Acórdão nº 23/14.2PCOER.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 04 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelANTERO LU
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Nos presentes autos de recurso acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I Relatório Na Comarca de Lisboa Oeste, Instância Local de Oeiras, Secção Criminal, Juiz 2, por sentença de 02/07/2015, constante de fls. 144 a 151, foi o arguido, T..., …, condenado, - pela prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143º, n.º 1, do C. Penal, na pena de 30 (trinta) dias de multa, à taxa diária de 6,00 €, perfazendo o montante de 180,00 € (cento e oitenta euros); - a pagar ao “Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, E.P.E.”, o montante de 112,07 €, a título de danos patrimoniais, acrescido dos juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a notificação do pedido e até integral pagamento.

*** Não se conformando, o arguido interpôs recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 204 a 223, com as seguintes conclusões: (transcrição) I. O recorrente impugna a douta sentença recorrida sobre matéria de facto, atento que o Tribunal a quo não valorizou corretamente a prova produzida, ocorrendo um erro notório de apreciação da prova (art. 410º n.º 2, alínea c), do C. de Processo Penal), apreciando-a incorretamente, admitindo este artigo o alargamento dos fundamentos do recurso às hipóteses previstas nas suas três alíneas, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum.

  1. Como decorre do corpo do nº 2 do art. 410º do C. de Processo Penal, estes vícios têm de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, o que significa que qualquer dos vícios tem de resultar da análise da decisão recorrida, na sua globalidade, mas sem recurso a elementos estranhos a ela, ainda que constantes do processo.

  2. Desde logo, diz o Recorrente que o Tribunal não poderia dar como provado os pontos 6, 7, 8 e 9 dos factos provados que constam do capítulo II, referente à fundamentação.

  3. E são estes itens que o arguido pretende que deixem de constituir a matéria de facto provada e passem a constar na matéria de facto não provada.

  4. Em primeiro lugar, há desde logo duas versões dos factos, uma a que é apresentada pela arguido, que nega que alguma vez tenha agredido o queixoso e a outra, a do queixoso, que afirma que o arguido lhe deu um soco contrariando o que afirmou na queixa-crime onde referiu que o arguido lhe deferiu vários murros.

  5. Os depoimentos das testemunhas de acusação foram suficientemente esclarecedores e cruciais para a descoberta da verdade material de forma a percebermos que as testemunhas não se afiguram credíveis atento os depoimentos prestados em sede de declarações na PSP, que contam outra versão dos factos.

  6. O Tribunal a quo, decidindo pela forma em que o fez, violou os artigos 128.° e 355.° do Código de Processo Penal, para ponderação da prova testemunhal.

  7. A sentença é nula por falta de indicação e exame crítico das provas atento que no ponto C) da sentença, intitulado "Convicção do Tribunal", o Tribunal a quo limita-se a afirmar que, no que aos factos respeita, assentou após análise crítica de toda a prova produzida em audiência, usando todas as presunções legais em processo penal admissíveis, limitando se a proferir uma menção genérica aos depoimentos dos autos sem enunciar em que termos valorou cada um deles como meio de prova e em que medida os mesmos contribuíram para o seu convencimento.

  8. Inexiste uma apreciação crítica dos depoimentos das testemunhas bem como dos documentos sendo certo que os documentos constantes dos autos constam de uma fotografia apresentada pelo queixoso e alegadamente tirada pela sua irmã, sem qualquer prova que a mesma tenha sido tirada em resultado de uma qualquer conduta do arguido.

  9. Os documentos constantes dos autos não fazem prova uma vez que não é possível apurar a origem do alegado ferimento provocado pelo arguido.

  10. Conforme estipula o artº 379 al. a) CPP, é nula a sentença que não contiver as menções referidas no n.º 2 e na al, b) do nº 3 do art.374º do CPP.

  11. Por sua vez, dispõe o art.º 374º, nº 2 que, "ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que terão servido para formar a convicção do tribunal, omitindo qualquer referência à apreciação crítica das mesmas.

  12. A falta de exame crítico das provas, imposto pelo artº 374°, n.º 2, do CPP, e a consequente insuficiência da fundamentação determina, nos termos do art. 379.°, n. nº1 a), do mesmo código a nulidade da sentença.

  13. A mera menção dos documentos juntos ao processo ( foto e relatório medico) não satisfaz a exigência de indicação das provas em que se fundou, circunstância que necessariamente conduzirá à nulidade da decisão em razão do disposto nos artºs 374.°, nº 2 e 379°, n.º 1 al. a) do CPP, pelo que se impõe ordenar o suprimento da nulidade verificada, com a consequente revogação da decisão e determinação de prolação de nova sentença da qual conste a indicação especificada da prova documental fundamentadora da convicção e o exame crítico das provas, circunstancia que sempre conduzirá à nulidade da sentença em razão do disposto nos art.º 374.°/2 e 379/1 al. a) do Código de Processo Penal.

  14. O depoimento da A..., única testemunha que assistiu à troca de palavras entre o ofendido e o arguido e á forma como os factos entre ambos ocorreram, não só não foi considerado, como ainda é referido na sentença que a testemunha não se pronunciou quanto à agressão, o que não corresponde à verdade como se pode verificar pela audição do seu depoimento, no qual afirma que não existiu qualquer agressão.

  15. A douta sentença ora posta em crise é contraditória e não fundamenta a razão pela qual deixou de se pronunciar sobre as declarações da testemunha Ana Bugalho bem como não esclareceu donde retirou a credibilidade das testemunhas mãe e irmã do queixoso, uma que nada viu e outra que apesar da discussão apenas assomou a janela no momento do murro.

  16. Ora tal contradição entre a matéria dada como provada e a prova que foi produzida enferma de nulidade insanável a douta sentença recorrida.

  17. O arguido não se conforma com a sentença uma vez que a prova produzida em audiência não poderia dar lugar aos factos provados, nomeadamente, que o arguido sabia e queria incorrer no crime pelo qual foi condenado.

  18. Pretendendo desta forma, o arguido ver apreciados os pontos que indica da matéria de facto provada, que entende incorretamente julgados, para efeitos da sua reapreciação.

  19. Se é certo que no âmbito do direito penal vigora o princípio da livre apreciação da prova (art.º 127º do C.P.P.), o mesmo não pode confundir-se com a apreciação arbitrária da prova, nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova, sendo, em concreto, reconduzível a critérios objetivos.

  20. O aludido princípio determina que o juiz se resolve, não por critérios formais mas através de um juízo objetivo - material, atípico e concreto.

  21. Desta forma, a prova livre não se confunde com prova arbitrária, obedecendo, antes, a critérios da experiência comum e da lógica do homem médio. O princípio da livre apreciação da prova pelo tribunal, constitui, no fundo, um dever de perseguir a chamada verdade material e, no exercício desse dever, o tribunal não pode esquecer o princípio de a dúvida ser decidida a favor do réu - princípio do ín dubio pro reo.

  22. O Principio da Livre Apreciação da Prova, plasmado no art. 127º do C. de Processo Penal. Este princípio indica que a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente (salvo as exceções ressalvadas na lei que, no caso, não se colocam).

  23. Os limites que estão subjacentes no citado art. 127º do C. de Processo Penal e que, aliados à institucionalização das regras de motivação e controlo em sede de apreciação da prova que obrigam a uma correcta fundamentação fáctica das decisões (cf. artigo 374 n.º 2 do mesmo Código).

  24. A censura da forma de formação da convicção do Tribunal não pode, consequentemente, assentar de forma simplista no ataque da fase final da formação da convicção, como o fez na valoração da prova.

  25. Não consta da douta sentença recorrida a fundamentação da decisão proferida sobre a matéria de facto atento que não faz referência às declarações integrais da testemunha Ana Paula e dos fundamentados dos motivos da credibilidade dos depoimentos e dos documentos juntos aos autos atento que só uma tal fundamentação satisfaz a exigência resultante dos arts. 127º e 374°, n° 2, ambos do C. de Processo Penal.

  26. A testemunha A... corroborou a versão do arguido afirmando que o arguido não agrediu o ofendido, pelo que o Tribunal a quo, decidindo pela forma em que o fez, violou os artigos 128.° e 355.° do Código de Processo Penal, para ponderação da prova testemunhal.

  27. Bem como violou, ainda, o princípio da valoração da prova e o princípio in dúbio pro reo XXIX. Assim, da prova produzida em sede de julgamento, nenhuma dúvida subsiste acerca da inocência do arguido na prática dos factos pelos quais vem acusado.

    Nestes termos e demais de direito deve o presente recurso obter provimento, e em consequência absolver o Recorrente como é de Justiça! (fim de transcrição) *** A Exma. Magistrada do Ministério Público respondeu ao recurso nos termos constantes de fls. 230 a 236, concluindo nos seguintes termos: (transcrição) 1.

    O recorrente alega a existência de erro na apreciação da prova por entender que não poderia dar-se como provado os pontos 6, 7, 8 e 9 e assenta a sua convicção no facto de se tratar de uma situação em que arguido e ofendido apresentam versões contraditórias do que se passou.

    1. Mais alega que as testemunhas mãe e irmã do queixoso mentiram porque...

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