Acórdão nº 586/15.5TDLSB-H.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Outubro de 2017

Data25 Outubro 2017
ÓrgãoCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes, em conferência, na 3ª Secção Criminal, deste Tribunal.

*** I–Relatório: Indeferido que foi o pedido de levantamento da apreensão sobre a conta da Massa Insolvente da sociedade L. – LP, S.A., identificada a fls. 3651, veio a referida massa recorrer do despacho, concluindo nos termos que se transcrevem: « a)- O presente recurso tem como objecto toda a matéria de facto e de direito versada no douto despacho promovido pelo Juiz de Instrução Criminal, datado de 06/12/2016, fls. 18 e 19 dos autos do Apenso H do processo em referência: b)- Impugnando-se expressamente a apreensão sobre a conta da massa insolvente, melhor identificada a fls. 3651, dos autos principais.

c)- O Administrador de Insolvência requereu o levantamento da apreensão de bens que não pertenciam ao Arguido o que lhe foi expressamente concedido, nos termos do n.°1 do art. 186.° do C.P.P..

d)- A apreensão subsequente, e da qual se recorre é ilegal, sendo que afronta, designadamente o art. 62.° da Lei Fundamental, bem como o disposto nas normas dos arts. 36°, 46.° e 149.3 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas - C.I R.E.

e)- A apreensão efectuada em ... padece de nulidade, cf. apreensão sobre a conta da massa insolvente identificada a fls, 3651. nos termos das normas supra referidas.

f)- A apreensão é ilegal, dado que, o Sr. Administrador de Insolvência não foi previamente ouvido, como determinava o artigo 81°, n.° 4 do CIRE.

g)- Salvo melhor entendimento a referida apreensão é ainda inconstitucional, pois viola as normas contidas nos arts 13.°, n.° 1, 20.°, n.°s 1, 4 e 5 da CRP.

h)- O Decreto-Lei n° 11/2007 de 19 de Janeiro, não prevê a possibilidade de o valor da Massa Insolvente apreendido para se declarar perdido a favor do Estado, o que veio a acontecer nos presentes autos.

i)- Acresce que, sustenta a decisão da qual se recorre, a fls. 19 que “solidificaram-se os indícios de que o arguido E. terá praticado crimes...".

j)- Tal afirmação é manifestamente ilegal e viola o princípio da presunção de inocência.

k)- O saldo bancário apreendido - propriedade da massa insolvente - não foi declarado perdido a favor do Estado, nem tão pouco desencadeado o procedimentalismo para tanto.

I)- O despacho recorrido enferma de uma vaguidade, abstracção e suposições, sendo que por falta de fundamentação, deve igualmente determinar-se a nulidade do despacho do tribunal a quo, proferido pelo Juiz de Instrução Criminal.

m) Todo e qualquer crédito que o Ministério Público entenda reclamar sobre a L. – LP, S.A., com o NIPC 508313422, tem de ser reclamado no processo de insolvência, sendo manifestamente ilegal e inconstitucional que use o presente processo-crime para o efeito, pois tal violaria o direito dos demais credores da Insolvência.

n)- Violando-se, igualmente, diversos princípios constitucionais regulares do Estado de Direito, maxime arts. 13.°, n.° 1, 20.°, n.°s 1, 4 e 5 da CRP que expressamente se invocam para os devidos efeitos legais.

o)- O valor agora apreendido só foi possível de realizar por a Massa Insolvente ter incorrido em diversas despesas.

p)- Despesas essas que o Administrador de Insolvência se vê agora manietado de cumprir.

q)- Se o Ministério Público pretendia reclamar sobre o resultado da apreensão dos bens para a massa insolvente, então, deveria tê-lo requerido por via do procedimento a que aludem os art.°s 141° e seguintes, do CIRE.

r)- Ao não o fazer subverteu as competências próprias da figura do Administrador de Insolvência.

s)- Evitando os trabalhos e custos previstos no n.° 2, do artigo 185°. do CPP.

t)- O Administrador de Insolvência não é titular de acção penal nem lhe estão delegadas funções nesse sentido, não sendo, com todo o devido respeito, funcionário do M P.

u)- A apreensão do saldo bancário - propriedade da Massa Insolvente - não se revela necessária, proporcional ou adequada, o que viola transversalmente o princípio da proporcionalidade.

v)- A apreensão não obedece aos pressupostos contidos no art. 181°, n.°1 do C.P.P.. porquanto nem o saldo bancário tem que ver com crime algum, nem tal se afigura interessante para a descoberta da verdade ou para a prova.

w)- A fls. 19 do despacho recorrido afirma-se: "(...) a sua venda sido autorizada pelo Ministério Público em conformidade com o art 185°. n.°s 1 e 2 do CPP, dado que a manutenção da apreensão sobre os bens em causa, atenta a natureza dos mesmos, não só não acarretaria custos para o Estado como iria necessariamente determinar uma perda do valor’:.

x)- O que vai de encontro ao disposto nas alíneas b) e c) do art 410.° do C.PP. e revelador de que foi cometida uma ilegalidade.

y)- Além da falta de fundamentação concreta, jamais se demonstra que os bens fossem perecíveis, perigosos, deterioráveis ou que a sua utilização implicasse perda de valor ou qualidades e que com isso se determinasse a sua venda.

z)- Igualmente revelador das ilegalidades cometidas e da leviandade com que que se actuou, é que o produto da venda não é nenhum sinalagma resultante de qualquer modalidade de venda prevista em lei processual civil, para os fins do n.° 2 do art. 185 ° do CPP aa)- Razão pela qual se não pode fundamentar, ficcionando-se, a situação de facto com a recondução à norma acabada de referir.

bb)- Giza o despacho recorrido que "(...) a manutenção da apreensão sobre os bens em causa, atenta a natureza dos mesmos, não só acarretaria custos para o Estado como iria necessariamente determinar uma perda de valor”.

cc)- Além de antagónico, tal argumentação é insuficiente para a decisão da matéria de facto provada nos termos da alínea a) do n.°2 do art. 410 ° do CPP.

dd)- Uma vez que todos os custos oriundos do depósito, conservação e guarda dos bens - que foram vendidos - integraram a contabilidade da Massa Insolvente, aqui recorrente.

ee)- Cabendo-lhe a ela liquidar os montantes das rendas do Armazém sito em Vale Figueira, no valor de € 71.398,16, bem como, pagar todas as despesas relacionadas com os serviços de segurança, bem como todas aquelas que se revelarão necessárias à intermediação da venda dos bens.

ff)- Razão pela qual se anota o desacerto do despacho recorrido e que é forçoso que se revogue em absoluto.

gg)- A apreensão é ilegal, inconstitucional, pois é desnecessária, desadequada e desproporcional fazendo uma interpretação errada daquilo que são as normas invocadas, designadamente, os arts. 111.°, n.°2 do C.R 178.°. n.°1, 181.°, n.°1 e 185°, n°1 e 2 do CPR hh)- O despacho recorrido viola o princípio da culpa, o princípio da igualdade, viola a boa-fé e as legítimas expectativas tuteladas pelo Direito no que toca à posição patrimonial da Massa lnsolvente aqui recorrente.

ii)- Viola o princípio do contraditório e da autonomia patrimonial, ao mesmo tempo que faz tábua rasa do princípio da proporcionalidade.

jj)- Caso assim se não entenda, o que por mero dever de patrocínio se coloca, deverá, no limite, ser o Ministério Público condenado a entregar à Massa Insolvente a quantia referente a todas as despesas resultantes da guarda, conservação e venda acrescida de juros legais que se vierem a apurar em incidente de liquidação, conforme n.°3 do art. 185.° do C.P.P..

kk)- O despacho recorrido além de injusto é ilegal, sendo proferido ao arrepio do disposto, designadamente, nas normas dos arts. 62.°, 13 n°1, 20.° n.°1, 4 e 5, 32.°, 18 ° da C.R.P.; 46°, n.°1, 36°, 81° n.°4, 149° e 141.° do C.I.R.E., 181.° n.°1, 185.° do C.P.P..

II)- Por tudo o que foi exposto, a apreensão que aqui se recorre deve ser revogada, nos termos do n.° 6 do art. 178.° do CPP.

mm)- Violou-se a Lei ao proceder como se procedeu criando uma injustiça e afronta incompatível com um Estado de Direito Democrático que ao douto Tribunal da Relação de Lisboa cumpre sindicar.

Termos em que se requer que seja dado provimento ao recurso e em consequência seja revogada a decisão que aqui se recorre, maxime a apreensão sobre a conta da massa insolvente, melhor identificada a fls. 3651 dos autos, ou caso assim se não entenda, o que por mera hipótese e dever de patrocínio se coloca ser o Ministério Público obrigado a entregar à Massa Insolvente a quantia equivalente às despesas resultantes da guarda, conservação e venda dos bens, acrescida de juros legais, que esta teve de suportar ou que a si é exigido, conforme sentido teleológico da norma do n.°3 do art. 185.° do C.P.P., e que se vier a apurar em incidente de liquidação. ».

*** Contra-alegou o Ministério Público, concluindo as respectivas alegações no sentido da improcedência do recurso, com fundamento em que: «A apreensão dos bens da L. – LP, S.A., efetuada pela Polícia Judiciária, foi validada tempestivamente pelo Ministério Público, nos termos do art. 178° n.° 1, 3 e 5 do Código de Processo Penal, carecendo de qualquer fundamento outrossim a invocação de nulidade dessa apreensão, sendo que o respetivo n.° 7 impõe o exercício do contraditório posteriormente à apreensão (como ocorreu) e não antes.

Essa apreensão precedeu, em muito, a declaração de insolvência da L. – LP, S.A., inexistindo dúvidas de que os bens em causa estiveram até à sua venda sempre à ordem destes autos, pelo que o destino da quantia resultante da venda dos mesmos tem de ser decidida neste âmbito e não no do processo de insolvência, aliás menos até por isso do que pela natureza de um e de outro.

O Ministério Público não invocou (nem tinha de invocar) qualquer crédito sobre a L. – LP, S.A. mas sim, como resulta de mera leitura da promoção e do douto despacho, que os bens adquiridos pela L. – LP, S.A. com dinheiro desviado pelo arguido E. G. de massas insolventes por si geridas são produto do crime de peculato em causa nos autos e, logo, também o é o resultado dessa venda, a qual o Ministério Público somente autorizou nesse intuito e de modo a conseguir o maior valor possível e não porque quisesse “abrir mão”, nestes autos, desses bens ou montantes. Aliás, a apreensão dos bens só foi levantada depois de determinada judicialmente e efetuada a do...

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