Acórdão nº 801/14.2GBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelMANUELA PAUP
Data da Resolução11 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: · Relatório Nestes autos de processo comum com o número acima identificado que se encontravam a correr termos pela Instância Local da Secção Criminal de Guimarães, Comarca de Braga (J2) foi rejeitada, por manifestamente infundada, a acusação deduzida pelo Ministério Público contra o arguido João M..

Inconformado com esta decisão dela veio o Ministério Público interpor o presente recurso, fazendo com os argumentos que constam de folhas 62 a 70 que agora aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os legais efeitos e que sintetiza nas conclusões seguintes: (transcrição) «1) Na sequência da acusação deduzida pelo Ministério Público contra o arguido João M. pela prática de um crime de ameaça, p. e p. pelos artigos 153.°n.°1 e 155.° n.° 1 ai. a), ambos do Código Penal, o Mmo. Juiz à quo, entendendo que a mesma era manifestamente infundada uma vez que os factos nela descritos não constituem crime, nos termos do artigo 311°, n.° 2, ai. a) e n.° 3 al. d) do CPP, rejeitou-a e determinou o arquivamento dos autos.

2) No despacho de que ora se recorre, o Mmo Juiz considerou que os factos descritos na acusação não configuram um crime de ameaça, porquanto no entendimento do mesmo estamos perante um mal iminente e não futuro.

3) Ora, com o devido respeito, entendemos que os factos descritos na acusação configuram a prática pelo arguido de um crime de ameaça, comportando todos os elementos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena e que preenchem todos os elementos do respectivo tipo, designadamente, o de estarmos perante um mal futuro.

4) Das expressões proferidas pelo arguido nas circunstâncias descritas na acusação - que aqui se dão como reproduzidas - não se infere que se esteja perante um acto de violência iminente, uma vez que da análise das mesmas apenas se extrai como imediata e iminente a intenção de o arguido produzir medo no ofendido e de perturbar a sua paz individual; 5) O homem médio comum, se confrontado com os factos em análise, sentiria medo, nesse momento e no futuro, e veria prejudicada a sua liberdade de movimentos e a sua paz individual, ou seja, os factos indiciariamente praticados pelo arguído são adequados a provocar medo, inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação.

6) Os factos descritos na acusação integram apenas um crime de ameaça e não a “tentativa de execução do respectivo acto violento” (ou, dito de outro modo, a tentativa de homicídio).

7) Acresce que, mesmo a considerar-se que estaríamos perante um mal iminente, não poderia o Mmo Juiz à quo rejeitar a acusação como fez.

8) Com efeito, são diversos os acórdãos que consideram o mal iminente ainda susceptível de configurar a prática de um crime de ameaça, porque futuro.

9) Assim, sendo controversa a questão jurídica em análise o Mmo Juiz à quo não poderia com base na mesma, tomando logo partido por uma das várias posições defendidas pela jurisprudência, rejeitar a acusação, considerando-a manifestamente infundada.

10) Tal posição apenas poderia ser tomada em julgamento, momento em que lhe é pedido que faça tal ponderação.

11) Uma decisão de rejeição de uma acusação apenas pode incidir sobre as situações em que os factos constantes da mesma não constituem crime de forma inequívoca.

12) Concluíndo, testa dizer que a acusação deduzida nos autos contém todos os elementos típicos (objectivos e subjectivos) do crime de ameaça p. e p. e p. pelos artigos 153°, n°s 1, e 155.° n°1 aI. a) do Código Penal imputado ao arguido; 13) Em conformidade com o explanado, discorda-se inteiramente com o despacho recorrido, que violou, designadamente, o disposto nos art.° 153°, n°s 1, e 155.° n.°1 ai. a) do Código Penal e o artigo 311°, n.° 2, ai. a) e n.° 3, ai. d), do do Código de Processo Penal.» Na 1ª instância não houve resposta ao recurso interposto.

Neste tribunal a Digna Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, nos termos que constam de folhas 96 a 98 dos autos, concluindo pelo provimento do recurso.

Cumprido o preceituado no artigo 417º número 2 do Código de Processo Penal, nada veio a ser acrescentado no processo.

Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos a conferência.

Nada obsta ao conhecimento do mérito.

· Fundamentação Tem o seguinte teor a decisão recorrida: (transcrição) «1. O Ministério Público deduziu acusação contra João M., imputando-lhe a prática de factos que entende serem susceptíveis de integrar um crime de ameaça p. e p. pelos art.º 153º e 155º, nº 1, al. a) do C.P..

  1. Nos termos do disposto no art.º 311º, n.º 2, al. a) do C.P.P., se o processo tiver sido remetido para julgamento sem ter havido instrução, o presidente despacha no sentido de rejeitar a acusação, se a considerar manifestamente infundada.

    Para efeitos do disposto naquele preceito, considera-se a acusação manifestamente infundada se, entre outras circunstâncias, os factos nela descritos não constituírem crime ( art.º 311º, n.º 3, al. d ) do C.P.P. ).

  2. Isto posto, vejamos os factos cuja prática é imputada ao arguido.

    Concretamente, o Ministério Público alega, além do mais, que no dia 20/12/2014, o arguido dirigindo-se a Carla V. e Elisabete A., disse “eu vou foder-vos a todos, eu tenho uma arma no carro, vou buscá-la e vou matar-vos a todos.

    Estes, os factos que o Ministério Público entende serem suficientes para integrar a prática do ilícito criminal que imputa ao arguido.

  3. Cumpre apreciar: Segundo resulta da respectiva previsão típica, “quem ameaçar outra pessoa com a prática de crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.” (itálico nosso) A ameaça é um crime contra a liberdade pessoal (Título I, Cap. V, da parte especial do Cód. Penal). O bem jurídico protegido é a liberdade de decisão e de acção “As ameaças, ao provocarem um sentimento de insegurança, intranquilidade ou...

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