Acórdão nº 232/10.3GAEPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelANA TEIXEIRA E SILVA
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os juízes, em conferência, na Secção Criminal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO LEANDRO B... veio interpor recurso da sentença que pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artºs 203º, nº1, e 204º, nºs 1, al. a), e 2, al. e), do CP, o condenou na pena de 38 meses de prisão, suspensa condicionalmente por igual período de tempo.

O arguido expressa as seguintes conclusões: I. Afigura-se ao aqui Recorrente que, salvo o devido respeito, carece de fundamento de facto e de direito a douta sentença de fls. 136 e seguintes dos autos, que o condenou como autor material de um crime de furto qualificado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 13º, 1ª parte, 14º, n.º 1, 26º, 1, 202º, alíneas a) e d), 203º, n.º 1 e 204º, n.º 1, alínea a), n.º 2, alínea e) e n.º 3, todos do Código Penal, na pena de 38 (trinta e oito) meses de prisão; II. Encontra-se errada e incorrectamente julgada a matéria de facto dada como provada nos pontos 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 dos factos provados, a qual deveria antes ter sido dada como não provada porque assim o impunha a ausência de prova; III. Não foi produzida prova alguma que permita ao Tribunal a quo, com segurança e o mínimo grau de certeza, dar como provada e assente que o arguido, ora recorrente, foi um ou o autor do crime de furto; IV. Além da prova que resultou do depoimento da testemunha, que não presenciou os factos, desconhecendo quem foi o autor do crime dos autos – cfr. fundamentação da douta sentença condenatória aqui posto em crise –, o Tribunal a quo, para prova da autoria do crime formou a sua convicção exclusivamente no “relatório de inspecção lofoscópica” de fls. 6 e “relatório de apreciação técnica pericial” de fls.24; V. Ora, conforme resulta, conforme supra referido, da motivação do douto Acórdão, a única testemunha/ofendido ouvida em sede de audiência de julgamento, António Faria, não presenciou os factos, nem por qualquer outra forma, legalmente valorável, teve conhecimento de quem foi ou foram os autores dos factos em julgamento; VI. Acresce que, conforme este referiu foi a esposa que terá chegado primeiro ao local uma ou algumas horas depois dos factos, aqui em julgamento, terem alegadamente ocorrido – cfr douta motivação a fls. 143 dos autos – “Descreveu de forma descomprometida, objectiva, segura, linear, coerente e credível o que lhe foi dado observar quando chegou àquela habitação, pelas 18 horas e 30 minutos – a esposa terá chegado mais cedo, pelas 18 horas.”; VII. Esposa esta que não ouvida enquanto testemunha, não só para esclarecer o que presenciou quando chegou ao local, bem como, para, uma vez que o arguido estava presente, esclarecer se o conhecia, se com este travara conhecimento por qualquer forma ou se este teria tido ou lhe teria sido permitido o contacto ou manuseado duas caixas de relógio, onde vieram alegadamente a serem identificadas e submetidas a processo revelação de impressões digitais e uma palmar; VIII. Nem sequer a empregada doméstica foi também ouvida, podendo e devendo ser inquirida sobre eventual conhecimento do arguido e presença anterior deste naquela moradia em quaisquer circunstâncias que não a dos crimes dos autos, se com este travara conhecimento por qualquer forma ou se este teria tido ou lhe teria sido permitido o contacto ou manuseado duas caixas de relógio, onde vieram alegadamente a serem identificadas e submetidas a processo revelação de impressões digitais e uma palmar ; IX. Acresce que, existindo um único indicio e sendo o crime em julgamento um crime punido com pena de prisão, impunha-se um maior rigor e exigência na apreciação da prova uma vez que o Tribunal a quo não dispunha de qualquer outra prova que corroborasse e confirmasse a autoria do crime por parte do arguido, devendo procurar avaliar existência de qualquer daqueles vestígios digitais e palmar não excluindo ab initio qualquer hipótese para a sua produção, como o fez na realidade, vendo ou “enxergando” apenas a realidade que pretendeu “enxergar” ou ver, excluindo qualquer hipótese que não a produção daqueles vestígios nas circunstâncias de tempo, modo e lugar em que o crime dos autos ocorreu; X. Ora, os vestígios em causa por si, quanto muito, permitem afirmar apenas que o arguido LEANDRO B...tocou ou manuseou, num qualquer momento, duas caixas de relógio, as quais vieram a ser encontradas em cima de uma cama; XI. Acresce que as impressões digitais ou palmares tanto podem ser efémeras como perenes, dependendo das condições climatéricas a que estiveram sujeitas, da sua própria natureza e composição, para além da própria qualidade do vestígio, sendo certo que o Tribunal a quo não dispõe, nos autos, de qualquer elemento probatório ou meio de prova que permita datar o vestígio, sendo o relatório pericial absolutamente omisso nesta questão (para além de ser omisso na própria fundamentação); XII. Não pode, nem podia, consequentemente, o Tribunal a quo, sem qualquer outro meio de prova que corroborasse a pratica do crime, dar como provado que o aqui recorrente foi o autor do crime dos autos e que praticou os factos vertidos nos pontos 1 a 7 dos factos provados, os quais deveriam, de acordo com o que se vem de expender e de acordo com a ausência de prova, deveriam ter sido dados como não provada tendo o aqui arguido como agente do crime; XIII. Nos autos temos, com o máximo respeito que é devido, uma informação e relatório de apreciação técnica (cfr. fls. … dos autos), transvestida de relatório de inspecção e relatório pericial, de reduzido ou nulo valor probatório; XIV. Ora, conforme se pode constatar da leitura de documento de fls. 6 e particularmente de fls. 24, 34 e 35 dos autos, estes, apesar da designação que lhe pretendem atribuir de relatórios de apreciação técnica, não consubstanciam uma perícia nem um relatório pericial, uma vez que estes não obedece aos requisitos impostos pelo artigo 157º supra referido, uma vez que não fundamenta a sua resposta e conclusão de que o recorrente produzira aquele impressão revelada, não demonstrando uma realidade, vertendo apenas uma convicção; XV. Acresce que esse alegado relatório nem sequer esclarece quais os métodos empregues para se proceder ao processo identificativo, nem são juntas aos autos quaisquer fotografias do vestígio digital alegadamente identificado e respectivas ampliações, bem como, do dactilograma com ele coincidente, para que fosse possível proceder às necessárias confrontações utilizando as regras formuladas por Locard; XVI. Ou seja, na informação/relatório de fls. 34 e 35 dos autos a pessoa que a efectuou apenas se limitou a afirmar e concluir, conforme se transcreve na dou sentença – e o arguido suscitou a questão em sede de alegações – “…os vestígios enviados para tratamento apresentam valor identificativo. Feita a reprodução fotográfica dos vestígios, procedeu-se ao seu confronto com as impressões digitais e palmares existentes nos ficheiros desta Polícia tendo-se verificado que todos eles se identificam com os dedos e uma das palmas de LEANDRO B...”, sem qualquer fundamento que permita sindicar a bondade da sua conclusão e metodologia empregue, impossibilitando a avaliação e valoração desse juízo técnico ou científico por si produzido, numa clara e manifesta violação do disposto no artigo 157º do Código Processo Penal. Afirmam mas não fazem qualquer demonstração da realidade reportada; XVII. Estar, nesse alegado relatório pericial, afirmado que o vestígio recolhido foi produzido por um qualquer dedo do aqui recorrente ou palma da mão, vale tanto como se nesse relatório viesse afirmado, sem qualquer fundamento ou sem que se conheça a razão de ciência, que o vestígio recolhido fora produzido por um qualquer dedo do aqui signatário, ou por um qualquer dedo de qualquer dos sujeito processual que intervierem nos presentes autos ou ainda, com o devido respeito, e para mero efeito de raciocínio (todos estes exemplos ou hipóteses aqui colocadas), que foi produzido pelos Ilustres Desembargadores que venham a apreciar o presente recurso; XVIII. Pelo exposto, no caso sub judice, não estamos perante um relatório pericial, e por o não ser não poderá o mesmo ser valorado enquanto tal, nomeadamente nos termos e com os efeitos consignados no artigo 163º do Código Processo Penal, como veio erradamente a acontecer; XIX. Sem prescindir, e como muito bem se refere no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 25 de Janeiro de 2010, em que é relator o Ilustre Desembargador Cruz Bucho: “I – A importância e transcendência da dactiloscopia radica na circunstância de as impressões digitais serem universais, permanentes, singulares e inconfundíveis, indestrutíveis e mensuráveis. II – Em função daquelas características das impressões digitais, o valor probatório da perícia dactiloscópica deve ser encarado numa tripla perspectiva: III - A aparição de uma impressão digital de uma pessoa com o objecto onde foi detectada aquela impressão; IV - Se a impressão digital faz prova directa do contacto dessa pessoa com o objecto onde foi detectada aquela impressão ou que aquela pessoa esteve no local onde ela foi colhida, já não faz prova directa da participação do sujeito no facto criminoso (até porque aquele contacto com a coisa pode ser posterior à prática do crime ou meramente ocasional). V - Embora não faça prova directa da participação do sujeito no facto criminoso, a impressão digital pode ser encarada como um indício que, conjugado com outros indícios, pode fundamentar uma decisão condenatória.”; XX. Ora, no caso em apreço, não existe para além do alegado relatório pericial – que como supra se referiu não poderá ser valorado enquanto prova pericial e as suas conclusões não têm qualquer valor enquanto juízo técnico ou científico – qualquer outra prova ou indício que possa de forma razoável e de acordo com as regras da experiência atribuir a autoria dos factos ao ora recorrente, porque, se as impressões digitais ou palmar podem fazer – sem prescindir o supra referido –...

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