Acórdão nº 508/14.0 PASNT.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelVIEIRA LAMIM
Data da Resolução23 de Junho de 2015
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa: Iº 1. No Processo Comum (Tribunal Colectivo) nº508/14.0PASNT, da Comarca de Lisboa Oeste, Sintra - Inst. Central - 1ª Secção Criminal - J6, em que são arguidos, E e F, o tribunal, após julgamento, por acórdão de 14Jan.15, decidiu: “.....

  1. Absolver o arguido E da prática, em co-autoria material, do crime de roubo, p. e p. pelo art. 210°, n.° 1 e n.° 2 al. b), com referência ao art. 204°, n° 2 al. f) do Código Penal, que lhe vinha imputado.

  2. Condenar o arguido F pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo, p. e p. pelo art. 210°, n.° 1 do Código/ Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão.

  3. Absolver o arguido F do mais que lhe vinha imputado.

    ....”.

  4. Deste acórdão recorre o arguido F, motivando o recurso com as seguintes conclusões (após aperfeiçoamento): 1. O recorrente foi condenado pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo, p. e p. pelo nº 1 do artigo 210º do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão.

  5. Quanto ao outro arguido, E, o Coletivo de Juízes não considerou provada a co-autoria material.

  6. A convicção do Tribunal a quo fundou-se basicamente nos depoimentos das testemunhas de acusação, considerados credíveis para condenar o ora recorrente, mas não suficientemente credíveis para condenar o arguido E.

  7. Todas as testemunhas de acusação reconheceram o arguido E como sendo um dos autores do fato ilícito. No entanto, comprovou documentalmente aquele arguido que, no momento em que o fato ocorreu, ele estava a ser assistido no Hospital.

  8. O documento emitido pelo Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca, E.P.E. foi suficiente para LEVANTAR DÚVIDAS acerca da participação, OU NÃO, do arguido E no ilícito em questão. E, assim sendo, em obediência ao princípio do in dúbio pro reo, foi absolvido.

  9. Ao aplicar este princípio relativamente ao arguido E o Coletivo de Juízes considerou fortemente a possibilidade das testemunhas terem-se equivocado e/ou, até mesmo, mentido quanto ao reconhecimento deste arguido.

  10. E, assim sendo, esta possibilidade também tem de ser relevada relativamente ao ora recorrente, que sempre negou a prática dos fatos. O Coletivo de Juízes não a relevou, cometendo, assim, um erro de apreciação da prova, já que desta extraiu uma conclusão contrária ao que ficou demonstrado e provado. Espera-se que este egrégio Tribunal o faça, reapreciando a prova e absolvendo-o.

  11. Além disso, os depoimentos das testemunhas de acusação não foram suficientes para comprovar a participação do ora recorrente no ilícito em questão. Uma delas sequer reconheceu o arguido na fase de inquérito. Como foi capaz de reconhecê-lo agora? 9. Pelas razões mencionadas anteriormente, o Recurso interposto tem como objeto toda a matéria do Acórdão, bem como a reapreciação da prova gravada.

  12. O depoimento do ofendido C, por si só, suscita dúvidas quanto à participação do ora recorrente no ilícito em questão.

  13. O ofendido disse que reconheceu o ora recorrente através do FACEBOOK. Como? A página do ora recorrente, cuja cópia consta nestes autos, sequer tem o seu nome. De que forma o ofendido realizou a pesquisa? Através da página do arguido E? Mas como chegou à página deste arguido se nela sequer consta o nome E, mas sim, ED? 12. O ofendido também afirmou que o ora recorrente não estava na roda, estando um pouco mais ao lado, e que os seus amigos estavam ao pé do F.

  14. Portanto, as declarações do ofendido demonstram que ele não tem certeza da participação do indivíduo identificado como sendo o ora recorrente no ilícito em questão.

  15. Portanto, muito embora no Acórdão ora recorrido conste, às fls. 11, que “(…) o ofendido disse não ter quaisquer dúvidas acerca da identificação dos arguidos como co-autores dos factos.”; não foi isso que ficou demonstrado através do seu depoimento.

  16. O depoimento da testemunha L também suscita dúvidas relativamente à identificação dos arguidos que, de acordo com ele, foi realizada através do FACEBOOK. E, assim sendo, nos mesmos termos do artigo 11º destas conclusões, pergunta-se: Como? 16. Acrescentou a referida testemunha que APÓS A PESQUISA PELO FACEBOOK mostrou as fotos às outras testemunhas.

  17. Às instâncias da ilustre Magistrada do Ministério Público (MP) acerca do reconhecimento realizado da Esquadra da PSP, a referida testemunha respondeu que era a mesma pessoa que ela tinha visto no FACEBOOK. Não disse, entretanto, que era a mesma pessoa que viu roubar o ofendido.

  18. É muitíssimo provável – e isto está a ocorrer com bastante frequência – que as testemunhas tenham reconhecido os arguidos como sendo os dois indivíduos cuja foto viram no FACEBOOK, e não dois dos indivíduos que participaram do ilícito em questão.

  19. Esta mesma testemunha afirmou que o indivíduo identificado como sendo F tinha as sobrancelhas cortadas.

  20. Pelo seu depoimento extrai-se que ele percebeu claramente que o ofendido estava a ser vítima de um roubo com ameaças do uso de uma faca. Não é credível que, ao invés de observar o que acontecia com o seu amigo, tenha tão bem observado o tal indivíduo branco a fim de reparar nas suas sobrancelhas.

  21. A testemunha M, não reconheceu NA AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO os arguidos, afirmando que “Agora, se visse, não me lembrava.” 22. Quanto à localização do indivíduo branco, a testemunha M respondeu que ele estava de fora da roda, estava longe, deixando sérias dúvidas da participação, OU NÃO, do indivíduo branco no ilícito em questão.

  22. Dúvida que fica ainda mais evidente pela atitude do indivíduo branco que, segundo esta mesma testemunha, ficou para trás, não correu imediatamente ao roubo.

  23. Tais fatos corroboram o depoimento do ofendido que, em momento algum, disse ter certeza da participação do indivíduo branco no ilícito. Muito pelo contrário, demonstrou dúvidas relativamente a esta suposta participação.

  24. Na fase de inquérito, por ocasião do reconhecimento realizado na Esquadra da PSP, mais concretamente 1 (um) mês após o roubo, a testemunha FA NÃO RECONHECEU O ARGUIDO F COMO SENDO O INDIVÍDUO BRANCO QUE PARTICIPOU DO ILÍCITO. Como pode, então, reconhecê-lo cerca de 8 (oito) meses depois? 26. Na audiência de julgamento esta testemunha afirmou não ter tido qualquer dúvida em reconhecer os arguidos quando foi na Esquadra da PSP. Ora, quando esteve naquela Esquadra NÃO RECONHECEU o arguido F como sendo o indivíduo branco que teria participado do roubo em questão. A TESTEMUNHA MENTIU EM TRIBUNAL! E o Coletivo de Juízes sequer mencionou tal fato! Nada fez! 27. Esta mesma testemunha afirmou que o indivíduo branco era um moldavo. Ora, como pode identificar um indivíduo como sendo um moldavo apenas por vê-lo? Conhecia-o? 28. O depoimento da testemunha FA não tem qualquer credibilidade, no entanto, confirma que o indivíduo branco, identificado como sendo o arguido F, estava mais afastado do grupo e nenhuma participação teve no ilícito.

  25. As testemunhas de acusação, todos menores de 16 (dezasseis) anos, dispensados de prestar juramento, não falaram com a verdade.

  26. As testemunhas sequer souberam concretizar o horário em que o crime foi cometido, sendo que o Coletivo de Juízes considerou que o crime ocorreu entre às 17:00 e às 18:00 horas.

  27. Ora, o arguido Ecomprovou ter permanecido até 17:12 horas nas urgências do Hospital Amadora/Sintra, portanto, não poderia ter participado do ilícito em questão.

  28. No entanto, todas as testemunhas, sem qualquer exceção, afirmaram que não viram quaisquer dos indivíduos a mancar, coxo e/ou a usar umas canadianas/bengala. Aliás, afirmaram que o indivíduo negro abandonou o local a correr.

    MENTIRAM! 33. Ao absolver o arguido E, o Coletivo de Juízes pôs em dúvida a credibilidade dos depoimentos prestados pelas testemunhas de acusação. E, assim sendo, esta mesma dúvida também deveria ter sido considerada relevante quanto às declarações prestadas relativas ao ora recorrente. Mas o Coletivo não a considerou.

  29. O Princípio da livre apreciação da prova, ou da livre convicção do Juízo, previsto no artigo 127º do Código de Processo Penal, pode gerar uma decisão arbitrária e, até mesmo, preconceituosa.

  30. E o Acórdão recorrido, nos termos do já anteriormente exposto, consubstancia uma inaceitável violação do Princípio in dúbio pro reo que se identifica com o Princípio da presunção de inocência, formulado em sede constitucional no nº 2 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, também consagrado no artigo 6º da CEDH, uma vez que a mesma dúvida é relevante para um arguido e não o é para o outro, neste caso, o ora recorrente.

  31. “MAIS VALE ABSOLVER DEZ CULPADOS, DO QUE CONDENAR UM INOCENTE.” 37. Neste caso concreto, muito embora haja clara contradição entre os depoimentos, depoimentos evidentemente inverídicos e irreais, o princípio in dúbio pro reo foi violado, uma vez que, NA DÚVIDA – e é certo que a dúvida existiu –, o Coletivo de Juízes optou por condenar o arguido, ao invés de absolvê-lo.

  32. Por todo o anteriormente exposto, e com fulcro nos Princípios do in dúbio pro reo e da Presunção de inocência, o Acórdão recorrido deve ser revogado, absolvendo-se o arguido da prática do crime de roubo.

  33. Caso V. Exa assim não entenda, o que, com a devida vénia, só em tese se admite, desde já se requer a aplicação de nova pena, bastante próxima do limite mínimo, uma vez que a pena aplicada foi exagerada e desproporcional, observando-se a especial atenuação prevista no Regime Especial para Jovens.

  34. Ainda, caso V. Exa não entenda pela revogação do Acórdão ora recorrido, o que, com a devida vénia, só em tese se admite, desde já se requer a V. Exa a suspensão da execução da pena, uma vez que, conforme consta dos autos, é o arguido F um rapaz trabalhador, que tem apoio familiar e da Comunidade. Além disso: a) À época dos fatos tinha apenas 20 anos e estava a trabalhar; b) O seguro foi acionado e o ofendido não teve qualquer prejuízo quanto ao bem roubado; c) A conduta ilícita não teve consequências graves, e, d) O arguido F não fez...

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