Acórdão nº 1775/11.7IDLSB.L2-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelARTUR VARGUES
Data da Resolução15 de Março de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Texto integral Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I - RELATÓRIO 1.

Nos presentes autos com o NUIPC 1775/11.7IDLSB, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa - Instância Local – Secção Criminal - J8, com intervenção do Tribunal Singular, foram os arguidos A e “CRH – Consultoria e Valorização de Recursos Humanos, S.A.” condenados, por sentença de 14/07/2014, nos seguintes termos: O A, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal qualificado, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 6º e 105º, nºs 1, 4, 5 e 7, da Lei nº 15/2001, de 05/06 (RGIT), em conjugação com o disposto nos artigos 30º, nº 2 e 79º, nº 1, ambos do Código Penal; A “CRH”, na pena de 560 dias de multa, à razão diária de 5,00 euros, o que perfaz o montante global de 2.800,00 euros, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal qualificado, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 7º e 105º, nºs 1, 4, 5 e 7, da Lei nº 15/2001, de 05/06 (RGIT), em conjugação com o disposto nos artigos 30º, nº 2 e 79º, nº 1, ambos do Código Penal.

  1. Os arguidos, bem como o Ministério Público, não se conformaram com a decisão e dela interpuseram recurso, tendo sido lavrado neste Tribunal da Relação acórdão, aos 24/02/2015, que decidiu: Declarar a nulidade da sentença de 14/07/2014 e dos actos subsequentes da mesma dependentes, determinando-se a reabertura da audiência para que seja dado cumprimento ao estabelecido no artigo 358º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Penal; Declarar prejudicada, pela anterior declaração de nulidade, a apreciação das demais questões suscitadas no recurso interposto pelo arguido A, bem como as que o foram nos recursos interpostos pela arguida “CRH – Consultoria e Valorização de Recursos Humanos, S.A.” e Ministério Público.

  2. Proferida foi nova sentença na 1ª instância aos 17/09/2015, que condenou os arguidos nos seguintes termos: O A, na pena de 1 ano e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal qualificado, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 6º e 105º, nºs 1, 4, 5 e 7, da Lei nº 15/2001, de 05/06 (RGIT), em conjugação com o disposto nos artigos 30º, nº 2 e 79º, nº 1, ambos do Código Penal; A “CRH”, na pena de 400 dias de multa, à razão diária de 5,00 euros, o que perfaz o montante global de 2.000,00 euros, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal qualificado, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 7º e 105º, nºs 1, 4, 5 e 7, da Lei nº 15/2001, de 05/06 (RGIT), em conjugação com o disposto nos artigos 30º, nº 2 e 79º, nº 1, ambos do Código Penal.

  3. Os arguidos A e “CRH”, inconformados com o despacho proferido em 02/07/2015, que indeferiu a arguida nulidade do despacho lavrado em 29/06/2015, que não admitiu a audição de testemunhas pelos mesmos impetrada, dele interpuseram recurso, com as conclusões que se transcrevem: 1. Na sequência da alteração da qualificação jurídica e, não tendo sido comunicada essa alteração aos arguidos, após recursos interpostos, veio o douto Acórdão da Relação de Lisboa, datado de 24/02/2015, declarar a nulidade da sentença preferida em 14/07/2014 e dos actos subsequentes da mesma dependentes, tendo determinado a reabertura da audiência para que fosse dado cumprimento ao estabelecido no artigo 358º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Penal; tendo ainda declarado prejudicada, por força dessa declaração de nulidade, a apreciação das demais questões suscitadas nos recursos interpostos.

  4. Na data designada para a reabertura da audiência, foi então comunicada aos arguidos a alteração da qualificação jurídica, tendo por estes sido requerido prazo para a preparação da defesa, o qual foi concedido.

  5. Com a apresentação da defesa, arrolaram os arguidos duas testemunhas. ao abrigo do disposto no art. 340º do CPP, os quais são Administradores da sociedade que adquiriu a sociedade arguida, e se mostram conhecedoras de factos essenciais para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa, e que se prendem com a gestão de facto da sociedade, sendo que apenas se teve conhecimento superveniente das mesmas, motivo pelo qual não foram indicadas anteriormente.

  6. Sucede que, tal produção de prova foi indeferida pela Mma Juiz a quo, por entender que:"(...) não se afigura viável a apresentação de defesa quanto à alteração da qualificação jurídica mediante a produção de prova testemunhal (...).

  7. Ora, não podem os arguidos concordar com tal decisão.

  8. Porquanto, gozam os arguidos do mais amplo direito de defesa, estando este consagrado no art. 32º da Constituição da República Portuguesa.

  9. De facto, o referido art. 340º CPP, consagra o denominado princípio da investigação ou da verdade material.

  10. Este princípio significa, mesmo no quadro de um processo penal orientado pelo principio acusatório (art. 32º, nº 5 da Constituição da República Portuguesa), que o Tribunal de julgamento tem o poder-dever de investigar por si o facto, isto é, de fazer a sua própria "instrução" sobre o facto, em audiência, atendendo a todos os meios de prova não irrelevantes para a descoberta da verdade, sem estar em absoluto vinculado pelos requerimentos das partes, com o fim de determinar a verdade material.

  11. Daqui resulta que o Tribunal deve, oficiosamente, ou a requerimento das partes, ordenar a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigurar necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa.

  12. Sendo que este princípio tem limites, os quais se encontram previstos nos nºs. 3 e 4 do citado artigo 340º do CPP.

  13. Ora. o cumprimento do Acórdão da Relação de Lisboa de 24/02/2015, implicava a reabertura da audiência para que fosse dado cumprimento ao estabelecido no art. 358º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Penal, mas não impedia a produção de novos meios de prova e o exercício cabal da defesa dos Arguidos.

  14. Consequentemente, o indeferimento do requerimento apresentado pelos Arguidos, não pode encontrar-se no cumprimento estrito do que fora superiormente ordenado.

  15. Na verdade, as razões que levaram ao indeferimento do requerido pelos Arguidos não se situam no núcleo essencial da questão, isto é, não se prenderam diretamente com o se (ou não) «afigurar necessário para a descoberta da verdade e boa decisão da causa», mas antes em razões externas e improcedentes, sem mesmo, se haver tentado previamente uma aproximação indiciária à utilidade intrínseca da diligência.

  16. Por tudo o exposto, deve ser revogado o despacho em crise e, consequentemente, ser substituído por outro que admita a requerida audição das testemunhas.

    NESTES TERMOS, e nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser considerado procedente e, em consequência, ser revogado o despacho em crise, devendo ser admitida a produção da prova requerida.

  17. O Ministério Público respondeu à motivação de recurso, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, por se não verificar qualquer nulidade.

  18. O arguido A interpôs recurso da sentença de 17/09/2015, apresentando as seguintes conclusões (transcrição): 1. Entende o arguido A, que não deveria ter sido condenado como autor de um crime de abuso de confiança fiscal qualificado, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 6.º e 105.º, n.º 1, 4, 5 e 7 da Lei n.° 15/2001, de 5 de Junho (RGIT), em conjugação com o disposto nos artigos 30º, n. 2 e 79º, n. 1, ambos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão, suspensa por igual período, uma vez que da prova produzida em audiência de julgamento não resulta sem margem para dúvidas que o recorrente passasse a tomar as decisões inerentes à gestão patrimonial da sociedade, desde Julho a Novembro de 2011.

  19. O aqui Recorrente não se conforma, com a fundamentação da matéria de facto assente pelo Tribunal «a quo», nomeadamente no que diz respeito aos factos dados como provados e à valoração dos depoimentos feitos pelo Tribunal «a quo» na decisão em crise.

  20. Vem o Recorrente impugnar a matéria de facto, nos termos do art. 412.º, n.º 3, do CPP, na medida em que, salvo o devido respeito, que, aliás, muito o é, afigura-se-nos que a decisão proferida através da mui douta sentença do Tribunal «a quo» merecerá reparo pela parte do aqui Recorrente, uma vez que considera diversos pontos da matéria de facto provada incorretamente julgados, nomeadamente os Pontos 9, 11, 17, 18, 19 e 20.

  21. Assim, conjugado o teor dos depoimentos áudio gravados em suporte informático, bem como outros meios de prova juntos aos presentes autos, com os restantes factos dados como provados na douta sentença, não deveria o arguido, aqui Recorrente, ter sido condenado.

  22. Há alguns factos dados como provados, que no modesto entendimento do Recorrente não o poderiam ter sido em face da prova produzida em audiência, pelo que, foram violados os princípios da presunção de inocência, da verdade material, da legalidade, da livre apreciação da prova e do in dúbio pro reo.

  23. Com efeito, não existe qualquer documento junto aos autos que comprometa o aqui Recorrente, na gestão de facto da sociedade arguida.

  24. No que tange à prova testemunhal o Tribunal apreciou erradamente as declarações de duas testemunhas, cujos testemunhos assumiram especial relevo para decisão da causa, JC e CS, já que dos mesmos não podia retirar qualquer premissa que concluísse que o Recorrente exercesse de facto a gestão da sociedade arguida, Vejamos, 8. Refira-se, tal como consta também da sentença em crise, nos factos provados - ponto 3 – "Por sentença proferida em 30.11.2010, no âmbito do processo nº 1516/10.6TYLSB, que corre termos no 3º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa, foi declarada a insolvência da sociedade arguida, tendo sido nessa mesma data nomeado como Administrador da Insolvência o arguido A." E ainda – ponto 4 – "No âmbito desses autos de insolvência, no dia 24.02.2011 realizou-se a...

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