Acórdão nº 250/17 de Tribunal Constitucional (Port, 24 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Claudio Monteiro
Data da Resolução24 de Maio de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

Acórdão n.º 250/2017[1]

Processo 156/2016

1.ª Secção

Relator: Claudio Monteiro

(Conselheiro João Pedro Caupers)

.

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), em que é Recorrente A., S.A. e é Recorrida a Autoridade Tributária e Aduaneira, o primeiro apresentou pedido de pronúncia arbitral, no qual peticionou a declaração de ilegalidade dos atos de liquidação do Imposto do Selo do ano de 2014, emitidos pela recorrida, a que correspondem os documentos com o n.º 2015003483742, n.º 2015003483743, n.º 2015003483744, n.º 2015003473403, n.º 2015003473404 e n.º 2015003473405, nos montantes de € 4.556,20, € 4.556,20, € 4.556,20, € 3.175,48, € 3.175,46 e € 3.175,46, respetivamente, por entender que deveria ser desaplicada, no caso concreto, a verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, por a mesma enfermar de inconstitucionalidade, por violar o princípio constitucional da igualdade.

2. Em 24 de dezembro de 2015, decidiu o tribunal arbitral julgar improcedente o pedido de pronúncia arbitral e absolver a Autoridade Tributária do pedido. Considerou-se, em relação à questão de inconstitucionalidade suscitada, ser de aplicar in casu o juízo de não inconstitucionalidade formulado no Acórdão n.º 590/2015, do Tribunal Constitucional (disponível em www.tribunalconstitucional.pt) (cfr. fls. 10 a 16).

3. É desta decisão que se recorre para o Tribunal Constitucional. O recurso de constitucionalidade vem interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC) e pede-se a este Tribunal que aprecie a conformidade da norma da verba n.º 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS), na redação introduzida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, e alterada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, que impõe a tributação anual sobre a propriedade de prédio habitacional ou de terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, cujo valor patrimonial tributário seja igual ou superior a €1000.000,00, com os “os princípios constitucionais conformadores da lei tributária, em especial, os princípios da legalidade e igualdade” (cfr. fls. 3 a 4).

4. Já neste Tribunal as partes vieram produzir as suas alegações e contra-alegações.

4.1. O Recorrente concluiu nos seguintes termos (cfr. fls. 140 a 153):

«I. Vem o presente recurso interposto da decisão proferida pelo Tribunal Arbitral a quo, na qual foi decidido que “a norma em causa [verba 28.1 da TGIS] não enferma de nenhuma inconstitucionalidade, inexistindo qualquer violação dos princípios constitucionais conformadores da lei fiscal, especificadamente, dos princípios da igualdade fiscal, da capacidade contributiva e da proporcionalidade. Razão pela qual, improcede o pedido da Requerente” e, como tal, “decide julgar-se improcedente o pedido de pronúncia arbitral, absolvendo-se a AT do pedido”.

II. Estando em desacordo com o conteúdo da Decisão Recorrida, vem o Recorrente apresentar as suas Alegações, pretendendo que seja ordenada a reforma da Decisão Recorrida com fundamento na inconstitucionalidade da verba 28.1 da TGIS quando aplicada a “terrenos para construção” e que, em consequência, seja determinada a anulação dos atos tributários de liquidações de Imposto do Selo, porquanto emitidos ao abrigo de uma norma manifestamente inconstitucional.

III. A norma cuja inconstitucionalidade foi arguida nestes autos consta da verba 28.1 da TGIS, introduzida pelo artigo 4.º da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de outubro, e determina a tributação de “terreno para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI”.

IV. Na Decisão Recorrida, o Tribunal Arbitral a quo aderiu integralmente ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 590/2015, de 11 de novembro de 2015 (Processo n.º 542/14), nos seguintes termos: “Sobre esta matéria, importa, antes de mais, ter presente o teor do acórdão do Tribunal Constitucional n.º 590/2015, Processo n.º 542/14, de 11 de novembro de 2015, precisamente, sobre a questão da inconstitucionalidade da Verba 28 da Tabela Geral (...), em concreto a violação dos princípios da igualdade tributária, capacidade contributiva e da proporcionalidade. Trata-se de jurisprudência que também aqui se acolhe, por com ela concordarmos integralmente (…)”

V. Tendo decidido o Tribunal a quo, com fundamento (único) na jurisprudência mencionada: somos levados a concluir que a norma em causa não enferma de nenhuma inconstitucionalidade, inexistindo qualquer violação dos princípios constitucionais conformadores da lei fiscal, especificamente, dos princípios da igualdade fiscal, da capacidade contributiva e da proporcionalidade. Razão pela qual, improcede o pedido da Requerente”.

VI. É aquela a norma em causa no presente Recurso e que o Recorrente reputa como inconstitucional por violação manifesta dos princípios constitucionais da igualdade e da capacidade contributiva, previstos no artigo 13.º e 104.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, bem como o princípio da dupla tributação jurídica.

VII. Desde logo, importa esclarecer que a situação de facto em causa no processo decidido pelo Tribunal Constitucional (a que o Tribunal a quo aderiu) e a argumentação de Direito expendida naquele Douto Acórdão, não poderiam ter sido transpostos na Decisão Recorrida.

VIII. De facto, aquela douta jurisprudência constitucional respeita à apreciação da inconstitucionalidade da norma quando aplicada a “prédios habitacionais” – e não quando aplicada a “terrenos para construção”, como os prédios em análise na Decisão Recorrida.

IX. Estava ali em causa a aplicação da verba 28.1 da TGIS a “prédios habitacionais”, situação manifestamente distinta da situação em apreço nos autos recorridos, i.e. a tributação de “terrenos para construção, cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação”.

X. E, necessariamente, os argumentos de direito escalpelizados naquele Acórdão (e transcritos pelo Tribunal a quo) não coincidem com a argumentação expendida pelo Requerente (ora Recorrente) e contraposta pela Autoridade Tributária e Aduaneira nos autos recorridos.

XI. O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, traduz a proibição de quaisquer discriminações no tratamento de situações iguais (dimensão igualizadora) e a admissão da desigualdade de tratamento de situações desiguais (dimensão diferenciadora).

XII. No domínio fiscal, o princípio da igualdade materializa-se enquanto “igualdade na lei”, traduzindo-se na “ideia de generalidade ou universalidade, nos termos da qual todos os cidadãos se encontram adstritos ao cumprimento do dever de pagar impostos, e da uniformidade, a exigir que semelhante dever seja aferido por um mesmo critério o critério da capacidade contributiva. Este implica assim igual imposto para os que dispõem de igual capacidade contributiva (igualdade horizontal) e diferente imposto (em termos qualitativos ou quantitativos) para os que dispõem de diferente capacidade contributiva na proporção desta diferença (igualdade vertical)”.

XIII. Este princípio da igualdade surge, desde logo, no artigo 5.º da LGT e, bem assim, a ideia base da capacidade contributiva surge reforçada ainda no artigo 55.º da LGT, como parâmetro da atividade da Autoridade Tributária e Aduaneira, vinculada à necessidade de exercer as suas atribuições na prossecução do interesse público, de acordo com os princípios da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da celeridade, no respeito pelas garantias dos contribuintes.

XIV. Em especial, em matéria de tributação do património, a Constituição da República Portuguesa prevê, no artigo 104.º, n.º 3, a regra essencial de que “a tributação do património deve contribuir para a igualdade entre os cidadãos”.

XV. Sendo que, “a capacidade contributiva não significa só um pressuposto, mas também uma medida. Assente que todos devem contribuir se tiverem capacidade contributiva, deve ir-se mais longe: contribuirão na medida da sua capacidade contributiva, sendo necessário que, no fim, cada um suporte a carga tributária em termos de igualdade, generalidade e em atenção só à sua capacidade económica”.

XVI. Está assim constitucionalmente vedada ao legislador ordinário a criação de normas de modo arbitrário, devendo as mesmas ser submetidas aos ditames de igualação e de discriminação positiva.

XVII. A tributação especial resultante da aplicação da verba 28.1 da TGIS a “terrenos para construção” promove um tratamento diferenciado e uma desigualdade injustificada entre os diferentes sujeitos passivos, em manifesta violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e do princípio da igualdade fiscal e da capacidade contributiva, consagrados no artigo 104.º, n.º 3 do mesmo diploma.

i. Do facto tributário: a tributação assenta numa “expectativa de afetação”.

XVIII. O facto tributário relevante para aplicação da verba 28.1 da TGIS assenta na titularidade de um direito real – “propriedade, usufruto ou direito de superfície” – sobre um “terreno para construção”, com um VPT superior a € 1.000.000,00, cuja “edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação”.

XIX. O facto tributário gerador do Imposto do Selo é assim constituído por três pressupostos cumulativos: a titularidade do direito real sobre o “terreno para construção”, o VPT do terreno e uma “edificação, autorizada ou prevista”, para habitação.

XX. Esta tributação assenta, deste modo, numa mera “expectativa de afetação”, i.e. na existência de uma “autorização” ou de uma “previsão” de que o terreno em causa venha a ser...

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