Acórdão nº 01951/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Março de 2015
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 25 de Março de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Recurso jurisdicional da rejeição liminar proferida no processo de oposição à execução fiscal com o n.º 862/13.1BELRS 1. RELATÓRIO 1.1 A…………….. (adiante Oponente ou Recorrente) deduziu oposição à execução fiscal que contra ele foi instaurada pelo Serviço de Finanças de Loures - 3, em cumprimento do pedido endereçado pela Autoridade Tributária Grega à Comissão Interministerial para a Assistência Mútua em matéria de Cobrança de Créditos, no âmbito do mecanismo de Assistência Mútua em matéria de Cobrança de Créditos entre Estados-Membros da União Europeia, para cobrança de dívidas de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) dos anos de 2003, 2004 e 2005 que, alegadamente, são da responsabilidade originária de uma sociedade e lhe estão a ser exigidas pela autoridade tributária grega na sequência de reversão efectuada por esta.
1.2 O Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa rejeitou liminarmente a oposição com fundamento na incompetência do Tribunal em razão da nacionalidade.
1.3 Inconformado com a decisão, o Oponente interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, recurso que foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
1.4 O Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «1. O Tribunal a quo concluiu ser “absolutamente incompetente para conhecer da presente acção de oposição”(cf. 5.º parágrafo da pág. 7 da Sentença, sublinhado nosso), entendendo assim estar verificada a excepção dilatória prevista nos artigos 96.º, 576.º, n.º 2 e 577.º, alínea a) do CPC e artigo 16.º, n.º 2 do CPPT (cf. 6.º parágrafo da pág. 7 da Sentença).
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Consequentemente decidiu pela rejeição liminar da acção, nos termos do artigo 590.º, n.º 1 do CPC, ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT (cf. 1.º parágrafo da pág. 8 da Sentença), decisão que deverá todavia ser revogada.
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Com efeito, nos termos do artigo 14.º, n.º 2 da Directiva n.º 2010/24/EU, de 16 de Março de 2010, “Os litígios relativos às medidas de execução tomadas no Estado-Membro requerido ou à validade de uma notificação efectuada por uma autoridade competente do Estado-Membro requerido são dirimidos pela instância competente desse Estado-Membro, nos termos das disposições legislativas e regulamentares que nele vigorem”.
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Por seu turno, estabelece o artigo 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 263/2012, de 20 de Dezembro que “Na execução da cobrança de créditos ou na adopção de medidas cautelares solicitadas por uma autoridade competente de outro Estado-Membro são aplicáveis as disposições do ordenamento jurídico-nacional estabelecidas para os créditos relativos aos mesmos impostos ou direitos ou, na sua ausência, a impostos ou direitos similares”.
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O Recorrente não dissente, portanto, da asserção plasmada na Sentença que “apenas os litígios relativos às medidas de execução podem ser conhecidos pelos tribunais do Estado-Membro requerido” (cf. 3.º parágrafo da pág. 6 da Sentença, sublinhado nosso).
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Mas discorda da decisão de que o Tribunal a quo é “absolutamente incompetente para conhecer da presente acção de oposição” (cf. 5.º parágrafo da pág. 7 da Sentença, sublinhado nosso), porquanto o caso dos autos constitui um litígio relativo às medidas de execução a que alude o artigo n.º 14, n.º 2 da Directiva n.º 2010/24/EU, de 16 de Março de 2010, e o artigo 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 263/2012, de 20 de Dezembro, ergo, uma Oposição à execução fiscal instaurada contra um nacional e residente português, que citado para a mesma contestou precisamente (e unicamente) as medidas adoptadas pela Autoridade Tributária Portuguesa destinadas à execução de um alegado crédito tributário de uma potência estrangeira (in casu, a Grécia) resultante de uma alegada reversão.
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Terá assim de concluir-se que o Tribunal a quo goza de competência internacional para julgar a Oposição Judicial deduzida, nos termos conjugados do artigo 14.º, n.º 2 da Directiva n.º 2010/24/EU, de 16 de Março de 2010, art. 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 263/2012, de 20 de Dezembro e artigos 59.º e 62.º do CPC.
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Perfilhando este entendimento vide o Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 24.11.2010, processo n.º 0384/10, e de 13.05.2009, processo n.º 01031/08, os quais concluíram, perante casos semelhantes aos do presente, pela competência internacional dos tribunais portugueses 9. De facto, o artigo 12.º, n.º 3 da Directiva n.º 76/308/CEE, de 15 de Março referido nos Acórdãos mencionados consagra regulação e terminologia materialmente equiparáveis às do artigo 14.º, n.º 2 da Directiva n.º 2010/24/EU, o mesmo sucedendo com o artigo 27.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 296/2003, de 21 de Novembro (que regulamentava a Directiva n.º 76/308/CEE), também mencionado naqueles Acórdãos, e o artigo 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 263/2012, de 20 de Dezembro (aplicável à Directiva n.º 2010/24/EU).
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O artigo 65.º do CPC a que fazem referência os arestos, corresponde por seu turno actualmente aos artigos 59.º e 62.º do mesmo diploma, sendo que se mantém na ordem jurídica portuguesa a subordinação da legislação interna à legislação europeia e convenções internacionais (cf. artigo 8.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa).
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Deste modo, não havendo razões para alterar a orientação da douta jurisprudência referida, que se reputa de consolidada, adere-se sem reservas ao argumentário vertido nos arestos citados, que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.
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Efectivamente, encontrando o caso dos autos acolhimento na interpretação clara da lei (in claris non fit interpretatio), bem como em jurisprudência superior deste Venerando Supremo Tribunal, o Recorrente não compreende a argumentação do Tribunal a quo, que parece errónea e até contraditória, olvidando que com a dedução da Oposição Judicial o Recorrente, de nacionalidade portuguesa e residente em Portugal, contestou apenas as medidas adoptadas pela Autoridade Tributária Portuguesa destinadas à execução de um alegado crédito tributário do Estado Grego resultante da reversão de uma alegada dívida fiscal de uma empresa.
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Com efeito, a simples leitura da petição inicial demonstra à saciedade que em lado algum o ora Recorrente contestou a legalidade da alegada dívida tributária grega, tendo essa contestação sido feita perante os competentes tribunais judiciais gregos, pela devedora originária (B.............), nos termos do artigo 30.º do Decreto-Lei nº 263/2012, de 20 de Dezembro, o que o Recorrente diligentemente comunicou aos autos juntando a respectiva prova incontrovertida e irrefutada (primeiro como Documento n.º 2 junto à petição inicial de Oposição Judicial, depois com a junção da respectiva tradução aos autos por requerimento de 26.07.2013 a fls. ...).
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De facto, são apenas as medidas de execução levadas a cabo pela Autoridade Tributária Portuguesa que estão a ser contestadas pelo Recorrente nestes autos.
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Incluem-se entre essas medidas de execução, entre outras, a instauração de processo de execução fiscal, citação e seus actos consequentes e ablativos por natureza, como a penhora e a venda, divulgação na lista de devedores, impossibilidade de usufruir de benefícios fiscais...
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Ora, é evidente que a instauração e a citação de processo de execução fiscal destinado à cobrança coerciva pela Autoridade Tributária de Portugal por alegada dívida à Grécia constituem medidas de execução cuja (i)legalidade pode (apenas pode) ser contestada no Estado-Membro requerido, ergo, perante os tribunais fiscais portugueses.
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E foi para discutir essas medidas de execução que o Recorrente reagiu através da Oposição Judicial ora rejeitada, onde sufragou a impossibilidade de cobrança do referido crédito por violação quer da Directiva n.º 2010/24/EU, de 16 de Março de 2010, quer do ordenamento jurídico nacional, nunca abordando a matéria da legalidade/ilegalidade do crédito, não indagando a sua (in)existência, nem a validade da respectiva notificação..., limitando-se a demonstrar que o mesmo não lhe era exigível.
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Assim, apenas por dever de patrocínio, e tendo presente que são aplicáveis as disposições legislativas e regulamentares que vigorem em Portugal (artigo 14.º, n.º 2, in fine da Directiva n.º 2010/24/EU, de 16 de Março de 2010), recordar-se-á que, em primeiro lugar, invocou o Recorrente não poderem ser executados créditos relativamente aos quais já havia decorrido o prazo legal para a sua cobrança, pelo que deveria ter sido recusado o pedido de assistência na cobrança de créditos com mais de 5 e de 10 anos (contados desde a data de vencimento dos mesmos no Estado Grego até à data do pedido de assistência inicial) ao abrigo da faculdade concedida pelo artigo 18.º, nºs 2 e 4 da Directiva n.º 2010/24/EU, de 16 de Março de 2010 e artigo 10.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 263/2012, de 20 de Dezembro, e extinguir-se o processo de execução fiscal n.º 3158201301016105, nos termos do artigo 204.º, n.º 1, alíneas b) e i) do CPPT – cf. artigos 29.º a 46.º da petição inicial de Oposição Judicial que se dão por integralmente reproduzidos e alegados para todos os efeitos legais.
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Em segundo lugar, invocou o Recorrente que no campo de aplicação da Directiva n.º 2010/24/EU, de 16 de Março de 2010 não estão contemplados os devedores subsidiários, tendo peticionado ao douto Tribunal que procedesse à extinção dos autos de execução fiscal por falta de legitimidade, nos termos do artigo 204.º, n.º 1, alínea b) e/ou alínea i) do CPPT – cf. artigos 47.º a 69.º da petição inicial de Oposição Judicial, que se dão por integralmente reproduzidos e alegados para todos os efeitos legais.
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Em terceiro lugar, invocou o Recorrente que não houve excussão prévia do património da devedora originária, face ao artigo 11.º, n.º 2 da Directiva n.º 2010/24/EU, de 16 de Março de 2010, peticionando a extinção da execução fiscal por falta dos pressupostos para a cobrança da dívida, nos termos do artigo 204.º, n.º 1, alíneas b) e i) do CPPT – cf. artigos 70.º a 81.º da petição inicial de Oposição Judicial...
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