Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho de 2004

Lei n.º 34/2004 de 29 de Julho Altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais e transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2003/8/CE, do Conselho, de 27 de Janeiro, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios.

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, para valer como lei geral da República, o seguinte: CAPÍTULO I Concepção e objectivos Artigo 1.º Finalidades 1 - O sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos.

2 - Para concretizar os objectivos referidos no número anterior, desenvolver-se-ão acções e mecanismos sistematizados de informação jurídica e de protecção jurídica.

Artigo 2.º Promoção 1 - O acesso ao direito e aos tribunais constitui uma responsabilidade do Estado, a promover, designadamente, através de dispositivos de cooperação com as instituições representativas das profissões forenses.

2 - O acesso ao direito compreende a informação jurídica e a protecção jurídica.

Artigo 3.º Funcionamento 1 - O sistema de acesso ao direito e aos tribunais funcionará por forma que os serviços prestados aos seus utentes sejam qualificados e eficazes.

2 - O Estado garante uma adequada remuneração bem como o reembolso das despesas realizadas aos profissionais forenses que intervierem no sistema de acesso ao direito e aos tribunais, em termos a regular por portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Justiça.

3 - É vedado aos profissionais forenses que prestem serviços no âmbito do acesso ao direito em qualquer das suas modalidades auferir, com base neles, remuneração diversa da que tiverem direito nos termos da presente lei e da portaria referida no número anterior.

CAPÍTULO II Informação jurídica Artigo 4.º Dever de informação Incumbe ao Estado realizar, de modo permanente e planeado, acções tendentes a tornar conhecido o direito e o ordenamento legal, através de publicação e de outras formas de comunicação, com vista a proporcionar um melhor exercício dos direitos e o cumprimento dos deveres legalmente estabelecidos.

Artigo 5.º Serviços de informação jurídica 1 - No âmbito das acções referidas no artigo anterior serão gradualmente criados serviços de acolhimento nos tribunais e serviços judiciários.

2 - Compete à Ordem dos Advogados, com a colaboração do Ministério da Justiça, prestar a informação jurídica, no âmbito da protecção jurídica, nas modalidades de consulta jurídica e apoio judiciário.

CAPÍTULO III Protecção jurídica SECÇÃO I Disposições gerais Artigo 6.º Âmbito de protecção 1 - A protecção jurídica reveste as modalidades de consulta jurídica e de apoio judiciário.

2 - A protecção jurídica é concedida para questões ou causas judiciais concretas ou susceptíveis de concretização em que o utente tenha um interesse próprio e que versem sobre direitos directamente lesados ou ameaçados de lesão.

3 - Lei própria regulará os sistemas destinados à tutela dos interesses colectivos ou difusos e dos direitos só indirecta ou reflexamente lesados ou ameaçados de lesão.

4 - No caso de litígio transfronteiriço, em que os tribunais competentes pertençam a outro Estado da União Europeia, a protecção jurídica abrange ainda o apoio pré-contencioso e os encargos específicos decorrentes do carácter transfronteiriço do litígio, em termos a definir por lei.

Artigo 7.º Ambito pessoal 1 - Têm direito a protecção jurídica, nos termos da presente lei, os cidadãos nacionais e da União Europeia, bem como os estrangeiros e os apátridas com título de residência válido num Estado membro da União Europeia, que demonstrem estar em situação de insuficiência económica.

2 - Aos estrangeiros sem título de residência válido num Estado membro da União Europeia é reconhecido o direito a protecção jurídica, na medida em que ele seja atribuído aos Portugueses pelas leis dos respectivos Estados.

3 - As pessoas colectivas têm apenas direito à protecção jurídica na modalidade de apoio judiciário, devendo para tal fazer a prova a que alude o n.º 1.

4 - A protecção jurídica não pode ser concedida às pessoas que alienaram ou oneraram todos ou parte dos seus bens para se colocarem em condições de o obter, nem, tratando-se de apoio judiciário, aos cessionários do direito ou objecto controvertido, quando a cessão tenha sido realizada com o propósito de obter aquele benefício.

Artigo 8.º Insuficiência económica 1 - Encontra-se em situação de insuficiência económica aquele que, tendo em conta factores de natureza económica e a respectiva capacidade contributiva, não tem condições objectivas para suportar pontualmente os custos de um processo.

2 - O disposto no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, às pessoas colectivas não referidas no número seguinte.

3 - A insuficiência económica das sociedades, dos comerciantes em nome individual nas causas relativas ao exercício do comércio e dos estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada deve ser aferida tendo em conta, designadamente, o volume de negócios, o valor do capital e do património e o número de trabalhadores ao seu serviço e os lucros distribuídos nos três últimos exercícios findos.

4 - Em caso de dúvida sobre a verificação de uma situação de insuficiência económica, pode ser solicitado pelo dirigente máximo do serviço de segurança social que aprecia o pedido que o requerente autorize, por escrito, o acesso a informações e documentos bancários e que estes sejam exibidos perante tal serviço e, quando tal se justifique, perante a administração tributária.

5 - A prova e a apreciação da insuficiência económica devem ser feitas de acordo com os critérios estabelecidos e publicados em anexo à presente lei.

Artigo 9.º Isenções Estão isentos de impostos, emolumentos e taxas os requerimentos, certidões e quaisquer outros documentos pedidos para fins de protecção jurídica.

Artigo 10.º Cancelamento da protecção jurídica 1 - A protecção jurídica é retirada, quer na sua totalidade quer relativamente a alguma das suas modalidades: a) Se o requerente adquirir meios suficientes para poder dispensá-la; b) Quando se prove por novos documentos a insubsistência das razões pelas quais foi concedida; c) Se os documentos que serviram de base à concessão forem declarados falsos por decisão com trânsito em julgado; d) Se, em recurso, for confirmada a condenação do requerente como litigante de má fé; e) Se, em acção de alimentos provisórios, for atribuída ao requerente uma quantia para custeio da demanda.

2 - No caso da alínea a) do número anterior, o requerente deve declarar, logo que o facto se verifique, que está em condições de dispensar a protecção jurídica em alguma ou em todas as modalidades concedidas, sob pena de ficar sujeito às sanções previstas para a litigância de má fé.

3 - A protecção jurídica pode ser retirada oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, da Ordem dos Advogados, da parte contrária, do patrono nomeado ou do solicitador de execução designado.

4 - O requerente de protecção jurídica é sempre ouvido.

5 - Sendo retirada a protecção jurídica concedida, a decisão é comunicada ao tribunal competente e à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores, conforme os casos.

Artigo 11.º Caducidade 1 - A protecção jurídica caduca nas seguintes situações: a) Pelo falecimento da pessoa singular ou pela extinção ou dissolução da pessoa colectiva a quem foi concedido, salvo se os sucessores na lide, no incidente da sua habilitação, juntarem cópia do requerimento de apoio judiciário e os mesmos vierem a ser deferidos; b) Pelo decurso do prazo de um ano após a sua concessão sem que tenha sido prestada consulta ou instaurada acção em juízo, por razão imputável ao requerente.

2 - O apoio judiciário nas modalidade de nomeação e pagamento de honorários de patrono e pagamento faseado de honorários de patrono nomeado é incompatível com o patrocínio pelo Ministério Público nos termos previstos no Código de Processo do Trabalho.

Artigo 12.º Impugnação Da decisão que determine o cancelamento ou verifique a caducidade da protecção jurídica cabe impugnação judicial, que segue os termos dos artigos 27.º e 28.º Artigo 13.º Aquisição de meios económicos suficientes 1 - Caso se verifique que o requerente de protecção jurídica possuía, à data do pedido, ou adquiriu no decurso da causa ou no prazo de quatro anos após o seu termo, meios económicos suficientes para pagar honorários, despesas, custas, imposto, emolumentos, taxas e quaisquer outros encargos de cujo pagamento haja sido declarado isento, é instaurada acção para cobrança das respectivas importâncias pelo Ministério Público ou por qualquer outro interessado.

2 - Para os efeitos do número anterior, presume-se aquisição de meios económicos suficientes a obtenção de vencimento na acção, ainda que meramente parcial, salvo se, pela sua natureza ou valor, o que se obtenha não possa ser tido em conta na apreciação da insuficiência económica nos termos do artigo 8.º 3 - A acção a que se...

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