e da acusação particular, entendimento este que viola o princípio constitucional do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva plasmado no artigo 20.º da CRP, representando de igual modo uma restrição interpretativa intolerável da teleologia imanente ao n.º 1 do artigo 246.º do Código de Processo Penal, toda ela imbuída de um desejável pragmatismo, para não dificultar o exercício do direito de queixa por parte dos cidadãos; H) Como é por demais consabido, não se exige uma homogeneidade absoluta quanto à factualidade expressa na queixa e na acusação particular; I) Da leitura integral do texto da queixa resulta um sentido interpretativo unívoco direccionado ao desejo de despoletamento de procedimento criminal contra o sujeito nela visada, reiterado no requerimento de constituição de assistente, acto processual que, de per se, vem confirmar a manifestação de vontade do aqui recorrente em reagir criminalmente contra o participado, o que deflui claramente do próprio cabeçalho do corpo de texto da redita queixa, que indicia claramente essa pretensão; J) O concreto circunstancialismo espácio-temporal do iter criminis e respectivo modo de execução do agente (consubstanciado na difusão via internet, através da famigerada rede social Facebook) vêm suficientemente explanados nos termos lavrados na minutada queixa, matéria incriminatória que é posteriormente revisitada na acusação particular, ainda que com particular desenvolvimento, fruto do expectável labor levado a cabo no exercício do mandato forense, mas sempre sem qualquer alteração quanto aos elementos essenciais de tempo, modo e lugar da factualidade incriminatória inserta na queixa; K) A única alteração relevante de um acto para o outro é a introdução de dois arguidos, consequência normal do resultado da investigação, aos quais a acusação pode outrossim ser direccionada com o beneplácito concedido pelo supradito artigo 114.º do CP; L) Os factos pelos quais são acusados os arguidos H. P. e F. P. são os constantes da queixa dirigida inicialmente ao arguido M. L., pois os textos em análise sobre os quais se debruça a acusação particular são precisamente aqueles que se encontram espelhados nos prints juntos à queixa e referidos na enunciação dos elementos documentais de prova do libelo acusatório (e parcialmente reproduzidos neste), não existindo qualquer inovação na factualidade a partir da qual se desencadeou o procedimento criminal.

Termina o assistente/recorrente pugnando para que o recurso seja julgado procedente e, em consequência, seja revogado o despacho recorrido, sendo proferido acórdão que determine a prossecução dos ulteriores termos do processo com vista ao agendamento da audiência de julgamento.

O recurso foi regularmente admitido, por despacho de fls. 373.

O Ministério Público, junto da 1ª Instância, não apresentou resposta ao recurso.

Os arguidos também não responderam ao recurso.

Neste Tribunal da Relação, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, a fls. 386 a 391 dos autos, nos termos que aqui se dão por reproduzidos, pronunciando-se no sentido de que o recurso deverá ser julgado procedente.

Foi dado cumprimento ao disposto no nº. 2 do artigo 417º do Código de Processo Penal, não tendo havido resposta.

Feito o exame preliminar, decidiu-se alterar o regime de subida e efeito fixados pelo Sr. Juiz a quo ao recurso, nos termos que se deixaram referidos no despacho que proferimos a fls. 182 e 183 dos autos principais.

Colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.

Cumpre agora apreciar e decidir: 2 – FUNDAMENTAÇÃO 2.1.

Delimitação do objeto do recurso É consabido que as conclusões formuladas pelo recorrente extraídas da motivação do recurso balizam ou delimitam o objeto deste último (cfr. artº. 412º do C.P.P.), sem prejuízo da apreciação das questões de natureza oficiosa.

Assim, no caso em análise, considerando os fundamentos do recurso, são duas as questões suscitadas: 1ª - A de saber se deve determinar a rejeição da acusação particular a circunstância de na queixa apresentada, o queixoso não identificar, desde logo, todos os suspeitos/arguidos, contra quem vem a deduzir a acusação; 2ª - A de saber se deve haver lugar à rejeição da acusação particular por os factos nesta descritos, imputados aos arguidos M. L. e F. P., não constarem da queixa apresentada; Para que possamos apreciar as questões suscitadas, importa ter presente o teor do despacho recorrido, que passamos a transcrever: 2.2.

Decisão recorrida «O processo está corretamente autuado como Processo Comum com intervenção do Tribunal Singular.

*O Tribunal é material, funcional e territorialmente competente.

O Ministério Público e o(a) assistente têm legitimidade para exercer a ação penal.

*Da rejeição da acusação particular 1) – Não recebo a acusação particular deduzida pelo assistente R. N.

a fls. 236 e segs., acompanhada pelo Ministério Público (cfr. fls. 294), contra o...

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