Acórdão nº 0425/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Setembro de 2015
Magistrado Responsável | MARIA DO CÉU NEVES |
Data da Resolução | 10 de Setembro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. RELATÓRIO A………………., devidamente identificada nos autos, inconformada com a decisão proferida em 2ª instância, em 29 de Janeiro de 2015 no TCAS, que mantendo a sentença proferida no TAC de Lisboa, no âmbito da providência cautelar de suspensão de eficácia, em que foi antecipado o julgamento da causa principal, julgou improcedente a acção administrativa especial intentada contra o Ministério da Educação, onde peticionava a anulação do despacho comunicado em 14/04/2014, nos termos do qual e em cumprimento do acórdão proferido no TACS, no âmbito do processo nº 0927/12, passou a recorrente à situação de não colocada no par instituição/curso Universidade de Lisboa – Faculdade de Medicina, interpôs o presente recurso.
Apresenta, para o efeito, as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: I. «Inexiste razão na decisão proferida pelo tribunal a quo, pois que, ao contrário do seu entendimento, estamos perante um acto repleto de vícios e que deve ser retirado do ordenamento jurídico nacional.
II. Em primeiro lugar, estamos perante uma situação em que fruto das decisões anteriores é necessário lançar mão do recurso de revista excepcional previsto no nº 1 do art.º 150º do CPTA, sendo que, III. perante mecanismo processual de “cariz excepcional”, deve, o presente recurso de revista ser admitido com vista a uma melhor aplicação do direito, porquanto a fundamentação utilizada no acórdão recorrido, viola a jurisprudência deste colendo tribunal, acrescendo que, IV. Esta mesma questão suscitada nos presentes autos, tem sido, igualmente suscitada num conjunto de processos a correr os seus devidos termos em 1ª e 2ª instância e obtido resultado diverso como se deixou expresso.
V. As razões aduzidas pelo recorrido e acolhidas pelo tribunal a quo no que concerne à legalidade do acto praticado por este, vão no sentido de manutenção da ilegalidade cometida pela administração, ao emitir um acto viciado com as ilegalidades/inconstitucionalidades supra referidas.
VI. Primeiramente, temos de afirmar que estamos perante uma situação em que a Administração actua, de forma perplexa aos olhos da recorrente, em completa violação do principio da legalidade que deve reger a actuação administrativa, e que, impõe a esta, “o dever de obediência à Lei e ao Direito, devendo para o efeito, a Administração respeitar as normas constitucionais e legais (...) e os direitos e as expectativas legitimas dos cidadãos.” VII. Desta forma temos que a Administração – nas diferentes vestes que hoje em dia se multiplicam – está injungida a actuar no completo respeito pelo princípio da legalidade, consagrado no art. 266º, nº 2, da CRP e concretizado no art. 3º, nº 1, do Código do Procedimento Administrativo.
VIII. Este último, concretizando a disposição constitucional do nº 2 do art.º 266º da CRP, estabelece que “Os órgãos da Administração Pública devem actuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes forem conferidos.” IX. Neste nº 1 do art.º 3º do CPTA, o principio da legalidade, deixa as suas origens de uma formulação meramente negativa – como no estado liberal, em que este, apenas impunha os limites à actuação da Administração Pública – para passar para uma formulação positiva, onde, serve de “fundamento, critério e limite de toda a actuação administrativa (cfr. FREITAS DO AMARAL, JOÃO CAUPERS, JOÃO MARTINS CLARO, JOÃO RAPOSO, PEDRO SIZA VIEIRA e VASCO PEREIRA DA SILVA, em Código do Procedimento Administrativo Anotado, 3ª edição, página 40. Em sentido semelhante, pode ver-se o primeiro Autor em Curso de Direito Administrativo, volume II, página 42).
X. A lei, neste sentido, “transforma-se”, passando de um “mero limite” à actuação da administração para um “guia de actuação” que esta terá de respeitar na sua relação com os cidadãos, ou seja, “não há um poder livre de a Administração fazer o que bem entender, salvo quando a lei lho proibir; pelo contrário, vigora a regra de que a Administração só pode fazer aquilo que a lei lhe permitir que faça. (cfr. FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, volume II, páginas 42-43).” XI. A esta luz, torna-se claro, que, na situação em concreto, a DGES, ao praticar um acto, desprovido de habilitação legal, viola o disposto no art. 266º, nº 2, da CRP e concretizado no art. 3º, nº 1, do CPA, ou seja, XII. Não basta dizer, como faz o recorrido, que executa o acórdão do TCAS de 19.12.2013, no sentido de “repor a legalidade”, pois que, essa reposição de legalidade, tem, necessária e obrigatoriamente de ser feita, com respeito pelas regras próprias da actuação da administração e, respeitando as decisões judiciais, ou no caso, o recurso que a recorrente, tinha apresentado para o Supremo Tribunal Administrativo. Em segundo lugar, XIII. O acto praticado pela Administração, nos precisos termos em que o foi, viola o princípio geral de direito, previsto no art.º 12º do Código Civil, o chamado o principio tempus regit actum que “constitui a regra geral de aplicação das leis no tempo e significa que as normas jurídicas têm efeito apenas para o futuro.”, sendo que, XIV. Relativamente ao direito administrativo, tem, a jurisprudência considerado que, “Com referência ao direito administrativo, ao princípio tempus regit actum é geralmente imputado o sentido de que os actos administrativos se regem pelas normas em vigor no momento em que são praticados, independentemente da natureza das situações a que se reportam e das circunstâncias que precederam a respectiva adopção.
XV. Como ficou consignado no Parecer nº 43/47 do Conselho Consultivo da PGR [Procuradoria-Geral da República] o momento da perfeição do acto fornece, pois, o critério temporal para a determinação da lei aplicável: aplicar-se-á a velha ou nova lei, conforme aquele momento for anterior ou posterior ao começo de vigência desta. Em sentido semelhante, XVI. “tem afirmado a jurisprudência deste Supremo Tribunal, a legalidade do acto administrativo afere-se pela realidade fáctica existente no momento da sua prática e pelo quadro normativo então em vigor, segundo a aludida regra, tempus regit actum.
Neste sentido decidiram, pelo menos, os acórdãos da 1ª Secção, de 24.2.99-Rº 43459, de 14.3.02-Rº 47804, de 7.10.03-Rº 790/03, de 5.2.04-Rº 1918/02, de 22.6.04-Rº 1577/04, e deste Pleno, de 24.10.00-Rº 37621, de 6.2.02-Rº 35272, e de 5-05-2005-Rº 614/02.” XVII. Em sentido semelhante, vem, M. E. de Oliveira, in Direito Administrativo, I vol., 169. «O princípio tempus regit actum constitui a regra geral de aplicação das leis no tempo e significa que as normas jurídicas têm efeito apenas para o futuro. Trata-se de um princípio geral de Direito, recebido no artigo 12º do Código Civil, mas enquanto princípio geral vale no Direito público e no privado” (cf. Parecer da PGR nº 135/2001, de 2.5.2002, na linha de orientação de Mário Aroso de Almeida, in Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, págs. 706 e segs.).” XVIII. Trata-se de um princípio geral de direito, recebido no artigo 12º do Código Civil, mas que, enquanto princípio geral, vale no direito público e no privado.” XIX. “O momento da perfeição do acto fornece o critério temporal para a determinação da lei aplicável: aplicar-se-á a velha ou nova lei, conforme aquele momento for anterior ou posterior ao começo de vigência desta.” XX. “Como se afirma no parecer deste Conselho nº 77/2005, «como emanação do princípio da legalidade a que toda a actividade administrativa está sujeita, os actos administrativos devem reger-se pelas normas que estiverem em vigor à data da sua prática (“tempus regit actum”)»”.
XXI. “Este princípio significa, pois, que, em regra, a legalidade do acto administrativo deve ser aferida pela situação de facto e de direito existente à data da sua prolação, considerando-se relevante, para o efeito, não o momento da formulação do pedido, mas o momento em que o acto é praticado.” Quer isto dizer que, tal como se defende em sede de requerimento cautelar a Recorrente, o recorrido, ao praticar o acto administrativo, aqui objecto, fá-lo, sem ter ocorrido o devido e necessário transito em julgado da sentença que esta, pretendia executar, pois que, de acordo com o disposto no Código de Processo Civil, XXII. aqui aplicado supletivamente, mais concretamente, da conjugação disposições do art.º 628º “A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação” e do art.º 704º “A sentença só constitui título executivo depois do trânsito em julgado, salvo se o recurso contra ela interposto tiver efeito meramente devolutivo”, ainda, não tinha transitado em julgado, logo, não estamos perante um titulo executivo passível de ser executado.
XXIII. Desta forma, e ainda que, o único objectivo da administração fosse a “reposição da legalidade”, esta actua, formulando um juízo de antecipação em alguns meses da decisão definitiva e passível de ser executada, pois que, XXIV. Da decisão do Supremo Tribunal Administrativo não existia, no caso em concreto, mais possibilidade de recurso.
XXV. A Administração no caso em concreto, não respeitou o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva de que o recorrido lançou mão, tempestiva e legalmente - pois que, não concordou com aquela decisão e, - na verdade, desrespeitou o poder judicial, ao achar-se no direito de executar uma decisão judicial que ainda não tinha transitado em julgado e que estava, naquele momento, a ser apreciada pelo Supremo Tribunal Administrativo. Ademais, XXVI. Sempre se poderá afirmar que, não pode o recorrido esquecer-se que a prossecução do interesse público – como este alega para justificar a sua actuação ilegal – terá de ser realizada sempre, obrigatória e necessariamente respeitando os direitos e os interesses legalmente protegidos dos cidadãos, ou seja, “num estado de direito...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO