Acórdão nº 151/14.4TTVRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelS
Data da Resolução02 de Junho de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Guimarães.

I.

  1. Sinistrado, designado por A. (autor): B ….

    Responsáveis civis (também designados por RR. de réus): C. Insurance (recorrente); D. (empregador).

    O sinistrado demandou os RR. alegando que é trabalhador agrícola à jeira, admitido pelo R. D. para cortar lenha com motosserra e arrumá-la mediante a contrapartida de € 40,00/dia de trabalho. No dia 21/08/2013, cerca das 11h00 horas, quando se encontrava ao serviço do empregador, o A. cortou-se com a motosserra no indicador da mão esquerda, sofrendo várias lesões as quais lhe determinaram a IPP de 5,92%, tendo tido alta clínica em 09/04/2014. A pensão anual e vitalícia a estabelecer deverá atender à remuneração diária de € 51,05 que consta do contrato de seguro celebrado entre os RR., titulado pela apólice nº 4716869. Os RR. devem ser condenados a pagar as diferenças não liquidadas relativas aos períodos de ITA e de ITP fixados e no valor de € 90,00 a título de indemnização pelas despesas suportadas pelo sinistrado com deslocações e alimentação. No auto de não conciliação as demandadas não se conciliaram dado que o empregador alegou ter transferido para a R. seguradora o risco decorrente dum salário até € 51,05 x 30 dias x 14 meses, não aceitando a demandada seguradora este montante salarial, mas apenas a transferência dum salário correspondente a € 485,00 x 14 meses. Termina pedindo a condenação dos RR. no pagamento das quantias peticionadas, de acordo com o valor da remuneração que se considere ser de estabelecer como transferida pelo contrato de seguro celebrado entre as mesmas demandadas.

    A R. seguradora alegou que o A. havia sido contratado para trabalho rural, com cariz sazonal e de curta duração por ano, tendo o sinistrado auferido aquando do acidente € 40,00 porque se encontrava nesse dia a trabalhar, pelo que deverá haver lugar à aplicação do disposto no art. 71º nº 4 da Lei nº 98/2009 de 04/09. Aceita a caracterização do acidente como sendo de trabalho e o nexo causal entre o mesmo e as lesões verificadas no sinistrado, mas considera que a retribuição média mensal garantida era a que correspondia a € 485,00 x 14 meses. À data do infortunio o A. não usava qualquer meio de segurança individual, como arnês ou cinto e linha de vida, pelo que estas omissões deverão ser imputáveis à R. entidade patronal.

    O empregador contestou pedindo a absolvição dos pedidos formulados pelo A., já que transferiu a responsabilidade infortunística para a R. seguradora, até ao limite máximo de € 51,05/dia, dado que a retribuição aos trabalhadores agrícolas depende das tarefas de que são incumbidos.

    * Efetuado o saneamento e a condensação foi efetuado o julgamento, tendo o Tribunal a final julgado: (...) procedente por provada a presente acção e em consequência, condenam-se as aqui demandadas nos seguintes termos: - A R. C. INSURANCE, S.A. a pagar ao A. o valor a título de ITA de 197 dias, diferença entre o valor liquidado (€ 2.565,32) e o valor devido (€ 6.347,53) que ascende a € 3.782,21 (três mil setecentos e oitenta e dois euros e vinte e um cêntimos) – cfr. doc. de fls. 18 e de ITP, a 30% de 34 dias, diferença entre o valor liquidado (€ 132,62) e o valor devido (€ 328,66) que ascende a € 195,84 (cento e noventa e cinco euros e oitenta e quatro cêntimos) – cfr. doc. de fls. 18.

    - Mais se condena a mesma demandada no pagamento ao A. de pensão anual e vitalícia, no valor de € 696,19 (seiscentos e noventa e seis euros e dezanove cêntimos), a que acresce a quantia de € 90,00 a título de ressarcimento do valor despendido a título de deslocações.

    A estas quantias acrescem os respectivos juros de mora vencidos desde o dia seguinte ao da alta, à taxa legal, bem como os vincendos até integral pagamento.

    * B) A R. seguradora não se conformou e recorreu, formulando estas conclusões: 1 - O 1º Réu (D.) na qualidade de tomador de seguro celebrou com a 2ª Ré Seguradora (aqui recorrente) um contrato de acidente de trabalho para trabalhadores agrícolas, de cuja a respectiva apólice (nos autos a fls…) consta: “… APÓLICE RAMO: 0100 Acidentes de Trabalho – Trabalhadores Agrícolas Retribuição (Cond. Gerais Apólice) Natureza de Trabalhos: Seguro Genérico Riscos Cobertos Valores Limite Euro Cobertura Legal 2.042,12 Quadro de Pessoal Retribuição Salário 2 Homens S/Nome mensal 51,05 …” 2 - Todavia, e conforme se retira da Motivação de Facto, da acta de audiência de julgamento (fls. …) e das cláusulas gerais relativas ao contrato de seguro celebrado entre a recorrente e o 1º Réu, e ainda da declaração do mediador que em representação da aqui recorrente veio ratificar o valor da remuneração constante daquele contrato, o valor expresso do salário máximo transferido (51,05) é por dia e não mensal – cfr. doc.s de fls. 47 a 59, fls. 119, e fls. 140 dos presentes autos.

    3 - Não obstante ser este o verdadeiro conteúdo do contrato de acidentes de trabalho sub judice, a douta sentença agora em recurso, refere: “… Ora, de acordo com a factualidade que após a discussão da causa verifica-se que resultou demonstrado que o A. auferia um vencimento de € 40,00 x 30 x 14, o que totaliza uma retribuição anual de € 16.800,00 (dezasseis mil e oitocentos euros). Ficou ainda demonstrado que este montante total se encontra totalmente contido no valor máximo de remuneração diária estabelecido no contrato de seguro celebrado entre os RR., já que pela apólice de seguro que o titula o R. empregador transferiu a sua responsabilidade infortunística até ao salário diário de € 51,05 para trabalhadores masculinos. … “ 4 - Não resultou demonstrado, nem consta da matéria de facto provada que, “o A. auferia um vencimento de € 40,00 x 30 x 14, o que totaliza uma retribuição anual de € 16.800,00 (dezasseis mil e oitocentos euros).” 5 - Resulta dos factos dados por provados, apenas, que o autor auferia a remuneração de € 40,00 por cada dia de trabalho.

    6 - Não resultou demonstrado que o A. trabalhava durante todos os dias do mês para a entidade patronal 1º Réu (D.), ou sequer durante todo o ano.

    7 - E, tal nunca ficou demonstrado porque o A. era um trabalhador agrícola à jeira, trabalhava apenas uns dias, durante um ano, conforme admitido pelo próprio A., no art. 2º da PI., o corte de lenha é reconhecidamente um labor de cariz sazonal e de curta duração por ano.

    8 - Em consequência, e uma vez que a Sentença não apreciou devidamente a questão “ sub judice “, entende a recorrente que a sentença é nula nos termos do disposto no nº 1 das alíneas c) e d) do artigo 615º do Código de Processo Civil, nulidade que desde já se invoca.

    9 - A douta sentença recorrida, embora dê como provados, entre outros, os seguintes factos: “… - O R. D. contratou os serviços do A. para cortar lenha com motosserra e arrumá-la pagando em contrapartida ao A. o valor de € 40,00 por cada dia de trabalho.

    … - À data do acidente o R. D. tinha transferido a sua responsabilidade infortunística para a R. seguradora mediante contrato de seguro de acidentes de trabalho titulado pela apólice nº 4716869.

    … - O contrato de seguro celebrado entre os RR. é um seguro agrícola genérico, o qual teve início em 31/10/2008.

    - Este contrato de seguro abrange o salário de € 51,05/dia por trabalhador.

    … “ (bold da recorrente) 10 - A sentença em recurso limita-se a caracterizar, erroneamente, a situação dos autos como contrato de trabalho a tempo parcial.

    11 - A ratio legis do artº 150º do Cód. do Trabalho (Trabalho a Tempo Parcial), não inclui, nem pretende incluir na letra ou no seu espírito, a situação dos autos: 12 - O trabalhador que foi contratado para cortar lenha e arrumá-la, apenas uns dias, durante um ano, não pode ser, razoavelmente, considerado um trabalhador a tempo parcial.

    13 - Neste sentido, Pedro Romano Martinez, 2015, 7ª Edição, Direito do Trabalho: “…O trabalho a tempo parcial, por vezes, designado part-time, constitui um regime laboral comum, sem uma natureza jurídica diversa do contrato em que o trabalhador se obriga a prestar a actividade a tempo inteiro, …” “II. Apesar de consubstanciar uma relação laboral sujeita ao regime comum, em que o trabalhador tem um período normal de trabalho inferior ao que é habitualmente praticado na empresa, importa atender às particularidades que decorrem dos arts. 150º e ss. do CT.

    Considera-se trabalho a tempo parcial o que corresponda a um período...

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