Acórdão nº 371/16 de Tribunal Constitucional (Port, 08 de Junho de 2016

Data08 Junho 2016
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 371/2016

Processo n.º 658/14

3.ª Secção

Relatora: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita

Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), em que é recorrente A., e recorridos Ministério Público, B. E C.,, o primeiro interpôs recurso, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alíneas b) e g), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), do acórdão do TRL (5ª Secção - Criminal), proferido em 17 de janeiro de 2012 (a fls. 1168-1199), no qual acordaram os Juízes em:

«A) não conhecer do objeto do recurso interposto pelo arguido A., que, nos termos dos artigos 420.º, n.º 1, alínea b), e 414.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, rejeitam porque intempestivamente interposto:

B) negar provimento ao recurso do Ministério Público e confirmar o acórdão recorrido» (cfr. fls. 1199).

2. O requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional tem o seguinte teor (cfr. fls. 1367-1373):

«A., arguido nos autos acima identificados, transitada que foi a via de Recurso no Tribunal Constitucional no âmbito da Reclamação apresentada da não admissão do Recurso para o S.T.J., vem interpor

Recurso para o Tribunal Constitucional

com os seguintes fundamentos:

I. Enquadramento cronológico do presente recurso:

1. Invoca-se, por parecer pertinente, um Acórdão do S.T.J. (proc. 742/98 - 3°, SASTJ, n.º 27, 80) - com a indelével qualidade e virtude de lembrar o que a justiça dos Tribunais se destina ao “povo” (ex. vi do art.º 202.º da C.R.P.):

"(... )a observância das regras ( ... ) tem de ser encarada com equilíbrio e sensatez de modo o que, sendo apercebido, num mínimo o desiderato ( ... ), se não fruste com aspetos formais o objetivo principal de aplicar justiça".

2. A questão que se coloca, feito este prévio enquadramento é que, se bem que se entendeu que o Douto Tribunal Constitucional não admitiu, confirmando a decisão do S.T.J., o Recurso por este dever ser interposto no Tribunal da Relação (ex. vi do art° 76°. n.º 1 da L.T.C.) é de índole processual e cumpre esclarecê-la aqui:

3. O recorrente, da decisão do Tribunal da Relação que não admitiu o Recurso interposto da Comarca por extemporaneidade, por entender - como o Exmo. Sr. Procurador da Relação - que essa decisão o era em 1ª instância, recorrer para o S.T.J ..

4. O S.T.J. não admitiu o recurso.

5. Dessa decisão da conferência do S.T.J. o recorrente recorreu para o Tribunal Constitucional.

6. Esse recurso foi aí admitido apenas em parte excluindo toda a matéria que se reportava à decisão da Relação de Lisboa.

7. Foi dessa admissão parcial - relativamente à parte não admitida - que se reclamou para o T. Constitucional e, doutamente, foi mantida a decisão do S.T.J. pelos mesmos motivos:

A decisão a impugnar é do Tribunal da Relação de Lisboa.

II. Quid luris?:

8. A dúvida que se põe é então procedimental pois, tendo relativamente à questão cujo recurso não se admite já interposto recurso para o S.T.J. - não admitido - a decisão do S.T.J., e também do Tribunal Constitucional, em remeter a admissão do dito recurso para o Tribunal da Relação é quase equivalente a negar o direito ao Recurso.

9. A questão mais complexa se torna quando foi admitido para este Venerando TC um recurso da decisão do S.T.J. (parte dessa decisão).

10. Tal admissão deste recurso nos próprios autos e com efeito suspensivo - douto despacho do Exmo. Conselheiro Vice-Presidente do S.T.J.

- implica que os autos se deslocaram fisicamente para as casas do Tribunal Constitucional.

11. O recorrente mantém todo o interesse no Recurso para o Tribunal Constitucional do segmento do decisão do Tribunal da Relação que esteve em causa na Reclamação dirigido à decisão do Exrna. Sr. Presidente do S.T.J. quer por ter toda o pertinência quer porque existe, pelo menos, um Acórdão do S.T.J. (proc. 2845/08, 5° secção; www.stLpt) que é de sinal frontalmente oposto ao decidido a dar-lhe razão.

12. Mas, neste momento, é ambíguo o modo de, processualmente, fazer valer/executar este desiderato - que é exercício de um direito com dignidade constitucional -: O do Recurso.

13. Uma das soluções possíveis, e julgou-se que seria a processualmente, certa, foi aguardar a decisão por este Douto T. Constitucional do Recurso que para ele foi admitido no S.T.J. e, baixando este - e na eventualidade do seu não provimento - recorrer, então, para este Tribunal Constitucional da decisão da Relação;

14. Mas tal pode parecer não cumprir o comando do art.º 76°. n° 1 do L.T.C., embora quer o S.T.J. quer o Tribunal Constitucional sejam claros a afirmar que cabe à Relação apreciar a admissão desse recurso, até porque;

15. O Recurso para o Tribunal Constitucional da decisão da Relação- que se pretende - assenta no pressuposto do esgotamento das decisões relativas ao pretendido - e que o MP junto à dita Relação também acolhia - recurso dessa decisão para o S.T.J., e depois para o Tribunal Constitucional, o que só agora ocorreu.

III. Do Recurso para o Tribunal Constitucional:

16. Feita esto sinopse cronológica vem invocar o que entende ser inconstitucional na presente decisão da Venerando Relação e que, insiste-se, só com o trânsito do percurso de recursos no Tribunal Constitucional, se pode agora fazer.

17. A Veneranda Relação de Lisboa não admitiu a recurso interposto, pelo arguido por extemporaneidade.

18. A extemporaneidade advém da dita Relação ter considerado que o recurso foi deficientemente feito quanto ao recurso atinente à matéria de facto o que reduziria o prazo de interposição para 20 dias ao invés dos 30 que o arguido contabilizou e usou.

19. O Supremo Tribunal de Justiça em recurso para ele dirigido, não revogou tal decisão até porque considerou a decisão da Relação irrecorrível, por força da al. c) do n.º 1 do art.º 400º CPP.

20. O Supremo Tribunal de Justiça também não se pronunciou porque o decidiu inadmissível - sobre o invocado incumprimento pela Veneranda Relação do n° 3 do art° 417° CPP;

21. Bem como, por não dizerem respeito à decisão reclamada, não tomou posição quanto à inconstitucionalidade que representa a posição da Relação pela interpretação que faz dos art°s 411°, n° 1, 3. e 4, 412°, n° 3 e 4 e 417°, n° 3 (todos do CPP) em clara afronta aos nºs 1 e 2 do art° 32° da Constituição da República Portuguesa e contra decisão expressa por este Tribunal Constitucional.

22. A questão cuja inconstitucionalidade se pretende ver declarada é então, a interpretação que a Venerando Relação fez dos referidos artes 411, n.º 1 e 4; 412°, nºs 3 e 4 e 417°, nºs 3 do Cód. Proc. Penal.

IV. Da extemporaneidade "do Recurso" para a Relação:

23. Esta questão tem importante relevo porque, para além de assentar numa interpretação inconstitucional das já referidas normas (violando os princípios da equidade, igualdade de meios, contraditório, presunção de inocência e acesso ao direito) tem já decisões prévias de sinal contrário quer no Supremo Tribunal de Justiça quer neste Tribunal Constitucional.

24. Assim, a dito decisão é inconstitucional não só por assentar em interpretação de norma arguida de inconstitucional (al. b) do n.º 1 do art.º 70° LCT) como, o que é mais determinante, aplica uma interpretação da norma que este Tribunal Constitucional já declarou inconstitucional (al. g) do n.º 1 do art.º 70° LCT); Isto é:

O Tribunal Constitucional já decidiu em 2004 o seguinte:

"São inconstitucionais, por violação do art.º 32°, n.º 1 da CRP as normas dos nºs 3 e 4 do art.º 412° do CPP interpretados no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação do recurso em que o arguido impugna a decisão sobre a matéria de facto das menções contidas na al. a) e pela forma prevista no n.º 4, nas als. b) e c) daquele n° 3, tem como efeito o não conhecimento da impugnação da matéria de facto e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tal deficiência ( ... ). "

Ac. TC 404/2004 de 2/6; Proc. 802/2003 – II série DR de 23 de Julho 2004).

25. Mas o próprio STJ decidiu sobre a matéria como segue, em dois momentos que se relevam:

"a falta de especificação consignada no art. 412.º n.º 3 do CPP não conduz à imediata e liminar rejeição do recurso antes dar-se ao recorrente a oportunidade de corrigir e completar as conclusões do motivação para o que será convidado, sob peno de, então, não o fazendo, ver o recurso rejeitado". Ac. ST J de 30/10/2002, proc.2535/02-3° SAST J, n.º 64, 90).

Em 2009;

" ...II - A argumentação …para rejeitar o recurso, por extemporaneidade - recorrendo a uma velha fórmula que tem sido quase sistematicamente usado quando estão em causa recursos da matéria de facto, ao alegar que o recorrente não fez uma verdadeira impugnação da matéria de facto, pois se limitou o impugnar a convicção adquirida pelo Tribunal, não dando cumprimento ao art.º. 412.°, nºs 3 e 4, do CPP -, não tem sentido: para o efeito da admissão do recurso e, nomeadamente, para efeito de contagem do prazo, que se altero consoante o recurso se restrinja à matéria de direito ou se alargue à matéria de facto, não importa saber se o recorrente alega bem ou mal, cumprindo ou deixando de cumprir as normas atinentes ao formalismo adequado.

III - O que relevo é o alvo visado pelo recurso: o recorrente, bem ou mal, impugnou a matéria de facto, tendo poro o efeito requerido cópia da prova gravada: tanto basta paro que o prazo para a interposição de recurso se alongue para os 30 dias ... ".

(Proc. 2845/08-5ª secção; www.stj.pt}.

26. A jurisprudência...

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