Acórdão nº 0129/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Maio de 2015
Magistrado Responsável | MARIA BENEDITA URBANO |
Data da Resolução | 21 de Maio de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1.
A Conservatória dos Registos Centrais (CRC) interpõe recurso de revista per saltum para este Supremo Tribunal, solicitando a revogação do acórdão do TAF de Lisboa, de 25.02.13, o qual confirmou a decisão do mesmo tribunal, de 26.06.12, que a tinha condenado “a deferir o pedido de aquisição de nacionalidade por naturalização formulada pelo autor” (fl. 83).
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A recorrente terminou as suas alegações, oferecendo as seguintes conclusões (fls 154-5): “I. Tendo A…………. sido punido pela prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual a três anos, não reúne o requisito objectivamente exigido no art.º 6º n.º 1, alínea d) da LN para a naturalização como português, estando a actividade da Administração vinculada à observância dos pressupostos legais exigidos; II. O douto Acórdão recorrido fez uma errada interpretação do citado art.º 6º n.º 1, alínea d) da LN, uma vez que o facto de a pena em que o referente foi condenado não constar já do respectivo certificado de registo criminal, passado o prazo fixado na alínea a) do n.º 1 do art.º 15º da Lei n.º 15/98, de 18 de Agosto, não implica que deixe de dever ser tida em consideração em sede de aquisição da nacionalidade por naturalização, onde o Ministro da Justiça (e quem por sua delegação ou subdelegação actue), exerce um poder que, in casu, é claramente vinculado; Por outro lado, III. Não podem constituir formalidades inúteis e sem objecto, para efeitos de aquisição da nacionalidade portuguesa por naturalização, as consultas oficiosas a entidades policiais (PJ e SEF) e à DGAJ – com acesso à transcrição da totalidade do registo criminal – impostas por lei (cfr. artigos 27º nº 5 e alínea a) do n.º 7 do art.º 37º do RN), o que bem poderia suceder se, para o efeito, apenas se relevasse a informação criminal constante do respectivo certificado, anotando-se que, sobre esta questão fundamental, suscitada pelo aqui recorrente em sede de reclamação para a conferência, se não pronunciou o Acórdão recorrido (alínea d) do n.º 1 do art.º 668º do CPC); Assim, IV. Secundando, como se demonstrou, a doutrina mais abalizada (cfr. Prof. Moura Ramos, ob. cit.) e a melhor jurisprudência, a prática de crime punível com pena de prisão de máximo igual ou superior a três anos, constitui impedimento absoluto à concessão da nacionalidade portuguesa por naturalização, independentemente de entretanto ocorrer a reabilitação do requerente da mesma”.
Termina pugnando pela revogação do acórdão recorrido, devendo ser “integralmente mantido o despacho que indeferiu a naturalização requerida”.
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Devidamente notificado, o R., veio “prescindir do prazo de resposta (30 dias) e reafirmar o já anteriormente alegado pelo Autor no que concerne à interpretação do art.º 6º, n.º 1, alínea d), da Lei da Nacionalidade” (fl. 163).
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Proferido o Despacho de fl. 189, subiram os autos a este STA.
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O Digno Magistrado do MP, devidamente notificado, não emitiu parecer.
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Estando preenchidos os requisitos do artigo 151.º do CPTA (valor da causa superior a três milhões de euros ou valor indeterminável, e sejam suscitadas pelas partes, nas suas alegações, apenas questões de direito), e colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir o presente recurso de revista per saltum.
II – Fundamentação 1.
De facto: São os seguintes os factos dados como provados pelo TAF de Lisboa (fls 139 e ss): (i) O autor nasceu no Bangladesh, em 31.12.75, e tem nacionalidade Bangladeshiana.
(ii) O autor reside em Portugal desde 27.04.01.
(iii) Em 16.05.06 foi emitido pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), em nome do autor, um ‘título de residência temporária’, com validade até 16.05.08.
(iv) O autor obteve aproveitamento no teste diagnóstico de Língua Portuguesa, a que corresponde o nível A2 do Quadro Europeu de Referência para as Línguas.
(v) Em 25.03.08, o autor solicitou a nacionalidade portuguesa por naturalização, nos termos do n.º 1 do artigo 6.º da Lei n.º 37/81, de 03.10, na redacção dada pela LO n.º 2/2006, de 17.04, por ter residência legal no território português há pelo menos seis anos.
(vi) Do certificado do registo criminal do autor, com o n.º 718282-C, emitido em 15.05.08, pelos Serviços de Identificação Criminal da Direcção-Geral da Administração da Justiça da República Portuguesa consta a condenação por crime de aproveitamento de obra contrafeita, com decisão transitada em julgado em 02.05.03, na pena de cinco meses de prisão, integralmente convertida em dias de multa, à razão diária de € 2,00 e na pena de 150 dias de multa à razão diária dos mesmos € 2,00, tendo sido fixada a pena única de 300 dias de multa, à razão diária de € 2,00. Em 15.10.03 foi proferido despacho, comprovado nos autos, do pagamento da multa, tendo sido declarada extinta a pena.
(vii) Em 29.01.09 foi enviado ao autor o parecer emitido pela Conservatória dos Registos Centrais, no âmbito do processo n.º 19320/2008, parecer no sentido do indeferimento do pedido de aquisição da nacionalidade, tendo sido concedido ao autor o prazo de 20 dias úteis para se pronunciar, ao abrigo do n.º 10 do artigo 27.º do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa.
(viii) Em sede de audiência prévia, o autor apresentou novo certificado do registo criminal, emitido em 05.02.09 pelos Serviços de Identificação Criminal da Direcção-Geral da Administração da Justiça da República Portuguesa, o qual faz menção expressa do fim a que se destina – “aquisição da nacionalidade portuguesa” – e dá conta de que “Nada consta acerca da pessoa acima indicada”.
(ix) Em 30.07.10 o seu pedido de aquisição da cidadania portuguesa foi indeferido por decisão da Vice-Presidente do Instituto dos Registos e Notariado, IP. (cujo teor se dá por integralmente reproduzido – fl. 136), por se considerar não estar preenchido o requisito constante do artigo 6.º, n.º 1, alínea d) da Lei da Nacionalidade. A tal decisão foi anexado o parecer emitido pela Conservatória dos Registos Centrais (que damos por integralmente reproduzido – fls 137-40), que assim conclui: “«Face ao exposto, nos termos do n.º 11 do artigo 27.º do RN, submete-se o processo a decisão, com parecer desfavorável ao deferimento do pedido, com fundamento na falta do preenchimento do requisito a que se refere o artigo 6.º, n.º 1, alínea d) da Lei da Nacionalidade»”.
(x) A p.i. da presente acção deu entrada no tribunal em 13.10.10.
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De direito: 2.1.
O problema jurídico que aqui cumpre apreciar e decidir é o de saber se a emissão de um novo certificado do registo criminal (in casu, em 05.02.09), de onde já não conste anterior condenação, permite que se considere cumprida a exigência da alínea d) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei da Nacionalidade (Lei n.º 37/81, de 03.10, com a última versão dada pela Lei n.º 43/2013, de 03.07).
No caso vertente, o que está em causa é, por conseguinte, saber qual a relevância a conferir a informação que foi cancelada do registo criminal de um requerente à obtenção da nacionalidade portuguesa por naturalização. E a questão que se coloca é a de saber se para efeitos de concessão da nacionalidade por naturalização apenas releva a informação constante do certificado do registo criminal, admitindo-se que a reabilitação legal ou de direito do requerente é de molde a satisfazer o requisito do artigo 6.º, ou se, pelo contrário, qualquer condenação nos termos legalmente previstos deve ser tida em consideração e valorada, configurando um obstáculo absoluto, e portanto inultrapassável, à aquisição da nacionalidade portuguesa por naturalização, ainda que o requerente tenha entretanto sido reabilitado.
Foi precisamente esta a questão que o TAF de Lisboa enfrentou, primeiramente em julgamento...
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