Acórdão nº 11/13.6PBCVL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Janeiro de 2015
Data | 28 Janeiro 2015 |
Órgão | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No 3º Juízo do [já extinto] Tribunal Judicial da comarca da Covilhã, mediante despacho de pronúncia, foi submetido a julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, o arguido A...
, com os demais sinais nos autos, a quem era imputada a prática, em autoria material e na forma consumada, de dois crimes de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, nº 1 do C. Penal.
O Centro Hospitalar da Cova da Beira, EPE, deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido com vista à sua condenação no pagamento das quantias de € 56,16 e € 56,16, devidas pela assistência prestada a C... e B....
C... deduziu pedido de indemnização contra o arguido com vista à sua condenação no pagamento da quantia de € 1.350, por danos patrimoniais [€ 150] e não patrimoniais sofridos [€ 1.200].
B... deduziu pedido de indemnização contra o arguido com vista à sua condenação no pagamento da quantia de € 1.350, por danos patrimoniais [€ 150] e não patrimoniais sofridos [€ 1.200].
Por sentença de 5 de Março de 2014, foi o arguido condenado, pela prática dos imputados crimes, nas penas de 220 dias de multa e de 190 dias de multa, e em cúmulo, na pena única de 320 dias de multa à taxa diária de € 6, perfazendo a multa global de € 1.920.
Mais foi condenado o arguido no pagamento ao Centro Hospitalar da Cova da Beira, EPE da quantia de € 112,32, acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, desde a data da notificação do pedido e até integral pagamento, no pagamento ao demandante C... da quantia de € 200 por danos não patrimoniais, e no pagamento à demandante B... da quantia de € 400 por danos não patrimoniais.
* Inconformado com a decisão recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: I. Resulta que, em audiência de discussão e julgamento, todos os elementos de prova testemunhal (dos ofendidos, do arguido e de pelo menos uma testemunha, contradizem, quer as conclusões e decisão proferida em sede da apreciação da prova, nomeadamente, no que respeita os pontos essenciais dados como provados que levaram à condenação do arguido, como todas as outras premissas e conclusões em que assentou a Meritíssima Juíza a quo para sustentar a condenação do Arguido.
II. Da prova produzida em sede de audiência e julgamento impunha-se reconhecer, pelo depoimento da própria ofendida, pela extensão, características e local da lesão que esta apresentava e identificada do relatório médico junto aos autos e, essencialmente, pelas necessárias e elementares regras da experiência comum, que a lesão em causa não poderia ter origem no acto que foi dado como provado nos autos, antes, sendo totalmente consentânea com o embater da porta da entrada de sua casa, no membro superior direito da ofendida que a segurava – como aliás consta da própria motivação constante da decisão – que pudesse levar às conclusões que supra sublinhadas.
III. Na verdade, não vislumbramos que a, sempre respeitável, livre convicção do tribunal se possa alicerçar em fundamentos e provas inexistentes e contraditórias, à revelia dos mais elementares princípios de Direito Penal! IV. Na verdade, todos os depoimentos e provas admissíveis recolhidos em sede de julgamento apontam nesse sentido, sendo que, nesse caso importará sempre reconhecer que a falta de intencionalidade no empurrão da porta que manifestamente reduz a culpa do arguido.
V. Por outro lado é manifesto que o depoimento quer da ofendida quer do ofendido quer de todas as testemunhas, referem que o ofendido é que se dirigiu ao local acompanhado por 3 pessoas, para tirar satisfações, e foi ele que exigiu que o arguido fosse chamado ao local para se travar de razões com ele.
VI. Nesta aspecto foram, totalmente, não foram, em nosso entender, correctamente valorados interpretados o depoimento do próprio ofendido C... e de pelo menos uma testemunha – I... – e, que, em nosso entender, contradizem totalmente os factos dados como provados em 7 e 8 dos factos provados na douta sentença.
VII. De tais depoimentos, em momento algum, resulta que o ofendido fosse atrás do arguido – tendo-se apenas dirigido ao apartamento onde habitava a testemunha I... e aí procedeu da forma que a testemunha referiu, agredindo-a, e exigindo que aquele chamasse o arguido, o que aconteceu e ali esperou pelo arguido, até que o arguido apareceu no elevador passado algum tempo e mal saiu (até pelo reduzido espaço onde ocorreram estes factos, descrito pelos intervenientes e pela testemunha) de imediato se pegaram mutuamente.
VIII. Não correspondendo à verdade que tenha sido o Arguido a avançar para o ofendido.
IX. Tal incorrecta valoração e apreciação da prova, implicarão necessariamente, alterações na matéria de facto provada e implicarão um reapreciação da prova e da decisão por ela fundamentada, nomeadamente, no que se refere à culpa à medida da pena que foi aplicada ao arguido.
X. Pelo que se forçosamente se terá de reapreciar a matéria de facto objecto dos depoimentos identificados.
Tudo como é da mais elementar Justiça! * Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público, alegando, em síntese, que a ofendida disse ter sido empurrada e agarrada pelo arguido, que este foi condenado por crime doloso, não vindo acusado da prática de crime negligente, que saber quem avançou primeiro e para quem são factos instrumentais da apurada conduta do arguido, que a existência de versões contraditórias entre testemunhas dos ofendidos e testemunhas do arguido é vulgar e que tudo releva da credibilidade atribuída a cada uma, que não foi cumprido o ónus de especificação quanto aos segmentos das declarações tidas por contraditórias e que não se descortinam razões para a pretendida diminuição da culpa, e concluiu pelo não provimento do recurso.
* Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, acompanhando a contramotivação do Ministério Público, realçando a inobservância do ónus de especificação imposto pelo recurso da matéria de facto, e concluiu pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.
* Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.
* Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.
* * * * II. FUNDAMENTAÇÃO Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.
Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são: - A incorrecta decisão proferida sobre a matéria de facto; - As consequências da modificação da decisão proferida sobre a matéria de facto na medida da pena.
* Para a resolução desta questão importa ter presente o que de relevante consta da sentença recorrida. Assim:
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Nela foram considerados provados os seguintes factos: “ (…).
[Da decisão instrutória (que remete para a acusação pública):] 1. No dia 16 de Janeiro de 2013, pelas 23h15m, o arguido dirigiu-se à residência sita no r/c esquerdo do n.º 0... da Rua Saudade na cidade da Covilhã e aí tocou à campainha.
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Ao que, B..., aí residente, abriu a porta e o arguido confrontou-a com a existência de ruído de vizinhança neste local.
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B... tentou encetar conversação com o arguido dizendo-lhe que não o conhecia de lado nenhum.
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Mas o arguido empurrou bruscamente a porta de entrada de habitação de modo a entalá-la e desferiu sobre a mesma um murro no braço direito.
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Tendo chegado a entrar na sua habitação, mas tendo sido impedido por D... e E..., que lhe ordenaram que se pusesse dali para fora, o que o mesmo fez.
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De seguida, B... telefonou ao seu marido, C..., a relatar-lhe o ocorrido e a chamá-lo para vir ter a casa por ter sido agredida.
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C..., de imediato, dirigiu-se a casa e foi atrás do arguido pedir explicações relativamente ao ocorrido, tendo descido à 1.ª cave do prédio identificado em 1., onde o arguido tem um andar arrendado.
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Chegado o arguido ao local mencionado em 7., este, ao ver C... avançou sobre ele, tendo-se ambos envolvido fisicamente e tendo o arguido, nesse contexto, desferido sobre o C... uma joelhada, murros na face e pontapés no corpo.
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Em consequência do descrito em 4. e 8., B... e C..., sentiram dores ao longo do seu corpo que lhe determinaram a necessidade de serem assistidos no serviço de urgência do Centro Hospitalar da Cova da Beira na Covilhã.
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Como consequência directa e necessária da conduta do arguido, a ofendida sofreu uma equimose com 15x8cm na face postero externa do braço e cotovelo direitos.
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Tais lesões determinaram a B... 8 (oito) dias para a cura, sem afectação da capacidade de trabalho geral e de trabalho profissional.
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Como consequência directa e necessária da conduta do arguido, o ofendido sofreu escoriações no queixo e polegar da mão esquerda.
13. Ao actuar nos termos descritos em 4. e 8., o arguido agiu com o propósito de lesar o corpo e a saúde de B... e C..., o que efectivamente conseguiu.
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O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que os seus comportamentos eram proibidos e punidos pela lei penal como crime.
[Dos pedidos de indemnização civil deduzidos pelo CHCB] 15. Por causa do descrito em 8., C... foi, no...
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