Acórdão nº 1239/16.2BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução30 de Março de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO V..., Advogado, com domicílio profissional na Rua ..., nº 9 – 1º Dt. º, ..., intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Sintra processo cautelar contra ORDEM DOS ADVOGADOS, com sede no Largo de S. Domingos, 14 – 1º, 1169 – 060 Lisboa, Sendo Contra-Interessado o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, I.P., com sede na Rua Rosa Araújo, nº 43, 1250 – 194 Lisboa.

O pedido formulado foi o seguinte: - Suspensão de eficácia do Acórdão aprovado pela 3ª secção do Conselho Superior da O.A. de 13 de julho de 2016, que deliberou negar provimento ao recurso interposto pelo requerente, confirmando o acórdão recorrido, que tinha decidido aplicar “ao senhor Advogado arguido (...) a pena disciplinar de MULTA no montante de € 3 000,00 (três mil euros)”.

Por decisão cautelar de 15-12-2016, o referido tribunal veio a prolatar decisão, onde indeferiu o pedido.

* Inconformado com tal decisão, o requerente interpôs o presente recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes demasiado e inutilmente longas conclusões: 1.

Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, de 20.12.2016, que decidiu indeferir a requerida providência de suspensão de eficácia do acórdão aprovado pela 3.ª secção do Conselho Superior da OA, de 13 de julho de 2016, que deliberou negar provimento ao recurso interposto pelo Recorrente, confirmando o acórdão recorrido, que tinha decidido aplicar “ao Senhor Advogado (…) a pena disciplinar de MULTA no montante de 3.000, 00 (três mil euros); 2.

O Tribunal “a quo” considerou com relevância para proferir a sentença em causa nos presentes autos, os factos indiciariamente provados resultantes dos números 1 a 11 e os documentos a que faz menção; 3.

O Tribunal “a quo” considerou que: sendo evidente que o Requerente, ora Recorrente praticou atos próprios de advogado à revelia do regime de exclusividade a que se tinha obrigado e, por essa razão ocorre o requisito do fumus malus iuris também previsto no art 120º, nº 1 do CPTA; 4.

E, acrescenta ainda que: também o requisito do periculum in mora não se verifica, porquanto, estando em causa a aplicação de uma pena de multa, inexistem prejuízos de difícil reparação, uma vez que, se a pretensão do requerente, eventualmente, a proceder na ação principal, sempre o montante da multa seria recuperável, atenta a sua qualidade de coisa fungível; 5.

A sentença impugnada ao arrepio do exercício mais prudente e cauteloso da sua função, nem sequer chega a ponderar, como é seu dever e obrigação, dos interesses públicos e privados em presença, de acordo com o comando normativo resultante do n.º 2 do artigo 120.º do C.P.T.A.; 6.

Ora, convém desde já realçar que foi o próprio Tribunal “a quo” que em relação ao facto consumado dos autos, referiu no seu despacho de 2016.10.20 que: Dúvida não sofre que é de reconhecer a existência de uma situação de especial urgência, passível de dar causa a uma situação de facto consumado na pendência do processo. Com efeito, se a pretensão do requerente obtiver provimento, a final, gerar-se-ia uma situação de facto consumado, de difícil reparação, caso o requerente fosse, de imediato, obrigado a pagar a multa no montante de € 3000,00, em que foi condenado, nos termos do ato aqui impugnado. (…).

(sublinhado nosso); 7.

Para além disso referiu ainda: sendo evidente que o Requerente, ora Recorrente praticou atos próprios de advogado à revelia do regime de exclusividade a que se tinha obrigado; o que constitui o pressuposto de toda a sentença e do silogismo que levou o Tribunal “a quo” a proferir a mesma, não tem qualquer suporte probatório; 8.

Com efeito, em nenhum lado da alegada denúncia, do procedimento, da acusação, do acórdão do Conselho Distrital de Deontologia de Lisboa, do acórdão do Conselho Geral da Ordem dos Advogados e da sentença impetrada, consta um só facto que permita ao Tribunal “a quo” considerar que o ora Recorrente praticou atos próprios de advogado, para efeitos dos n.ºs 5, 6, 7 e 9 do artigo 1.º da Lei n.º 49/2004, de 24 de agosto; 9.

Paradoxalmente, ou talvez não, é uma posição no mínimo sui generis, na medida em que todo o procedimento, bem como dos factos que indiciariamente foram provados nos autos, não consta que o Recorrente tenha praticado atos próprios de advogado em representação de quaisquer interesses, públicos ou privados, para efeitos dos n.ºs 5, 6, 7 e 9 do artigo 1.º da Lei n.º 49/2004, de 24 de agosto; 10.

Ora, os atos próprios de advogado, são os que constam dos n.ºs 5, 6, 7 e 9 do artigo1.º da Lei n.º 49/2004, de 24 de agosto e, de jure nenhum deles consta quer dos factos indiciariamente provados quer dos documentos juntos ao procedimento; 11.

ou seja, não existindo elemento probatório que permita ao Tribunal “a quo” fundamentar tal asserção (praticou atos próprios de advogado à revelia do regime de exclusividade), afigura-se que a sentença é nula, por manifesta falta de fundamento probatório; 12.

E, em face dessa nulidade, é ostensiva a procedência da ação principal, pois para se apurar a procedência destes dois vícios não é necessária uma laboriosa indagação em termos de direito, o que é suficiente para se concluir que a procedência do referido vício é palmar, manifesta, não exigindo uma cuidada análise, ou seja, verifica-se o critério de concessão da providência previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 120.º do C.P.T.A., in acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 09 de Julho de 2015, tirado no âmbito do Processo n.º 12.218/15 (disponível in www.dgsi.pt); Acresce que, 13.

Acresce que, a sentença em causa, é manifestamente omissa em relação à apreciação de um dos vícios imputados ao – ato impugnado -, a saber, o vício de forma – por falta dos requisitos legais da decisão condenatória, obrigação que resulta das alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 374.º do C.P.P., aplicáveis por remissão da alínea b) do então artigo 121.º do E.O.A.; 14.

Na verdade, a propósito dos vários vícios imputados ao ato impugnado, a sentença em crise nos autos limitou-se ao seguinte: Quanto à alegada omissão de pronúncia ela não se verifica, pois da análise do Acórdão impugnado resulta a abundante fundamentação e a apreciação do recurso limitado às suas conclusões; além disso, a fundamentação considera-se suficiente quando é claramente compreensível pelo seu destinatário, como tem vindo a ser defendido pela jurisprudência STA, e, aliás, sucedeu, in casu. Atentos os factos assentes, afigura-se que assiste razão à entidade requerida, porque na verdade, a infração disciplinar não se confunde com a infração criminal e, embora o direito penal funcione, subsidiariamente, em relação ao direito disciplinar, colmatando- lhe algumas lacunas, um ilícito disciplinar não é, rigorosamente, crime, pelo que, não têm de ser as concretas circunstâncias de tempo, modo e lugar em que o requerente patrocinou interesses privados, em clara violação do compromisso de exclusividade que assumira para com a entidade pública empregadora; 15.

Ora, a sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, na esteira do ato impugnado que lhe deu origem, é absolutamente omissa quanto aos aspetos que constituem elementos fundamentais de uma decisão condenatória; 16.

Com efeito, decorria do então artigo 121.º do EOA, sob a epígrafe “Direito subsidiário” que: “Ao exercício do poder disciplinar da Ordem dos Advogados, em tudo o que não for contrário ao estabelecido no presente Estatuto e respetivos regulamentos, são subsidiariamente aplicáveis: As normas do Código Penal, em matéria substantiva; As normas do Código de Processo Penal, em matéria adjetiva.”; 17.

E, quanto aos requisitos da sentença, in casu, do acórdão condenatório – ato impugnado -, por remissão da alínea b) do artigo 121.º do EOA, os mesmos estão elencados no artigo 374. ° do C.P.P.; 18.

Acontece que, a sentença em causa, que acolhe o ato administrativo impugnado (decisão condenatória), é omissa, desde logo quanto à indicação precisa da infração disciplinar imputada ao aqui Recorrente (não preenche tal requisito legal afirmar sem elemento probatório que – o Recorrente praticou atos próprios de advogado à revelia do regime de exclusividade a que se tinha obrigado), como resulta da alínea c) do n.º 1 do artigo 374.º do C.P.P., aplicável por remissão da alínea b) do então artigo 121.º do E.O.A.; 19.

Na verdade, é precisamente para que situações destas não ocorram, que existe a obrigação legal da indicação do crime (da infração disciplinar), ou dos crimes imputados (das infrações disciplinares) ao Arguido, aqui recorrente, segundo a acusação, ou pronúncia, se a tiver havido, resultante da alínea c) do n.º 1 do artigo 374.º do C.P.P.

; 20.

Todavia, a este propósito o Tribunal “a quo”, considera que: a infração disciplinar não se confunde com a infração criminal e, embora o direito penal funcione, subsidiariamente, em relação ao direito disciplinar, colmatando-lhe algumas lacunas, um ilícito disciplinar não é, rigorosamente, crime.; 21.

Ora, tal omissão não permite o cabal exercício do direito de defesa, consagrado na própria Constituição da República Portuguesa (cfr.

n.ºs 1 e 10 do artigo 32.º da C.R.P.

) aplicável, como aí expressamente se refere, a todos os processos sancionatórios, incluindo os disciplinares; 22.

O que apenas se alcançaria, caso ao ora Recorrente, através do ato administrativo impugnado (decisão condenatória), ou da sentença impetrada, tivessem sido dadas a conhecer quais as infrações disciplinares com a indicação expressa dos factos e das normas que lhe são imputadas em concreto, o que não ocorre no processo sub judicie; 23.

Pelo que, mal andou o Tribunal ao deixar de se pronunciar sobre questões que é sua obrigação apreciar; 24.

Pelo que, nestes termos, deve a sentença ser anulada, por violação do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, por interpretação e aplicação de preceitos da lei processual administrativa em...

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