Acórdão nº 34/14.8PECBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelJORGE FRAN
Data da Resolução28 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA Nos autos de processo sumário que, sob o nº 34/14.8PECBR, correram termos pelo extinto 3º Juízo Criminal de Coimbra, o arguido A...

foi submetido a julgamento, sendo a final condenado nos seguintes termos: «pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de tráfico de menor gravidade, previsto e punido pelos art.ºs 21.º, n.º 1, 25.º, al. a), e Tabelas Anexas I-A e I-B, do Dec.-Lei 15/93, de 22/01, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão.

Vistas as circunstâncias acima mencionadas e relativas ao arguido, nos termos dos art.ºs 50.º, n.ºs 1 e 2, 52.º, n.ºs 2, als. a), d) e f), 53.º e 54.º, do Cód.Penal, o Tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada ao arguido pelo período de 1 (um) ano e 8 (oito) meses, com regime de prova, assente em plano de reinserção social, a elaborar e executar pelos serviços de reinserção social, com vista a consciencializar o arguido dos malefícios sociais da toxicodependência, e mediante a imposição dos seguintes deveres e regras de conduta: 1. Deveres:

  1. Responder a convocatórias do magistrado responsável pela execução e do técnico de reinserção social; b) Receber visitas do técnico de reinserção social e comunicar-lhe ou colocar à sua disposição informações e documentos comprovativos dos seus meios de subsistência; c) Informar o técnico de reinserção social sobre alterações de residência e de emprego, bem como sobre qualquer deslocação superior a 8 dias e sobre a data do previsível regresso; d) Obter autorização prévia do magistrado responsável pela execução para se deslocar ao estrangeiro.

    1. Regras de conduta: a) Proibição da frequência de todos e quaisquer lugares usualmente conotados com a venda e o consumo de estupefacientes; b) Obrigação de não acompanhar, de não alojar e de não receber, em sua casa ou de terceiros, consumidores de produtos estupefacientes; c) Proibição de trazer consigo quaisquer produtos estupefacientes e seja em que quantidades.

    Nos termos do disposto nos art.ºs 35.º, n.ºs 1 e 2, e 62.º, n.ºs 4, 5, e 6, do Dec.-Lei 15/93, de 22/01, declaro perdida a favor do Estado a substância estupefaciente apreendida nos autos e supra identificada e determino a sua destruição, lavrando-se o respectivo auto e remetendo-se cópia do mesmo a estes autos.

    Visto o preceituado nos art.ºs 109.º, n.º 1, e 111.º, n. º2, do Código Penal, declaro perdidos a favor do Estado:

  2. Veículo automóvel com a marca “Kia FB SHUMA” e a matrícula (...) QV; b) Telemóveis descritos no auto de apreensão de fls. 7; c) Quantia monetária descrita no auto de apreensão de fls. 7; d) Telemóveis, cartões e chips descritos no auto de apreensão de fls.64.

    » Inconformado, o arguido interpôs o presente recurso que motivou, concluindo nos seguintes termos:

  3. Foi o ora arguido condenado pela prática de um crime de tráfico de menor gravidade p. e p. artigo 25.º, alínea a) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

  4. Contudo, não pode o arguido conformar-se com tal decisão, entendendo o arguido que foi feita uma errada valoração da prova produzida em sede de Julgamento, ao não considerar que os estupefaciente na posse dos arguidos eram para consumo.

  5. Entendeu o Tribunal a quo que as quantidades detidas eram demasiado elevadas para se destinarem apenas ao consumo, e que assim sendo trariam quantidades mais pequenas, deixando o remanescente em casa.

  6. Ademais, o facto de o arguido se encontrar na posse de dinheiro, e ter em sua casa vários telemóveis, indiciavam também a prática de um crime de tráfico.

    D1) Desvalorizando, por completo o depoimento do arguido que se encontra gravado no ficheiro 20140225145735 116687 64313 minutos 9,44 a 10,10, que só por si jusificaria decisão diversa. e) Ora a própria Lei despenaliza a posse para consumo até 10 doses, o que é inferior à quantidade detida pelo arguido.

  7. No que tange à argumentação no sentido de que, estando o arguido desempregado este não teria dinheiro para a aquisição dos estupefacientes, esta não procede.

  8. Com efeito, o valor do produto apreendido era inferior a 100€, portanto um valor diminuto, sendo que, os consumidores, não raras vezes, têm a aquisição de estupefacientes como sua primeira prioridade. Além do mais, o arguido tinha a ajuda dos pais e da esposa, para fazer face às suas despesas.

  9. O depoimento prestado pelos agentes inquiridos na qualidade de testemunhas, gravado no ficheiro 20140225145735 116687 64313 minutos 12,57 a 13,37, não revelam factos que estes conheçam, mas apenas meras opiniões ou convicções pessoais, não podendo garantir se o arguido era ou não consumidor, pelo que não deveria ter sido valorada pelo Tribunal a quo.

  10. O facto de o arguido ter uma tão pequena dose em sua casa, revela um padrão de consumidor. Se o arguido apenas vendesse, e não consumisse, não teria uma única dose de cocaína em sua casa.

  11. Na busca domiciliária efectuada à casa do arguido não foi encontrado qualquer artefacto geralmente associado ao tráfico.

  12. A existência de telemóveis, velhos, e inutilizados, ainda que em número relativamente elevado, também não permite retirar qualquer ilação que permita servir de base à imputação ao arguido de um crime de tráfico.

  13. Resulta das fotos juntas aos autos e do depoimento de testemunhas que o arguido vive numa habitação modesta, com mobiliário humilde, sem plasmas ou portáteis, faz-se movimentar num carro de baixa gama e antigo, com diminuto valor comercial.

    M1) Com efeito, no depoimento do agente C..., gravado no ficheiro 20140225153628 64313, minuto 12,23 a 13,21, este confirma que o arguido habitava uma casa modesta, facto que não foi devidamente relevado pelo tribunal.

    M2) O arguido esteve sobre vigilância da polícia pelo menos 6 meses, como resulta do depoimento gravado no ficheiro 20140225153628 64313 minuto 13,30 a 14,27, pelo que sendo este traficante certamente que a investigação poderia facilmente recolher provas sólidas da prática de um crime.

  14. O arguido esteve sobre vigilância da policia desde há pelo menos 6 meses, pelo que, sendo este traficante certamente que a investigação poderia facilmente recolher provas sólidas da prática de um crime.

  15. Não obstante, os agentes da autoridade, não carrearam qualquer prova para o processo, para além da droga apreendida, quando cruzando-se, por acaso, com o arguido, o mandaram parar.

  16. Fosse o arguido um verdadeiro traficante, e certamente que os agentes da PSP, cuja competência é absolutamente inquestionável, reuniriam com facilidade prova mais do que suficiente para fundamentar a prática de pelo menos um crime de tráfico.

  17. Toda a prova que serviu de base à fundamentação do Tribunal é meramente indiciária, não servindo, mesmo com recurso às regras da experiência ou da normalidade para negar que o arguido detinha as substâncias apenas para o seu consumo.

  18. Não foi assim feita qualquer prova, que indicasse que o arguido não fosse consumidor e ao invés se dedicasse ao tráfico.

  19. Por outro lado, do depoimento do recorrente, gravado no ficheiro 2014025145735 116687 64313, resulta que este era apenas consumidor, num depoimento que se revelou seguro, coerente e credível, devendo como tal ser valorado.

  20. O Recorrente vive num ambiente familiar estável, mas humilde, sem quaisquer sinais exteriores de riqueza, modo de vida nada característico de alguém que se dedique ao tráfico.

  21. Em todo o caso, atenta a escassez da prova produzida, deverá mobilizado o principio do in dubeo pro reo, absolvendo-se o arguido.

  22. Deverá assim, ser revogado o douto acórdão proferido pelo Tribunal a quo...

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