Acórdão nº 016/18 de Tribunal dos Conflitos, 13 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução13 de Setembro de 2018
EmissorTribunal dos Conflitos

Conflito negativo de Jurisdição n.º 16/18 Acordam no Tribunal dos Conflitos: I - Relatório: A………. e outros intentaram, em 2 de Maio de 2014, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa acção administrativa comum contra B………..

e o Estado Português (Ministério da Justiça), pedindo a sua condenação solidária no pagamento da quantia de € 500.067,49, acrescida de juros.

Alegaram, em síntese, que: - são antigos trabalhadores da sociedade C……….., SA, entretanto declarada insolvente, tendo os seus créditos reconhecidos. O Réu B………. foi o liquidatário judicial no processo de insolvência; - o Réu B……….. procedeu à liquidação do património da sociedade, obtendo a quantia de € 2.159.008,96, que investiu, em nome da massa insolvente, numa aplicação financeira junto do BPP; - em virtude das dificuldades financeiras do BPP, que levaram à sua insolvência, não foram pagos aos autores os seus créditos; - o Réu B……….. praticou actos ilícitos uma vez que lhe está vedado por lei investir em aplicações financeiras o produto da liquidação e tem a obrigação de restituir os montantes resgatados e de proceder ao pagamento dos créditos; - tal situação acarretou danos para os autores no montante dos créditos reconhecidos e respectivos juros; - O Réu Ministério da Justiça, através do juiz titular do processo, nomeou o Réu B………… liquidatário; - incumbia ao juiz do processo controlar, acompanhar e fiscalizar a actividade do liquidatário judicial, o que não aconteceu; - O Réu Ministério da Justiça, com a inércia dos seus agentes, permitiu o arrastamento do processo de insolvência que foi declarada em 2001, a liquidação da massa e reconhecimento e graduação dos créditos só foi concluída em 2010, sendo que em 2014 ainda os créditos dos autores não haviam sido pagos.

O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, por decisão de 26 de Fevereiro de 2015, declarou-se materialmente incompetente.

Foi solicitada pelos autores a remessa dos autos ao Juízo de Comércio da Comarca de Lisboa para serem apensados ao processo de insolvência, tendo esse tribunal, por decisão de 9 de Dezembro de 2015, declinado, igualmente, a competência em razão da matéria.

Os autores suscitaram, então, a remessa dos autos aos Tribunais Comuns, mais concretamente, a Instância Central Cível da Comarca de Lisboa.

Aqui foi proferida decisão, em 7 de Novembro de 2017, a absolver os réus da instância com fundamento na incompetência material do tribunal para conhecer do pedido formulado, atribuindo-se essa competência aos tribunais administrativos e fiscais.

Foi suscitada oficiosamente a este Tribunal dos Conflitos a resolução do presente conflito negativo de jurisdição, ao abrigo do disposto nos artigos 109º nºs 1 e 3 e 111º nº 1 do Código de Processo Civil.

O Ministério Público, em douto parecer, defendeu a atribuição da competência para a decisão da causa à jurisdição administrativa, concretamente, ao Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa.

  1. Fundamentos: Está em causa saber se a competência para apreciar e julgar a acção pertence à jurisdição administrativa ou à jurisdição comum, uma vez que tanto os tribunais da jurisdição administrativa, como os da jurisdição comum a declinaram reciprocamente.

    Como vem sendo repetidamente afirmado, os tribunais judiciais constituem a regra dentro da organização judiciária e, por isso, gozam de competência não discriminada ou de competência genérica, enquanto os restantes tribunais, constituindo excepção, têm a sua competência limitada às matérias que lhes são especialmente cometidas pela lei.

    A competência material dos tribunais judiciais é, assim, residual ou negativa, já que é determinada pela exclusão da sua atribuição a outra ou outras jurisdições.

    É o que resulta, justamente, do disposto no artigo 211.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP), preceito constitucional que na lei ordinária encontra concretização nos artigos 64.º do Código de Processo Civil (anterior artigo 66º) e 40.º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada pela Lei n.º 62/2013, de 13 de Janeiro, alterada pela 40-A/2016, de 22 de Dezembro (preceito correspondente ao anterior artigo 18º n° 1 da LOFT aprovada pela Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro).

    É pacífico o entendimento no sentido de que a competência em razão da matéria se afere pela natureza da relação jurídica, tal como o autor a apresenta na petição inicial, ou seja, no confronto entre a pretensão deduzida (pedido), independentemente do seu mérito, e os respectivos fundamentos (causa de pedir). Determina-se em função dos termos em que a acção é proposta, ou seja, pelo modo como...

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