Acórdão nº 02137/14.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Abril de 2017
Magistrado Responsável | Frederico Macedo Branco |
Data da Resolução | 28 de Abril de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório TJSM, Autor nos Autos de Ação Administrativa Especial, devidamente identificado nos referidos autos, que intentou contra a Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa e Ministério da Educação e Ciência, não se conformando com o Despacho Saneador proferido no TAF do Porto, na parte em que julgou procedente a exceção de ilegitimidade passiva da Ré, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, e que julgou ainda parcialmente procedente a exceção de caso julgado, veio em 10 de março de 2016 recorrer do mesmo jurisdicionalmente, e em separado, concluindo: “I. O presente recurso de apelação autónoma tem por objeto a impugnação do douto despacho saneador proferido pelo Tribunal a quo, na parte em que julga procedente a exceção de ilegitimidade passiva da Recorrida Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa (FCM), absolvendo-a da instância, bem como na parte em que julga parcialmente procedente a exceção de caso julgado, abstendo-se de apreciar os fundamentos de invalidade do ato impugnado referentes à violação das liberdades de aprender, de escolha de profissão e de ensino, à violação dos princípios tempus regit actum, da certeza e da segurança jurídicas, absolvendo o Recorrido Ministério da Educação e Ciência (MEC) do terceiro pedido deduzido na petição inicial.
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Tendo por fundamento a verificação de erros de julgamento de Direito no que respeita à parte do despacho saneador que julga procedente a exceção de ilegitimidade passiva da FCM, bem como na parte decisória relativa à procedência parcial da exceção de caso julgado, por errada interpretação e aplicação e consequente violação, pelo menos, das normas dos artigos 10.º, n.º 1 do CPTA, 580.º, 581.º, 577.º, alínea i) do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 1.º do CPTA, 87.º e 89.º, n.º 1, alínea i) do CPTA, bem como dos artigos 32.º da Portaria n.º 550-E/2004, na redação introduzida pela Portaria n.º 91/2012, 11.º, n.º 6 e 15.º, n.º 6 do Decreto-Lei n.º 74/2006, de 26/03 na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 42/2012, de 22/02, 13.º, 18.º, n.º 3, 42.º, 43.º, n.º 1 e 47.º, n.º 1, 74.º, n.ºs 1 e 2 alínea d) e 76.º, n.º 1 da Constituição e 12.º do Código Civil.
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Bem como, ao abrigo do disposto no artigo 640.º do CPC, a reapreciação da matéria de facto, por insuficiência.
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O presente recurso de apelação autónoma resulta da convolação de uma anterior reclamação para a conferência, determinada por Despacho do Tribunal a quo datado de 04 de fevereiro de 2016.
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O Recorrente entende que a factualidade dada como provada é insuficiente, pois foram omitidos, aparentemente, factos pertinentes para a descoberta da verdade, a saber: VI. (i) O Recorrente concluiu o ensino secundário recorrente no ano letivo de 2010-2011, com a classificação final de 198,0 pontos (facto invocado na petição inicial e provado através do documento n.º 2 a) junto com a petição inicial).
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(ii) O Recorrente concorreu ao acesso ao ensino superior no ano de 2012 através, nomeadamente, da classificação final do ensino secundário recorrente de 198,0 pontos, obtida e certificada no ano letivo de 2010-2011 (facto invocado na petição inicial e provado através do documento n.º 2 a) e b), junto com a petição inicial).
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Os supra referidos dois factos são pertinentes para demonstrar que a classificação final do ensino secundário recorrente, com a qual o Recorrente se candidatou no ano de 2012, foi obtida e certificada no ano letivo de 2010-2011, isto é, antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 42/2012.
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Pelo que, se requer que os dois mencionados factos sejam aditados à matéria de facto dada como provada.
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Quanto ao mais, considera-se que não está provado nos autos que a situação escolar do ora Recorrente tenha sido especificamente apreciada no âmbito do processo de intimação n.º 1726/12.1BELSB, que correu termos no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, no Tribunal Central Administrativo Sul e no Tribunal Constitucional.
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E considera-se ainda que, nem do Acórdão n.º 355/2013, do Tribunal Constitucional, nem do Acórdão do TCAS, de 19/12/2013, consta, por um lado, a apreciação da situação (factual) escolar do ora Recorrente, nem dessas decisões consta, por outro, qualquer permissão (habilitação) ou imposição (vinculação) da Administração escolar (in casu, a DGES integrada no MEC) para praticar, no caso concreto, um ato de alteração da classificação final do ensino secundário recorrente do Recorrente nem para revogar e modificar o seu ato de colocação, no ano de 2012, no curso de mestrado integrado em medicina da FCM da UNL.
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O Tribunal a quo, ao julgar procedente a exceção de ilegitimidade passiva da Recorrida FCM, incorreu em erro de julgamento de Direito, por errada interpretação e aplicação e consequente violação, pelo menos, da norma do artigo 10.º, n.º 1 do CPTA.
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Ainda que a Recorrida FCM aceite expressamente a frequência do curso por parte do Recorrente, não deixa esta entidade pública administrativa de fazer parte da relação jurídico-administrativa controvertida, que tem na sua base o ato impugnado.
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A procedência dos pedidos deduzidos pelo Recorrente na sua petição inicial – designadamente o pedido de reconhecimento judicial da validade e irrevogabilidade do ato de colocação no curso de Mestrado Integrado em Medicina – implicará a emissão de um conjunto de vinculações jurídicas (materiais) que têm por destinatários a comunidade jurídica em geral e, sobretudo, o Recorrido MEC (autor do ato impugnado e único instigador do litígio) e a Recorrida FCM (entidade que é competente para realizar a matrícula).
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Sendo assim, a relação jurídico-administrativa, desencadeada pela emissão ilegal do ato impugnado, tem como partes o Recorrente (na qualidade de administrado lesado), o Recorrido MEC (enquanto autor do ato e instigador do litígio) e a Recorrida FCM que, seja qual for o sentido da decisão final do presente processo, deverá sempre ficar abrangida pelo caso julgado material daí emergente.
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O despacho saneador proferido pelo Tribunal a quo, ao julgar parcialmente procedente a exceção de caso julgado, padece de erro de julgamento de Direito, por errada interpretação e aplicação e consequente violação, pelo menos, das normas dos artigos 580.º, 581.º, 577.º, alínea i) do CPC, aplicáveis ex vi do artigo 1.º do CPTA, 87.º e 89.º, n.º 1, alínea i) do CPTA, bem como dos artigos 32.º da Portaria n.º 550-E/2004, na redação introduzida pela Portaria n.º 91/2012, 11.º, n.º 6 e 15.º, n.º 6 do Decreto-Lei n.º 74/2006, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 42/2012, 13.º, 18.º, n.º 3, 42.º, 43.º, n.º 1 e 47.º, n.º 1, 74.º, n.ºs 1 e 2 alínea d) e 76.º, n.º 1 da Constituição e 12.º do Código Civil.
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O Tribunal a quo, para julgar parcialmente procedente a exceção de caso julgado, partiu do entendimento erróneo de que a questão referente à possibilidade de o Recorrente usar, para o acesso ao ensino superior no ano de 2012, a classificação final de 198,0pontos, já tinha sido decidida, em sentido desfavorável ao Recorrente, no âmbito do processo de intimação n.º 1726/12.1BELSB – o que não corresponde à realidade nem encontra cabimento na parte dispositiva ou na fundamentação dos Acórdãos n.º 355/2013, do Tribunal Constitucional e de 19/12/2013 do Tribunal Central Administrativo Sul.
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A classificação final do ensino secundário recorrente de 198,0pontos, com a qual o Recorrente se candidatou, no ano de 2012, ao acesso ao curso de medicina, foi obtida e está definitivamente certificada desde o ano de 2011, isto é, antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 42/2012 e da Portaria n.º 91/2012.
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A aplicação do novo regime resultante do Decreto-Lei n.º 42/2012 à situação escolar do Recorrente configura uma aplicação retroativa e inadmissível de um regime jurídico novo a uma situação fáctica já juridicamente reconhecida mediante a atribuição de certificação já consolidada na ordem jurídica à data da entrada em vigor desse novo regime.
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A referida classificação final (de 198 pontos) e a consequente habilitação escolar encontram-se imunes a qualquer alteração legislativa posterior, não apenas por força do princípio geral da irretroatividade das leis restritivas de direitos fundamentais (artigos 18.º, nº 3 da Constituição e 12.º do Código Civil), mas também por força da própria natureza do ato certificativo de habilitação escolar, que é sempre determinado em função do regime e dos factos existentes à data da sua prática (princípio geral tempus regit actum).
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Como a referida classificação final de 198 pontos está definitivamente certificada desde o ano letivo de 2010-2011 e como nenhuma norma ou decisão judicial impedia que a mesma fosse usada para efeito de acesso ao curso de medicina no ano de 2012, deve concluir-se que o Recorrente podia concorrer ao ensino superior, em 2012, com a classificação final de 198 pontos e com as provas de ingresso especificamente exigidas para esse efeito.
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O ato administrativo impugnado nos autos de ação administrativa especial constituiu uma nova relação jurídico-administrativa, determinando, de forma manifestamente ilegal, a revogação e modificação do ato de certificação da conclusão, pelo Recorrente, do ensino secundário recorrente no ano letivo de 2010-2011 com a classificação final de 198 pontos, a modificação/alteração da sua nota de candidatura no concurso nacional de acesso ao ensino superior de 2012 e a revogação do seu ato de colocação no curso de mestrado integrado em medicina da FCM da UNL.
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Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, não se encontram preenchidos, no presente processo, os pressupostos de que depende a procedência (ainda que parcial) da exceção de caso julgado, pelo que a mesma devia ter sido julgada totalmente improcedente – o que se requer ao Tribunal ad quem.
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Para verificar se, concretamente, estão ou não preenchidos os pressupostos de que depende a...
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