Acórdão nº 7313/12.7TBMAI-G.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ RAINHO
Data da Resolução08 de Janeiro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção): I - RELATÓRIO AA e BB intentaram - pelo Juízo Local Cível de Vila Nova de Gaia e por apenso aos autos da sua insolvência - contra a Massa Insolvente de AA e de BB ação de impugnação da resolução em benefício da massa insolvente do contrato de compra e venda celebrado em 3 de setembro de 2012 entre os Insolventes (vendedores) e CC (comprador) de 10.000 ações ao portador da sociedade denominada Restaurante - O ... S.A., resolução essa oportunamente feita operar pela Administradora da Insolvência.

Com idêntica finalidade foi também instaurada pelo adquirente CC uma outra ação contra a dita Massa Insolvente, mas cuja apensação aos presentes autos foi determinada, seguindo os dois processos tramitação unitária.

Em síntese, alegaram estes dois conjuntos de Autores que o direito à resolução da suposta compra e venda caducou, por isso que a Administradora da Insolvência teve conhecimento do negócio e das suas especificidades desde agosto e setembro de 2014, mas apenas procedeu à resolução mediante cartas de 11 de maio de 2016, fazendo-o assim para além do prazo de seis meses estabelecido na lei. Mais alegaram que os Insolventes, pese embora ter o Insolvente celebrado em 2006 contrato-promessa de venda de ações da sociedade Restaurante - O ... S.A., nunca detiveram as ações em questão, que foram inicialmente adquiridas pelo Autor CC à sociedade DD, S.A. e Outros pelo preço de 350.000,00€, com dinheiro ao mesmo pertencente, sendo que o Insolvente apenas “emprestou” e “deu como garantia” o seu nome ao negócio.

Contestou a Ré, concluindo pela improcedência das ações.

Disse, em síntese, que apenas em 8 de abril de 2016 tomou conhecimento de factos relevantes para o exercício do direito à resolução, de sorte que improcedia a exceção de caducidade deduzida.

Mais disse que as ações se mantêm em poder dos Insolventes, sendo o Insolvente quem continua a gerir de facto a sociedade Restaurante - O ... (entretanto transformada em sociedade por quotas), tendo sido os Insolventes quem efetivamente adquiriu a totalidade das ações em causa em 2006, vindo os Insolventes e o CC, em 3 de setembro de 2012, a declarar contratar - mas de forma que se revela prejudicial aos interesses da massa - a compra e venda das faladas 10.000 ações ao portador.

Veio depois a ser proferido saneador-sentença que, por efeito da ocorrência da invocada caducidade do direito de resolução, julgou procedentes as ações.

Inconformada com o assim decidido, apelou a Ré Massa Insolvente.

Fê-lo com êxito, pois que a Relação do Porto considerou que não tinha ocorrido a caducidade e, em consequência, revogou a sentença e determinou o prosseguimento dos autos.

É agora a vez dos dois grupos de Autores, insatisfeitos com o decidido, pedirem revista.

+ Da respetiva alegação extraem os Autores AA e BB as seguintes conclusões: I. Não merece censura a sentença proferida pelo Tribunal a quo que elaborou um processo minucioso dos prazos do conhecimento por parte da AI do acto, que a AI tomou conhecimento do ato aquando do incidente de qualificação de insolvência apresentado pelo credor EE em 28 de outubro de 2014 e em por outro lado, no seu requerimento probatório datado de 19 de outubro de 2015, que nesta data poderia ao abrigo doo disposto do art. 121° do n.º 1 b) doo CIRE resolver incondicionalmente.

  1. Destarte, o prazo iniciou-se com o conhecimento do acto, pela AI em 28 de outubro de 2014, prazo que teve conhecimento e deveria ter acautelado, e respeitado a observância dos prazos previstos no art. 123°, ou seja, quando o AI tomou conhecimento das circunstâncias e conteúdo do acto que ocorreu em 28 de outubro de 2014 e em 19 de outubro de 2015 de que esse acto poderia ser objeto de resolução.

  2. Sendo ainda de relevar, para o caso em concreto, se poder concluir que o prazo de 28 de outubro de 2014 e em 19 de outubro de 2015, é o prazo nele contido que assume o prazo de caducidade, que é entendimento unânime na doutrina e na jurisprudência, que o prazo de caducidade é quando a AI toma conhecimento dentro de seis do ato, dentro dos anos, isto é em 28 de outubro de 2014 e 19de outubro de 2015 e não em 11 de maio de 2016 como invoca e fazer crer que teve conhecimento.

  3. Nesta conformidade tem de concluir-se que os prazos constantes no art° 123.º do CIRE, e não obstante a sua epígrafe é um prazo de caducidade que ocorreu em 28 de outubro de 2014 e 19 de outubro de 2015, data de conhecimento de todos os factos por parte da AI, em que esta não procedeu em conformidade a que estava obrigada, mostrando incúria na resolução dos atos.

  4. Na verdade, a AI com a declaração de resolução em 11 de maio de 2016, pretendeu exercitar um direito, defender um interesse e obter um certo efeito jurídico quando esse efeito jurídico já tinha caducado em 28 de outubro de 2014 e em 19 de outubro de 2015 e para contornar a omissão do acto invoca que teve conhecimento dos factos em 11 de maio de 2016, o que é falacioso e ofensivo à lei, que só por interesse próprio poderá entender-se tal interpretação.

  5. O art° 123.º do CIRE, ao estabelecer o prazo de seis meses, a contar do respectivo conhecimento por parte da Administradora, para que esta exerça o direito potestativo de resolver os atos prejudiciais à massa, a qual só exerceu em 11 de maio de 2016 quando teve conhecimento em 28 de outubro de 2014, que detinha todos os pressupostos, facto que invocou no parecer de incidente de qualificação de insolvência como culposa, pelo que o prazo que ocorreu em 11 de maio de 2016 é de caducidade - Ac. da RP de 12.05.2014, cit., e, bem assim, Ac. RL de 19.11.2015, p. 1061-07.7TYLSB.

  6. O legislador é perentório na fixação de um prazo. E se se negligenciasse o momento em que o administrador da insolvência devia conhecer o circunstancialismo isso significaria, em concreto um excessivo alargamento do prazo, como já aqui se defendeu era conceder ad inicio um direito à AI que não lhe assiste, e a qualquer momento encontrava fundamentos que não legais para invocar o direito da resolução.

  7. Entende-se, por conseguinte, que a AI teve conhecimento do acto e de todos os pressupostos em três momentos, que o Tribunal da relação do Porto ignorou na sua totalidade, um em 19 de setembro de 2014, na Assembleia de credores e um segundo momento em 28 de outubro de 2014 e um terceiro em 19 de outubro de 2015, quando dá o seu parecer no âmbito da qualificação da insolvência e fundamenta o mesmo com os pressupostos do negócio.

  8. Para além da diferente interpretação que o Tribunal da Relação do Porto a que procedeu, no que respeita ao início da contagem do prazo de resolução, entende necessário o conhecimento dos pressupostos da resolução, que ocorreu em 11 de maio de 2016, quando os pressupostos já eram conhecidos em 28 de outubro de 2014 e 19 de outubro de 2015 e que o Tribunal da 1ª Instancia reconheceu que a AI teve conhecimento do acto aquando da apresentação do seu requerimento probatório em sede de incidente de qualificação de insolvência, em 19-10-2015; ora, no presente caso, o Tribunal da Relação do Porto não verificou as datas nem a interpretação do art. 123.º do CIRE, que a Administradora de Insolvência não foi célere no exercício das suas funções não podendo, por isso, escudar-se, como o faz a decisão recorrida.

  9. Como parece evidente, a seguir-se o entendimento adotado nesta decisão da Relação sobre o início do prazo de resolução é alterar o espírito do legislador e assim vir ocultar a referida atuação menos diligente da AI que teve conhecimento na data do seu requerimento probatório, em 19-10-2015, como bem refere o tribunal a quo, quando o prazo se iniciou com o mero conhecimento do acto, ou seja, em 28 de outubro de 2014, já tinha conhecimento dos pressupostos do acto, pelo que aquele prazo já estaria há muito esgotado, antes mesmo de se verificar aquele comportamento negligente.

  10. Na verdade, o artigo 123.º n.º 1 do CIRE refere-se a “ ... conhecimento do acto ...” e não das circunstâncias que irão influenciar o exercício ou não do direito de resolução por parte do administrador da insolvência, apesar disso a AI teve conhecimento de todos os requisitos do ato.

  11. Como refere a lei, estipula que o prazo conta-se a partir do conhecimento do ato que se pretende resolver - art° 123.º do CIRE. Ora no que concerne ao alcance e abrangência de tal «conhecimento» deve entender-se que ele se reporta ao conhecimento, pelo AI, em 19 de setembro de 2014, na Assembleia de credores e um segundo momento em 28 de outubro de 2014 e um terceiro em 19 de outubro de 2015, quando a AI apresenta o incidente de qualificação de insolvência, em que poderia proceder a resolução incondicional do acto, o que significa que a mesma teria apenas de fazer prova do acto em si, sem necessidade de provar outros requisitos: facto que foi omitido por inércia e que encontrou uma justificação injustificável para resolver o contrato em 11 de maio de 2016, quando há muito se tinha esgotado o prazo e tinha o conhecimento de todos os atos.

  12. Salvo o devido respeito, não podem os Recorrentes sufragar a interpretação do acórdão do Tribunal da Relação ao art. 123° do CIRE quanto ao momento do conhecimento pela AI do acto, não tem apoio na letra da lei, nem no seu espírito. Na verdade, o art°. 123.°, n.º 1 do CIRE refere expressamente “( ... ) seis meses seguintes ao conhecimento do acto”, e não das circunstâncias que irão influenciar o exercício ou não do direito de resolução por parte da AI que desde já se impugna, e fosse intenção do legislador condicionar o decurso do prazo de seis meses ao conhecimento das circunstâncias que poderiam fundamentar a resolução do acto, tê-lo-ia dito expressamente no próprio texto do preceito, tendo em conta o efeito gravoso que daí resultava para as partes intervenientes nesses atos.

  13. Como é sabido, toda a atividade inerente ao processo de insolvência é urgente, pelo que o Administrador terá de ser célere no exercício das suas funções, assim como todas as entidades...

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