Acórdão nº 11744/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 29 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelNUNO COUTINHO
Data da Resolução29 de Janeiro de 2015
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – Relatório Maria ……………, requereu no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa providência cautelar de suspensão de eficácia de acto administrativo comunicado por ofício datado de 14 de Abril de 2014, nos termos do qual, em cumprimento do Acórdão proferido por este Tribunal Central no âmbito do Proc. nº 09271/12 passou à situação de não colocada no par instituição/curso Universidade de Lisboa – Faculdade de Medicina Por despacho de fls. 258 foi decidido antecipar o juízo sobre a causa principal, tendo o T.A.C. de Lisboa, por sentença proferida em 7 de Outubro de 2014, decidido julgar improcedente a acção.

Inconformada com o decidido, a A. recorreu para este TCA Sul, tendo formulado as seguintes conclusões: “1 Entende a recorrente que deve o recorrido se assim achar devido, deve expurgar da ordem jurídica administrativa, o despacho proferido pelo Director Geral do Ensino Superior, a 10 de Abril de 2014 dado que este acto é irremediavelmente ilegal no que tange à situação concreta a recorrente, 2. O acolhimento do designado princípio do aproveitamento dos actos administrativos não é aceitável na formulação que dela faz o tribunal a quo.

3. Isto porquanto não houve um juízo antecipatório da Administração, que não deve ser protegido, visto que, “executa” um acórdão, que não era definitivo, e, do qual existiu o competente e legal recurso, para o Supremo Tribunal Administrativo se pronunciasse sobre tal matéria e, em definitivo, sentenciar, Esta postura, 4 por parte da Administração, em nosso entender, não é defensável e, não deve ser “validada”, pois que, se corre o risco de que, esta, sempre que se achar com razão, execute toda e qualquer decisão judicial, sem que esta, tenha transitado em julgado, colocando assim, em causa, o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva dos cidadãos. Desta forma, 5.consideramos que este comportamento da administração é um comportamento censurável e, violador do principio da legalidade, nas suas diferentes vertentes mas, que, 6.impõe a esta “o dever de obediência à Lei e ao Direito, devendo para o efeito, a Administração respeitar as normas constitucionais e legais (…) e os direitos e as expectativas legítimas dos cidadãos.” 7.Desta forma ternos que a Administração - nas diferentes vestes que hoje em dia se multiplicam - está injungida a actuar no completo respeito pelo princípio da legalidade, consagrado no art. 266º, nº 2, da C.R.P, e concretizado no art. 3º, nº 1, do Código do Procedimento Administrativo.

8. Este último, concretizando a disposição constitucional do n.º 2 do artº 266º da CRP, estabelece que “Os órgãos da Administração Pública devem actuar em obediência à lei e ao direito, dentro dos limites dos poderes que lhes estejam atribuídos e em conformidade com os fins para que os mesmos poderes lhes forem conferidos.” 9. Neste nº 1 do artº 3º do CPTA, o principio da legalidade, deixa as suas origens de uma formulação meramente negativa - como no estado liberal, em que este, apenas impunha os limites à actuação da Administração Pública - para passar para uma formulação positiva, onde, serve de “fundamento, critério e limite de toda a actuação administrativa (cfr. FREITAS DO AMARAL, JOÃO CAUPERS, JOÃO MARTINS CLARO, JOÃO RAPOSO, PEDRO SIZA VIEIRA e VASCO PEREIRA DA SILVA, em Código do Procedimento Administrativo Anotado, 3º edição, página 40. Em sentido semelhante, pode ver-se o primeiro Autor em Curso de Direito Administrativo, volume li, página 42).

10 A lei, neste sentido, “transforma-se”, passando de um “mero limite à actuação da administração para um “guia de actuação” que esta terá de respeitar na sua relação com os cidadãos) ou seja, “não há um poder livre de a Administração fazer o que bem entender, salvo quando a lei lho proibir; pelo contrário, vigora a regra de que a Administração só pode fazer aquilo que a lei lhe permitir que faça. (cfr. FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, volume 11, páginas 42-43).” 11.Este tema, foi abordado também por MARCELO REBELO DE SOUSA, Lições de Direito Administrativo, 1999, volume 1, página 84, que refere: “Com o Estado pós-liberal, em qualquer das suas três modalidades, a legalidade passa de externa a interna. A Constituição e a lei deixam de ser apenas limites à actividade administrativa, para passarem a ser fundamento dessa actividade. Deixa de valer a lógica da liberdade ou da autonomia, da qual gozam os privados, que podem fazer tudo o que a Constituição e a lei não proíbem, para se afirmar a primazia da competência, a Administração Pública só pode fazer o que lhe é permitido pela Constituição e a lei, e nos exactos termos em que elas o permitem.”, afirmando ainda, que, 12.”Esta obediência à Constituição e à lei estende-se, por força delas mesmas, a todas aos actos a que elas conferem força vinculativa, designadamente, normas de direito internacional, regulamentos e contratos administrativos e actos administrativos constitutivos de direitos, que integram o bloco de legalidade condicionante da actuação administrativa” 13.Em sentido semelhante defendem MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA CONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM, em Código do Procedimento Administrativo Comentado, volume 1, 1ª edição página 138 referindo que “a actuação da Administração Pública é comandada pela lei, sendo ilegais não apenas os actos (regulamentos ou contratos) administrativos produzidos contra proibição legal, como também aqueles que não tenham previsão ou habilitação legal, ainda que genérica (ou até orçamental)” 14. A esta luz, torna-se claro, que, na situação em concreto, a DGES, ao praticar um acto, desprovido de habilitação legal, viola o disposto no art. 266, nº 2, da C.R.P. e concretizado no art. 3º, nº 1. do CPA. Em segundo lugar, 15.0 acto praticado pela Administração, nos precisos termos em que o foi, viola o princípio geral de direito, previsto no artº 12 do Código Civil, o chamado princípio tempus regit actum que “constitui a regra geral de aplicação das leis no tempo e significa que as normas jurídicas têm efeito apenas para o futuro.”, sendo que, 16.Relativamente ao direito administrativo, tem, a jurisprudência considerado que, “Com referência ao direito administrativo, ao principio tempus regit actum é geralmente imputado o sentido de que os actos administrativos se regem pelas normas em vigor no momento em que são praticados, independentemente da natureza das situações a que se reportam e das circunstâncias que precederam a respectiva adopção.

17.Como ficou consignado no Parecer n°43/47 do Conselho Consultivo da PGR [Procuradoria Geral da República] o momento da perfeição do acto fornece, pois, o critério temporal para a determinação da lei aplicável: aplicar-se-á a velha ou nova lei, conforme aquele momento for anterior ou posterior ao começo de vigência desta. Em sentido semelhante, 18. “tem afirmado a jurisprudência deste Supremo Tribunal, a legalidade do acto administrativo afere-se pela realidade táctica existente no momento da sua prática e pelo quadro normativo então em vigor, segundo a aludida regra, tempus regit actum. Neste sentido decidiram, pelo menos, os acórdãos da 1ª Secção, de 24.2.99-Rº 43459, de 14.3.02-R° 47804, de 7.10.03-R° 790/03, de 5.2.04-Rº 1918/02, de 22.6.04-Rº 1577/04, e deste Pleno, de 24.10.00-R° 37621, de 6.2.02-R° 35272, e de 5-05-2005-R 614/02.” 19.Se a posição da jurisprudência é esmagadora e consensual, relativamente ao facto de que, é no momento da perfeição do acto, ou seja, é no momento em que o acto foi notificado à recorrida que deve aferir da sua conformação legal, a doutrina, 20.Segue posição idêntica, pois que, M. E. de Oliveira, in Direito Administrativo, 29 I vol., 169. «O princípio tempus regit actum constitui a regra geral de aplicação das leis no tempo e significa que as normas jurídicas têm efeito apenas para o futuro. Trata-se de um princípio geral de Direito, recebido no artigo 12º do Código Civil, mas enquanto princípio geral vale no Direito público e no privado” (cf. Parecer da PGR n 135/2001, de 2.5.2002, na linha de orientação de Mário Aroso de Almeida, in Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, pags. 706 e segs.).” 21. “Trata-se de um princípio geral de direito, recebido no artigo 12º do Código Civil, mas que, enquanto princípio geral, vale no direito público e no privado.” “O momento da perfeição do acto fornece o critério temporal para a determinação da lei aplicável: aplicar-se-á a velha ou nova lei, conforme aquele momento for anterior ou posterior ao começo de vigência desta.” 22. ”Como se afirma no parecer deste Conselho nº 77/2005, «como emanação do principio da legalidade a que toda a actividade administrativa está sujeita, os actos administrativos devem reger-se pelas normas que estiverem em vigor à data da sua prática (“tempus regit actum)»“.

23.”Este princípio significa, pois, que, em regra, a legalidade do acto administrativo deve ser aferida pela situação de facto e de direito existente à data da sua prolação, considerando-se relevante, para o efeito, não o momento da formulação do pedido, mas o momento em que o acto é praticado”. Quer isto dizer que, tal como se defende em sede de requerimento cautelar, a Recorrente, ao praticar o acto administrativo, aqui objecto, fá-lo, sem ter ocorrido o devido e necessário transito em julgado da sentença que esta, pretendia executar, pois que, de acordo com o disposto no Código de Processo Civil, 24. aqui aplicado supletivamente, mais concretamente, da conjugação disposições do artº 628º “A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação” e do art.º 704º “A sentença só constitui título executivo depois do trânsito em julgado, salvo se o recurso contra ela interposto tiver efeito meramente devolutivo”, ainda, não tinha transitado em julgado, logo, não estamos perante um título executivo passível de...

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