Acórdão nº 01132/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Fevereiro de 2015
Magistrado Responsável | FONSECA DA PAZ |
Data da Resolução | 26 de Fevereiro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM NO PLENO DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: RELATÓRIO A…………, Juiz de Direito, inconformado com o Acórdão da Secção deste Supremo Tribunal, que julgou improcedente a acção administrativa especial que intentara contra o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (doravante CSTAF), a impugnar a deliberação, de 2012.09.19, deste órgão, que ratificara o despacho, de 2012.07.25, do Presidente do CSTAF, que indeferiu o pedido de recusa/suspeição deduzido contra o Instrutor do processo disciplinar que lhe havia sido instaurado, interpôs o presente recurso, tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões (sintetizadas na sequência de despacho do relator): “1.
O Recorrente peticionou a declaração de nulidade/anulação da deliberação do CSTAF de 19.09.2012, que ratificou o despacho de 25.07.2012 do Presidente do CSTAF com fundamento na violação do princípio constitucional da imparcialidade e da fundada desconfiança sobre a imparcialidade do Sr. Instrutor (suspeição/recusa).
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Não obstante toda a prova produzida pelo Recorrente, a verdade é que, surpreendentemente, o recurso foi julgado improcedente, para o que concorreram a resposta à matéria de facto, e a aplicação das regras do direito.
DA AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO 3.
A reapreciação da matéria ‘provada’ e ‘não provada’, com vista à sua ampliação, decorre duma deficiente convicção do Tribunal recorrido sobre a mesma para sustentar a decisão.
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A factualidade dada como provada na decisão recorrida consta de fls. 17 a 22, sob os nºs 1 a 20, sendo certo, todavia, que, em resultado da prova produzida, a matéria constante das conclusões n°s. 9 (e 34), 48, 49, 50, 51, 52, 58, 60, 61, 62, 63, 65, 66, 67 e 68 teria também de ser dada como ‘provada’.
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A conclusão n°. 9 (e a 34) é comprovada pelos docs. nºs 4, 5, 6 e 7 (extraídos do processo disciplinar n°. ……) que foram apresentados pelo Recorrente com a petição inicial do recurso, e que não foram impugnados pela Recorrida.
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Os demais factos são de conhecimento superveniente do Recorrente, e não foram rejeitados pelo Tribunal recorrido (que portanto se têm por admitidos e integrados nos autos).
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A matéria da conclusão n° 48 encontra-se provada pela publicação daquela eleição no Diário da República – 2ª Série, n°. 239, de 11.12.2009, que foi junta às alegações do Recorrente como doc. n°. 1.
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A matéria da conclusão n°. 49 assenta no disposto no art°. 20, n°. 1 do ETAF e no art°. 37°, n°. 2, al. b) do DL 498/72, de 09/12.
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Relativamente à conclusão n°. 50 deveria ter sido dado como provado que “O mandato do Sr. Instrutor como presidente do STA (e do CSTAF) estava compreendido entre Dezembro de 2009 e 24.10.2011, altura em que teria obrigatoriamente de jubilar-se por atingir o referido limite de idade (70 anos)”, uma vez que tais factos decorrem do disposto nos mencionados art°s. 20, nº. 1 do ETAF; 37º, n°. 2, al. b) do DL 498/72, de 09/12, bem como do doc. n°. 2 que o Recorrente juntou às suas alegações, e que foi produzido pelo CSTAF, no qual consta a data de nascimento do Sr. Instrutor.
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Relativamente às conclusões n°s 51, 52 e 58 deveria ter sido dado como provado que: Conclusão n°. 58 “O instrutor assume que queria terminar o seu mandato apenas em 2014.” Conclusão n°. 51: “Era entendimento do Sr. Instrutor que o seu mandato de cinco anos deveria terminar efectivamente em 2014, e não antes (em Outubro de 2011), mesmo que ele perfizesse 70 anos em momento anterior, tendo inclusivamente chegado a efectuar algumas diligências para que a lei fosse mudada de forma a permitir manter-se no cargo para além dos 70 anos” Conclusão n°. 52 “Alteração que, todavia, não veio a ocorrer.” 11.
Todos estes factos são comprovados pelos docs. n°s 3 e 4 junto às alegações do Recorrente, que constituem notícias publicadas no ‘Jornal de Negócios’ e no jornal “Público”, respectivamente, contendo excertos de citações do próprio Sr. Instrutor.
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A factualidade constante da conclusão nº 60 deveria também ter sido dada como provada na medida em que é uma consequência directa dos factos provados números 19, 07, 15 e 20.
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Os factos constantes da conclusão n° 66 e da conclusão n° 67 deviam ter sido dados como provados uma vez que são decorrência directa da norma contida no art° 77.º, nº 1 do ETAF.
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Finalmente, relativamente à matéria constante nas conclusões 61, 62, 63, 65 e 68 deveria ter sido dado como provado o seguinte, na medida em que constituem factos notórios que decorrem do senso comum e da experiência comum: Conclusão n° 61 “Novamente no CSTAF, ele apreciará, debaterá com os demais membros deste órgão e votará todas as matérias que porventura tenham alguma conexão com a presente instância ou com o processo disciplinar a ela subjacente”.
Conclusão n°. 62 “O Sr. Instrutor foi Presidente do CSTAF entre Dezembro de 2009 e Novembro de 2011, sendo natural que, por força destas funções, as suas opiniões sejam bem acolhidas e adquiram um especial relevo e preponderância junto dos restantes membros do CSTAF.” Conclusão n°. 63 “E que, consequentemente, os demais membros do CSTAF acabem por fazer sua a opinião do ex-Presidente.” Conclusão n°. 65 “A sua renúncia ao cargo de Presidente do STA (e consequentemente do CSTAF) permitiu ao Sr. Instrutor influenciar / interferir na escolha do seu sucessor.
” Conclusão n° 68 “Ao invés, tendo renunciado ao cargo com efeitos apenas a partir de 21.10.2011, o então Presidente provocou a antecipação das eleições mas continuou a exercer as suas funções e, assim, influenciar / interferir directamente na escolher o seu sucessor, não só podendo fazer ‘campanha’ nos corredores e gabinetes do STA onde permaneceu em funções, como igualmente votando na eleição do sucessor.
” 15.
O senso comum e a experiência comum constituem um saber informal do homem ‘médio’ e são uma forma de compreensão / conhecimento das coisas por intermédio do saber social, isto é, através de experiências vividas ou ouvidas no quotidiano englobando, designadamente, os costumes, os hábitos, as tradições, as normas, a ética, etc.
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Os factos notórios não carecem de prova, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento público (art°. 514°, n°. 1, do Código de Processo Civil).
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Os factos constantes das conclusões 61, 62, 63, 65 e 68 são ilações / consequências lógicas da factualidade dada como provada, da permanência do Sr. Instrutor no CSTAF, da sua renúncia ao cargo de Presidente deste órgão e do seu posterior regresso ao CSTAF escassos 17 meses depois, em virtude do que constituem também presunções naturais (tal como definidas no art°. 349°, do Código Civil).
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Em consequência do exposto, a decisão recorrida deveria ter dado como ‘provada’ a factualidade constante das conclusões das alegações do Recorrente n°s 9 (e 34), 48, 49, 50, 51, 52, 58, 60, 61, 62, 63, 65, 66, 67 e 68, nos termos supra indicados, pelo que a decisão de facto da causa deve ser ampliada nos termos sobreditos em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito.
DA ERRADA APLICAÇÃO DAS REGRAS DO DIREITO Da violação do princípio constitucional da imparcialidade 19.
Nos termos do n°. 266°, n° 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP) e do art°. 6° do Código do Procedimento Administrativo (CPA), o princípio da imparcialidade constitui (na sua vertente negativa) um meio de protecção da confiança do público nos órgãos da Administração de forma a salvaguardar-se a sua confiança nas autoridades que tomam decisões e, assim, impedindo-se que possa razoavelmente suspeitar-se da sua isenção ou da rectidão da sua conduta.
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Este princípio impõe que os órgãos e agentes da administração ajam de forma isenta e equidistante relativamente aos interesses em jogo nas situações que devem decidir ou sobre as quais se pronunciem sem carácter decisório, estando-lhes vedado intervirem em certos procedimentos a fim de que não possa suspeitar-se da isenção ou rectidão da sua conduta.
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Estão vinculadas ao princípio da imparcialidade, em decorrência da sua natureza funcional, todas as autoridades ou entidades públicas ou privadas que, de alguma forma, exerçam a função administrativa ou pratiquem actos em matéria administrativa, como é precisamente o caso do CSTAF cujas deliberações (designadamente em matéria disciplinar) constituem verdadeiros actos administrativos.
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Acresce que o CSTAF apresenta-se no figurino constitucional como um órgão com independência externa face aos outros poderes estranhos à organização judiciária, e como tal, o princípio da imparcialidade terá de se lhe impor por maioria de razão, como forma de garantir que a sua actuação seja isenta e equidistante face aos interesses em jogo.
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De acordo com a decisão recorrida, o Autor/Recorrente baseia a sua pretensão nos factos constantes dos art°s. 19, 20, 21, 22 e 24 desse articulado, não tendo alegado a “dúvida” sobre a imparcialidade do Sr. Instrutor, antes apresentando determinados factos dos quais retirou a ‘certeza’ de que, no caso dos presentes autos, esta imparcialidade foi posta em crise.
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Acrescentando-se que “À luz das regras comuns da experiência esses factos – base não são (...) idóneos a gerar a convicção da certeza (...) de que o instrutor se afastou das exigências atinentes ao princípio da imparcialidade (isenção, neutralidade, independência e transparência).” 25.
Ora, nos termos do art°. 5°, nºs 1, 2 e 3, do C. P. Civil, (aplicável ex vi artº 35º nº 2 do CPTA), e em decorrência do princípio do dispositivo, às partes incumbe a apresentação da matéria de facto da causa, mediante alegação dos factos principais.
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No domínio da indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas, ao invés, o Tribunal não está condicionado pelas alegações das partes, o que é uma decorrência do princípio constitucional da legitimidade do conteúdo da decisão (que o Tribunal recorrido violou).
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Assim sendo, ao Recorrente incumbia articular/invocar a factualidade subjacente ao pedido formulado ('in caso', a anulação / declaração de...
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