Acórdão nº 607/18 de Tribunal Constitucional (Port, 14 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução14 de Novembro de 2018
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 607/2018

3.ª Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), em que é reclamante A. e reclamado SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, o primeiro interpôs recurso para o Tribunal Constitucional e, não tendo o mesmo sido admitido por decisão do TCAS, vem apresentar reclamação ao abrigo do artigo 76.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, adiante denominada pela sigla «LTC»).

2. O requerimento de interposição de recurso para este Tribunal tem o seguinte teor:

«A., autor nos autos à margem identificados, vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, al. b) da Lei do Tribunal Constitucional.

O autor pretende que seja apreciada a inconstitucionalidade do artigo 24.º, n.º 5, alínea a) da Lei n.º 34/2004, quando interpretado no sentido de que o prazo interrompido por aplicação do n.º 4 do mesmo artigo se inicia com a notificação ao patrono nomeado da sua designação, quando o requerente do apoio judiciário desconheça essa nomeação, por dela ainda não ter sido notificado, por violação do artigo 20.º, n.os 1 e 4 da CRP, questão suscitada aquando da reclamação para a conferência.»

3. Por despacho de 11 de julho de 2018 o recurso não foi admitido com os seguintes fundamentos:

«Ora, o preceito invocado pelo recorrente, na interpretação por si tida por inconstitucional, não constituiu fundamento normativo ou ratio decidendi do referido acórdão de 14.6.2018, pois aí se considerou que o recurso era intempestivo, tendo em conta que, face ao disposto nomeadamente no art. 24º nº 5, al. a), da Lei 34/2004, de 29/7, na redacção da Lei 47/2007, de 28/8, o prazo de 15 dias para a interposição de recurso se contava a partir da notificação ao novo patrono nomeado (Dr. B.) da sua designação, nunca aí se tendo afirmado que o prazo de 15 dias para a interposição de recurso se contava a partir da notificação ao novo patrono nomeado da sua designação, apesar de o recorrente ainda não ter sido notificado dessa nomeação, pois o recorrente nunca alegou tal facto – isto é, nunca alegou que não foi notificado da nomeação do Dr. B. como seu defensor –, em tempo oportuno, nem posteriormente.

Do exposto decorre que a questão de constitucionalidade suscitada não constituiu a ratio decidendi do acórdão recorrido de 14.6.2018, pois tal acórdão não interpretou o art. 24.º n.º 5, al. a), da Lei n.º 34/2004, no sentido propugnado pelo recorrente, pelo que um eventual julgamento de inconstitucionalidade não produziria qualquer efeito útil no caso, uma vez que o acórdão recorrido se manteria.»

4. Inconformado o reclamante, reagiu ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4 da LTC, nos termos seguintes:

«A., autor nos autos à margem identificados, vem reclamar para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 76° n° 4 da Lei do Tribunal Constitucional, com os fundamentos seguintes:

1. O acórdão recorrido aplicou o artigo 24°, n.º 5, alínea a), da Lei n° 34/2004, e aplicou-o no sentido julgado inconstitucional pelo acórdão do TC n° 461/2016, de 13-10.

2. Efectivamente, o recorrente alegou que não foi notificado da nomeação, quer na resposta à questão da intempestividade do recurso, quer na reclamação para a conferência.

3. Assim, deve a presente reclamação ser deferida em razão de ter sido aplicada norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo.».

5. O representante do Ministério Público pronunciou-se no sentido de deferir a presente reclamação, nos seguintes termos:

«1. Nos autos, a que respeita a presente reclamação por não admissão de recurso, A. intentou, no TAC de Lisboa, acção administrativa, tramitada como intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, contra o Ministério da Administração Interna (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras – SEF), na qual peticionou a anulação do despacho da Directora Nacional do SEF, de 24 de Março de 2017, que lhe recusou a concessão de protecção internacional, bem como a concessão da requerida protecção internacional ou, em alternativa, conceder-lhe protecção subsidiária com fundamento em razões humanitárias.

2. Por sentença, de 29 de Setembro de 2017, do referido tribunal, foi a acção julgada improcedente e, em consequência, absolvido o réu dos pedidos.

3. Inconformado, o autor interpôs recurso jurisdicional, dessa sentença, para o Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS).

4. Por despacho judicial de 14 de Março de 2018, da digna desembargadora do TCAS, foi suscitada a questão relativa à intempestividade do recurso, com base na seguinte argumentação:

Afigura-se que o presente recurso jurisdicional é intempestivo, dado que:

- o defensor do recorrente – Dr. C. – foi notificado da sentença recorrida de 29.9.2017 por carta registada de 2.10.2017 (cfr. fls. 90, dos autos em suporte digital);

- em 11.10.2017 o Dr. C. comprovou nos autos a formulação de pedido de escusa, o que, nos termos do art. 34º, nº 2 e 3, da Lei 34/2004, de 29/7, na redacção da Lei 47/2007, de 28/8, implicou a interrupção do prazo de 15 dias para recorrer da sentença proferida em 29.9.2017 (cfr. fls. 93 a 95, dos autos em suporte digital);

- em 30.10.2017 a Ordem dos Advogados informou que nessa data notificou o Dr. D. de que tinha sido nomeado defensor do ora recorrente, em substituição do Dr. C., (cfr. fls. 97, dos autos em suporte digital), o que implicou que, face ao estatuído no art. 24º, n º 5, al. a), ex vi art. 34º nº 2, parte final, ambos da Lei 34/2004, de 29/7, na redacção da Lei 47/2007, de 28/8, a partir desse momento começasse a correr o prazo de 15 dias para a interposição de recurso;

- tal prazo de 15 dias já se encontrava esgotado quando, em 22.11.2017, a Ordem dos Advogados informou que nessa data notificou a Dra. E. de que tinha sido nomeada defensora do ora recorrente, em substituição do Dr. D. (cfr. fls. 98, dos autos em suporte digital) [e por maioria de razão tal prazo já se encontrava esgotado quando a Ordem dos Advogados informou nos autos de que o Dr. F. tinha sido nomeado defensor do recorrente em substituição da Dra. E.], pois entre 30.10.2017 e 22.11.2017 não foi dado conhecimento nos autos de qualquer pedido de substituição de patrono ou de escusa (o que se tivesse ocorrido teria permitido a interrupção desse prazo de 15 dias, mas, no entanto, não seria aplicável o disposto no art. 139º, nº 5, do CPC de 2013 – neste sentido, Ac. do STJ de 2.11.2017, proc. nº 6638/16.7, Ac. da Rel. de Coimbra de 10.3.2015, proc. nº 20/14.8, e Ac. da Rel. de Guimarães de 16.6.2016, proc. nº 3040/15.1).

5. Notificado para se pronunciar sobre esta questão, veio o autor referir, em defesa da sua posição:

1. O acórdão TC nº 461/2016, de 13-10, julgou inconstitucional a interpretação normativa, extraída do artigo 24º, nº 5, alínea a), da Lei nº 34/2004, com o sentido de que o prazo interrompido por aplicação do nº 4 do mesmo artigo se inicia cm a notificação ao patrono nomeado da sua designação, quando o requerente do apoio judiciário desconheça essa nomeação, por dela não ter sido notificado, por violação do artigo 20º, nºs 1 e 4, da Constituição.

2. Ora, a Ordem dos Advogados não consegue saber a data em que o recorrente foi efectivamente notificado da nomeação do Dr. D. em razão de ter expedido a notificação por correio simples.

3. Assim, o recurso é tempestivo.

6. Foi, então, proferida decisão sumária, novamente no âmbito do TCAS, com data de 8 de Abril de 2018, através da qual se concluiu pela intempestividade do recurso interposto pelo ora reclamante.

Aí se consignava, para além dos elementos relativos à nomeação de defensores oficiosos atrás referidos (cfr. supra nº 4 do presente parecer):

7) Em 27.12.2017, a Ordem dos Advogados informou que nessa data notificou o Dr. F. de que tinha sido nomeado defensor do ora recorrente, em substituição da Dra. E. (cfr. fls. 102, dos autos em suporte digital).

8) O autor, representado pelo Dr. F., apresentou recurso jurisdicional da sentença referida em 2) através de requerimento remetido por correio registado em 29.12.2017 (cfr. fls. 103 a 05, dos autos em suporte digital).

7. A mesma decisão sumária considerou, ainda:

Ora, o prazo de 15 dias que o autor tinha para recorrer já se encontrava esgotado quando, em 22.11.2017, a Ordem dos Advogados informou que nessa data notificou a Dra. E. de que tinha sido nomeada defensora do autor, em substituição do Dr. D. [pois entre 2.11.2017 e 22.11.2017 não foi dado conhecimento nos autos de qualquer pedido de...

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