Acórdão nº 12/17 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelCons. Maria José Rangel de Mesquita
Data da Resolução18 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 12/2017

Processo n.º 1083/15

3ª Secção

Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

I - Relatório

1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), em que são recorrentes A., B. e C. e recorridos o Ministério Público, D., Lda. e E., S. A., o relator proferiu a Decisão Sumária n.º 697/2016 (de fls. 6343-6355), a qual, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, decidiu não conhecer do objeto do recurso com os seguintes fundamentos (cfr. Decisão Sumária n.º 697/2016, II, 6. e ss.):

«(…)

6. A primeira questão de constitucionalidade é assim enunciada no requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade: «a interpretação que a decisão recorrida faz do artigo 399º do Código do Processo Penal, no sentido de que o tribunal de 2ª instância não deve sindicar, em concreto, a determinação da medida concreta da pena, dentro dos parâmetros da sua determinação abstratamente considerados, salvo perante a violação das regras da experiência, ou da desproporção da quantificação efetuada, viola o disposto no artigo 32º, nº 1, da CRP, que o mesmo é dizer, o citado art.s 399º, com aquela interpretação, viola este normativo constitucional.»

Cabe aos recorrentes delinear o objeto do recurso de modo que a norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade pretendem ver apreciada corresponda, integral e fidedignamente, à que foi efetivamente aplicada pela decisão alvo de recurso, i.e., tem de haver exata correspondência entre a norma cuja (re)apreciação é requerida pelo recorrente e aquela que fundamentou a decisão recorrida.

Desde logo, quanto à identificação da base legal aplicada.

Como escreve Carlos Lopes do Rego (Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Almedina, Coimbra, 2010, p. 208): «A identificação da norma assenta prioritariamente na indicação do preceito ou preceitos – do “arco legislativo” – que funciona como “fonte” do núcleo essencial do regime jurídico que se considera colidente com a Constituição – cabendo ao recorrente identificar, de forma certeira, os preceitos relevantes – e que naturalmente – salvo demonstração de que ocorreu implícita aplicação de diferente “arco legislativo” – não poderão deixar de ser aqueles que a decisão recorrida no exercício da sua tarefa de determinação e interpretação do direito infraconstitucional tido por aplicável, eleger como base do “critério normativo” aplicado à definição do caso.»

A este respeito, verifica-se, contudo, que a pretensa interpretação normativa do artigo 399.º do Código de Processo Penal não decorre do preceito legal em causa nem do juízo feito pelo Tribunal recorrido do quadro legal aplicável à situação vertente.

Desde logo, da leitura do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 1/10/2015 (fls. 5972-6321), ora recorrido - que negou provimento aos recursos dos três arguidos, ora recorrentes, e confirmou o acórdão condenatório então recorrido, proferido pelo tribunal de 1ª instância em 14/10/2014 - retira-se que o mesmo aresto não aplicou o artigo 399.º do Código de Processo Penal à situação dos autos nem dele retirou qualquer dimensão normativa, de forma explícita ou implícita.

De facto, quanto à determinação da medida das penas aplicadas aos arguidos, assim se pronunciou o referido Tribunal:

(…)

«Resta ainda conhecer sobre a discordância quanto às penas fixadas, sendo aqui de considerar que assentando os fundamentos para a invocada diminuição das penas no pressuposto da verificação da unidade criminosa do crime de falsificação e da cumplicidade no lugar da autoria, e, atenta a posição acima assumida, o conhecimento da questão encontra-se praticamente já prejudicado.

Ainda assim, vejamos o que foi escrito na decisão recorrida sobre a aplicação concreta das penas dos recorrentes.»

(…)

(…)

Como já se disse em acórdão que subscrevemos, desta secção, relativamente à apreciação da pena concreta: "Entendemos que a intervenção dos tribunais de 2.ª instância na apreciação das penas fixadas pela 1.ª instância deve ser parcimoniosa e cingir-se à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não deve sindicar a determinação, dentro daqueles parâmetros da medida concreta da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada"

Tudo a indicar, nos factos fixados, do ponto de vista da prevenção especial (personalidades vertidas nos factos, e reiteração das condutas) não ter o tribunal os necessários elementos favoráveis a uma conclusão de prognose futura sobre a reinserção social dos arguidos.

Quanto à prevenção geral, esta, no Estado de Direito, por se apoiar no consenso dos cidadãos, traduz as convicções jurídicas fundamentais da colectividade, e coloca assim a pena ao serviço desse sentimento jurídico comum; isto significa que ela não pode ser aplicada apenas para intimidar os potenciais delinquentes mas que, acima de tudo, deve dar satisfação às exigências da consciência jurídica geral, estabilizando as suas expectativas na validade da norma violada. Subordinada a função intimidatória da pena a esta sua outra função socialmente integradora, a pena preventiva (geral) nunca poderá ser pura intimidação mas, sim, intimidação limitada ao necessário para restabelecer a confiança geral na ordem jurídica ou, por outras palavras, intimidação conforme ao sentimento jurídico comum.

E,

De harmonia com o plasmado no artigo 40.º do Código Penal, a aplicação de uma pena visa a protecção de bens jurídicos, entendida como tutela da crença e confiança da comunidade na sua ordem jurídico-penal e a reintegração social do agente, não podendo a pena ultrapassar a medida da culpa, sendo certo que não se trata de medida exacta, situando- se a pena concreta entre um limite mínimo (já adequado à culpa) e um limite máximo (ainda adequado à culpa), intervindo os outros fins das penas - prevenção geral e especial - dentro daqueles limites (cf. Claus Roxin, in Culpabilidad Y Prevencion en Derecho Penal, pags. 4 a 1l3).

A determinação da medida concreta da pena será, pois, efectuada segundo os critérios estatuídos no artigo 71.º do Código Penal, onde se explicita que a medida da pena se determina em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo-se, no caso concreto, a todas as circunstâncias, que não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente e contra ele.

Em sede de determinação da medida concreta da pena, ponderando os aludidos critérios, que resultam da análise supra, os elementos de ilicitude e culpabilidade e todo o circunstancialismo apurado, julgam-se adequadas as penas aplicadas pelo Tribunal da 1.ª Instância, isto é, do exposto, verifica-se que os factores de avaliação evidenciados na decisão recorrida mostram-se correctos. Nenhuma circunstância factual foi demonstrada, no sentido de suportar uma eventual atenuação especial. Não se vislumbram pois, circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa dos agentes ou a necessidade da pena, pelo que está completamente arredada uma eventual atenuação especial da pena pretendida por qualquer dos arguidos.

Ainda quanto à determinação da pena única de um concurso.

Vimos seguindo a jurisprudência ilustrada pelo Ac. do STJ de 11/12/2008, processo 08P3632, relatado pelo Sr. Conselheiro Simas Santos, que reflecte a jurisprudência maioritária do STJ, in www.gdsi.pt. de cujo sumário citamos: " ... 6 - No caso de realização de cúmulo jurídico, como vem entendendo o STJ, importa atender à soma das penas parcelares que integram o concurso, atento o princípio de cumulação a fonte essencial de inspiração do cúmulo jurídico sem esquecer, no entanto, que o nosso sistema é um sistema de pena unitária em que o limite mínimo da moldura atendível é constituído pela mais grave das penas parcelares (numa concessão minimalista ao princípio da exasperação ou agravação - a punição do concurso correrá em função da moldura penal prevista para o crime mais grave, mas devendo a pena concreta ser agravada por força da pluralidade de crimes), sem...

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